Situação Geral dos Tribunais

O prazo de antecedência para a denúncia do contrato de arrendamento calcula-se com base na duração da última renovação do contrato

        A Autora, proprietária da fracção autónoma sito no edifício x, celebrou com o Réu um contrato de arrendamento, nos termos do qual aquela deu de arrendamento a este a fracção autónoma supramencionada, pelo período compreendido entre 5 de Janeiro de 2008 e 4 de Agosto de 2008, mediante a renda mensal de MOP$2.800,00.Findo o prazo de arrendamento, as partes convencionaram verbalmente que o contrato se renovaria pelo período de sete meses. Depois disso, cada vez que terminou o prazo de arrendamento, as partes renovaram o contrato pela mesma forma. Mas na constância do arrendamento, as partes modificaram várias vezes o valor da renda, sendo de MOP$5.500,00 o valor actual da renda mensal. A Autora pretendeu alguma vez que o Réu lhe restituísse a fracção autónoma em causa até 30 de Setembro de 2013. Porém, como o Réu não recebeu a carta registada enviada pela Autora, esta não conseguiu fazer aviso prévio nos termos legais, ficando o contrato de arrendamento renovado automaticamente até 3 de Junho de 2014. A fim de dissolver a relação locativa entre as partes, a Autora, mediante escritório de advogados, enviou ao Réu, por carta registada, comunicações da denúncia do contrato de arrendamento, em 14 de Janeiro de 2014 e em 4 de Março de 2014, respectivamente, as quais não chegaram ao poder do Réu por sua recusa em as receber. Por isso, em 6 de Março de 2014, o mesmo escritório de advogados entregou pessoalmente ao domicílio do Réu as respectivas correspondências, que foram recebidas pelos seus familiares. Após findo o prazo em 4 de Junho de 2014, a Autora ligou diversas vezes para o Réu, solicitando a devolução da fracção arrendada, sem obter êxito. Além disso, o Réu deixou de pagar a renda desde Fevereiro de 2014. Quando a Autora telefonou ao Réu para cobrar as rendas em dívida, só respondeu este último: “As rendas que te devo, vou pagar quando me apetecer.”

        No dia 15 de Agosto de 2014, a Autora intentou no Tribunal Judicial de Base uma acção de despejo contra o Réu. Entendeu o Tribunal Judicial de Base que, tendo em conta que a respectiva relação locativa durou mais de seis anos, a comunicação da denúncia feita pela Autora ao Réu não observou o prazo de antecedência de 180 dias consagrado no art.º 1039.º, n.º 1, al. a) do Código Civil, não produzindo, pois, o efeito de fazer cessar o contrato, razão pela qual o Réu não está obrigado a restituir a fracção arrendada, não assistindo à Autora o direito de exigir ao Réu uma indemnização pelo atraso na restituição da fracção arrendada desde Junho de 2014. Assim sendo, o Tribunal Judicial de Base julgou improcedente o pedido de despejo e restituição da fracção arrendada, mas concedeu provimento ao pedido de indemnização, apresentado a título de rendas em dívida, no valor de MOP$60.500,00, absolvendo o Réu dos demais pedidos.

        Discordando do assim decidido, a Autora interpôs recurso para o Tribunal de Segunda Instância, alegando que o Tribunal recorrido incorreu em erro na interpretação e na aplicação da lei, e defendendo que deveria aplicar-se o art.º 1039.º, n.º 1, al. b) do Código Civil que estabelece para a comunicação da denúncia a antecedência mínima de apenas 90 dias.

        Conforme adiantou o Tribunal de Segunda Instância, desde o início do aludido contrato até ao termo da última renovação, transcorreu um período de 6 anos 5 meses e 6 dias. Todavia, para determinar a antecedência mínima com que se deve comunicar a denúncia, o prazo de arrendamento mencionado nas diferentes alíneas do art.º 1039.º do Código Civil não se refere à duração global e efectiva do contrato acrescida de todas as suas renovações, mas singularmente à duração do contrato ou à da sua última renovação. Isto porque, nos termos do art.º 1038.º, n.º 2, a denúncia não pode ser eficaz antes do decurso do prazo de dois anos sobre o início do arrendamento, caso seguíssemos o entendimento do Tribunal a quo para ter em conta a duração global do contrato, não teriam sentido as alíneas c) e d) do art.º 1039.º.

        Neste caso concreto, sendo de sete meses a duração da última renovação do contrato de arrendamento, é aplicável o disposto no art.º 1039.º, n.º 1, al. c), pelo que, diversamente do que entenderam a Autora ou o Tribunal a quo, o prazo para a comunicação da denúncia seria de 30 dias no mínimo, e não de 180 dias, nem tampouco de 90 dias. Uma vez que o termo da última renovação ocorreria em 3 de Junho de 2014, a denúncia efectuada em Março desse ano respeitava, por excesso, esse prazo. Dito isto, o recurso nesta parte merece proceder.

        Por outro lado, considerando a tempestividade da denúncia, é óbvio que, além da condenação já efectuada na 1ª instância, o Réu tem que ficar incurso no pagamento das rendas a partir de Junho de 2014 até à efectiva entrega do local arrendado, porque assim o determina o art.º 1027.º do Código Civil. Tal indemnização correspondente ao valor da renda será elevada para o dobro, em caso de mora do Réu na entrega do arrendado após interpelação pela Autora.

        Nos termos expostos, o Tribunal de Segunda Instância concedeu provimento ao recurso e, em consequência, revogou a sentença recorrida na parte em que julgou improcedente o pedido de despejo, decretando o despejo imediato do Réu da fracção a este arrendada pela Autora. Condenou, ainda, o Réu no pagamento da indemnização correspondente ao valor da renda, por cada mês de atraso na restituição do arrendado, e que será elevado ao dobro em caso de mora deste após interpelação pela Autora.

        Vide Acórdão do TSI, processo n.º 710/2015.

 

Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância

07/03/2016