Situação Geral dos Tribunais

A aplicação da multa por atraso na conclusão de obra pode ter lugar até à recepção definitiva da obra

     A Companhia A, interpôs recurso contencioso de anulação para o Tribunal de Segunda Instância do despacho de 24 de Julho de 2013, do Secretário para os Transportes e Obras Públicas, que a puniu com uma multa no montante de MOP$8.865.561,00 por atraso de 64 dias na conclusão de obra “Empreitada de Construção do Dique da Zona de Aterro de Material de Construção no COTAI” que lhe fora adjudicada.

     O Tribunal de Segunda Instância, por acórdão de 23 de Julho de 2015, concedeu provimento ao recurso e anulou o mencionado acto, por extemporaneidade na aplicação da multa, tendo entendido que a mesma só poderia ter sido aplicada até ao fim dos trabalhos, que ocorre imediatamente antes da recepção provisória, nos termos do artigo 174.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 74/99/M, de 8 de Novembro.

     Inconformado, interpõe o Secretário para os Transportes e Obras Públicas recurso jurisdicional para o Tribunal de Última Instância, sustentando que a multa poderia ter sido aplicada até à recepção definitiva da empreitada.

     Finda a apreciação da causa, entendeu o Tribunal Colectivo do Tribunal de Última Instância quea aplicação de multas pelo dono da obra ao empreiteiro, tem, como qualquer sanção, uma dupla finalidade, preventiva e repressiva, nuns casos acentuando-se mais uma vertente, noutras, outra. No caso das multas do artigo 174.º parecem estar em causa as duas finalidades. Sanciona-se o empreiteiro para o castigar pelo incumprimento mas, sobretudo se a aplicação da multa ocorrer antes do fim dos trabalhos, pune-se para que corrija a sua actuação.

     Acordaram que a tese do acórdão recorrido tem contra si uma razão de lógica e de razoabilidade. Se a multa é, como no caso, por incumprimento do prazo contratualmente estabelecido, não faria sentido que ela só pudesse ser aplicada até ao fim dos trabalhos. É que o dono da obra não sabe, antecipadamente, quando vai ocorrer o fim dos trabalhos. Este fim há-de ser comunicado pelo empreiteiro ao dono da obra, a fim de este promover a vistoria, que há-de conduzir à recepção provisória da obra. No caso de incumprimento do prazo contratualmente estabelecido para a obra, só no fim desta é que se sabe qual foi o período de incumprimento contratual. Ora, se o dono da obra só pudesse aplicar a multa por incumprimento do prazo contratualmente estabelecido até ao fim dos trabalhos, como este lhe é comunicado pelo empreiteiro, a partir daí não poderia aplicar nenhuma multa com o fundamento em causa. Até porque ainda teria de notificar o empreiteiro para se pronunciar no prazo de 10 dias para se defender da eventual aplicação de multa. E anteriormente também não a podia aplicar, dado que o dono da obra, antes do fim dos trabalhos, não sabia qual o prazo da mora do empreiteiro. Só o poderia saber quando este terminasse a obra. De qualquer modo, sempre há um termo final para a aplicação de multas, que é a data da recepção definitiva, se o contrato não se extinguir por outra forma.

     Assim, o Tribunal Colectivo concluiu que a aplicação da multa prevista no artigo 174.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 74/99/M, pode ter lugar até à recepção definitiva da obra, e o n.º 1 das aludidas dispostas “…até ao fim dos trabalhos ou à rescisão do contrato…” significaria que os dias de multa diária a aplicar contar-se-iam até ao fim dos trabalhos ou à rescisão do contrato.

     Face ao expendido, acordaram conceder provimento ao recurso jurisdicional e revogaram o acórdão recorrido, para que conheça dos restantes vícios imputados ao acto, se nada obstar a tal.

     Cfr. o acórdão do processo n.º 2/2016 do Tribunal de Última Instância.

 

Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância

11/05/2016