Situação Geral dos Tribunais

Foi revogada a autorização para funcionamento da companhia offshore por não dispor de contabilidade organizada

      A companhia A interpôs, para o Tribunal de Segunda Instância (TSI), recurso contencioso de anulação do despacho de 18 de Fevereiro de 2014 do Secretário para a Economia e Finanças, que revogou a autorização da recorrente para funcionamento como instituição de serviços comerciais e auxiliares offshore por não dispor de contabilidade organizada,.

      Em 21 de Abril de 2016, O Tribunal Colectivo do TSI negou provimento ao recurso.

      Inconformada, interpôs A recurso jurisdicional para o Tribunal de Última Instância (TUI), alegando que: A recorrente dispõe de contabilidade organizada, ao contrário do que entendeu o acórdão recorrido; a decisão de revogação em causa foi efectivamente praticada ao abrigo de poderes discricionários, representando o acto recorrido uma violação dos princípios da prossecução do interesse público, da adequação e da proporcionalidade.

      O Tribunal Colectivo do TUI conheceu do caso e entendeu que: A recorrente exerce a actividade offshore, como instituição de serviços comerciais e auxiliares offshore nos termos regidos pelo Decreto-Lei n.º 58/99/M. Nos termos do mesmo diploma, as instituições offshore dispõem obrigatoriamente de contabilidade organizada, sob pena de ser revogada a autorização para funcionamento como instituição de gestão fiduciária offshore.

      Como é sabido, a contabilidade organizada é um regime fiscal aplicável a certos contribuintes, no âmbito do imposto complementar de rendimentos e do imposto profissional. Uma vez que o Decreto-Lei n.º 58/99/M, para os efeitos do disposto nos artigos 68.º e 42.º, n.º 1, alínea e), não define o que seja contabilidade devidamente organizada, é razoável presumir que o legislador quis adoptar o conceito fiscal, tal como ele é acolhido nas normas de contabilidade. Portanto, as Normas de Relato Financeiro, constantes do Anexo II ao Regulamento Administrativo n.º 25/2005, aplicam-se à preparação e apresentação das demonstrações financeiras, entre outras, das instituições offshore, ainda que no exercício da actividade regulada pelo Decreto-Lei n.º 58/99/M. Um conjunto completo de demonstrações financeiras inclui: (a) um balanço; (b) uma demonstração dos resultados; (c) uma demonstração de alterações no capital próprio que mostre: (i) todas as alterações no capital próprio; ou (ii) as alterações no capital próprio que não sejam as provenientes de transacções com detentores de capital próprio agindo na sua capacidade de detentores de capital próprio; (d) uma demonstração dos fluxos de caixa; (e) notas, compreendendo um resumo das políticas contabilísticas significativas e outras notas explicativas. É pacífico que uma instituição offshore que não elabore as demonstrações financeiras a que está obrigada, e que sucintamente descrevemos, não dispõe de contabilidade devidamente organizada.

      O Tribunal Colectivo entendeu que, era indiscutível que a recorrente não cumpriu o dever imposto pelo artigo 66.º do Decreto-Lei n.º 58/99/M atrás citado, que consiste em enviar ao IPIM o relatório e contas de cada exercício, acompanhado do correspondente relatório de auditoria. Não o fez no prazo legal nem posteriormente, tendo sido sancionada por tal incumprimento. É evidente que uma entidade poderia ter elaborado o relatório e contas de um exercício mas não o ter enviado no prazo previsto, por esquecimento ou outra razão. Haveria violação de um dever, punível com multa nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 70.º do Decreto-Lei n.º 58/99/M, mas não falta de contabilidade organizada. Não era este o caso da recorrente. Esta não só não enviou o relatório e contas do exercício em questão, como o não elaborou. Portanto, não tinha a recorrente contabilidade devidamente organizada, como entendeu o acórdão recorrido e decidiu o acto administrativo recorrido.

      O Tribunal Colectivo entendeu que, no que respeita à questão de violação de princípios jurídicos por parte dos actos recorridos, alegada pela recorrente, estatui o artigo 68.º do Decreto-Lei n.º 58/99/M que a autorização para o funcionamento de instituições de serviços comerciais e auxiliares offshore é revogada nos casos previstos nas alíneas a) a f) do n.º 1 do artigo 42º. Destes dois preceitos (artigos 68.º e 42.º) resulta, indiscutivelmente, que logo que se verifiquem os comportamentos, as omissões, ou as infracções previstas no último dos artigos, impõe-se, inelutavelmente, à Administração a revogação da autorização para o funcionamento da instituição offshore em questão. Não tem a Administração qualquer margem de livre apreciação ou decisão. Contra o entendimento do acórdão recorrido de que o acto administrativo recorrido foi praticado no uso de poderes vinculados, não relevando, por conseguinte, a alegada violação de princípios jurídicos por parte do mesmo acto. Tratando-se de acto praticado no exercício de poderes vinculados não é operante a alegação de violação de princípios jurídicos, de justiça, proporcionalidade ou outros, como tem este Tribunal decidido uniformemente.

      Pelo exposto, o Tribunal Colectivo negou provimento ao recurso jurisdicional.

      Cfr. o acórdão do processo n.º 53/2016 do Tribunal de Última Instância.

 

Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância

29/09/2016