Situação Geral dos Tribunais

Acórdão do Tribunal de Segunda Instância que negou provimento ao recurso da concessionária do terreno desocupado foi reenviado para novo julgamento

      Em 7 de Julho de 2016, o Tribunal de Segunda Instância (TSI) negou provimento ao recurso contencioso interposto pela concessionária do terreno sito na Taipa, no Aterro de Pac On, Lote D, contra o despacho do Chefe do Executivo que declarou a caducidade da concessão do terreno, confirmando a decisão administrativa de reversão do terreno. Inconformada, veio a concessionária recorrer para o Tribunal de Última Instância (TUI). O TUI conheceu do caso.

      O Tribunal Colectivo indicou que, o acórdão recorrido entendeu erradamente o fundamento que o despacho recorrido teve por base ao declarar a caducidade da concessão do terreno. No despacho, o único fundamento da caducidade foi a falta de aproveitamento do terreno no prazo contratual, e não o decurso do prazo da concessão como foi entendido pelo acórdão recorrido, por que: em primeiro lugar, o fundamento jurídico invocado no parecer do Secretário para os Transportes e Obras Públicas que o despacho recorrido tem por base é a “alínea a) do n.º 1 da cláusula décima terceira do contrato que rege a revisão da concessão do terreno, bem como o disposto na alínea 1) do n.º 1 do artigo 166.º da Lei n.º 10/2013 (Lei de Terras) ”, que se referem ambos à caducidade das concessões por não conclusão do aproveitamento do terreno nos prazos e termos contratuais, o que quer dizer que, nunca se invoca a caducidade com fundamento nos artigos 47.º, 48.º e 52.º da Lei de Terras, que são aqueles em que prevê a caducidade por decurso do prazo; em segundo lugar, no parecer da Comissão de Terras, no qual se baseia, por seu lado o mencionado parecer do Secretário para os Transportes e Obras Públicas, faz-se referência ao facto de o prazo de arrendamento ter terminado em 26 de Outubro de 2013, num parágrafo apenas num texto denso de 35 páginas, mas exactamente para esclarecer que tal facto não impede a continuidade do procedimento de declaração de caducidade da concessão do terreno com base no incumprimento das obrigações contratuais e nos termos previstos na alínea 1) do n.º 1 do artigo 166.° e no artigo 167.° da Lei n.º 10/2013 (Lei de Terras); em terceiro lugar, a concessionária foi notificada em 23 de Novembro de 2012, para efeitos da audiência prévia, nos termos do artigo 93.º do Código do Procedimento Administrativo, da intenção de se proferir decisão de caducidade da concessão por falta de aproveitamento do terreno no prazo contratualmente previsto, tendo a concessionária respondido por escrito em 6 de Dezembro de 2012, ora, não só a concessionária apenas foi ouvida sobre a intenção de se declarar a caducidade por falta de aproveitamento do terreno no prazo contratualmente previsto, como também, tanto em 23 de Novembro de 2012, como em 6 de Dezembro de 2012, não tinha ainda decorrido o prazo de 25 anos da concessão, que só ocorreu a 26 de Outubro de 2013; em quarto, quando o fundamento decisório da declaração de caducidade é o decurso do prazo, isso aparece claramente dito na decisão e não apenas na fundamentação. Assim, o acórdão recorrido enferma de excesso de pronúncia sempre que se pronunciou sobre questões pressupondo que o acto administrativo recorrido se fundamentou no decurso do prazo da concessão, ao mesmo tempo, o acórdão recorrido é nulo por omissão de pronúncia na parte em que não se pronunciou sobre questões relativas ao real fundamento do acto administrativo (não conclusão do aproveitamento do terreno nos prazos e termos contratuais) designadamente, erro manifesto ou total desrazoabilidade dos poderes discricionários, violação dos princípios da boa-fé, da igualdade, da justiça, da tutela da confiança e da proporcionalidade.

      Por outro lado, o Tribunal Colectivo esclareceu detalhadamente sobre a aplicação da antiga e nova lei de Terras e das cláusulas contratuais. O Tribunal Colectivo indicou que, no que respeita aos direitos e deveres dos concessionários, a alínea 2) do artigo 215.º da nova Lei de Terras faz prevalecer o convencionado nos respectivos contratos sobre o disposto na lei. Na sua falta, aplica-se a nova Lei e não a antiga Lei (Lei n.º 6/80/M), mas não impede a aplicação do artigo 11.º do Código Civil. Assim, no contrato de concessão de terreno celebrado entre a concessionária e RAEM, a cláusula 13.ª onde se estipula sobre as condições de caducidade do contrato de concessão por falta de aproveitamento do terreno no prazo contratual, pelo que a mesma se aplica nos termos da alínea 2) do artigo 215.º da Lei nova. Nas situações omissas pode ter lugar a aplicação da Lei nova.

      Quanto à alínea 3) do artigo 215.º da lei nova, o Tribunal Colectivo indicou que, tendo em conta que o proémio do artigo 215.º já determina a aplicação da lei às concessões provisórias anteriores à sua entrada em vigor, a intenção desta alínea é a de aplicar imediatamente dois preceitos da lei nova, mesmo contra o que esteja convencionado nos respectivos contratos (alínea anterior) e na lei antiga. Segundo esta alínea 3), no que respeita às concessões provisórias, as alíneas 1) e 2) do n.º 1 do artigo 166.º da nova Lei de Terras prevalecem sobre as alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 166.º da Lei antiga, e também prevalecem sobre o disposto na alínea a) do n.º 1 da cláusula 13.ª do contrato de concessão. Isto é, as concessões provisórias caducam quando se verifique não conclusão do aproveitamento do terreno nos prazos e termos contratuais ou, sendo o contrato omisso, decorrido o prazo de 150 dias previsto no n.º 3 do artigo 104.º, independentemente de ter sido aplicada ou não a multa. Ou seja, na nova Lei de Terras pode ser declarada a caducidade por não conclusão do aproveitamento do terreno nos prazos e termos contratuais decorrido o prazo de 150 dias previsto no n.º 3 do artigo 104.º, independentemente de ter sido aplicada ou não a multa. Assim, não há violação da cláusula 13.ª do contrato de concessão, nem dos artigos 166.º e 215.º da nova Lei de Terras, nem das disposições da antiga Lei, não aplicáveis nesta sede.

      Finalmente, sobre a questão de violação da Instrução n.º 095/DSODEP/2010, de 12 de Maio de 2010, o Tribunal Colectivo indicou que, as instruções são ordens dadas pelos superiores para serem seguidas pelos subalternos de modo a habilitá-los a proceder em circunstâncias futuras que não se sabe precisamente como se apresentarão. A violação de instrução pode constituir infracção de dever funcional por parte do subalterno, mas não constitui fonte de direito, pelo que o interessado não pode invocar a violação de instrução, como fundamento de anulação de acto administrativo. Portanto, não procede este fundamento.

      Face ao expendido, o Tribunal Colectivo concedeu parcial provimento ao recurso jurisdicional e:

      A) Revogou o acórdão recorrido na parte em que interpretou o acto recorrido no sentido de que a caducidade do contrato de concessão também foi declarada com fundamento no decurso do prazo da concessão;

      B) Declarou nulo o acórdão recorrido por excesso de pronúncia sempre que se pronunciou sobre questões pressupondo que o acto administrativo recorrido se fundamentou no decurso do prazo da concessão, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 563.º, n.º 3, 571.º, n.º 1, alínea d), 2.ª parte e 633.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, aplicáveis por força do preceituado no artigo 1.º do Código de Processo Administrativo Contencioso;

      C) Declarou nulo o acórdão recorrido por omissão de pronúncia na parte em que não se pronunciou sobre questões relativas ao real fundamento do acto administrativo (não conclusão do aproveitamento do terreno nos prazos e termos contratuais), nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 563.º, n.º 2, 571.º, n.º 1, alínea d), 1.ª parte e 633.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, aplicáveis por força do preceituado no artigo 1.º do Código de Processo Administrativo Contencioso, designadamente, quantos aos vícios alegados respeitantes a erro manifesto ou total desrazoabilidade na utilização dos poderes discricionários, violação dos princípios da boa-fé, da igualdade, da justiça, da tutela da confiança e da proporcionalidade, devendo o Tribunal recorrido, com os mesmos Juízes, conhecer das matérias omitidas;

      D) Negou provimento ao recurso, na parte restante.

      Cfr. Acórdão do Tribunal de Última Instância, no Processo n.º 81/2016.

 

Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância

22/02/2017