Situação Geral dos Tribunais

A polícia tem poderes para fixar uma área para reunião ou manifestação dentro da zona de Portas do Cerco, com fundamento em considerações de segurança pública

      Em 13 de Março de 2017, Cheong Weng Fat, na qualidade de representante de Macau Power People, deu conhecimento ao presidente do conselho de administração do Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais de reunião, a realizar de 17 a 31 de Março de 2017, entre as 7:30 horas e as 21 horas, na zona das Portas do Cerco, no corredor coberto para peões. Em 15 de Março de 2017, o despacho do Comandante do Corpo de Polícia de Segurança Pública (CPSP) impediu a reunião no mencionado corredor, determinando que esta tivesse lugar nessa zona, mas fora do corredor. Veio Macau Power People interpor recurso para o Tribunal de Última Instância (TUI) deste despacho, alegando que anteriormente a Polícia permitia a reunião no corredor em causa.

      Apreciando a causa, entendeu o Colectivo do TUI que, de acordo com o artigo 40.º da Lei Básica, os direitos e liberdades de que gozam os residentes de Macau não podem ser restringidos excepto nos casos previstos na lei e as restrições aos direitos e liberdades não podem contrariar as convenções internacionais aplicáveis em Macau, bem como que também o n.º 3 do artigo 1.º da Lei n.º 2/93/M, determina que o exercício dos direitos de reunião ou manifestação apenas pode ser restringido, limitado ou condicionado nos casos previstos na lei. Relativamente aos direitos de reunião e manifestação, no sentido de proibir ou impor restrições antes da sua realização, o comandante do CPSP apenas tem competência para exercer os poderes previstos no artigo 8.º, n. os 2 e 3. Já no decurso de tais actividades, as autoridades policiais têm outros poderes, previstos no artigo 11.º, no sentido da sua interrupção, quando tenha sido regularmente comunicada aos promotores a sua não permissão, quando as mesmas, afastando-se da sua finalidade ou não tendo sido objecto de aviso prévio, infrinjam o disposto no artigo 2.º ou quando as mesmas se afastem da sua finalidade pela prática de actos contrários à lei que perturbem grave e efectivamente a segurança pública ou o livre exercício dos direitos das pessoas.

      No caso dos autos, o Comandante do CPSP não determinou nenhuma alteração do local da reunião/manifestação, limitou-se a fixar uma faixa dentro da zona das Portas do Cerco, onde a pessoa/o grupo deve efectuar a reunião/manifestação. Mas a Lei n.º 2/93/M nada diz expressamente a este respeito, terá violado a lei?

      Entendeu o Colectivo do Tribunal de Última Instância que, há ponderar que a Lei já tem mais de 20 anos. A realidade social e política de Macau mudou muito neste lapso de tempo. A população aumentou. O número de turistas que visitam Macau cresceu exponencialmente, a realidade política é, também, completamente diversa da de 1993. E a Lei continua a mesma. É certo, por outro lado, que a lei não pode prever tudo. É sabido que ao CPSP incumbem atribuições de manutenção da ordem e tranquilidade públicas, bem como da segurança pública. Com base no artigo 11.º da Lei n.º 2/93/M, a Polícia pode interromper manifestações quando as mesmas se afastem da sua finalidade pela prática de actos contrários à lei que perturbem grave e efectivamente a segurança pública ou o livre exercício dos direitos das pessoas. Cabe também ao CPSP, em sede de manifestações, zelar pelo bom ordenamento do trânsito de pessoas nas vias públicas (artigo 8.º, n.º 2, da Lei n.º 2/93/M). Assim sendo, com base neste conjunto de normas, afigura-se-nos poder extrair um princípio segundo o qual a Polícia tem poderes para fixar uma área para reunião ou manifestação, dentro do local mais vasto pretendido pelos respectivos promotores, com fundamento em considerações de segurança pública e de manutenção da ordem e tranquilidade públicas.

      A zona das Portas do Cerco é uma área com muito movimento de pessoas. Pelo corredor coberto, para peões, transitam permanentemente centenas de pessoas. O promotor pretende manifestar-se continuamente durante 15 dias, ininterruptamente, de 17 a 31 de Março de 2017, desde as 7:30 até às 21 horas de cada dia. Por outro lado, o recorrente utiliza vários caixotes, como adereços, que pode pôr em causa a segurança das pessoas, atento o elevado tráfico. A circunstância de a Polícia anteriormente ter autorizado o recorrente a manifestar-se no local, argumento utilizado pelo recorrente, não significa que aquela não possa mudar a sua avaliação da situação.

      Em conclusão, não se afigura desproporcionada a limitação imposta pelo acto recorrido, de fazer a reunião fora do corredor, ao lado do mesmo. Assim, o despacho recorrido não violou a lei.

      Face ao expendido, o Colectivo negou provimento ao recurso.

      Cfr. Acórdão do Tribunal de Última Instância, no Processo n.º 18/2017.

 

Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância

24/03/2017