Situação Geral dos Tribunais

Compete ao Juízo Cível do Tribunal Judicial de Base julgar conflitos da relação jurídico-privada entre Administração e particular

      Depois de o Chefe do Executivo da RAEM ter declarado, 8 de Agosto de 2012, por Despacho a nulidade do processo de transmissão da concessão por arrendamento dos cinco terrenos em frente do aeroporto por causa da intervenção criminosa do ex-Secretário para os Transportes e Obras Públicas no processo de selecção da sociedade transmissária, Moon Ocean Ltd. (Autora), sociedade transmissária dos respectivos terrenos intentou acção no Juízo Cível do Tribunal Judicial de Base contra Tai Lei Loi – Sociedade de Fomento Predial, Limitada (1ª Ré), Região Administrativa Especial de Macau (2ª Ré), Cam – Sociedade do Aeroporto Internacional de Macau SARL (3ª Ré), Sociedade de Turismo e Diversões de Macau SA (4ª Ré) e Companhia de Investimento Tai Fok Wah, Limitada(5ª Ré), pedindo às cinco Rés a restituição dos preços que lhes pagou para a transmissão dos direitos resultantes da concessão, bem como a indemnização pelas benfeitorias realizadas no terreno.

      Como fundamento, a Autora invocou que, desde 15 de Novembro de 1999 que Tai Lei Loi – Sociedade de Fomento Predial, San Hung Fat – Sociedade de Fomento Predial, Limitada, San Hou Kong Sociedade de Fomento Predial, Limitada, San Vai Ip Sociedade de Fomento Predial, Limitada e Lei Tin Sociedade de Fomento Predial, Limitada (que foram constituídos pelo ex-governo de Macau, Sociedade de Turismo e Diversões de Macau SA, Cam – Sociedade do Aeroporto Internacional de Macau SARL e Companhia de Investimento Tai Fok Wah, Limitada) eram concessionárias dos respectivos cinco terrenos. Em 17 de Março de 2006, o Chefe do Executivo autorizou por despacho a transmissão da concessão provisória dos cinco terrenos ao Moon Ocean Ltd, para a qual este pagou às Sociedades concessionárias originais um preço total de MOP1.368.000.000,00 . Em 8 de Agosto de 2012, o Chefe do Executivo declarou a nulidade da transmissão e, em consequência disso, foi cancelada a sua inscrição a favor da ora Autora, tendo a concessão por arrendamento dos respectivos terrenos passado a estar novamente registados a favor das aludidas Sociedades concessionárias originais. Mas a Autora já deu início à execução do plano de aproveitamento previamente acordado, tendo gasto MOP220.547.979,83. Sendo assim, por aplicação do regime geral dos efeitos da nulidade dos contratos, previsto no Código Civil, as Rés devem restituir o preço pago pela transmissão e indemnizar as benfeitorias realizadas pela Autora.

      Por despacho de 06/10/2016, o juíz do 1º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Base entendeu que o contrato de concessão por arrendamento de terrenos urbanos do domínio privado da RAEM é um contrato administrativo, o que determina que o Tribunal competente é o Tribunal Administrativo e não o Tribunal Judicial de Base. Assim, declarou a incompetência do Tribunal Judicial de Base para julgar a acção e ordenou a remessa dos autos para o Tribunal Administrativo.

      Inconformada, a Autora recorreu para o Tribunal de Segunda Instância

      O TSI conheceu do caso. O Tribunal Colectivo indicou que, no caso em apreço, a Autora não está a pedir a restituição do prémio da concessão pago à RAEM, mas sim os preços pagos às Rés para a transmissão dos direitos resultantes da concessão. A 2ª Ré, Região Administrativa Especial de Macau, é demandada nos presentes autos como ex-sócia duma sociedade transmitente – a Sociedade de Fomento Predial Lei Tin, Limitada – sem se dotar de qualquer jus imperii, agindo portanto como um contraente privado.

      O Tribunal Colectivo salientou que, a questão principal que se discute nos presentes autos é a de saber se as Rés têm ou não a obrigação de restituir os preços da transmissão que receberam, bem como de indemnizar as alegadas benfeitorias realizadas pela Autora no terreno. Trata-se duma relação jurídico-privada e não jurídico-administrativa. Ainda que para decidir a referida questão principal implicaria a apreciação da questão da nulidade dos contratos de concessão, que são contratos administrativos, tal circunstância não determina a incompetência do tribunal para a questão principal, antes poderá constituir, máxime e simplesmente uma questão prejudicial. Por outro lado, a nulidade é de conhecimento oficioso e pode ser declarada por qualquer tribunal, cuja intervenção é meramente declarativa, limitando-se a comprovar a existência de nulidade, uma vez que a nulidade opera ipso jure.

      Pelas apontadas razões, o Tribunal de Segunda Instância acordou em conceder provimento ao recurso interposto pela Autora, revogando a decisão recorrida e decidindo que o 1º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Base é competente para a presente acção.

      Vide Acórdão do Tribunal de Segunda Instância, processo n.º 298/2017.

 

Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância

13/06/2017