Situação Geral dos Tribunais

O TUI proferiu decisão final sobre o processo da reversão de um terreno de STDM

      Sociedade de Turismo e Diversões de Macau, SARL (doravante STDM), interpôs recurso contencioso ao Tribunal de Segunda Instância, pedindo a anulação do despacho de 30 de Setembro de 2015, do Chefe do Executivo, que declarou a caducidade do contrato de concessão por arrendamento de um terreno, de 15 de Março de 1986, com a área de 968m2 sito na península de Macau, no gaveto formado pela Estrada de D. João Paulino, Estrada de Santa Sancha e Calçada das Chácaras.

      O Tribunal de Segunda Instância (TSI), por acórdão de 24 de Novembro de 2016, apesar de considerar procedentes dois dos fundamentos do recurso contencioso (erro sobre os pressupostos de facto e erro sobre os pressupostos de direito) não procedeu à anulação do acto recorrido e conheceu oficiosamente da caducidade do contrato de concessão pelo decurso do prazo de 25 anos, de concessão provisória sem esta ter sido convertida em definitiva, que declarou (caducidade esta que não havia declarada pelo Chefe do Executivo).

      Inconformadas, recorreram ambas as partes para o Tribunal de Última Instância (TUI).

      Em primeiro, o Tribunal Colectivo fez uma interpretação do acto recorrido, entendendo que, como se disse no acórdão recorrido, o despacho do Chefe do Executivo, de 30 de Setembro de 2015, apenas declarou a caducidade do contrato de concessão com fundamento em incumprimento pela concessionária da obrigação de realizar o aproveitamento do terreno no prazo contratual. Eis porque: em primeiro lugar, o fundamento jurídico invocado no parecer do Secretário para os Transportes e Obras Públicas que o despacho recorrido tem por base é a “alínea a) do n.º 1 da cláusula décima segunda do contrato que rege a revisão da concessão do terreno, bem como o disposto na alínea 1) do n.º 1 do artigo 166.º da Lei n.º 10/2013 (Lei de Terras) ”, que se referem ambos à caducidade das concessões por não conclusão do aproveitamento do terreno nos prazos e termos contratuais, o que quer dizer que, nunca se invoca a caducidade com fundamento nos artigos 47.º, 48.º e 52.º da Lei de Terras, que são aqueles em que prevê a caducidade por decurso do prazo; em segundo lugar, no parecer da Comissão de Terras, no qual se baseia, por seu lado o mencionado parecer do Secretário para os Transportes e Obras Públicas, faz-se referência ao facto de o prazo de arrendamento ter terminado em 14 de Março de 2013, num parágrafo apenas num texto denso de dezenas páginas, mas exactamente para esclarecer que tal facto não impede a continuidade do procedimento de declaração de caducidade da concessão do terreno com base no incumprimento das obrigações contratuais e nos termos previstos na alínea 1) do n.º 1 do artigo 166.° e no artigo 167.° da Lei n.º 10/2013 (Lei de Terras); em terceiro lugar, a concessionária foi notificada em 21 de Novembro de 2012, da intenção de se proferir decisão de caducidade da concessão por falta de aproveitamento do terreno no prazo contratualmente previsto, tendo a concessionária respondido por escrito em 3 de Dezembro de 2012, ora, não só a concessionária apenas foi ouvida sobre a intenção de se declarar a caducidade por falta de aproveitamento do terreno no prazo contratualmente previsto, como também, tanto em 21 de Novembro de 2012, como em 3 de Dezembro de 2012, não tinha ainda decorrido o prazo de 25 anos da concessão, que só ocorreu a 14 de Março de 2013; em quarto, quando o fundamento decisório da declaração de caducidade é o decurso do prazo, isso aparece claramente dito na decisão e não apenas na fundamentação. Assim, improcedeu o recurso do Chefe do Executivo.

      Seguidamente, o Tribunal Colectivo indicou que à declaração de caducidade por decurso do prazo aplica-se a nova Lei de Terras. Após uma síntese ao regime dos terrenos do Estado na Região Administrativa Especial de Macau previsto na nova lei, entendeu o tribunal colectivo: a caducidade por decurso do prazo da concessão é qualificada como caducidade-preclusão, porque depende apenas do decurso do prazo e da constatação objectiva da falta de apresentação da licença de utilização do prédio por parte do concessionário, o Chefe do Executivo não tem que apurar se o este incumprimento das cláusulas de aproveitamento se deve ter por motivo não imputável ao concessionário, ademais, nenhuma norma permite à Administração considerar suspenso o prazo de concessão provisória ou poder prorrogá-lo. Ao contrário, a caducidade por incumprimento do concessionário do prazo de aproveitamento do terreno é uma caducidade-sanção, até porque, a propósito do prazo de aproveitamento do terreno, a lei permite que, a requerimento do concessionário, o Chefe do Executivo autorize a prorrogação desse prazo ou que o mesmo se considere suspenso se considerar que o não aproveitamento do terreno não é imputável ao concessionário. Portanto, em relação a esta parte, improcedeu o recurso da STDM.

      Por fim, o TUI emitiu também a sua opinião sobre a questão de saber se será adequado o TSI declarar oficiosamente a caducidade do contrato de concessão de terras. Indicou o Tribunal Colectivo que o regime de caducidade no âmbito de  direito civil é distinto daquele em direito administrativo. Em direito civil, mesmo no domínio do contrato, a caducidade opera automaticamente. Porém, em direito administrativo a caducidade só opera automaticamente se a lei assim o determinar, dado o interesse público que lhe está subjacente e o fim que a caducidade visa. Quando tem em vista assegurar o efeito de uma faculdade da Administração a caducidade não opera automaticamente e depende da declaração administrativa. In casu, a caducidade não opera automaticamente, porque o artigo 167.º da Lei de Terras é expresso em dizer que a caducidade é declarada pelo Chefe do Executivo, que é o órgão executivo máximo da RAEM, parte do contrato de concessão. Por isso, ao declarar oficiosamente a caducidade, o TSI não foi correcto incorrendo assim em excesso de pronúncia.

      Todavia, o TSI apesar de considerar procedentes dois dos fundamentos do recurso contencioso, não emitiu qualquer pronúncia decisória (ou seja proceder à anulação do acto), e a parte em que declarou oficiosamente a caducidade é nula por excesso de pronúncia, assim, só se pode entender que trata-se de uma omissão da pronúncia. Como não foi invocada no presente recurso jurisdicional a nulidade do acórdão por omissão de pronúncia, e o tribunal de recurso, oficiosamente, não tem poderes para declarar tal omissão de pronúncia nem para determinar ao tribunal recorrido que supra a omissão, assim, tudo se passa como tivesse havido uma absolvição da instância.

      Face ao expendido, o Tribunal Colectivo negou provimento ao recurso do Chefe do Executivo, concedeu parcial provimento ao recurso da STDM e anulou, por excesso de pronúncia, a decisão do acórdão recorrido, que declarou a caducidade do contrato de concessão.

      Vide o Acórdão do TUI, Processo n.º 28/2017.

 

Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância

15/10/2017