Situação Geral dos Tribunais

TUI: Ambos os cônjuges têm legitimidade para participar em acção em que se pede a declaração de inexistência do seu casamento

A instaurou no Tribunal Judicial de Base acção declarativa de simples apreciação negativa com processo comum contra B (a 1.ª ré), C (a 2.ª ré) e D (a 3.ª ré), pedindo que: 1. A acção fosse julgada procedente, com fundamento na circunstância de os conteúdos da escritura pública de casamento e do certificado de casamento apresentados à Conservatória do Registo Civil de Macau pela 1ª ré sucessivamente em 2004 e 2007, não corresponderem à verdade, pelo que, deve ser declarado que o falecido E não se casou com a 1ª ré; 2. Fosse cancelado o registo de E como pai das 2ª e 3ª rés constante dos assentos de nascimento das mesmas emitidos pela Conservatória do Registo Civil de Macau; 3. Seja ordenado à 1ª ré que apresente a “escritura pública de casamento” e o “certificado de casamento” que tinham sido exibidos pela 1ª ré, a fim de ser feito o exame pericial e de confirmar a veracidade dos documentos.

Por despacho do Tribunal Judicial de Base, foi indicado que por qualquer razão que seja ao questionar a paternidade presumida, deve ser intentada a acção de “impugnação da paternidade” nos termos do art.º 1697.º do Código Civil de Macau. Com base nisso, quanto à legitimidade passiva, nos termos do art.º 1700.º do Código Civil de Macau, conjugado com o art.º 1666.º, n.ºs 1 e 2, al. a) do mesmo código, deve o autor intentar acção contra a mãe, o filho e o presumido pai constantes do registo de nascimento e no caso de morte do presumido pai, devem ser demandados os descendentes, mas segundo a petição inicial, a autora não intentou acção contra elas. Pelo que, o Juízo rejeitou a petição deduzida pela autora, devido à ineptidão da legitimidade passiva.

A interpôs recurso do despacho para o Tribunal de Segunda Instância (TSI).

O Tribunal de Segunda Instância entendeu que, a ilegitimidade plural é sanável, pelo que, o Juiz a quo deveria ter promovido a sanação; além disso, entendeu ainda que, no caso, nem existe ilegitimidade plural, não sendo necessária a intervenção dos herdeiros do falecido E, porque não está em causa uma acção de impugnação da paternidade em que se intenta provar que a paternidade do marido da mãe é manifestamente improvável. Pelo que, o TSI decidiu revogar o despacho recorrido, determinando o prosseguimento da acção.

Recorrem agora as rés B, C e D para o Tribunal de Última Instância (TUI).

O Tribunal de Última Instância conheceu o caso, apontando que é pressuposto da acção de impugnação da paternidade, que o indivíduo que consta no registo como pai de alguém era casado com a mãe deste ao tempo do seu nascimento ou da concepção (n.º 1 do artigo 1685.º do Código Civil), o que não sucede quando o autor pede a declaração da inexistência do mencionado casamento.

Mais, quanto à legitimidade das partes é evidente a falta de razão do acórdão recorrido, dado que as pessoas que constam do registo do casamento como tendo celebrado este contrato, ou seja, os cônjuges, têm manifesto interesse em contradizer, em acção em que se pede a declaração que o casamento não foi celebrado, pelo prejuízo que dessa procedência pode advir, pelo que são partes legítimas como réus, se não forem os autores. Tendo o E já falecido, são os seus herdeiros quem tem legitimidade como réus na acção.

O poder do juiz de providenciar pelo suprimento da falta de pressupostos processuais é incumbência oficiosa e, portanto, vinculada, face ao disposto no n.º 2 do artigo 6.º e alínea a) do n.º 1 do artigo 427.º, ambos do Código de Processo Civil. A ilegitimidade plural na acção declarativa, por falta de alguém que, devendo estar, não foi indicada como parte principal, é sanável, face ao disposto no artigo 213.º do Código de Processo Civil. Por isso, cabe ao Juiz do Tribunal Judicial de Base convidar a autora a indicar como réus os herdeiros de E, se a autora não tiver esta iniciativa.

Face ao expendido, o Tribunal de Última Instância acordou em negar provimento ao recurso e determinou o prosseguimento da acção.

Vide o Acórdão do Tribunal de Última Instância, processo n.º 83/2017.

 

Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância

17/01/2018