Situação Geral dos Tribunais

O Tribunal Judicial de Base condenou dois indivíduos por infracção da medida sanitária preventiva

Desde Abril de 2020, o Tribunal Judicial de Base admitiu, sucessivamente, oito casos penais, em que o Ministério Público acusava indivíduos por infracção da medida sanitária preventiva.

O TJB proferiu, respectivamente em 12 e 16 de Junho, sentenças em dois casos (processos n.º CR3-20-0116-PCS e n.º CR2-20-0135-PCS).

Pelo relato dos casos, visando garantir a segurança da saúde pública, a prevenção, o controlo e o tratamento eficazes de doenças transmissíveis, nos termos do disposto no art.º 14.º da Lei n.º 2/2004 (Lei de prevenção, controlo e tratamento de doenças transmissíveis), os Serviços de Saúde da RAEM passaram a exigir, a partir da meia-noite do dia 26 de Fevereiro e do dia 17 de Março de 2020, respectivamente, que todos os indivíduos que tivessem estado em países ou regiões fora da China, nos 14 dias anteriores à entrada em Macau, seriam sujeitos a observação médica de isolamento por 14 dias em locais designados. No decurso da observação médica, não seria permissível a ausência, sem autorização, desses indivíduos dos locais designados para observação, pois, caso contrário, os infractores poderiam ser sujeitos a medidas de isolamento compulsório, bem como ser responsabilizados criminalmente. No testemunho dos trabalhadores dos Serviços de Saúde, os dois arguidos assinaram, voluntariamente, a “Declaração de aceite/recusa de submissão à observação médica” e aceitaram submeter-se à observação médica nos períodos e locais designados. Na assinatura da aludida declaração, os arguidos conheceram e aceitaram as condições da observação médica.

No primeiro caso (processo n.º CR3-20-0116-PCS), o arguido A, estudante de Macau que frequentava aulas no Reino Unido, deslocou-se, em 14 de Março de 2020, do Reino Unido para Hong Kong de avião. Depois de se submeter ao exame médico no Posto Fronteiriço da Ponte Hong Kong-Zhuhai-Macau, em colaboração com as medidas sanitárias preventivas, o arguido foi transportado, por seus familiares, até ao Hotel Beverly Plaza para a realização do isolamento voluntário. Todavia, em 23 de Março de 2020, às 13h15, o arguido saiu do quarto do hotel e deslocou-se, através do elevador, ao espaço da recepção, situado no átrio do hotel. A seguir, regressou ao quarto e lá manteve contacto com um seu amigo por cerca de 20 minutos.

O juiz titular do 3.º Juízo Criminal do TJB conheceu do caso. À luz dos factos, dados como provados, entendeu o Juízo que a conduta do arguido pôs em risco a segurança da saúde pública. Não obstante ser o arguido um delinquente primário, entendeu o Juízo, por a pneumonia causada pelo novo tipo de coronavírus ser altamente contagiosa e ser necessária a prevenção geral do crime, que a aplicação da pena de multa ao arguido seria insuficiente para realizar a finalidade da punição. Porém, atenta a personalidade do agente, o seu modo de vida, o comportamento manifestado, anterior e posteriormente, ao crime e as circunstâncias concretas do crime, o Juízo concluiu que a censura do facto e a ameaça da prisão realizariam, de forma suficiente e adequada, essa finalidade da punição; assim, decidiu a suspensão da execução da pena de prisão, aplicada ao arguido.

Pelo exposto, o Juízo julgou procedente a acusação, deduzida contra o arguido A, condenando-o, pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de infracção da medida sanitária preventiva, p. e p. pela alínea 2) do art.º 30.º, em conjugação com a alínea 1) do n.º 1 do art.º 14.º da Lei n.º 2/2004, na pena de 2 meses de prisão, suspensa na sua execução por 1 ano.

No segundo caso (processo n.º CR2-20-0135-PCS), o arguido B deslocou-se, em 17 de Março de 2020, às 03h15, das Filipinas para Hong Kong de avião, entrando em Macau pelo Posto Fronteiriço da Ponte Hong Kong-Zhuhai-Macau. O arguido não se submeteu à observação médica domiciliar. Conforme o registo da migração, o arguido entrou em Macau, em 17 de Março de 2020, às 03h15, e logo a seguir, às 04h20, voltou a sair de Macau através do Posto Fronteiriço da Zona Industrial Transfronteiriça. Em 24 de Março de 2020, às 20h25, os guardas do Corpo de Polícia de Segurança Pública deslocaram-se à residência do arguido para a realização de busca e, seguidamente, com o consentimento do pai do arguido, entraram nela e confirmaram que o arguido a tinha abandonado.

O juiz titular do 2.º Juízo Criminal do TJB conheceu do caso. À luz dos factos, dados como provados, entendeu o Juízo que a conduta do arguido pôs em risco grave a segurança da saúde pública. Não obstante ser o arguido residente da RAEM, não havia, até o momento, uma diminuição significativa do número de casos de infecção pelo novo tipo de coronavírus no Mundo e não existiam ainda as respectivas vacinas, pelo que se tornava regular e contínuo o exercício dos trabalhos de prevenção e combate à epidemia. A par disso, a finalidade da punição, não só visa educar o autor do crime, como também exige a prevenção criminal. Para impedir que mais pessoas adoptassem um comportamento tão irresponsável e egoísta como o do arguido, de que resultariam, não só desfavoráveis, como severas consequências para a segurança da saúde pública da RAEM, entendeu este Juízo que só se realizaria, de forma suficiente, a finalidade da punição, se se aplicasse ao arguido a pena privativa da liberdade, ou seja, a pena de prisão. No que concerne à determinação da medida da pena, o Juízo, tendo ponderado sinteticamente as exigências da prevenção especial e geral do crime cometido pelo arguido, concluiu que só ficariam satisfeitas as exigências da prevenção criminal, se se impedisse que as pessoas criassem, em sua mente, a expectativa de ser sempre suspensa a execução da pena de prisão, aplicada pela prática do crime em apreço, e se evitasse que mais pessoas corressem o risco de provocarem consequências irreparáveis aos trabalhos de prevenção e combate à epidemia, quando o arguido condenado fosse em pena de prisão efectiva.

Nos termos expostos, o Juízo julgou procedente a acusação deduzida contra o arguido B, condenando-o, pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de infracção da medida sanitária preventiva, p. e p. pela alínea 2) do art.º 30.º, em conjugação com a alínea 1) do n.º 1 do art.º 14.º da Lei n.º 2/2004, na pena de 3 meses de prisão efectiva.

Os restantes seis casos foram devidamente distribuídos no Tribunal e aguardam julgamento.

Cfr. Sentenças proferidas pelo Tribunal Judicial de Base nos processos n.º CR3-20-0116-PCS e n.º CR2-20-0135-PCS.

Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância

17/06/2020