Situação Geral dos Tribunais

Sessão Solene de Abertura do Ano Judiciário de 2013/2014

    Numa organização conjunta entre os Tribunais e o Ministério Público da RAEM, realizou-se a Sessão Solene de Abertura do Ano Judiciário de 2013/2014, no passado dia 17 de Outubro, pelas 15H30, no Pequeno Auditório do Centro Cultural de Macau. O Chefe do Executivo, Chui Sai On, presidiu à Sessão, que contou com a presença na tribuna de honra dos Presidente da Assembleia Legislativa, Ho Iat Seng, Presidente do Tribunal de Última Instância, Sam Hou Fai, Secretária para a Administração e Justiça, Florinda Chan, Procurador, Ho Chio Meng, Presidente da Comissão Independente Responsável pela Indigitação de Juízes, Lau Cheok Va e Presidente da Direcção da Associação dos Advogados, Jorge Neto Valente. Na cerimónia, fizeram uso da palavra o Chefe do Executivo, Chui Sai On, o Presidente do Tribunal de Última Instância, Sam Hou Fai, o Procurador, Ho Chio Meng, e o Presidente da Direcção da Associação dos Advogados de Macau, Jorge Neto Valente.

    No seu discurso, o Chefe do Executivo, Dr. Chui Sai On, referiu que a independência judicial constitui uma pedra basilar da estabilidade e do desenvolvimento da RAEM. O Dr. Chui Sai On reconhece as contribuições dos órgãos judiciais para a sociedade da RAEM apontando que, além da sinergia de esforços dos órgãos judiciais de todas as instâncias e de todos os profissionais judiciais, no desempenho das suas funções na defesa da independência do poder judicial e salvaguarda da justiça, é, também, necessária a cooperação entre o Governo e a sociedade tendo em vista um generalizado conhecimento das leis, a elevação da consciência cívica da população e a obtenção do consenso social, que permitam a criação de um ambiente que favoreça a garantia do princípio do primado da Lei.

    O Chefe do Executivo afirmou que o Governo da RAEM continuará a defender escrupulosamente o princípio da independência do poder judicial e o princípio do primado da lei, e irá impulsionar o desenvolvimento do sistema jurídico da Região. Disse ainda que o Governo da RAEM, empenhado no apoio ao desenvolvimento dos órgãos judiciais e do sector jurídico, dá grande importância à auscultação de opiniões junto do sector judiciário e dos profissionais do Direito, e, em comunhão de esforços com os órgãos judiciais, tudo tem feito no sentido do aperfeiçoamento da equipa judicial e, paralelamente, irá continuar a reforçar a formação dos funcionários de justiça, continuará a apoiar os órgãos judiciais no que diz respeito à melhoria das instalações e equipamentos, recursos humanos, meios e instrumentos, na assimilação de experiências de gestão moderna e científica na perspectiva de um desenvolvimento contínuo do sistema judicial, proporcionando, assim, as melhores condições para a constante elevação da eficiência e da qualidade da administração da Justiça. Por fim, assegurou que o Executivo irá envidar todos os esforços na promoção do aperfeiçoamento do edifício legislativo e da optimização contínua do sistema jurídico, proporcionando sólidos alicerces legais que garantam o bem-estar da população, a prosperidade e a estabilidade a longo prazo da RAEM.

    O Presidente do Tribunal de Última Instância, Dr. Sam Hou Fai, começou o seu discurso por apresentar a situação de processos admitidos e concluídos dos tribunais de três instâncias no ano judiciário decorrido. No ano judiciário transacto, deram entrada um total de 17.323 processos nos tribunais das três instâncias e foram concluídos 17.106 processos. Apesar de uma descida de 865 processos em comparação com o ano anterior, merece uma referência que o número dos processos findos no Juízo de Instrução Criminal e no Tribunal Administrativo registou uma subida em relação ao ano anterior. No ano judiciário que findou, o número dos processos pendentes nas três instâncias é de 8.052, encontrando-se basicamente no mesmo nível do ano judiciário anterior.

    O Dr. Sam Hou Fai apontou que o número dos processos admitidos pelos tribunais de três instâncias foi basicamente no mesmo nível dos anos anteriores, porém, verificou-se uma alteração nas proporções das espécies de processos. No respeitante às espécies dos processos entrados nos tribunais das diversas instâncias, merece uma referência aos seguintes aspectos:

  1. O número de entrada dos processos de recurso contencioso, que constitui um meio judicial correspondente ao primeiro grau de jurisdição através do qual o cidadão procura a reapreciação das decisões administrativas tomadas pela Administração junto dos órgãos judiciais, é apenas de 95 no Tribunal de Segunda Instância e de 71 no Tribunal Administrativo, números esses que representam uma queda significativa de 53% e 23%, respectivamente.
  2. O número dos processos crimes continuou a subir, especialmente o dos processos de maior gravidade que requeiram a intervenção de tribunal colectivo, o qual registou um aumento de 10% em comparação com o ano anterior. Isto mostra que, quanto à segurança de Macau, não há razão para ficarmos optimistas. Os processos ligados aos jogos ainda permanecem em número elevado, e quanto à criminalidade tradicional, a maioria continuam a ser o tráfico de drogas, a falsificação de cartões de crédito ou notas e o furto. Além disso, verificou-se ainda uma evidente tendência de aumento de crimes transregionais e de crimes praticados por estrangeiros, razão pela qual há realmente necessidade de acelerar a cooperação judiciária internacional e interregional em matéria penal.
  3. Registou-se um aumento significativo de 336% dos processos contravencionais respeitantes à violação da Lei do Trânsito Rodoviário (Lei n.º 3/2007) em comparação com o ano anterior, correspondente a 2.603 processos. Para além de reforçar a execução da Lei de Trânsito Rodoviário, o Governo deve ainda desenvolver acções de divulgação e de sensibilização da mesma, de maneira a que os cidadãos tenham consciência da licitude ou ilicitude da sua conduta, respeitando assim a Lei do Trânsito Rodoviário de forma espontânea.

    O número dos processos entrados no Juízo das Pequenas Causas Cíveis sofreu uma descida enorme de 48%. Será que se deve considerar a hipótese de aumentar adequadamente o limite máximo do valor da causa à adopção desta forma de processo, para atingir o objectivo de facilitar a vida dos cidadãos e elevar a eficiência judicial?

    O Dr. Sam Hou Fai referiu ainda que a tomada de posse de mais 6 juízes locais recém-formados no mês passado, e o início das funções de mais 80 escrivães judiciais auxiliares num momento antecedente, bem como a criação dos Juízos Laboral e de Família e Menores que ontem acabaram de entrar em funcionamento, marcaram a concretização do plano decenal de reforma judicial para a especialização dos tribunais de Macau, o que, acredita, elevará certamente e em grande medida a eficiência e qualidade do exercício da Justiça.

    Mas mesmo assim, ainda espera que o Governo promova, com firmeza e em conjunto com os órgãos legislativos, a alteração da Lei de Bases da Organização Judiciária, e que leve para adiante o aperfeiçoamento do funcionamento do sistema judicial, incluindo ampliar adequadamente o quadro dos juízes-presidentes de colectivo dos Tribunais de Segunda e Primeira Instâncias, e criar regimes de nomeação de juízes do Tribunal de Segunda Instância por destacamento e de julgamento de recursos em acumulação de funções.

    O Dr. Sam Hou Fai chamou especial atenção de todos para dois fenómenos iniciais verificados na sociedade de Macau nos últimos anos.

    Primeiro, o Dr. Sam Hou Fai frisou que a independência da Justiça não só é um arranjo de carácter constitucional atinente ao sistema político de Macau, como também constitui um dos valores essenciais da sociedade. Porém, nos últimos anos, na medida em que deram entrada e que foram julgados nos tribunais certos processos que envolvem questões socialmente sensíveis, ou que envolvem avultados interesses económicos e outros com implicações amplas, começaram a surgir pessoas que, dentro ou até fora da RAEM, por motivos ou considerações diversas e por formas diferentes, exerceram publicamente pressões ou influências sobre os órgãos judiciais.

    Segundo, falou do “princípio da não apreciação de questões políticas”, dizendo que aquilo é quase costume dos tribunais de todos os países e regiões do Mundo, e o artigo 19.º da Lei de Bases da Organização Judiciária de Macau também tem disposições sobre isto. No entanto, nos últimos anos, gerou-se em Macau uma tendência de judicialização da Política, isto é, há pessoas que pretendem resolver questões puramente políticas por via judicial, e há outras que a cada instante ameaçam interpor recurso aos tribunais ou recorrer à Justiça para exercer pressões ou influências sobre o Governo.

    Por fim, o Presidente do Tribunal de Última Instância chamou atenção para a profunda alteração do ambiente social já verificada ou ainda está em curso que os órgãos judiciais estão a enfrentar, dizendo que, como adaptar-se a esta alteração, de modo a julgar sempre segundo as leis e assegurar uma recta administração da Justiça, é um desafio a enfrentar por todos os juízes. Neste sentido, formulou as seguintes expectativas aos juízes e funcionários de justiça dos tribunais das várias instâncias:

  1. Todos devem elevar o sentido de responsabilidade e manter sempre a consciência de serviço, não podendo relaxar a auto-disciplina e ter uma atitude passiva e preguiçosa por ter ficado durante longo tempo no mesmo posto de trabalho, nem esquecer-se das missões e incumbências que lhes são confiadas.
  2. Perante as mudanças significativas ocorridas no ambiente social, todos desempenham a sua função com honestidade e lealdade, rejeitando categoricamente toda a espécie de seduções e perturbações, e quaisquer formas de pressão ou influência, sejam directas, sejam indirectas, de forma a manterem-se sempre imparciais, impávidos, leais e empenhados.

    No seu discurso, o Procurador Dr. Ho Chio Meng fez o balanço do trabalho do Ministério Público do ano passado, referindo que os números dos processos penais autuados e dos processos de acusação estavam ainda a aumentar e o trabalho geral de tramitação processual do Ministério Público continua a manter-se numa situação positiva. O julgamento dos crimes de menor gravidade em forma de processo penal sumário aumentou muito a eficácia da acusação e obteve bons resultados. O Ministério Público também assumiu uma grande parte do trabalho de representação da RAEM em juízo, defesa da legalidade e fiscalização da implementação da lei. O Dr. Ho Chio Meng apontou, em particular, os processos administrativos e processos relacionados com o património e envolvendo o Governo, dizendo que se verificou uma descida tendencial no número dos casos com procedência da acção administrativa e um aumento nos correspondentes casos relativos às responsabilidades administravas e compensações civis.

    Quanto à questão de que as legislações penais se apresentavam com atrasos em vários âmbitos, o Procurador disse que isso é desfavorável à punição dos respectivos actos violadores da lei e que já é tempo oportuno para a inserção da matéria de revisão do Código Penal de Macau na agenda de discussão, invocando a mentalidade jurídica de “rever a lei maior para assegurar a lei menor” para resolver a questão de coordenação entre as leis penais avulsas e o Código Penal e regulamentar e absorver, mediante a revisão do Código Penal, os aspectos razoáveis das leis penais avulsas e deixar ou anular aquelas normas obsoletas.

    No que respeita ao próprio trabalho no novo ano judicial, o Procurador revelou que vai continuar a ajustar os mecanismos de trabalho internos, criar um sistema de análise periódica para gerir o volume de tramitação processual de cada um dos magistrados do Ministério Público, que será dotado de um assistente para o coadjuvar na tramitação processual, adoptar programas de informática novos para melhorar o seguimento e gestão dos processos e vão ser criadas ainda duas secções no Serviço de Acção Penal. Nos serviços do Ministério Público juntos do Tribunal Judicial de Base e do Tribunal Administrativo, vai ser procedida à nova distribuição dos serviços judiciais necessários aos diversos tipos de processos. Aos serviços do Ministério Público juntos dos Tribunais de Segunda e Última Instâncias, foram afectados mais procuradores-adjuntos para a tramitação dos recursos, em particular, os recursos nos âmbitos administrativo e cível. A par disso, o Ministério Público vai continuar a empenhar-se activamente na prevenção criminal, construindo conjuntamente uma firewall para a prevenção dos crimes, e alargar o âmbito de acções formativas, apresentar as opiniões sobre uma revisão do sistema de subsídios para o trabalho específico e perigoso dos funcionários de justiça assim como do sistema de promoção, com vista a reforçar a ética profissional e a integridade e aumentar a qualidade profissional.

    Por sua vez, o Presidente da Direcção da Associação dos Advogados de Macau, Dr. Jorge Neto Valente, disse no seu discurso que o número de processos entrados nas diversas instâncias dos tribunais da RAEM no último ano foi idêntico ao do total entrado no ano precedente, todavia, o número de processos findos foi consideravelmente inferior, o que significa que continua a haver milhares de processos em atraso, indicando que é altura de se pensar numa reforma profunda da organização judiciária.

    O número de processos arquivados pelo Ministério Público do ano transacto foi ainda elevado e o número de magistrados do Ministério Público continua a ser insuficiente e de que é necessária uma profunda revisão do sistema, por forma a que o Ministério Público possa desempenhar em pleno as funções que lhe são cometidas pela Lei Básica, na estrita observância dos princípios que regem esta magistratura, designadamente os princípios da legalidade e do acusatório.

    O Dr. Jorge Neto Valente indicou, em particular, que os serviços públicos devem melhorar os seus recursos humanos, apontando que se tem constatado um aumento da dificuldade dos cidadãos no relacionamento com serviços públicos, o que se trata de falta de preparação de base por parte dos respectivos funcionários, por outro lado, é claramente uma deficiente selecção de responsáveis. A isso, acresce a qualidade de alguns responsáveis que não assumem as suas responsabilidades e não tomam as decisões que lhes compete tomar, para evitarem recursos hierárquicos ou contenciosos.

    Quanto aos advogados, disse que a esta data, estão inscritos 281 Advogados, sendo mais de 90 de língua materna chinesa, e 109 Advogados-estagiários, cerca de 80% dos quais de língua materna chinesa. No primeiro trimestre deste ano, a Associação dos Advogados deliberou suspender o protocolo, anteriormente existente, que permitia a inscrição recíproca de Advogados de Macau e estão a ser estudados os critérios mais adequados à situação actual da profissão e que permitam, no futuro, o estabelecimento de regimes de reciprocidade de inscrição de profissionais que possam ser úteis à RAEM.

    Para além de todos os magistrados dos tribunais e do Ministério Público, estiveram ainda presentes cerca de duzentos e tal convidados nesta cerimónia de abertura do Ano Judiciário 2013/2014, tais como os representantes do Gabinete de Ligação do Governo Popular Central na Região Administrativa Especial de Macau e do Comissariado do Ministério dos Negócios Estrangeiros na Região Administrativa Especial de Macau, os titulares dos principais cargos da RAEM, os membros do Conselho Executivo, os membros da Comissão Independente Responsável pela Indigitação de Juízes, os membros do Conselho dos Magistrados Judiciais, os membros do Conselho dos Magistrados do Ministério Público, os deputados à Assembleia Legislativa, os chefes e os assessores do Gabinete do Chefe do Executivo e dos Gabinetes dos titulares dos principais cargos públicos, os directores dos serviços públicos, os advogados e os representantes das escolas superiores.