Situação Geral dos Tribunais

EQUIPARAÇÃO DOS EMPREGADOS DAS SOCIEDADES DE JOGOS AO FUNCIONÁRIO DEFINIDO NO CÓDIGO PENAL

        Na altura da ocorrência do facto, a arguida era empregada da tesouraria do Casino YY. Em 6 de Janeiro de 2007, à tarde, a arguida, enquanto prestava serviço no balcão de caixa da sala de slot machine, tomando uma escala de serviço como coberta, tirou, às escondidas, da gaveta do balcão uma nota de HKD 1.000,00, escondeu-a entre duas escalas de serviço e depois, quando lhe convinha, colocou a nota na sua posse. Em 3 de Fevereiro de 2010, a arguida, acusada pela prática de um crime de peculato p. e p. pelo Código Penal, foi submetida a julgamento no Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base. Realizada a audiência de julgamento, o Tribunal a quo, convolando a acusação, condenou a arguida pela prática de um crime de furto simples p. e p. pelo Código Penal, na pena de multa de 90 dias, à taxa diária de MOP 100,00, perfazendo a multa global de      MOP 9.000,00, convertível em 60 dias de prisão se não for paga ou substituída pelo trabalho; mais condenou a arguida a pagar à XX Casino, S.A. o montante de MOP 1.000,00 a título de indemnização por danos patrimoniais, acrescido de juros legais desde 6 de Janeiro de 2007 até integral pagamento. Não se conformando com a decisão, o Ministério Público recorreu para o Tribunal de Segunda Instância, tendo por fundamento que o Tribunal a quo, ao considerar a empregada da sociedade de jogos não se integrar no conceito de funcionário estabelecido no art.º 336.º do Código Penal, incorreu em erro na interpretação da lei, pugnando pela condenação da arguida pela prática de um crime de peculato numa pena novamente fixada.

        Conforme entendeu o Tribunal Colectivo do Tribunal de Segunda Instância, nos presentes autos, a questão-chave reside em saber se pode considerar-se a arguida, empregada duma sociedade de jogos, como equiparada ao funcionário previsto no art.º 336.º do Código Penal, de modo a condená-la pelo cometimento do crime de peculato. Estatui-se no art.º 336.º, n.º 2, al. c) do Código Penal: “Ao funcionário são equiparados os titulares dos órgãos de administração, de fiscalização ou de outra natureza e os trabalhadores de empresas públicas, de empresas de capitais públicos ou com participação maioritária de capital público, bem como de empresas concessionárias de serviços ou bens públicos ou de sociedades que explorem actividades em regime de exclusivo.” Desta forma, é o mais importante no caso vertente apurar a natureza das sociedades de jogos. Para verificar se as sociedades de jogos são de exploração exclusiva, não é elemento decisivo o número de licenças de exploração de jogos. A emissão de diversas licenças não significa que a exploração da indústria de jogos se tenha transformado numa actividade de livre acesso. O Governo, por força da Lei n.º 16/2001 e do Despacho do Chefe do Executivo n.º 26/2002, apenas concedeu três licenças de exploração de jogos a três empresas, sendo que as outras não têm acesso a esta área. Dado o não livre acesso, mantém-se a exclusividade. Uma vez que tais sociedades de jogos são de exploração exclusiva, os seus empregados preenchem o disposto no art.º 336.º do Código Penal, sendo equiparados ao funcionário.

        Face ao exposto, o Tribunal Colectivo do Tribunal de Segunda Instância julgou procedente o recurso do Ministério Público, tendo reformulado a decisão a quo nos termos seguintes: anulada a qualificação operada pelo Tribunal a quo, condena a arguida pela prática de um crime de peculato p. e p. pelo art.º 340.º, n.º 1, conjugado com o art.º 336.º, n.º 2, al. c), ambos do Código Penal, na pena de 1 ano e 1 mês de prisão, suspensa na sua execução por 2 anos, sob a condição do pagamento de MOP 1.000,00, a título de indemnização, a favor do respectivo Casino.

        Cfr. o processo n.º 260/2010 do Tribunal de Segunda Instância.

Gabinete do Tribunal de Última Instância

15/01/2014