Situação Geral dos Tribunais

TSI: Confirmação dum divórcio registado no Interior da China que não se estendeu ao acordo de partilha dos bens

        Uma mulher do Interior da China e um homem de Macau celebraram casamento em 23 de Abril de 2008 no Interior da China. Fruto do seu casamento, nasceu uma filha. Em 6 de Julho de 2010, por ruptura da relação conjugal, divorciaram-se por mútuo consentimento junto da Conservatória do Registo de Casamentos de Chongqing. Em 12 de Dezembro de 2013, a mulher requereu ao Tribunal de Segunda Instância da RAEM a revisão e confirmação de decisão proferida por tribunais do exterior de Macau, solicitando que fossem confirmados o registo de divórcio autorizado pelo Departamento de Administração Civil do Interior da China e os acordos por este reconhecidos sobre a regulação do exercício do poder paternal e a partilha dos bens entre as partes, para que os mesmos fossem plenamente eficazes na ordem jurídica de Macau.

        Após o julgamento, o Tribunal de Segunda Instância entendeu que a confirmação de decisão proferida por tribunal do exterior de Macau pressupunha a verificação dos requisitos previstos no art.º 1200.º do Código de Processo Civil (CPC). No caso sub judice, o registo de divórcio em causa é uma decisão proferida por uma autoridade administrativa do Interior da China. Trata-se dum documento autêntico devidamente selado e traduzido, cujo conteúdo facilmente se alcance, pelo que, apesar de não ser uma decisão judicial, não deixa de produzir os mesmos efeitos. Quanto aos requisitos relativos ao trânsito em julgado, competência do tribunal ou autoridade do exterior, ausência de litispendência ou de caso julgado, citação e garantia do contraditório, conforme o entendimento que tem sido seguido pela Jurisprudência de Macau, bastaria ao requerente a sua invocação, ficando dispensado de fazer a sua prova positiva e directa. Ora, nada resulta dos autos ou do conhecimento oficioso do Tribunal no sentido da não verificação desses requisitos, que, assim, se têm por presumidos. Ademais, nenhuma das situações contempladas no art.º 20.º do CPC em que os tribunais de Macau têm competência exclusiva colide com o caso vertente. Por último, em relação à ordem pública, não se vislumbra qualquer incompatibilidade do respectivo registo de divórcio com a ordem pública de Macau, já que o ordenamento jurídico de Macau prevê igualmente a possibilidade do divórcio por mútuo consentimento. Nestes termos, é de confirmar o próprio registo de divórcio.

        As mesmas razões são igualmente válidas para a regulação do exercício do poder paternal. As partes acordaram que seria a filha entregue à guarda e cuidados do pai, com garantia da visita por parte da mãe, acordo esse que não fere a ordem pública de Macau, devendo assim ser confirmado.

        No que diz respeito ao acordo de partilha dos bens, tendo o Primeiro Juiz-Adjunto expressado uma opinião com reservas, o Tribunal Colectivo sublinhou o seguinte: Os bens partilhados situam-se no exterior de Macau, donde não se alcançar onde resida o interesse processual nesta revisão, sendo que os efeitos de tal acto não se repercutem no ordenamento de Macau, nem aqui é passível de execução. Assim sendo, não deve ser confirmado pelo Tribunal o acordo de partilha dos bens, pois a partilha incide sobre bens situados fora de Macau e não foi homologada judicialmente.

        Pelas razões acima expostas, o Tribunal Colectivo decidiu confirmar o divórcio entre a requerente e o requerido, registado pelo Departamento de Administração Civil da Cidade de Chongqing, em 6 de Julho de 2010, no sentido de poder o registo produzir eficácia na RAEM, julgando, porém, improcedente o pedido de confirmação relativo ao acordo de partilha dos bens.

        Cfr. o acórdão do Tribunal de Segunda Instância, processo n.º 373/2013.

 

 

Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância

26/02/2014