Situação Geral dos Tribunais

Trabalhador recrutado no exterior que pediu indemnização por alegado despedimento ilícito viu a sua pretensão indeferida pelo Tribunal

      Em 1984, o Instituto Emissor de Macau (IEM), antecessor da actual Autoridade Monetária e Cambial de Macau (Ré) deu início ao processo especial de recrutamento em Portugal, solicitando a necessária autorização à tutela e a requisição à entidade patronal de origem. A empresa Cimentos de Portugal, E.P. (“CIMPOR”), por telex datado de 4 de Dezembro de 1984, informou a Ré de que autorizara a prestação de serviços do seu analista (Autor) junto da Ré, e que consentira que as sucessivas renovações do contrato fossem autorizadas pela tutela, sendo para os anos de 1985 a 1995 as requisições aprovadas por tal empresa. Em 1 de Fevereiro de 1985, o Autor celebrou contrato de trabalho com a Ré, no qual consta que o A exerceria funções para a Ré pelo período de 2 anos com início em 1 de Fevereiro de 1985, sendo tácita e automaticamente renovável por iguais períodos desde que não seja denunciado por qualquer das partes, mediante o pagamento da Ré àquele da remuneração ali prevista e demais regalias, tendo as partes ainda previsto que se aplicavam ao contrato entre si celebrado, subsidiariamente, as normas constantes do Estatuto Privativo do Pessoal e demais normas e regulamentos internos do IEM. Encontrando-se em regime especial de recrutamento, o Autor mantinha o seu vínculo laboral com a CIMPOR, pelo que o tempo de serviço por ele prestado em Macau foi contabilizado como tempo efectivo ao serviço da CIMPOR, e a Ré procedeu aos pagamentos de prestações devidas para o Fundo de Pensões daquela entidade, em Portugal. Em 16 de Setembro de 1994, o Autor celebrou com a CIMPOR um acordo de pré-reforma, através do qual o mesmo cessaria ali as suas funções, passando a receber prestações mensais de pré-reforma. No entanto, o contrato celebrado entre o Autor e a Ré foi sendo renovado até 28 de Setembro de 1998, quando a Ré comunicou ao Autor a cessação do contrato com efeitos a partir de 31 de Dezembro de 1998. A comunicação foi feita pela Ré até 60 dias antes da pretendida cessação do contrato, tendo a Ré, assim, respeitado as cláusulas contratuais. Nessa altura, o Autor não levantou nenhuma dúvida.

      Cerca de treze anos depois, o Autor propôs acção no Juízo Laboral do Tribunal Judicial de Base, alegando que, depois de ter sido recrutado ao exterior de Portugal, entre os anos de 1995 e 1998, prestou a sua actividade profissional para a Ré, sob suas ordens, direcção e fiscalização, mediante uma contrapartida salarial, pelo que deveria ser considerado como trabalhador pertencente ao quadro da Ré, sendo aplicável a legislação laboral vigente no Território, termos em que entendeu que o seu contrato de trabalho devia ser contrato sem termo. Desta forma, afirmou o Autor que a não renovação do contrato pela Ré, sem quaisquer razões decorrentes da sua prestação laboral, equivalia a um despedimento ilícito, solicitando, por isso, que fosse a Ré condenada a pagar-lhe o montante de MOP$847.600,00, acrescido de juros legais até integral e efectivo pagamento. Ainda pediu o Autor que, no caso de o pedido principal não proceder, fosse a Ré condenada no pagamento da quantia de MOP$121.333,33, a título de indemnização rescisória.

      Conforme o Tribunal indicou, o Autor pretendeu ver o contrato celebrado em Macau reconhecido como sem termo, quando em Portugal manteve sempre um outro contrato de trabalho até à sua reforma, ou seja, quis cumular ao mesmo tempo dois contratos sem termo. Porém, isso não é possível. Com efeito, existe uma clara subordinação do contrato de trabalho celebrado entre o Autor e a Ré relativamente ao contrato de trabalho existente entre o Autor e a CIMPOR, sem o qual o Autor não teria vindo trabalhar para Macau. Além disso, tal contrato “subordinado” pode extinguir-se, quer por força da denúncia unilateral por parte da Ré no prazo contratualmente previsto, quer por força da não autorização para a sua continuação em Macau por parte da entidade patronal. Nesta medida, o clausulado no contrato celebrado entre o Autor e a Ré sobrepõe-se às normas vigentes no ordenamento jurídico de Macau. E muito menos, as partes apenas previram a aplicação subsidiária do Estatuto Privativo do Pessoal e demais normas e regulamentos internos do IEM, sem aludir à legislação vigente. Assim sendo, o contrato celebrado entre o Autor e a Ré, que foi sendo renovado, não se converteu num contrato em termo, daí que a denúncia unilateral do contrato feita pela Ré não possa ser entendido como um despedimento ilícito e, portanto, não dê direito à correspondente indemnização, nem, por ter sido feita nos termos contratuais, justifique a atribuição de uma indemnização por força da denúncia unilateral.

      Face ao exposto, o Tribunal julgou totalmente improcedente a acção vertente, absolvendo a Ré dos pedidos principal e subsidiário formulados pelo Autor.

      Cfr. Sentença do Juízo Laboral do Tribunal Judicial de Base, processo n.º LB1-11-0002-LAC.

Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância

10/03/2014