Situação Geral dos Tribunais

A força probatória da prova documental não depende da leitura em audiência

        Em 30 de Julho de 2007, a arguida depôs como testemunha junto do Ministério Público sobre os factos relacionados com a prática do crime de falsificação de documento de especial valor imputada ao A, altura em que, depois de ter prestado juramento e ter sido advertida das consequências penais a que se expunha, sempre prestou depoimento falso, de forma livre, voluntária e consciente, perante a autoridade judiciária, alegando que, durante o ano de 1995, só teve relações sexuais com o seu sogro A, daí estar convicta de que era este o pai biológico da sua filha, até que se fez o teste laboratorial de parentesco (teste DNA), momento em que ficou a saber o seu sogro A não era o pai biológico da sua filha. No entanto, a arguida declarou, na sua contestação apresentada na Acção Ordinária de Impugnação de Paternidade n.º CV3-08-0022-CAO intentada no Tribunal Judicial de Base, que o A era apenas o avô da filha dela, e que, quando ela procedeu ao registo civil da filha junto dos serviços de registo do Governo, modificou o facto por motivos económico e de família.

        O Ministério Público acusou a arguida pela prática de um crime de falsidade de testemunho previsto e punível pelo Código Penal. Realizada a audiência de julgamento, o Colectivo do Tribunal Judicial de Base condenou a arguida pela prática de um crime de falsidade de testemunho previsto e punível pelo art.º 324.º, n.º 3 do Código Penal, na pena de um ano e seis meses de prisão, suspensa na sua execução por dois anos, sob condição de pagar MOP$8.000,00 ao Território no prazo de dois meses a contar do trânsito em julgado do acórdão. Inconformada com a decisão, a arguida dela recorreu para o Tribunal de Segunda Instância, invocando, em síntese, os seguintes fundamentos: A decisão recorrida fundou-se exclusivamente na prova documental (o auto de inquirição da recorrente), a qual, por não ter sido produzida, lida ou discutida na audiência de julgamento, não podia servir de base à formação da convicção do Tribunal. A decisão recorrida violou os princípios do contraditório, da imediação e da oralidade, padecendo do vício de violação de lei, conducente à sua nulidade ou anulação.

        O Colectivo do Tribunal de Segunda Instância manifestou o seguinte: Entendeu a recorrente que, nos termos do art.º 336.º do Código de Processo Penal, toda e qualquer prova que servisse de base à formação da convicção do tribunal tinha que ser produzida ou examinada em audiência. Mas segundo a jurisprudência portuguesa nesta matéria, “embora as provas documentais possam ser lidas se as partes tiverem conhecimento dos documentos e se estiver em causa o cumprimento do princípio do contraditório, a sua força probatória não depende da leitura em audiência”. Quer dizer, a não examinação em audiência dos respectivos documentos não implica necessariamente a violação do direito de defesa do arguido protegido pelo art.º 336.º do referido diploma legal. Na causa vertente, as provas em que se baseou a convicção do Tribunal (provas documentais) foram todas prestadas pela própria recorrente ao Ministério Público na fase de inquérito, o que significa que a recorrente tinha perfeito conhecimento dos documentos em causa e do seu conteúdo, sendo que a força probatória destes não depende da sua leitura em audiência.

        O Colectivo do Tribunal de Segunda Instância negou provimento ao recurso.

        Cfr. Acórdão do Tribunal de Segunda Instância, n.º 836/2011.

 

 

Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância

11/03/2014