Situação Geral dos Tribunais

Exercício do poder paternal deve ser harmonizado com o interesse do menor

        A recorrente A, inconformada com a decisão do Tribunal Judicial de Base que confiou exclusivamente ao recorrido B o exercício do poder paternal do seu filho menor, veio dela recorrer para o Tribunal de Segunda Instância, entendendo que seria mais vantajoso para o crescimento, o futuro e a educação do filho em Macau que fosse o mesmo confiado à recorrente, deixando-a exercer singularmente o poder paternal.

        Após o julgamento, o Colectivo do Tribunal de Segunda Instância apurou, principalmente, a factualidade seguinte:

        A recorrente e o recorrido contraíram casamento civil em Maio de 1998 em Hong Kong e, até ao momento, ainda mantêm a relação matrimonial. Desde 2010 até agora, os cônjuges encontravam-se separados de facto, havendo, neste momento, um processo de divórcio litigioso pendente que lhes concerne.

        Do casamento deles nasceram dois filhos (a filha nasceu em Macau em Maio de 1999 e o filho nasceu em Macau em Março de 2009). A filha menor tem vivido sempre com a recorrente, sob a guarda e cuidados desta. Actualmente, está a recorrente a exercer o poder paternal da filha menor e suportar, por si só, as despesas de vida da mesma. O filho menor, desde o seu nascimento até ao presente, tirando os nove meses precedentes ao dia 17 de Julho de 2011, durante os quais vivia com a recorrente, tem vivido com o recorrido, que dele cuidava e suportava por si só as suas despesas. A 17 de Julho de 2011, o recorrido levou o filho menor a deixar a residência da recorrente, vindo ainda impedir a mesma de visitar o filho. Agora, a recorrente e o recorrido já chegaram ao consenso de que o filho menor passa os sábados e domingos com a recorrente e a irmã, podendo a recorrente levá-lo para casa ao fim-de-semana. O recorrido trabalha como croupier, ao passo que a recorrente está desempregada, recebendo, mensalmente, subsídio do Instituto de Acção Social.

        A partir de Março de 2006 até este momento, a recorrente tem-se submetido ao tratamento no Serviço de Psiquiatria do Centro Hospitalar Conde de São Januário. Referiu-se no relatório entregue pelos Serviços de Saúde em 7 de Fevereiro de 2013: “Analisadas sinteticamente a sua história clínica e a avaliação psiquiátrica a que foi sujeita, a doente foi diagnosticada com perturbação delirante. Actualmente, ainda necessita de ter consultas periódicas e tomar medicamentos. Quanto à gravidade, considera-se ligeira a demência, da qual está a doente a recuperar-se. Sem o tratamento medicamentoso, poderia haver recidiva da doença. A doente mostra-se capaz de lidar com os assuntos da vida quotidiana dela própria e do menor, assim também de fazer trabalho normal.”

        Entendeu o Colectivo do Tribunal de Segunda Instância nos termos seguintes: O exercício do poder paternal deve ser harmonizado com o interesse do menor, em vez do interesse de qualquer um dos progenitores. De acordo com a avaliação levada a cabo por médico diferenciado, pese embora seja de grau ligeiro a doença mental sofrida pela recorrente, da qual até está a recuperar-se, não deixa de ser necessário controlar a doença mediante tratamento medicamentoso, sem o qual poderia haver a recidiva da doença. Para além disso, a recorrente precisa, todos os dias, de tempo suficiente para descansar, pelo que só cozinha à noite para jantar com a filha. Tendo em conta a situação de saúde da recorrente, é-nos difícil acreditar que ela consiga cuidar ao mesmo tempo dos dois filhos menores. Por fim, tendo vivido com o recorrido durante muito tempo, o filho menor já está acostumado ao actual modelo de vida e de estudo. Uma vez alterado esse modelo, necessitará o mesmo de se habituar ao novo, o que, muito provavelmente, lhe trará algumas influências. Assim sendo, mostra-se mais adequado ser confiado ao recorrido o exercício do poder paternal relativo ao filho menor.

        O Colectivo do Tribunal de Segunda Instância negou provimento ao recurso da recorrente, mantendo a decisão a quo.

Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância

28/04/2014