Situação Geral dos Tribunais

Provimento dado pelo TSI à impugnação da decisão do GRH de cancelamento sem justa causa de autorizações de contratação de trabalhadores não residentes

        Em 2007, o Gabinete para os Recursos Humanos (GRH) autorizou a Shun Tak, Serviços de Gestão, S.A. a contratar dois trabalhadores não residentes para desempenhar, respectivamente, as funções de vice-cozinheiro e de pasteleiro. Ao mesmo tempo, o trabalhador da mesma empresa, A, deduziu impugnação, alegando ter sido despedido sem justa causa. Em 2008, a Direcção dos Serviços dos Assuntos Laborais (DSAL), após investigações, afirmou que, verificado o despedimento sem justa causa do trabalhador A, a empresa em apreço tinha violado as disposições da Lei n.º 4/98/M (Lei de Bases da Política de Emprego e dos Direitos Laborais). O GRH procedeu a nova avaliação e ponderação, vindo a determinar o cancelamento das duas autorizações de importação de mão-de-obra não residente emitidas a essa empresa. Inconformada, a empresa apresentou reclamação ao GRH, na qual manifestou que nunca tinha despedido A, estando em causa apenas o mau entendimento na comunicação entre este e o seu superior hierárquico, acrescentou que já lhe tinha explicado repetidamente a situação, além de o ter persuadido a voltar ao trabalho, pedido esse que, porém, tinha sido recusado pelo mesmo. Apesar da reclamação, o GRH manteve a sua decisão. Em seguida, a aludida empresa interpôs recurso hierárquico necessário perante o Secretário para a Economia e Finanças, o qual também foi indeferido. Assim sendo, veio a empresa interpor recurso contencioso dos despachos do Secretário para a Economia e Finanças para o Tribunal de Segunda Instância, entendendo que a decisão recorrida tinha violado o disposto na Lei Básica, e padecia dos vícios de erro sobre os pressupostos de facto, falta de fundamentação e falta de audiência prévia.

        Conforme o Tribunal de Segunda Instância, dos factos dados por provados no respectivo processo de contravenção laboral resulta que a entidade recorrente não procedeu ao despedimento do seu trabalhador A, daí a presunção legal da inexistência do facto de despedimento. Apesar disso, ao abrigo do disposto no art.º 579.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, a Administração pode ilidir essa presunção mediante prova em contrário, mas não o fez. Por outras palavras, não existiam os pressupostos de facto subjacentes à decisão da Administração de cancelar as respectivas autorizações de contratação, a qual, portanto, se mostra inválida, devendo ser anulada.

        Além disso, a Administração, ao cancelar as autorizações de contratação, não fez mais nada do que remeter para a alegação da DSAL que imputou à entidade recorrente a violação da Lei n.º 4/98/M. Mas a verdade é que nenhuma norma deste diploma legal foi invocada pela DSAL na sua motivação, pelo que se fica sem saber a razão concreta do cancelamento das autorizações de trabalho dos dois trabalhadores não residentes. Dest´arte, o acto recorrido é manifestamente insuficiente no plano da fundamentação, tanto do ponto de vista factual, como do ponto de vista jurídico, devendo, nestes termos, ser anulado.

        Ademais, à luz do art.º 93.º do Código do Procedimento Administrativo, concluída a instrução, a Administração deve, em regra, realizar a audiência dos interessados, formalidade essa que mais ainda se justifica nos casos de actividade administrativa discricionária agressiva, ablativa ou sancionatória, em que, portanto, o direito de defesa e de participação assume um papel de relevo essencial, sendo tal exactamente o caso. No entanto, a Administração não observou o princípio da audiência dos interessados antes de determinar o cancelamento das autorizações de contratação, daí que seja de anular a sua decisão.

        Face ao exposto, o Tribunal de Segunda Instância concedeu provimento ao recurso, anulando o acto impugnado.

        Cfr. Acórdão do Tribunal de Segunda Instância, processo n.º 525/2008.

 

 

Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância

07/05/2014