Situação Geral dos Tribunais

Existe uma relação de concurso aparente entre o crime de detenção indevida de instrumentos para consumo de drogas e o crime de consumo de drogas

        O recorrente A (1º arguido) foi condenado pelo Tribunal Judicial de Base, pela prática de um crime de tráfico ilícito de estupefacientes e de substâncias psicotrópicas (crime de tráfico de drogas), na pena de seis anos e dez meses de prisão; pela prática de um crime de consumo ilícito de estupefacientes e de substâncias psicotrópicas (crime de consumo de drogas), na pena de dois meses de prisão; e pela prática de um crime de detenção indevida de utensílio ou equipamento (crime de detenção indevida de instrumentos para consumo de drogas), na pena de dois meses de prisão. Em cúmulo jurídico, foi o recorrente A condenado na pena única de sete anos de prisão efectiva.

        A recorrente B (2ª arguida) foi condenada, pela prática de um crime de tráfico ilícito de estupefacientes e de substâncias psicotrópicas (crime de tráfico de drogas), na pena de seis anos de prisão; pela prática de um crime de consumo ilícito de estupefacientes e de substâncias psicotrópicas (crime de consumo de drogas), na pena de dois meses de prisão; e pela prática de um crime de detenção indevida de utensílio ou equipamento (crime de detenção indevida de instrumentos para consumo de drogas), na pena de dois meses de prisão. Em cúmulo jurídico, foi a recorrente B condenada na pena única de seis anos e dois meses de prisão efectiva.

        Inconformados com a sentença a quo, A e B vieram dela recorrer, com os fundamentos a seguir indicados: 1. Entenderam que deviam ser absolvidos do crime de detenção indevida de utensílio ou equipamento (crime de detenção indevida de instrumentos para consumo de drogas). 2. Alegou o recorrente B que a favor dele militava uma circunstância atenuante (com as informações prestadas por B, a Polícia Judiciária chegou a capturar o 1º arguido A), que, todavia, não foi levado em consideração pelo Tribunal a quo na determinação da medida da pena. 3. O recorrente A indicou que era delinquente primário, e adiantou que o Tribunal a quo, na determinação da medida da pena, não tinha considerado suficientemente a quantidade de drogas encontradas, sendo excessiva a pena de seis anos e dez meses de prisão que lhe foi imposta, a qual, portanto, deveria ser convolada para uma pena de cinco anos de prisão, que seria mais adequada.

        O Colectivo do Tribunal de Segunda Instância (TSI) entendeu nos seguintes termos: De acordo com os factos dados como provados pelo Tribunal a quo, os recorrentes A e B detinham os materiais apreendidos, nomeadamente garrafas plásticas, tampas, palhinhas, folhas de papel de alumínio, isqueiro e recipientes de vidro, e usavam-nos como instrumentos para consumir as respectivas drogas, sendo que detinham os aludidos utensílios que usavam para consumir drogas, apesar de saberem bem que o era proibido. No entanto, o TSI manifestou que, existindo uma relação de concurso aparente entre o crime de detenção indevida de utensílio ou equipamento e o crime de consumo ilícito de estupefacientes e substâncias psicotrópicas, deviam os dois recorrentes ser absolvidos da acusação da prática de um crime de detenção indevida de utensílio ou equipamento.

        Consideraram-se, porém, improcedentes os demais fundamentos e termos formulados pelos recorrentes.

        Em sintonia com as respectivas disposições do Código Penal, a atenuação especial da pena tem como requisito material que as circunstâncias “diminuam por forma acentuada a ilicitude do facto, a culpa do agente ou a necessidade da pena”. A diminuição acentuada exigida pela lei não é uma diminuição em medida moderada. Em casos concretos, a atenuação especial da pena só se justifica quando, em virtude da existência de certas circunstâncias, a ilicitude do facto, a culpa do agente ou a necessidade da pena se mostrem diminuídas em grande medida. À luz do art.º 18.º da Lei n.º 17/2009, se o agente abandonar voluntariamente a sua actividade, afastar ou fizer diminuir consideravelmente o perigo por ela causado ou se esforçar seriamente por consegui-lo, auxiliar concretamente na recolha de provas decisivas para a identificação ou captura de outros responsáveis, especialmente no caso de grupos, de organizações ou de associações, pode a pena ser-lhe especialmente atenuada ou haver lugar à dispensa de pena.

        A recorrente B declarou que, após detida, ela tinha levado e acompanhado a polícia a ir capturar o recorrente A ao respectivo quarto de hotel. Mas conforme os factos provados, no caso vertente, na sequência da participação feita por um hotel, a polícia deteve o 3º arguido C, e, através deste, tomou conhecimento do número de telemóvel do recorrente A. A recorrente B foi detida pela polícia enquanto auxiliava o recorrente A a fazer transacção de drogas com o 3º arguido, tendo, então, sido encontrado na sua posse um cartão de quarto dum outro hotel. Depois disso, em companhia da recorrente B, a polícia deslocou-se a esse hotel, onde chegou a capturar o 1º arguido. Da factualidade dada como assente pelo Tribunal a quo, não se pode concluir que a recorrente B tenha colaborado com a polícia na captura de outros arguidos na mesma dausa. Assim, não se verificando os pressupostos da atenuação especial da pena estipulados no art.º 18.º da Lei n.º 17/2009, a recorrente B não reúne todos os requisitos legais para a atenuação especial da pena.

        Em relação à medida da pena, dos factos provados resulta que, tendo adquirido drogas dum indivíduo de identidade desconhecida, os recorrentes A e B, já várias vezes, em distribuição de tarefas, venderam-nas a outras pessoas, incluindo os arguidos C e D. Ora, segundo a análise quantitativa, as drogas encontradas no presente processo continham, no total, 24,511 gramas de Metanfetamina e 0,214 grama de Cocaína. O recorrente A não é residente de Macau. É delinquente primário, sem antecedente criminal, circunstância esta que lhe mostra favorável. Não obstante, durante a audiência de julgamento, ele apenas confessou o consumo de drogas e a detenção de instrumentos para consumo de drogas, não reconhecendo ter praticado o tráfico de drogas, nem mostrando nenhum arrependimento pelo seu comportamento. Tendo analisado os factos concernentes e todas as circunstâncias que depõem a favor ou contra o recorrente A, designadamente a quantidade de drogas e o facto criminoso de ele ter traficado drogas várias vezes, considera-se adequada e não excessiva a pena de seis anos e dez meses de prisão em que foi condenado pelo Tribunal a quo.

        Face ao exposto, o Colectivo do TSI julgou parcialmente procedente o recurso dos recorrentes, absolvendo-os da acusação da prática de um crime de detenção indevida de utensílio ou equipamento, pelo que procedeu a novo cúmulo jurídico das penas impostas aos recorrentes:

        O recorrente A (1º arguido) foi condenado pelo Tribunal a quo, pela prática de um crime de tráfico ilícito de estupefacientes e de substâncias psicotrópicas (crime de tráfico de drogas), na pena de seis anos e dez meses de prisão; pela prática de um crime de consumo ilícito de estupefacientes e de substâncias psicotrópicas (crime de consumo de drogas), na pena de dois meses de prisão. Ora, operando o cúmulo jurídico das duas penas parcelares, veio o mesmo a ser condenado na pena de seis anos e onze meses de prisão efectiva.

        A recorrente B (2ª arguida) foi condenada pelo Tribunal a quo, pela prática de um crime de tráfico ilícito de estupefacientes e de substâncias psicotrópicas (crime de tráfico de drogas), na pena de seis anos de prisão; pela prática de um crime de consumo ilícito de estupefacientes e de substâncias psicotrópicas (crime de consumo de drogas), na pena de dois meses de prisão. Ora, operando o cúmulo jurídico das duas penas parcelares, veio a mesma a ser condenada na pena de seis anos e um mês de prisão efectiva.

        Cfr. Acórdão do Tribunal de Segunda Instância, processo n.º 80/2014.

 

 Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância

13/05/2014