Situação Geral dos Tribunais

Processo de inventário pode ser suspenso após conferência de interessados

      O Tribunal de Segunda Instância julgou um processo de inventário nos últimos dias.

      Relatório: No processo de inventário destinado a pôr termo à comunhão hereditá que correu termos no Tribunal Judicial de Base, chegaram todos os interessados a um acordo sobre a relação de bens a partilhar, depois da realização da conferência de interessados. Os bens foram, um por um, partilhados, entre os quais o imóvel inscrito sob a verba nº 49 da relação foi licitado pelos interessados A e B pelo valor de MOP700.000.000,00. Em 4/12/2012, a Secretaria do Tribunal Judicial de Base elaborou o mapa de partilha. Mas, em 31/01/2013, já depois da notificação dos interessados A e B para procederem ao depósito das tornas, aqueles mesmos vieram finalmente requerer a suspensão do processo, com a invocação de disporem de elementos documentais alegadamente comprovativos de que a verba nº 49 afinal não pertencia ao inventariado. Instauraram a seguir, em 4/3/2013, uma acção de simples apreciação para resolver a questão relativa à da titularidade do bem imóvel. Em 19/3/2013, o juiz do processo de inventário proferiou despacho que deferiu o requerimento dos A e B, ordenando a suspensão do processo até que fosse proferida decisão transitada em julgado na referida acção de simples apreciação.

      Outro herdeiro C não se conformou com o despacho referido, do qual interpôs recurso, invocando que, com base no artº 989º, nº 1 do Código de Processo Civel, o juiz marca dia para a realização de uma conferência de interessados, após resolvidas as questões susceptíveis de influir na partilha e determinados os bens a partilhar. O que quer dizer que todas as reclamações relativas à relação de bens a partilhar hão-de ser resolvidas antes da realização da conferência de interessados. Por conseguinte, não se pode aceitrar o requerimento dos A e B, formulado após a realização da conferência, que levantou a questão da titularidade do bem imóvel inscrito sob a verba 49 da relação de bens e pediu a suspensão do processo de inventário. Caso contrário, incorre-se em violação do artigo 574º do Código de Processo Civil (valor da sentença transitada em julgado).

      O Tribunal de Segunda Instância constituiu um tribunal colectivo para proceder à apreciação do processo, tendo apontado: o requerimento de suspensão do processo de inventário tinha por base o artigo 970º, nº 1 do Código de Processo Civil, que tem por pressuposto que o processo de inventário esteja em curso, sem definir o termo ad quem ou a fase até à qual a suspensão pode ocorrer. Aliás, esta disposição legal insere-se no capítulo I com a epígrafe “Disposições gerais”, sendo aplicáveis a todo o processo e a todas as suas fases. Portanto, não pode a circunstância de a fase de conferência de interessados estar já ultrapassada constituir obstáculo à suspensão.

      O deferimento do requerimento depende de que a suspensão justificar-se-á se as questões a resolver nos meios comuns forem necessárias à conclusão sobre a admissibilidade do próprio inventário,ou necessárias à definição dos direitos dos interessados na partilha. Quanto à primeira questão, segundo a doutrina, se houve já partilha, se existe um contrato-promessa de partilha válido, etc. Então deve o processo de inventário ser suspenso. Mas, quanto à segunda, o Tribunal de Segunda Instância entende que a expressão “definição dos direitos dos interessados directos na partilha” abarca inúmeras questões que terão como resultado ou efeito “relacionar bens questionados ou fazê-lo com qualificação específica”. No caso dos autos, os dois requerentes pretenderam resolver nos meios cumuns a questão relativa à titularidade do imóvel descrito sob a verba 49 da relação de bens. Uma vez que ele foi relacionado, a liquidez desta questão influenciará o direito (a definição) de cada interessado. Os Juízes entenderam que se os documentos juntos por aqueles dois interessados não foram tidos por suficientes para habilitar o juiz do inventário a resolver essa “vexata quaestio”, então acredita-se que a suspensão ao abrigo do art. 970º tem cabimento, até para evitar a nulidade a que se refere o art. 1963º do Código Civil. Isso também em nada contende com o disposto no artigo 574º do Código de Processo Civil, porquanto aqueles interessados logo deram a entender que fariam nova incursão aos autos para pedir a suspensão no momento em que encontrassem documentos que revelassem a titularidade sobre o dito bem. Portanto, a relação de bens elaborada na conferência de interessados não pode ser considerada definitiva, não constituindo caso julgado.

      Nos fundamentos acima expostos, o Tribunal Colectivo julgou improcedente o recurso, confirmando o despacho proferido pelo Tribunal a quo que ordenou a suspensão do processo de inventário.

      Cfr. acórdão proferido no processo nº 57/2014 do Tribunal de Segunda Instância.

 

Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância

06/10/2014