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Processo n.º 17/2012 Data do acórdão: 2012-3-8 (Autos de recurso penal)
  Assuntos:
– medida da pena
– roubo
– prevenção geral do crime
– suspensão da execução da prisão
– art.o 48.o, n.o 1, do Código Penal
– art.o 82.o, n.o 2, do Código de Processo Penal
– despesas de tradução de língua estrangeira
S U M Á R I O
1. Ainda que o arguido recorrente seja delinquente primário, não tenha causado ferimento ao corpo do ofendido do crime de roubo por ele praticado e tenha condições sócio-económicas modestas, estas circunstâncias, por si só ou em conjunto, não têm a virtude de fazer baixar a pena de prisão achada pelo Tribunal a quo, uma vez que são muito elevadas as exigências da prevenção geral deste crime, especialmente quando cometido por pessoa estrangeira.
2. É jurisprudência constante do Tribunal de Segunda Instância que não se pode suspender a execução da prisão imposta pelo crime de roubo, por mor precisamente das elevadas exigências da prevenção geral deste delito (cfr. o critério material exigido na parte final do n.o 1 do art.o 48.o do vigente Código Penal para efeitos de suspensão da prisão).
3. O art.o 82.o, n.o 2, do vigente Código de Processo Penal dispõe que “Quando houver de intervir no processo pessoa que não conhecer ou não dominar a língua de comunicação, é nomeado, sem encargo para ela, intérprete idóneo, ...”, pelo que há que revogar o acórdão recorrido na parte em que se condenou o arguido, filipino, no pagamento das despesas de tradução da língua filipina, passando essas despesas a ser suportadas agora pelo Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância.
O relator,
Chan Kuong Seng

Processo n.º 17/2012
(Autos de recurso penal)
Recorrente: A





ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU
I – RELATÓRIO
Em 30 de Novembro de 2011, foi proferido acórdão em primeira instância no âmbito do Processo Comum Colectivo n.° CR3-11-0138-PCC do 3.o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base, por força do qual o arguido B (rectius A) ficou condenado como co-autor material de um crime consumado de roubo, p. e p. pelo art.o 204.o, n.o 1, do vigente Código Penal de Macau (CP), na pena de dois anos e três meses de prisão, com pagamento de custas processuais (com quatro UC de taxa de justiça), de mil e seiscentas patacas de honorários totais aos seus dois Exm.os Defensores Oficiosos, e de mil patacas de despesas de tradução da língua filipina (cfr. o teor desse acórdão, a fls. 116 a 119 dos presentes autos correspondentes).
Inconformado, veio o arguido recorrer para este Tribunal de Segunda Instância (TSI), imputando concreta e materialmente ao Tribunal a quo o excesso na medida da pena e a violação do disposto no art.o 48.o do CP e no art.o 82.o, n.o 2, do vigente Código de Processo Penal (CPP), para rogar a redução da sua pena de prisão a dois anos, com almejada suspensão da sua execução por quatro anos, e simultânea revogação da decisão condenatória no pagamento das despesas de tradução da língua filipina (cfr. a motivação de recurso de fls. 135 a 137 dos autos).
Ao recurso respondeu a Digna Delegada do Procurador junto do Tribunal recorrido no sentido de procedência da argumentação do recorrente somente na parte referente às despesas de tradução (cfr. a resposta de fls. 139 a 141).
Subidos os autos, emitiu a Digna Procuradora-Adjunta parecer (a fls. 158 a 159v), pugnando também pelo provimento parcial do recurso, em moldes congéneres aos vertidos na resposta ao recurso.
Feito subsequentemente o exame preliminar e corridos os vistos legais, procedeu-se à audiência em julgamento.
Cumpre, pois, decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA
Como ponto de partida para o trabalho, é de relembrar aqui todos os factos já dados como provados pelo Tribunal a quo, descritos na Parte II (páginas 2 a 3) do texto do acórdão recorrido, e não impugnados pelo arguido, os quais se dão por aqui integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais, de acordo com os quais:
– em 26 de Maio de 2011, pelas três horas da tarde, o arguido e um outro indivíduo masculino de identidade não apurada, andaram detrás do ofendido desde as imediações dos Correios de Macau para esperar pela oportunidade de roubar um maço de notas colocado por este no bolso esquerdo das calças;
– quando o ofendido estava a atravessar a zebra do cruzamento da Avenida de Almeida Ribeiro com a Avenida da Praia Grande, o arguido pegou à força nas pernas do ofendido e causou assim a este a perda de equilíbrio, enquanto o outro indivíduo deu um empurrão nas costas do ofendido e estendeu logo depois a mão no bolso esquerdo das calças do ofendido e retirou daí dez mil renminbis;
– o arguido agiu livre, consciente e voluntariamente, em conjugação de esforços com aquele outro indivíduo, sabendo que a sua conduta era proibida por lei e como tal punível;
– o arguido não tem antecedentes criminais, e declara que é operário de construção civil, com quatrocentos pesos filipinos de rendimento diário, com 5.a classe do ensino primário e com três filhos a cargo.
Outrossim:
– conforme o teor de fl. 7 dos autos, referente ao passaporte filipino do arguido, este tem por apelido X;
– em sintonia com o teor da acta da audiência de julgamento no Tribunal a quo (lavrada a fls. 114 a 115), foi nomeado um guarda de segurança filipino desse Tribunal para desempenhar o papel de tradutor da língua filipina, tendo em conta que “o arguido é filipino”;
– e segundo a fundamentação do acórdão recorrido, o arguido não admitiu a prática do crime imputado.
III – FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
De antemão, cabe notar que mesmo em processo penal, e com excepção da matéria de conhecimento oficioso, ao tribunal de recurso cumpre resolver apenas as questões material e concretamente alegadas na motivação do recurso e devidamente delimitadas nas conclusões da mesma, e já não responder a toda e qualquer razão aduzida pela parte recorrente para sustentar a procedência das suas questões colocadas (nesse sentido, cfr., de entre muitos outros, os acórdãos do TSI, de 7 de Dezembro de 2000 no Processo n.o 130/2000, de 3 de Maio de 2001 no Processo n.o 18/2001, e de 17 de Maio de 2001 no Processo n.o 63/2001).
E antes de entrar na abordagem do objecto do recurso, cumpre proceder, nos termos do art.o 361.o, n.o 1, alínea b), e n.o 2, do CPP, à rectificação oficiosa da redacção do nome completo do arguido recorrente escrito no texto do acórdão recorrido, no sentido de que onde se escreveu aí, por lapso manifesto de escrita, “B”, deve ser “A”, isto porque conforme o teor da fl. 7, referente aos dados de identificação constantes do passaporte filipino do arguido, o apelido deste é X.
O recorrente começou por defender que como ele é delinquente primário e o seu acto de roubo não causou ferimento ao corpo do ofendido, a pena de prisão aplicada pelo Tribunal recorrido é excessiva, não obstante a sua não confissão dos factos na audiência então realizada.
Entretanto, para este Tribunal ad quem, ainda que o arguido seja delinquente primário, não tenha causado ferimento ao corpo do ofendido e tenha condições sócio-económicas modestas, estas circunstâncias, por si só ou em conjunto, não têm a virtude de fazer baixar a pena de prisão achada pelo Tribunal recorrido, uma vez que são muito elevadas as exigências da prevenção geral do crime de roubo, especialmente quando praticado por pessoa estrangeira, sendo certo que in casu o montante roubado não é de valor diminuto, com a agravante de que o arguido nem admitiu a prática do delito.
E no tangente ao pedido de suspensão da execução da pena de prisão, é jurisprudência consabidamente constante deste TSI que não se pode suspender a execução da prisão imposta pelo crime de roubo, por mor precisamente das elevadas exigências da prevenção geral deste delito (cfr. o critério material exigido na parte final do n.o 1 do art.o 48.o do CP para efeitos de suspensão da prisão).
Por fim, já assiste razão ao arguido no tocante à questão de despesas de tradução da língua filipina, posto que o art.o 82.o, n.o 2, do CPP dispõe que “Quando houver de intervir no processo pessoa que não conhecer ou não dominar a língua de comunicação, é nomeado, sem encargo para ela, intérprete idóneo, ...”. Daí que há que revogar o aresto recorrido na parte em questão, com determinação do pagamento das despesas de tradução da língua filipina pelo Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância.
IV – DECISÃO
Nos termos expostos, acordam em:
– rectificar oficiosamente a redacção do nome completo do arguido escrito no texto do acórdão recorrido, no sentido de que onde se lê aí “B”, se deve ler “A”;
– e julgar parcialmente provido o recurso, revogando o acórdão recorrido apenas na parte referente à condenação do arguido no pagamento de mil patacas de despesas de tradução da língua filipina, passando essas despesas a ser suportadas pelo Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância, e ficando, pois, intacto o restante decidido nesse acórdão.
Pagará o arguido dois terços das custas do recurso e quatro UC de taxa de justiça.
Fixam em mil e trezentas patacas os honorários do seu Exm.o Defensor Oficioso, a entrar na regra das custas, e ora a adiantar pelo Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância.
Macau, 8 de Março de 2012.
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Chan Kuong Seng
(Relator)
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Tam Hio Wa
(Primeira Juíza-Adjunta)
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José Maria Dias Azedo
(Segundo Juiz-Adjunto)



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