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Processo nº 377/2012 Data: 24.05.2012
(Autos de recurso penal)

Assuntos : Crimes de “sequestro”, “falsidade de depoimento”, “exigência de documento”, “falsificação de documento”, “falsas declarações sobre a identidade” e “reentrada ilegal”.
Pena.
Atenuação especial.


SUMÁRIO

1. A atenuação especial só pode ter lugar em casos “extraordinários” ou “excepcionais”, ou seja, quando a conduta em causa “se apresente com uma gravidade tão diminuída que possa razoavelmente supor-se que o legislador não pensou em hipóteses tais quando estatuiu os limites normais da moldura cabida ao tipo de facto respectivo.

2. Na determinação da medida da pena, adoptou o Código Penal de Macau no seu art.º 65.º, a “Teoria da margem da liberdade”, segundo a qual, a pena concreta é fixada entre um limite mínimo e um limite máximo, determinados em função da culpa, intervindo os outros fins das penas dentro destes limites.

O relator,

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José Maria Dias Azedo

Processo nº 377/2012
(Autos de recurso penal)






ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:





Relatório

1. Em audiência colectiva no T.J.B. respondeu A, com os sinais dos autos, vindo a ser condenado como autor da prática em concurso real de, 1 crime de “sequestro”, p. e p. pelo art, 152°, n.° 2, al. a) do C.P.M., na pena de 3 anos e 3 meses de prisão, 1 crime de “falsidade de depoimento de parte ou declaração”, p. e p. pelo art. 323°, n.° 2 do C.P.M., na pena de 10 meses de prisão, 1 crime de “exigência ou aceitação de documento”, p. e p. pelo art. 14° da Lei n.° 8/96/M, na pena de 2 anos e 6 meses de prisão, 1 crime de “falsificação de documentos”, p. e p. pelo art. 18°, n.° 3 da Lei n.° 6/2004, na pena de 7 meses de prisão, 1 crime de “falsas declarações sobre a identidade”, p. e p. pelo art. 19°, n.° 1 da mesma Lei n.° 6/2004 na pena de 8 meses de prisão, e 1 crime de “reentrada ilegal” p. e p. pelo art. 21° da dita Lei n.° 6/2004, na pena de 3 meses de prisão.
Em cúmulo, foi o arguido condenado na pena única de 5 anos de prisão, e na pena acessória de proibição de entrada nos Casinos da R.A.E.M., (cfr., art. 15° da Lei n.° 8/96/M), por 1 período de 4 anos; (cfr., fls. 253-v a 254-v que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).

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Inconformado o arguido recorreu.
Motivou para, a final, e em síntese, afirmar que excessiva era a pena pedindo assim a sua atenuação especial ou redução; (cfr., fls. 290 a 296).

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Respondendo, pugna o Exmo. Magistrado do Ministério Público pela rejeição do recurso; (cfr., fls. 312 a 316-v).

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Admitido o recurso, e remetidos os autos a este T.S.I., em sede de vista juntou o Ilustre Procurador Adjunto condenando também que nenhuma razão tinha o recorrente, sendo de confirmar na íntegra a decisão recorrida; (cfr., fls. 328 a 329-v).

*

Cumpre decidir.

Fundamentação

Dos factos

2. Estão provados os factos como tal elencados no Acórdão recorrido, a fls. 248 a 251-v, e que aqui se dão como reproduzidos para todos os efeitos legais.

Do direito

3. Vem o arguido recorrer do Acórdão que o condenou nos termos que atrás se deixou explicitado.

Não discutindo a decisão da matéria de facto, nem a qualificação jurídico-penal da sua conduta dada como provada, pede uma “atenuação especial”, invocando o art. 66°, n.° 2, al. d) do C.P.M., ou (mera) “redução”, invocando, para tal o art. 65°, n.° 2, al. d) do mesmo código.

Ora, como se deixou consignado em sede de exame preliminar, cremos que nenhuma razão tem o ora recorrente, sendo o recurso de rejeitar dada a sua manifesta improcedência; (cfr., art. 410°, n.° 1 do C.P.P.M.).

Vejamos.

Prescreve o art. 40° do C.P.M. que:

“1. A aplicação de penas e medidas de segurança visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade.

2. A pena não pode ultrapassar em caso algum a medida da culpa.

3. A medida de segurança só pode ser aplicada se for proporcionada à gravidade do facto e à perigosidade do agente”.

Estatui também o art. 65° do mesmo Código que:

“1. A determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção criminal.

2. Na determinação da medida da pena o tribunal atende a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele, considerando nomeadamente:

a) O grau de ilicitude do facto, o modo de execução deste e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação dos deveres impostos ao agente;

b) A intensidade do dolo ou da negligência;

c) Os sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins ou motivos que o determinaram;

d) As condições pessoais do agente e a sua situação económica;

e) A conduta anterior ao facto e a posterior a este, especialmente quando esta seja destinada a reparar as consequências do crime;

f) A falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto, quando essa falta deva ser censurada através da aplicação da pena.

3. Na sentença são expressamente referidos os fundamentos da determinação da pena”.

E, por sua vez, o art. 66° que:

“1. O tribunal atenua especialmente a pena, para além dos casos expressamente previstos na lei, quando existirem circunstâncias anteriores ou posteriores ao crime, ou contemporâneas dele, que diminuam por forma acentuada a ilicitude do facto, a culpa do agente ou a necessidade da pena.

  2. Para efeitos do disposto no número anterior são consideradas, entre outras, as circunstâncias seguintes:

a) Ter o agente actuado sob influência de ameaça grave ou sob ascendente de pessoa de quem dependa ou a quem deva obediência;

b) Ter sido a conduta do agente determinada por motivo honroso, por forte solicitação ou tentação da própria vítima ou por provocação injusta ou ofensa imerecida;

c) Ter havido actos demonstrativos de arrependimento sincero do agente, nomeadamente a reparação, até onde lhe era possível, dos danos causados;

d) Ter decorrido muito tempo sobre a prática do crime, mantendo o agente boa conduta;

e) Ter o agente sido especialmente afectado pelas consequências do facto;

f) Ter o agente menos de 18 anos ao tempo do facto.

  3. Só pode ser tomada em conta uma única vez a circunstância que, por si mesma ou em conjunto com outras, der lugar simultaneamente a uma atenuação especial da pena expressamente prevista na lei e à atenuação prevista neste artigo”.

–– Ora, como se disse, invoca o arguido a alínea d) do n.° 2 do transcrito art. 66° para pedir uma “atenuação especial”.

Não vemos como.

Na verdade os factos integradores dos vários crimes pelos quais foi o recorrente condenado tiveram lugar em 2011, não se vislumbrando como dar por verificada a aludida circunstância atenuativa especial, (de “ter decorrido muito tempo…”).

Aliás na matéria em questão tem este T.S.I. entendido que “a atenuação especial só pode ter lugar em casos “extraordinários” ou “excepcionais”, ou seja, quando a conduta em causa “se apresente com uma gravidade tão diminuída que possa razoavelmente supor-se que o legislador não pensou em hipóteses tais quando estatuiu os limites normais da moldura cabida ao tipo de facto respectivo”, (cfr., v.g., o recente Ac. deste T.S.I. de 14.04.2011, Proc. n°130/2011 e de 19.01.2012, Proc. n° 795/2011), não sendo obviamente este o caso.

–– Quanto à redução da pena, vejamos.


Alega o recorrente que face à factualidade provada, verificada está a circunstância da alínea d) do n.° 2 do art. 65°.

É também patente a improcedência do recurso na parte em questão.

Com efeito, e na parte que para aqui releva, provado está que antes da prática do crime era o ora recorrente comerciante, auferindo mensalmente RMB$7.000,00 ou RMB$8.000,00, sendo casado, tendo a seu cargo a sua mãe, esposa e 1 filho, tendo confessado, parcialmente, os factos, e sendo primário.

E não se olvidando o preceituado no art. 22° da Lei n.° 6/2004 – onde se prescreve que “na determinação da medida da pena correspondente aos crimes previstos na legislação comum, o facto de o agente ser um indivíduo em situação de imigração ilegal constitui circunstância agravante” – poder-se-á considerar que houve excesso na determinação das penas parcelares e única?

Cremos que não.

Na matéria em questão, tem este T.S.I. considerado que “na determinação da medida da pena, adoptou o Código Penal de Macau no seu art.º 65.º, a “Teoria da margem da liberdade”, segundo a qual, a pena concreta é fixada entre um limite mínimo e um limite máximo, determinados em função da culpa, intervindo os outros fins das penas dentro destes limites”; (cfr., v.g., o Ac. de 03.02.2000, Proc. n° 2/2000, e, mais recentemente, de 29.09.2011, Proc. n° 483/2011).

E sendo o recorrente “imigrante clandestino”, tendo regressado a Macau, ilegalmente, e em violação de uma “ordem de proibição de reentrada”, para cometer, (nomeadamente), os crimes de “sequestro” e “exigência ou aceitação de documento”, bem se vê que intenso é o dolo e elevado o grau de ilicitude, tornando, também, fortes, as necessidades de prevenção especial e geral.

E, nesta conformidade, atentas as respectivas molduras penais para os (vários) crimes cometidos, não vemos como considerar excessivas as penas fixadas.

Em sede do cúmulo jurídico, e em causa estando como moldura penal com 1 limite mínimo de 3 anos e 3 meses de prisão, e 1 limite máximo de 8 anos e 3 meses de prisão, (cfr., art. 71°, n.° 2), e sendo que na fixação da pena única se deve ponderar, “em conjunto, os factos e a personalidade do agente”, (cfr., art. 71°, n.° 1), também aqui há que dizer que excessiva não é a pena única de 5 anos de prisão fixada, pois que o recorrente revela ter uma personalidade mal formada, que não olha a meios para atingir os fins a que se propõe, certo sendo igualmente que a dita pena única ainda está relativamente próxima do seu limite mínimo, não atingindo sequer o seu meio.

Tudo visto, resta decidir.

Decisão

4. Em face do exposto, acordam, rejeitar o recurso; (cfr., art°s 409°, n° 2, al. a) e 410°, n° 1 do C.P.P.M.).

Pagará o recorrente 5 UCs de taxa de justiça, e como sanção pela rejeição do seu recurso, o equivalente a 4 UCs; (cfr., art. 410°, n.° 4 do C.P.P.M.).

Honorários ao Exmo. Defensor no montante de MOP$1.000,00.

Macau, aos 24 de Maio de 2012

José Maria Dias Azedo
Chan Kuong Seng
Tam Hio Wa


Proc. 377/2012 Pág. 14

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