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Proc. nº 167/2012
(Recurso cível e Laboral)
Relator: Cândido de Pinho
Data do acórdão: 31 de Maio de 2012
Descritores:
-Nulidade de sentença
-Empreitada e Subempreitada
-Defeitos da obra

SUMÁRIO:

I- A nulidade por omissão de pronúncia prevista no art. 571º, nº1, al. d), do CPC só se verifica quando o tribunal ignora pura e simplesmente qualquer questão que devesse ser apreciada por essencial ao resultado ou desfecho da causa, não já em relação a alguns dos fundamentos invocados pelas partes. Por isso se diz que, mesmo sem abordar algum dos fundamentos alinhados por elas, não é nula a sentença se esta contiver todos os argumentos de facto e de direito que a sustentam, ainda que, porventura, em erro de julgamento.
II- São aplicáveis à subempreitada, definido pelo artigo 1139º do Código Civil, com as devidas adaptações, as regras do contrato de empreitada, tudo se passando, ao fim e ao cabo, como se o empreiteiro assumisse perante o subempreiteiro a qualidade de dono da obra.
III- A caducidade do exercício dos direitos do dono da obra implica que a obra tenha sido acabada com defeitos. Assim, tanto a recusa de aceitação, e a aceitação com reserva (art. 1150º, nº1, cit.), como a própria denúncia de defeitos (art. 1146º do C), implicam que a obra tenha sido pronta ao dono da obra ou ao empreiteiro, se efectuada por subempreiteiro.
IV- Para se poder extrair algum efeito da denúncia, seria preciso observar as regras de actuação previstas no Código segundo a ordem de prioridade nele estabelecidas: em primeiro lugar, a eliminação dos defeitos, se estes pudessem ser eliminados; em segundo lugar, uma nova construção, se os defeitos não pudessem ser eliminados; em terceiro lugar, na hipótese de não serem eliminados os defeitos ou construída de novo a obra, o exercício do direito de exigir a redução do preço ou, em alternativa, a resolução do contrato.

Proc. nº 167/2012
(Recurso Civil e Laboral)

Acordam no Tribunal de Segunda Instância da RAEM

I- Relatório
A, com os demais sinais dos autos, moveu acção declarativa com processo ordinário contra “B”, pedindo a condenação desta no pagamento de Mop$ 1.189.614,29 e juros respectivos, por serviços prestados e não pagos no âmbito de um contrato de subempreitada entre ambos celebrado.
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Contestou a ré, defendendo a improcedência da acção e a procedência da reconvenção por si deduzida no sentido do pagamento por parte do A. da quantia de Mop$ 1.860.730,70 e juros respectivos.
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A seu tempo foi a acção julgada parcialmente provada e procedente e condenada a ré a pagar ao autor a quantia de Mop$ 897.006,00 e juros de mora, e improcedente a reconvenção.
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É dessa sentença que ora vem interposto pela Ré o presente recurso jurisdicional, em cujas alegações formulou as seguintes conclusões:
A. Entendeu o Tribunal a quo que o pedido reconvencional foi extemporâneo pois, teria já caducado o direito de eliminação dos defeitos, redução do preço, resolução do contrato e indemnização, por força do disposto no art. 1150.º n.º 1 do CC:
B. Em lugar algum foi alegado que o R. se recusou a aceitar as referidas obras, nem foi provado nenhum facto de onde se possa retirar tal conclusão;
C. O A. não foi notificado dos defeitos, nem da recusa de aceitação da obra, apenas, que havia defeitos e por causa deles cessava o contrato de empreitada entre ambos;
D. Os factos dados como provados pelo Tribunal a quo, salvo o devido respeito, contradizem-se uns aos outros;
E. O Tribunal a quo, ao mesmo tempo que dá como provado que as obras foram concluídas no segundo semestre de 2008, dá também como provados defeitos quem impedem dar as obras por concluídas;
F. Da matéria assente não resulta quem concluiu os trabalhos, ficamos sem saber se as obras referidas foram concluídas pelo A. ou pelos trabalhadores que a R contratou posteriormente ao A. abandonar as fracções;
G. O Tribunal a quo não pode considerar uma obra concluída e ao mesmo tempo dar como provados todos os defeitos enumerados;
H. Em consequência, nem as obras referidas foram, concluídas pelo A., nem foram aceites pelos donos da obra ou pela R que também não se recusou a aceitá-las, o que impede a aplicação do Art. 1150.º n.º 1 do C. C.;
I. O A. directamente e através dos seus empregados, começou a perseguir o Sr. C, injuriando, difamando e ameaçando a integridade física do sócio da R;
J. Os defeitos só não foram denunciados antes, como resulta da acusação pública deduzida no Proc. CR2-10-0233-PCC, porque o Sr. C receava pela sua integridade física;
K. No apuramento do montante a pagar pela R ao A. o Tribunal a quo procedeu de forma errada;
L. Se o dono da obra pôs termos ao contrato com a R e se opôs à conclusão destas por qualquer pessoa providenciada pela R (como foi dado como provado), o Tribunal a quo não pode julgar devidos os mesmos montantes como se nada tivesse acontecido;
M. As obras não foram concluídas, o preço não foi pago à R, não podendo esta pagar a totalidade do montante orçamentado ao A.;
N. Pelo que, pelo menos, no que diz respeito à obra do 14.º Andar C do China Plaza, a R nada mais tem a pagar ao A., devendo ser revogado o pagamento de MOP$232.252,00;
O. Para além do pedido julgado improcedente por caducidade, a R pedia, ainda, ao A., a título de danos patrimoniais a quantia equivalente a dois contratos de empreitada já assinados e não executados pela R no valor de MOP$843.783,50 e, também, a título de danos não patrimoniais a quantia de MOP$300.000,00 pelo dano causado ao bom nome e reputação da R;
P. O Acórdão recorrido não se pronuncia sobre tais pedidos;
Q. Há, assim, omissão de pronúncia por parte do Tribunal a quo;
R. Nulidade que se invoca nos termos do disposto no Art. 571.º n.º 1 al. d) do C.P.C.;
S. Devendo o A. ser condenado a pagar à R a quantia de MOP$843.783,50 pelos dois contratos de empreitada já assinados e não executados pela R, e a quantia de MOP$300.000,00, a título de danos não patrimoniais, pelo dano causado ao bom nome e reputação da R, tudo no valor de MOP$1.143783,50;
T. O Tribunal a quo violou os Art. 752.º n.º 1 e 2, 1144.º n.º 1, 1146.º n.º 1, 1150.º n.º 1 todos do C.C e, ainda o Art. 571.º n.º 1 al. d) do C.P.C
Termos em que, sempre com o Mui Douto suprimento de V.ªs Ex.ªs, o Acórdão sob censura deverá ser substituído por um outro que acolha materialmente as conclusões ora formuladas.
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O autor da acção respondeu ao recurso nos seguintes termos conclusivos:
1. A R. enviou em 12/12/2008 por meio do advogado ao A. uma carta, alegando que se verificavam vários defeitos na obra realizada pelo A. na fracção, pelo que encerrou a relação da sub-empreitada.
2. Apesar de que a R. não expressou que recusou a aceitação da obra realizada pelo A., podemos entender que se a R. aceitasse a obra realizada pelo A., não encerrava unilateralmente a relação de sub-empreitada com este.
3. Se assim não se entender, pode-se entender que a R. aceitou com reserva.
4. Ao abrigo do disposto do art. 1150º do Código Civil, os direitos de eliminação dos defeitos, redução do preço, resolução do contrato e indemnização caducam, se não forem exercidos dentro de 1 ano a contar da recusa da aceitação da obra ou da aceitação com reserva.
5. Por isso, o colectivo não enferma de nenhum erro no seu entendimento. A R. encerrou a relação da sub-empreitada com o A., o que significa a não aceitação da R. da obra realizada pelo A.. Se assim não se entender, pode-se entender que a R. aceitou com reserva.
6. A recorrente indicou que o colectivo deu como provado que foram todas concluídas no segundo semestre de 2008 as obras no 26º Andar “E” do Edifício La Cité, no 6º Andar “B” do Edifício Kuan Hou, no 7º Andar “C” do Edifício Torre VII, Nova City e no 4º Andar “B” do Bloco 1, do Edifício Marbela.
7. No entanto, o A. deve indicar que isto consiste numa conclusão do juiz depois de analisar os depoimentos de todas as testemunhas.
Pelo que, nos termos do art. 558º, n.º 1 do CPC, é a livre apreciação das provas do juiz, o que não se pode ser impugnada pela recorrente.
8. É de esclarecer que a recorrente confunde a obra entregue pela mesma para ser concluída pelo A. com a existência de defeitos na obra.
9. O A., como sub-empreiteiro, é obrigado apenas a concluir a obra. empreitada, obra exigida pela R ..
10. Se o dono não está satisfeito com a obra realizada pelo sub-empreiteiro, a empreiteira, R., tem o direito de exigir a reparação ao sub-empreiteiro, A.. Mas isso não implica que o A. não conclui a obra.
11. Por isso não se verifica contradição nos factos provados no douto acórdão do tribunal a quo.
12. Além disso, a recorrente entende que a obra supracitada não foi concluída pelo A. e que o dono ou a R. não a aceitaram nem recusaram a aceitá-la. Pelo que não é aplicável o disposto do art. 1150º, n.º 1 do Código Civil.
13. É de explicar que, a R. enviou em 12/12/2008 por meio do advogado ao A. uma carta, alegando que se verificavam vários defeitos na obra realizada pelo A. na fracção, pelo que encerrou a relação da sub-empreitada, do qual se resulta que a R. ficou em 12/12/2008 ciente da existência dos defeitos e encerrou unilateralmente a relação da sub-empreitada com o A..
14. Apesar de que a R. não expressou que recusou a aceitação da obra realizada pelo A., podemos entender que se a R. aceitasse a obra realizada pelo A., não encerrava unilateralmente a relação de sub-empreitada com o A..
15. A R. encerrou a relação da sub-empreitada com o A., o que significa a não aceitação da R. da obra realizada pelo A..
16. Se assim não se entender, pode-se entender que a R. aceitou com reserva.
17. Ao abrigo do art. 1150º do CC, os direitos de eliminação dos defeitos, redução do preço, resolução do contrato e indemnização caducam, se não forem exercidos dentro de 1 ano a contar da recusa da aceitação da obra ou da aceitação com reserva.
18. Ao mesmo tempo, a recorrente explica, nos artºs 28 a 32 na sua petição de recurso, a razão das circunstâncias supracitadas, o qual se dá aqui por integralmente reproduzido.
19. No entanto, de acordo com o que conta na página 10 do documento 30 na contestação da recorrente, o Cheong Chi Ko (張子高) (sic.) é acusado de um crime de ameaça, crime semi-público. Na página 2º constam apenas os crimes de difamação e de injúria, dizendo que a respeito dos dois crimes o procedimento penal depende de acusação particular. Por isso, não são crimes públicos como referidos pela recorrente nem há documentos a mostrar que é o processo n.º CR2-10-0233-PCC.
20. Além disso, isso não tem nada a ver com o objecto de julgamento, o qual é alegado pela recorrente como um pretexto da caducidade resultante da inexecução do direito à indemnização dentro 1 ano contado desde o conhecimento dos defeitos.
21. O douto acórdão recorrido não enferma de nenhum erro ao julgar que caducaram os direitos da R. de eliminação dos defeitos, redução do preço, resolução do contrato e indemnização.
22. Sendo a relação da sub-empreitada entre o A. e a R., sempre que o A. conclua a obra indicada pela R. e que caduquem os direitos da R. de eliminação dos defeitos, redução do preço, resolução do contrato e indemnização contra o A., a R. fica obrigado a pagar ao A. as despesas da obra em dívida.
23. A resolução, feita pelo dono da fracção, do contrato com o A., não prejudica a obrigação da R. a pagar ao A. as despesas em dívida.
24. Por isso, é adequado o douto acórdão do Tribunal a quo em que foi condenada a recorrente no pagamento das despesas restantes em termos do 14º andar C do Edifício China Plaza no valor de MOP$ 232.252,00.
25. A 1ª testemunha da R. disse, “Não é realizada a obra na fracção autónoma no Edifício Ka Va Kok.” Quando o advogado do A. insistiu a perguntá-la, esta disse, “Fica em frente do Templo de Kun Iam Tong. Não me lembro da fracção. Não sei o montante do contrato nem o nome do dono.” E acrescentou, “Por causa da queda da mesa. Como é a obra feita no Edifício Marbela. Sei a no Edifício Ka Va Kok. Simplesmente é porque não tem confiança na E T DESIGN E CONSTRUÇÃO, LIMITADA.” E “Não sei se assinaram ou não um contrato.”
26. Como se vê, a perda do contrato do Edifício Ka Va Kok resulta de que não tem confiança na E T DESIGN E CONSTRUÇÃO, LIMITADA por causa do caimento da secretária. Como acima já referido, a R. devia pedir a indemnização causada pelo A. na obra sub-empreitada dentro de 1 ano a contar desde o recuso da aceitação da obra ou a aceitação com reserva. Por isso, caducou o direito à indemnização da R. contra o A. por meio de reconvenção no dia 6 de Setembro de 2010.
27. Por outro lado, o tribunal recorrido já apreciou esta parte no n.º 3 do seu douto acórdão, questão da caducidade da revonvenção, entendendo que, “dos dados resulta-se que a R. deduziu o pedido de indemnização ao A. por meio de reconvenção em 06/09/2010. O anterior executou extemporaneamente o direito de acção, pelo que é de indeferir, nos termos da lei, o pedido reconvencional” .
28. O tribunal recorrido já apreciou esta parte, pelo que não viola o disposto do art. 571º, n.º 1, alínea d) do Código de Processo Civil - o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar.
29. Se assim não se entender, do depoimento da 1 a testemunha, resulta-se que esta não sabe se a R. assinou ou não um contrato de empreitada com o dono da fracção autónoma do Edifício Ka Va Kok.
30. Ao mesmo tempo, não existe nenhum contrato ou documento a mostrar que a R. assinou um contrato de obra da decoração com outros ou que perdeu o contrato por causa dos defeitos na obra realizada pelo A..
31. Mesmo que se entendesse que sim, seria a perda de um contrato, em vez de dois contratos de empreitada como referido pela recorrente no n.º 50 na sua petição de recurso.
32. Mesmo que se entendesse que perdesse um contrato de empreitada, mas nenhuma testemunha em juízo conseguiu provar este contrato perdido nem o seu montante.
33. Isso não se leva nos factos provados.
34. Não tem qualquer fundamento nem se pode provar o montante de MOP$ 843.783,50 dos dois contratos perdidos, como requerido pela recorrente.
35. Esta parte consiste na livre apreciação das provas do juiz, o que não se pode ser impugnada pela recorrente.
36. Por outro lado, o recorrente alega que também pediu na sua reconvenção o pagamento da indemnização não patrimonial no montante de MOP$ 300.000,00.
37. Como acima referido, caducou o seu direito à indemnização a título de dano moral em virtude da sua inexecução dentro de 1 ano após a recusa da aceitação da obra ou a aceitação com reserva.
38. O tribunal recorrido já apreciou esta parte, pelo que não viola o disposto do art. 571º, n.º 1, alínea d) do Código de Processo Civil - o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar.
39. Além disso, nenhuma testemunha em juízo pôde provar a preocupação, pressão e angústia sofridas pela R. resultantes da obra de sub-empreitada realizada pelo A..
40. Ou seja, não foram provados em audiência os factos relativos, por isso, deve ser indeferido o pedido deduzido pela recorrente de indemnização por dano moral.
41. O tribunal recorrido não viola os dispostos do art. 752º, nºs 1 e 2, art. 1144º, n.º 1, art. 1146º, n.º 1 e art. 1150º, n.º 1 do Código Civil ou do art. 571º, n.º 1, alínea d) do Código de Processo Civil.
Finalmente, pede que seja indeferido o recurso interposto pela R. e mantido o douto acórdão do tribunal a quo.
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Cumpre decidir.
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II- Os Factos
A sentença deu por assente a seguinte factualidade:
O A. é titular da empresa comercial denominada FIRMA DECORADORA KIT NGAI, registada na Contribuição Industrial da Repartição de Finanças de Macau para exercer, entre outras, a actividade de trabalho de instalações que concorrem para a construção de edifícios, como seja o caso de obras de decoração de interiores de imóveis. (A)
A R. é uma sociedade comercial por quotas, que tem por objecto social o design de obras de decoração de espaços interiores, conforme decorre da respectiva denominação social. (B)
No âmbito da prossecução das respectivas actividade e objecto social, estas firmas trabalharam anteriormente na concepção e concretização de obras de decoração de interiores de fracções autónomas. (C)
No ano de 2008, a R. procurou o A. para lhe pedir ajuda na concretização de cinco projectos de decoração de interiores respeitantes às seguintes fracções autónomas:
i) 26º ANDAR “E” DO EDIFÍCIO LA CITÉ;
ii) 6º ANDAR “B” DO EDIFÍCIO KUAN HOU;
iii) 7º ANDAR “C” DO EDIFÍCIO TORRE VII, NOVA CITY.
iv) 14º ANDAR “C” DO EDIFÍCIO CHINAPLAZA; e,
v) 4º ANDAR “B” DO BLOCO 1, DO EDIFÍCIO MARBELA. (D)
No final do mês de Abril de 2008, o Sr. C, sócio maioritário e administrador da ET DESIGN E CONSTRUÇÃO, LIMITADA, convidou o A., a elaborar um orçamento relativo a uma obra de decoração da fracção autónoma 26º andar “E” do Edifício LA CITÉ, a partir dos projectos elaborados pela sua firma em 17/5/2008 (doc. 3), em 19/5/2008 (doc. 4) e, em 20/5/2008. (E)
O A., em 5/5/2008, apresentou à R. um orçamento de MOP$ 327.677,00 (trezentas e vinte e sete mil, seiscentas e setenta e sete patacas), para a realização dessa obra, valor que foi aceite por esta última, tendo-se iniciado os correspondentes trabalhos. (F)
Posteriormente, a R., por intermédio do referido C, ordenou verbalmente ao A. que eliminasse alguns dos trabalhos solicitados inicialmente, como seja o caso das obras assinaladas no orçamento sob os números 2.3, 2.4, 2.5, 4.9, 4.10, e 8.4, no montante global de MOP$ 68.280,00 (sessenta e oito mil e duzentas e oitenta patacas), o que levou a que o preço inicial baixasse para MOP$ 259.397,00 (duzentas e cinquenta e nove mil, trezentas e noventa e 1 sete patacas). (G)
Mais tarde, o referido responsável da R., solicitou a realização de uma série de trabalhos adicionais em:
a) 5/9/2008, no montante de MOP$ 47.418,00 (quarenta e sete mil, quatrocentas e dezoito patacas) - doc.7;
b) 9/9/2008, no montante de MOP$ 13.640,00 (treze mil, seiscentas e quarenta patacas) - doc.8;
c) 6/10/2008, no montante de MOP$ 500,00 (quinhentas patacas) - doc.9;
d) 5/9/2008, no montante de MOP$ 3.230,00 (três mil, duzentas e trinta patacas) - doc.10; e,
e) 4/11/2008, no montante de MOP$ 26.220,00 (vinte e seis mil, duzentas e vinte patacas) - cfr. Anotações manuscritas, constantes da última folha do doc. 6;
com o valor dessa obra a atingir o montante global de MOP$ 350.405,00 (trezentas e cinquenta mil, quatrocentas e cinco patacas) - cfr. dcs. 6 a 10. (H)
estas sucessivas alterações nessa obra tiveram como consequência a demora na conclusão dos trabalhos inicialmente contratados, da exclusiva responsabilidade da R. (I)
A R. aceitou essas revisões de preço, tendo procedido em 31/10/2008 ao pagamento de parte do preço acordado inicialmente, ou seja, de MOP$ 130.000,00 (cento e trinta mil patacas) - doc. 11. (J)
No princípio do mês de Maio de 2008 o aludido sócio da R. pediu ao A. que elaborasse um orçamento relativo à obras de decoração da fracção autónoma do 6º andar “B” do Edifício XX, a partir de vários projectos, desenhados pela sua firma em 20/2/2008 (doc. 13) e, em 30/4/2008 (doc. 14), em 3/5/2008 (doc. 15), em 27/5/2008 (doc. 16) e, em 3/6/2008 (doc. 17), que entregou ao ora A. para esse efeito. (L)
O A., em 08/5/2008, apresentou à R. um orçamento de MOP$ 619.776,00 (seiscentas e dezanove mil, setecentas e setenta e seis patacas), para a realização dessa obra, valor que foi aceite por esta, tendo-se iniciado os correspondentes trabalhos - doc. 18. (M)
Em 13/11/2008, a R. ordenou verbalmente ao ora A. que realizasse vários trabalhos adicionais, no montante global de MOP$ 73.113,00 (setenta e três mil, cento e treze patacas) - doc. 19. (N)
Mercê dessas alterações, o valor da obra, atingiu o montante global de MOP$ 692.889.00 (seiscentas e noventa e duas mil, oitocentas e oitenta e nove patacas) - cfr. doc. 19. (O)
Estas sucessivas alterações nessa obra tiveram como consequência a demora na conclusão dos trabalhos inicialmente contratados, da exclusiva responsabilidade da R. (P)
A R. aceitou essas revisões de preço, tendo procedido por três ocasiões, ao pagamento de parte do preço acordado inicialmente, ou seja:
i) MOP$ 250.000,00 (duzentas e cinquenta mil patacas) - doc. 20;
ii) MOP$ 100.000,00 (cem mil patacas) - doc. 21; e,
iii) MOP$ 100.000,00 (cem mil patacas), em numerário;
no montante global de MOP$ 450.000,00 (quatrocentas e cinquenta mil patacas). (Q)
No final do mês de Maio de 2008, o aludido sócio da R. pediu ao A. que elaborasse um orçamento relativo às obras de decoração da fracção autónoma do 7º andar “C” do Edifício XX, XX, a partir de vários projectos, concebidos pela sua firma em 27/5/2008 (doc. 22), que entregou ao A. para esse efeito. (R)
O A., em 05/6/2008, apresentou à R. um orçamento de MOP$ 367.524,00 (trezentas e sessenta e sete mil, quinhentas e vinte e quatro patacas), para a realização dessa obra, valor que foi aceite por esta última, tendo-se iniciado os correspondentes trabalhos - doc. 23. (8)
Em 13/11/2008, a R. ordenou verbalmente ao A. que realizasse vários trabalhos adicionais, no montante global de MOP$ 44.626,00 (quarenta e quatro mil, seiscentas e vinte e seis patacas) – doc. 24. (T) Posteriormente, foram realizados outros trabalhos adicionais, agora no montante de MOP$1.380,00 (mil trezentas e oitenta patacas) - doc. 25. (U)
Mercê dessas alterações, o valor da obra, atingiu o montante global de MOP$ 414.230,00 (quatrocentos e catorze mil, duzentas e trinta patacas) - cfr. docs. 23 a 25. (V)
As sucessivas alterações desta obra tiveram como consequência a demora na conclusão dos trabalhos inicialmente contratados, da exclusiva responsabilidade da R.(X)
A R. aceitou essas revisões de preço, tendo procedido ao pagamento de parte do preço acordado inicialmente, ou seja, de MOP$ 300.000,00 (trezentas mil patacas) - doc. 26. (Z)
No início do mês de Junho de 2008, a R. convidou o A. a elaborar um orçamento relativo aos projectos de obra de decoração da fracção autónoma “C”, do 14º andar do Edifício XX, elaborados em 7/12/2007 (doc. 27) e, em 2/1/2008 (doc. 28). (AA)
O A., passadas cerca de duas semanas sobre essa reunião, concretamente em 21/6/2008, apresentou à R. um orçamento inicial de MOP$ 318.162,00 (trezentas e dezoito mil, cento e sessenta e duas patacas), para a realização dessa obra, o qual foi aceite por esta, tendo-se iniciado os correspondentes trabalhos - doc. 29. (AB)
Posteriormente, esse preço inicial foi revisto para MOP$ 327.682,00 (trezentos e vinte e sete mil, seiscentos e oitenta e duas patacas), por motivo da revisão de alguns dos preços, como seja o caso as obras e materiais assinaladas em 4.3, 5.3, 5.4, 5.5, 5.6, 5.10 e 5.12 - cfr. doc. 29. (AC)
A R. solicitou verbalmente ao A. a realização de um conjunto de alterações das obras em curso, concretamente em:
a) 01/09/2008, no montante de MOP$ 18.440,00 (dezoito mil, quatrocentas e quarenta patacas) - cfr. aditamento manuscrito, constante na parte final do doc. 29;
b) 09/09/2008, no montante de MOP$ 7.680,00 (sete mil seiscentas e oitenta patacas) - doc.30;
c) 18/09/2008, no montante de MOP$ 5.600,00 (cinco mil e seiscentas patacas) - doc.3l ;
d) 22/09/2008, no montante de MOP$ 1.950,00 (mil novecentas e cinquenta patacas) - doc.32; e
e) 30/09/2008, no montante de MOP$ 900,00 (novecentas patacas) - doc. 33. (AD)
Obras adicionais que obrigaram à revisão do orçamento atingindo assim o preço final de MOP$ 362.252,00 (trezentas e sessenta e duas mil, duzentas e cinquenta e duas patacas) - cfr. docs. 29 a 33. (AE)
Estas sucessivas alterações das obras tiveram como consequência a demora na conclusão dos trabalhos inicialmente contratados, da exclusiva, responsabilidade da R .. (AF)
A R. aceitou a revisão de preço, tendo procedido em 18/09/2008 ao pagamento de parte do preço acordado inicialmente, ou seja, de MOP$ 130.000,00 (cento e trinta mil patacas) - doc. 34. (AG)
No princípio do mês de Julho de 2008 a R. conviou o A. a elabora um orçamento relativo às obras de decoração da fracção autónoma do 4º andar “B” do Bloco 1, do Edifício XX, a partir de um documento manuscrito, contendo o levantamento dos trabalhos necessários, que entregou ao ora A. - doc. 35. (AR)
O A., em 22/7/2008, apresentou à Ré um orçamento de MOP$ 84.910,00 (oitenta e quatro mil, novecentas e dez patacas), para a realização dessa obra, o qual foi aceite por esta, tendo-se iniciado os correspondentes trabalhos - doc. 36. (AI)
Posteriormente, a R. ordenou verbalmente ao A. que eliminasse um dos trabalhos solicitados inicialmente, como seja o caso da obra assinalada sob o número 13, tendo ainda a obra referenciada sob o número 2, sido acrescida de MOP$ 1.500,00 (mil e quinhentas patacas), bem como acrescentado um novo item (número 17), no montante de MOP$ 1.000,00 (mil patacas), tendo por isso, o preço supra cotado, baixado para MOP$ 80.510,00 (oitenta mil, quinhentas e dez patacas) cfr. doc. 36. (AJ)
Em 5/9/2008, o referido responsável da R., solicitou a realização de mais quatro trabalhos adicionais, no montante global de MOP$ 4.020,00 (quatro mil e vente patacas) - doc. 37. (AL)
Em 15/9/2008, ordenou a feitura de outros quatro trabalhos adicionais, os quais importam num acréscimo de MOP$ 2.700,00 (duas mil e setecentas patacas) - doc. 38. (AM)
Mercê dessas alterações, o valor da obra, atingiu assim o montante global de MOP$ 87.230,00 (oitenta e sete mil, duzentas e trinta patacas) - cfr. docs. 36 a 38. (AN)
A R. enviou ao A. uma carta, datada de 12.12.2008, constante de fls. 73 a 75 destes autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. (AO)
Na carta datada de 12/12/2008, a R. declarou ao A. que as contas entre ambos, relativas às obras realizadas nas fracções aludidas em D), seriam acertadas na altura do Ano Novo Chinês de 2009. (1º)
O que nunca foi feito. (2º)
A obra levada a cabo na fracção 26º andar “E” do Edifício XX foi concluída no segundo semestre de 2008. (3º)
A obra levada a cabo na fracção 6º andar “B” do Edifício XX foi concluída no segundo semestre de 2008. (4º)
A obra levada a cabo na fracção 7º andar “C” do Edifício XX; XX foi concluída no segundo semestre de 2008. (5º)
O dono da obra no 14º andar C do Edifício XX pôs termo ao contrato celebrado com a R., opondo-se à conclusão das obras por qualquer trabalhador providenciado pela R.. (7º, 8º, 21 º e 31º)
A obra levada a cabo na fracção 4º andar “B” do Bloco 1, do Edifício XX, foi concluída no segundo semestre de 2008. (10º)
O A. não pagou aos seguintes indivíduos as quantias abaixo descriminadas:
-MOP$ 20.000,00 a D;
-MOP$ 12.000,00 a E;
-MOP$ 23.000,00 a F;
-MOP$ 5.000,00a G. (12º)
Na obra sita na Taipa, Ed. XX Bloco 11, 150 A, por incúria do A. caiu um armário de parede. (16º)
Tal armário tinha sido afixado à parede de forma inadequada. (17º e 18º)
Motivando o desagrado do dono da obra junto da R., sendo esta obrigada a gastar MOP$ 4.000,00 na reparação dos respectivos defeitos. (19º)
Na obra do 26º andar E do Edifício XX a R. teve gastos na reparação e conclusão da mesma, nomeadamente com: - Deixaram o mármore rachado;
- O papel de parede foi colocado de forma errónea. (25º)
Na obra do 6º andar B do Edifício XX a R. teve gastos na sua conclusão e reparação, designadamente:
- Os móveis estão sujos pela pintura;
- O Portão anti-roubo de aço inoxidável eléctrico da varanda está
mal instalado;
- A pintura da parede é desigual. (27º)
Na obra do 7º andar C da XX do Edifício XX a R. teve gastos na sua conclusão e reparação, nomeadamente:
- Perfurou o chão, destruiu um cano de água, provocando inundação no vizinho de baixo;
- Atrasou muito os trabalhos;
- Deixou os mosaicos do chão em mau estado;
- Devido à incúria do A. quando o proprietário tomou banho, provocou nova inundação pois, o cano de esgoto foi obstruído. (29º)
Na obra do 4º andar B do Bloco I do Edifício XX a R. teve gastos na conclusão e reparação, nomeadamente: - A secretária caiu em cima da empregada;
- As juntas do papel de parede separaram-se após um mês;
- A cor pedida não foi aplicada. (33º).
***
III- O Direito
1-Da nulidade
Nas alegações do recurso (pontos 50º a 57º; conclusões O. a R.) suscita a recorrente “B”, a nulidade da sentença com fundamento em omissão de pronúncia sobre dois pedidos que havia formulado na sua reconvenção: um relativo aos danos patrimoniais, correspondentes a dois contratos de empreitada já assinados e não executados no valor de Mop$ 843.783,50; outro, a título de danos não patrimoniais, no valor de Mop$ 300.000,00.
Estaria assim cometida a nulidade a que respeita a alínea d), do art. 571º do CPC.
Vejamos. Como se sabe, a nulidade por omissão de pronúncia prevista no art. 571º, nº1, al. d), do CPC só se verifica quando o tribunal ignora pura e simplesmente qualquer questão que devesse ser apreciada por essencial ao resultado ou desfecho da causa, não já em relação a alguns dos fundamentos invocados pelas partes (entre outros, Ac. TSI, de 1/03/2012, Proc. nº 867/2010 e, no direito comparado, Acs. do STA de 6/1/77, in BMJ nº 263/187; de 10/02/2000, Proc.nº 41 166 e de 09/11/2000, Proc. Nº 46 454; Ac. STJ, de 5/05/2005, Proc. nº JTRP00037731.dgsi.Net). Por isso se diz que, mesmo sem abordar algum dos fundamentos alinhados por elas, não é nula a sentença se esta contiver todos os argumentos de facto e de direito que a sustentam, ainda que, porventura, em erro de julgamento (Ac. do STA de 15/03/94, in Ap. Ao DR de 21/12/96, pag. 1271).
Ora, no caso concreto, não é verdade que a sentença tenha deixado de fora os pedidos em causa, pois logo no primeiro parágrafo do ponto 3, a fls. 17, o julgador equacionou expressamente os pedidos de indemnização « …a título dos danos patrimonial e não patrimonial..», sem fazer qualquer discriminação, a todos querendo, portanto, abranger. Por conseguinte, ninguém pode afirmar que a sentença recorrida omitiu, por esquecimento ou negligência, a alusão a tais questões.
E assim, tendo-as equacionado, para todas fez o mesmo enquadramento legal com base no art. 1150º do Código Civil, segundo o qual, os direitos de indemnização (todos), caducam se não forem exercidos dentro de um ano, sem prejuízo da caducidade do artigo 1146º.
Quer isto dizer que a caducidade que o julgador fez recair sobre a situação emergente da reconvenção não era unidireccional, mas pelo contrário se dirigia a todos os pedidos reconvencionais destinados à concretização do direito de indemnização invocado, incluindo os patrimoniais e os não patrimoniais. O facto de não os ter expressamente analisado, um a um, com reporte à identificação específica da fonte da indemnização pretendida, não serve para dizer que os quis excluir do seu âmbito ou que, por descuido ou esquecimento, os não incluiu na sua apreciação concreta.
Serve isto para concluir pela inexistência da invocada nulidade.
*
2- Da condenação da ré na acção
Apenas recorreu a ré, como se viu.
A sentença, tal como do relatório deste aresto bem resulta, julgou parcialmente procedente a acção.
Comecemos pela decisão do pedido da acção, de cuja procedência a ré parcialmente discorda, colocando, porém, unicamente a tónica do seu acometimento na matéria da condenação referente às obras efectuadas no 14º andar C, do Edifício XX.
Vejamos.
A sentença tomou por base a matéria provada nas alíneas AA) , AB), AC), AD), AE) e AF) da factualidade assente, partindo do princípio, verdadeiro aliás, de que o preço das obras inicialmente acordadas e posteriormente ampliadas se cifraria em Mop$ 363.352,00. Mas, por ter sido provado, entretanto, o pagamento ao A./subempreiteiro da quantia de Mop$ 130.000,00 (AG), computou a dívida no valor da diferença. Isto é, procedeu a um simples cálculo aritmético de subtracção para obter a quantia de Mop$ 232.252,00, que englobou no valor total da condenação da ré/reconvinte (fls. 20 da sentença).
Só que este raciocínio peca por não ter levado em linha de conta que o subempreiteiro/autor não procedeu à realização da obra na sua integralidade. Com efeito, tal como resulta da factualidade adquirida na resposta ao art. 21º da Base Instrutória, o dono da obra pôs termo ao contrato com a ré, opondo-se à sua conclusão. A partir desta resposta, e porque nenhuma outra matéria foi possível somar-lhe, não temos elementos para dizer qual a dimensão da obra realizada, nem qual o custo/valor dos trabalhos feitos por conta dessa subempreitada. Assim sendo, não seria possível que a sentença condenasse a Ré/recorrente no pagamento da diferença entre o valor orçamentado e o recebido. Porque se trata aqui de matéria que ao autor cumpriria provar, a falta de tais elementos importa a absolvição da ré no que respeita a esse quantitativo.
Concede-se, pois, razão à recorrente nesta parte.
*
3- Da reconvenção
3.1- A caducidade
A sentença em crise julgou improcedente a reconvenção, absolvendo o autor do correspondente pedido, com base na caducidade do direito estabelecida no art. 1150º do C.C.
No presente recurso jurisdicional a ré/reconvinte manifesta-se em oposição a tal decisão absolutória. Fê-lo, como já se viu, por discordar da ocorrência da caducidade do direito de reconvir, mas também por considerar que a sentença errou na decisão em não condenar o autor a pagar-lhe a peticionada quantia de Mop$ 843.783,50.
Tememos, porém, não poder sufragar a posição da recorrente.
Senão, vejamos.
O art. 1150º citado preceitua o seguinte:
Artigo 1150.º
(Caducidade)
1. Os direitos de eliminação dos defeitos, redução do preço, resolução do contrato e indemnização caducam, se não forem exercidos dentro de 1 ano a contar da recusa da aceitação da obra ou da aceitação com reserva, sem prejuízo da caducidade prevista no artigo 1146.º
2. Se os defeitos eram desconhecidos do dono da obra e este a aceitou, o prazo de caducidade conta-se a partir da denúncia; em nenhum caso, porém, aqueles direitos podem ser exercidos depois de decorrerem 2 anos sobre a entrega da obra.
A sentença entendeu que a carta, constante de fls. 73-75 dos autos (Vol. II, com tradução a Fls. 12 e 13 do apenso “traduções”), envida pela ré reconvinte, através do seu advogado, ao autor em 12/12/2008 (facto AO), chamando a atenção para defeitos e falhas na obra realizada pelo A. nas fracções e pondo termo à relação de empreitada, consubstanciava uma recusa da aceitação da obra, e que seria a partir da data da sua emissão que se daria início à contagem do prazo de caducidade do art. 1150º.
Reparemos então no teor da carta. Ela diz que (tradução livre) “… existem vários defeitos e falhas nas obras efectuadas por Vª Ex.ª, tais como a instalação de mobiliário danificado na fracção, a inundação desta, a queda da mesa de estudo e mesa de jantar em duas fracções, entre outros, para além de incontáveis as situações semelhantes, a que acresce a demora em todas as obras, o que provocou o aumento do seu custo e danos patrimoniais. Consideram-se definitivos os danos causados pelo acréscimo de custo e a quantia em causa não fica por menos de HK$160.000,00; além disso, em virtude do vosso cumprimento defeituoso, mostra-se em 71.321,99 a redução da remuneração pelos proprietários das fracções.
Outrossim, em virtude dos vícios no vosso cumprimento, verificou-se a perda de contratos de desenho e decoração no valor de HK$5.000.000,00, a serem celebrados com o nosso cliente, além do prejuízo na reputação comercial deste.
Tendo em conta a existência contínua dos vossos vícios e erros nas obras, não se mostrou o cumprimento pontual e de boa fé do acordo, conduzindo a grandes danos no nosso cliente, motivo pelo qual, ora notificamos a extinção das respectivas relações de subcontrato com base em incumprimento dos deveres do acordo e para responder às reclamações de todos os proprietários das referidas obras de decoração (destaque nosso).
Quanto ao preço a pagar pelo seu serviço, não se consegue fazer o apuramento antes de completarmos as obras e deduzirmos o custo de todos os danos e antes de os proprietários efectuarem o pagamento final. O nosso cliente informá-lo-á do preço final por notificação escrita, que se prevê ser realizada no ano novo lunar.
A presente carta não constitui qualquer renúncia do nosso cliente a respeito dos direitos ou opções a exercer nos termos da lei, particularmente o direito de indemnização”.
A sentença sob escrutínio, considerou que o conteúdo desta carta representava uma recusa da aceitação da obra, como se disse. E partindo dessa ideia, assimilou o caso à previsão do art. 1150º do CC para declarar a caducidade do direito de reconvir. Portanto, para atingir esse desfecho, o caminho que o tribunal “a quo” trilhou foi o de um exercício de interpretação do documento transcrito.
Bem. Conforme da sua literalidade flui, aquela carta parece (mas veremos que rigorosamente nem isso pode ser) antes ter uma missão: veicular uma resolução do contrato, por considerar que este foi defeituosamente cumprido, e por ser necessário levar a cabo obras de reparação.
Mas o problema mantém-se se desviarmos a trajectória da nossa atenção para o pedido indemnizatório1 formulado pela via reconvencional, pois é o mesmo prazo de um ano a observar, contável da recusa da aceitação ou da aceitação com reserva.
E se assim é, faz sentido que se coloquem previamente e de forma separada duas questões, embora possam ter solução conjunta. E elas são:
- Se a aceitação implica a completude da obra;
- Se a recusa pode ser feita antes da obra pronta.
Tanto quanto decorre de uma interpretação literal do art. 1150º citado, este prazo de caducidade está submetido a um pressuposto normativo, que percorre toda a Secção III, do Capítulo X, do Livro II, subjugada à epígrafe “Defeitos da Obra”. Isto significa, portanto, que se deva estar ante uma obra completa, ainda que imperfeita ou defeituosa.
E perante a obra entregue, o dono, ou, neste caso, o empreiteiro2, pode fazer a denúncia dos defeitos que nela encontrar nos 30 dias após o seu descobrimento (art. 1146º). Nessas circunstâncias, ele pode exigir do construtor a eliminação dos defeitos ou, se tal se mostrar impossível, nova construção (art. 1147º, do CC).
E se os defeitos não forem eliminados, nem a obra for construída de novo, o dono pode exigir a redução do preço ou a resolução do contrato, se os defeitos tornarem a obra “inadequada ao fim a que se destina” (art. 1148º, do CC).
Num caso ou noutro, como vimos, tudo se passa sem prejuízo do direito de indemnização (art. 1149º, do CC).
Portanto, sempre e em todos os casos, estamos em presença de uma fattispecie caracterizada por uma situação factual de obra completa e defeituosa. E porque é assim, para que se possa apelar ao art. 1150º do C.C., importa que as obras tenham sido acabadas e entregues e recebidas já prontas3. Por isso é tão importante que o dono da obra proceda à “verificação da obra” (art. 1144º, do CC) antes de a aceitar.
Ora, se olharmos para os factos constantes das respostas aos quesitos 3º, 4º, 5º e 10º, verificamos que as obras foram “concluídas” no 2º semestre de 2008 (entre 1 de Julho e 31 de Dezembro). Só o dono da obra do 14º andar C, do edifício XX pôs termo ao contrato celebrado com a ré, opondo-se à sua conclusão (facto resultante da resposta ao quesito 21º).
Admitimos, é certo que, aparentemente, as respostas aos quesitos 25º, 27º, 29º e 33º inculcam outra direcção ao darem conta de a ré ter tido gastos na “reparação” e na “conclusão” das mesmas obras (exceptuando o caso da resposta ao quesito 21º). Ou seja, ao jeito da evidência do marechal francês La Palisse, talvez fosse caso para observar que se a R. gastou dinheiro na conclusão, isso só poderia dever-se ao facto de as obras efectuadas pelo subempreiteiro A. terem sido entregues inacabadas. E, logo, se não estavam terminadas no momento da entrega, dificilmente se compreenderia a prova de que elas tinham sido concluídas no 2º semestre de 2008, a não ser que a conclusão a que se referem as respostas àqueles quesitos não se reportasse à conclusão pelo subempreiteiro A., mas à conclusão feita pelo próprio empreiteiro R. após o recebimento das obras.
A recorrente, precisamente sobre este ponto, suscita a dúvida para dizer que se está frente a uma contradição, com reflexos na decisão, em especial no que respeita ao problema da recusa da aceitação e do prazo para a verificação da caducidade.
Compreendemos a recorrente: Se as obras não estavam prontas, como podia haver aceitação ou aceitação com reserva (porque esta implica uma entrega de obra concluída, porventura com defeito)?! E, portanto, se não podia haver aceitação por essa razão, também por igual motivo não podia haver recusa, pois o pressuposto da norma (art.1150º cit.) é precisamente o mesmo (obra concluída com defeito). E com este raciocínio - de não tomar a carta com o sentido de declaração de recusa de aceitação, tal como o decidiu a sentença recorrida – cairia automaticamente a decisão de caducidade prevista naquele preceito.
Compreendemo-la, mas não a podemos acompanhar, salvo o devido respeito.
As obras dadas de subempreitada foram efectivamente concluídas no segundo semestre de 2008 pelo autor (respostas aos quesitos 3º, 4º, 5º e 10º). Trata-se de matéria que havia sido invocada pelo autor e que só não foi provada na parte relativa à data do termo das obras (ver arts. 21º, 47º, 74º, 103º, 130º da p.i.).
Mas nem só nesses pontos avistamos a noção de conclusão das obras pelo autor/recorrido. Também as alíneas I), P), X), AF), revelam que o subempreiteiro autor deu as obras prontas ao empreiteiro, embora com atraso por causa das sucessivas alterações dos trabalhos previstos.
Portanto, a interpretação sistemática de todos estes itens (respostas e factos assentes) não pode deixar de nos conduzir nesse sentido. O subempreiteiro acabou mesmo as obras!
Aliás, a própria carta transmite a ideia de cumprimento defeituoso e nunca de incumprimento. Quer dizer, não se nos afigura que tal comunicação apresente uma leitura dúbia no que a esse aspecto se refere. Desta maneira, a inclusão do vocábulo “conclusão” nas respostas aos artigos 25º, 27º, 29º e 33º da Base Instrutória tem que ser entendida em termos hábeis: trata-se de uma actividade levada a cabo pelo empreiteiro já depois das obras recebidas e que tinha por objectivo corrigir os vícios e reparar os defeitos, antes de as entregar aos donos. E assim não há contradição na matéria de facto.
*
Prosseguindo, como, então, interpretar o sentido daquela declaração?
1ª hipótese: Resolução do contrato?
Pelos seus termos, não repugnaria à partida acreditar que sim, uma vez que nela se comunica a extinção das respectivas relações de subcontrato (sic). Contudo, de acordo com o art. 1148º do CC, a resolução depende de duas coisas: a primeira, é a não eliminação dos defeitos4, para o que deveria ter sido dirigida a exigência prévia ao subempreiteiro, o que não se mostra ter sido feito; a segunda, é que os defeitos tornem a obra inadequada ao fim a que se destina, circunstância nem sequer invocada no caso concreto. Portanto, de resolução eficaz não podemos falar neste caso, por não ter havido a montante a realização prévia daqueles passos legais.
*
2ª hipótese: Recusa de aceitação?
Em primeiro lugar, importa chamar a atenção para o argumento da temporalidade da comunicação da “verificação”. Vozes existem a admitirem que essa comunicação (art. 1144º, nº4, do CC) possa ocorrer imediatamente a seguir à verificação ou num prazo muito curto5. E se a verificação - eventualmente acompanhada de aceitação - pode ocorrer nesses momentos, é óbvio que na mesma declaração/comunicação pode ser feita a recusa.
Ora, a comunicação dos resultados da verificação pode ser acompanhada da denúncia dos defeitos e vícios existentes. E nessas circunstâncias, pode dizer-se que a obra se deve ter como recusada6. Logo, a comunicação através da referida carta pode ser interpretada como revelação de vícios e, assim, como recusa. Só assim não seria se fosse afirmado e provado pelo autor, em sede de excepção, que tal comunicação ultrapassou todos os prazo usuais e razoáveis inscritos na norma (art. 1144º, nº1, do CC). Mas tal não resulta provado.
A ser assim, é possível acompanhar a solução interpretativa da sentença recorrida. Não obstante, pensemos ainda noutra hipótese.
*
3ª hipótese: Denúncia de defeitos?
Não custa decifrar a declaração com esse alcance, atendendo à revelação dos vícios que ela comporta. E nesse caso, sendo ela interpretada dessa maneira, o prazo da caducidade contar-se-á a partir da denúncia (art. 1150º, nº2, CC).
Mas, relativamente à denúncia de defeitos o que a lei dispõe é que ela deve ser feita no prazo de 1 mês após os vícios terem sido descobertos (art. 1146º, nº1, do CC).
Verdade que não sabemos se esse prazo foi respeitado, pois nada sobre o assunto foi carreado para os autos. Porém, essa era uma questão de facto que ao autor cumpriria alegar e provar, pois se trata de assunto de excepção à matéria reconvencional.
E assim, aceitando como boa a ideia de que esta denúncia, se assim for interpretada, foi tempestiva, as consequências disso parecem óbvias: O prazo da caducidade conta-se a partir da denúncia (art. 1150º, nº2, do CC). Como esta foi feita em 12/12/2008, operada está a caducidade quando a acção foi intentada, uma vez que em 3/06/2010 (data da entrada da petição) já havia sido ultrapassado o prazo de um ano ali previsto.
Logo, o desfecho decisório seria o mesmo que a sentença atingiu.
Fazendo aqui uma breve pausa, diremos que:
- Se se entender que a carta expressa uma recusa de aceitação, andou bem a sentença, face à caducidade que sobre o caso fez incidir;
- Se for de entender que a carta se interpreta como uma denúncia de defeitos, a solução não deixa de ser igual, tendo presente as mesmas regras de caducidade.
*
4ª hipótese
Tentemos, por fim, um outro caminho.
Dando de barato que a solução acima apontada pode não se dar por definitiva ou por pacífica, a controvérsia jurídica em redor deste tema não terá diferente solução se o olharmos por outro prisma.
O problema resolve-se com uma outra forma de encarar a questão emergente da denúncia. É a seguinte: para se poder extrair algum efeito da denúncia, seria preciso observar as regras de actuação previstas no Código segundo a ordem de prioridade ali estabelecidas: em primeiro lugar, a eliminação dos defeitos, se estes pudessem ser eliminados; em segundo lugar, uma nova construção, se os defeitos não pudessem ser eliminados; em terceiro lugar, na hipótese de não serem eliminados os defeitos ou construída de novo a obra, o exercício do direito de exigir a redução do preço ou, em alternativa, a resolução do contrato7.
Com efeito, «Detectado o defeito pelo dono da obra e denunciado dentro dos prazos legais, o empreiteiro é responsável por todos aqueles, relativos à qualidade dos materiais aplicados (se não forem fornecidos pelo dono da obra), podendo o dono exigir a sua eliminação, ou, no caso de não puderem ser eliminados, nova construção, salvo se as despesas forem desproporcionadas em relação ao proveito – art. 1221.º do CC. Não sendo eliminados os defeitos ou construída nova obra, o dono da obra pode exigir a redução do preço ou a resolução do contrato, se os defeitos tornarem a obra inadequada ao fim a que se destina – art. 1222.º do CC –, tudo sem prejuízo de exigir cumulativamente uma indemnização nos termos gerais – art. 1223.º do CC. Os direitos conferidos ao dono da obra pelos arts. 1221.º e 1222.º do CC não podem ser exercidos arbitrariamente, nem existe entre eles uma relação de alternatividade; existe, sim, uma sequência de prioridades que o dono da obra terá de respeitar»8 (sublinhado nosso).
Ou seja, estaremos em condições de concluir que o declarante não observou a referida ordem de prioridades. E, posto que assim seja, face aos arts. 1147º, 1148º e 1149º do C.C., na linha da jurisprudência comparada que citámos, também não seria possível julgar procedente a reconvenção.
Dito por outras palavras, não poderíamos reconhecer ao empreiteiro o direito de tomar a iniciativa de fazer as obras de reparação e pedir, como aqui foi feito, ao subempreiteiro o valor daquilo que nelas despendera9.
Quer isto dizer, pois, que até por esta razão, não poderá deixar de se confirmar o julgado no que respeita à reconvenção.
***

IV- Decidindo
Face ao exposto, acordam em:
1- Conceder parcial provimento ao recurso e, em consequência, revogar a sentença na parte em que condenou a re/reconvinte, ora recorrente, a pagar ao autor, entre outras, a quantia de Mop$ 232.252,00, ficando assim reduzida a condenação a Mop$ 664.754,00, acrescida de juros legais, contados pela forma decidida pelo TUI no seu acórdão de 2/03/2011, no processo n. 69/2010;
2- Negar provimento ao recurso na parte restante, designadamente na relativa à reconvenção, confirmando-se, correspondentemente a sentença recorrida.
Custas:
Quanto à acção: pelo recorrente e recorrido em ambas as instâncias na proporção do vencimento;
Quanto à reconvenção: custas pela recorrente em ambas as instâncias.
TSI, 31 / 05 / 2012

José Cândido de Pinho
Lai Kin Hong
Choi Mou Pan





1 Não há qualquer obstáculo a que, além da resolução, se reclame indemnização, pois assim o reza o art. 1149º do CC.
2 “Na subempreitada o empreiteiro definitivo figura como comitente, transferindo para terceiro (subempreiteiro) a execução da obra. Assim sendo, são aplicáveis a tal contrato, definido pelo artigo 1213º do Código Civil, com as devidas adaptações, as regras do contrato de empreitada, tudo se passando, ao fim e ao cabo, como se o empreiteiro assumisse perante o subempreiteiro a qualidade de dono da obra”: Ac. Relação de Évora, Portugal, de 20/05/1993, BMK nº 427/611. No mesmo sentido, o Ac. R.P., de 17/1/2012, Proc. nº 8609/06.2TBVNG.P1
3 Neste sentido, entre outros, Ac. STJ, de 25/07/1985, Proc. nº 072792.
4 O art. 1148º do CC torna o exercício daqueles direitos, nomeadamente o de resolução, dependente do facto de não terem sido eliminados os defeitos ou de não ter sido construída de novo a obra. Neste sentido, P. Lima e A. Varela, CC anotado, II, pag. 821.
5 P. Lima e A. Varela, ob. cit., II, pag. 815.
6 Autores, ob. e loc. cits.
7 Ac. STJ de 5/03/1999, Proc. nº 09B0262; também Ac. STJ de 10/09/2009, Proc. nº 08B3689
8 Ac. STJ, 13/10/2009, Proc. nº 08A4106
9 Apud, Ac. STJ de 4/12/2003, Proc. nº 03B3968; também, AC. STJ, de 3/12/2009, Proc. nº 204/2000. C2.S1
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