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   ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU:
   
1. Relatório
A, melhor identificado nos autos, interpôs recurso contencioso do despacho do Exmo. Senhor Secretário para a Economia e Finanças proferido em 10 de Novembro de 2011 que indeferiu o pedido de renovação de autorização para fixação de residência temporária formulado por si e pela sua família.
Por Acórdão proferido em 15 de Novembro de 2012, o Tribunal de Segunda Instância decidiu negar provimento ao recurso, mantendo o acto administrativo impugnado.
Inconformando com a decisão, vem A recorrer para o Tribunal de Última Instância, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões:
1. No acórdão recorrido, foram rejeitados os motivos e fundamentos de recurso apresentados pelo recorrente.
2. Assim, salvo o devido respeito, o recorrente não se conformou com o acórdão recorrido, interpondo o presente recurso.
3. Com base nos factos assentes do acórdão recorrido, constata-se que, ao requerer a fixação de residência em Macau por investimento, o recorrente tinha já dois bens imóveis e uma conta de depósito a prazo, contudo, a Administração indeferiu o pedido da renovação da autorização de residência por motivo de que um dos aludidos bens imóveis foi vendido pelo procurador do recorrente em 4 de Maio de 2007, e, em 31 de Agosto de 2007, o recorrente comprou um outro bem imóvel; dado que havia alteração no projecto de investimento que anteriormente tinha sido declarado para efeitos de fixação de residência por investimento, porém, a respectiva alteração não foi comunicada à Administração dentro do prazo legal, o acto administrativo em causa indeferiu a respectiva renovação da autorização de residência.
4. Encontram-se nos autos as certidões de trabalho e casamento dos membros do agregado familiar abrangidos pelo requerimento do recorrente, bem como as de nascimento dos filhos daqueles membros. O recorrente e os seus familiares residiam em Macau há mais de seis anos e, nesse período, não se logrou demonstrar que os mesmos tivessem violado qualquer lei de Macau que resulte outra acção a não ser desta, mormente acção penal ou acção de infracção administrativa. Eles são todos cidadãos e cumpridores da lei de Macau, sendo completamente integrados na sociedade de Macau.
5. Pelos factos assentes, na verdade, o recorrente não comunicou, nos termos do artigo 18º do Regulamento Administrativo n.º 3/2005, à Administração, após a venda dum bem imóvel;
6. Todavia, o recorrente tinha emitido a um indivíduo uma procuração para a venda do bem imóvel, servindo como garantia das dívidas contraídas, e, em seguida, o indivíduo vendeu a propriedade em causa, sem ter comunicado ao recorrente. Quando o recorrente tomou conhecimento da situação, este foi logo adquirir uma outra propriedade com um preço mais elevado do que o da propriedade vendida, a fim de preencher os requisitos previstos na respectiva disposição legal, no entanto, a situação não foi comunicada à Administração dentro do prazo legal,
7. Para o recorrente, com o seu nível de conhecimento, é difícil de compreender completamente sobre a questão de que a alteração do bem imóvel deve ser comunicada à Administração no prazo de 30 dias, no caso de incumprimento poderá resultar consequência grave, tal como a anulação de qualidade,
8. O recorrente entendeu que já tinha preenchido os requisitos previstos na disposição legal aquando da compra do novo bem imóvel, e não ia resultar a anulação da autorização de residência temporária. Deste modo, o recorrente considerou que já tinha apresentado a justa causa à Administração,
9. Embora este ponto de vista não fosse admitido pela Administração, o acórdão recorrido devia admiti-lo e declarar que o recorrente possuía justa causa, revogando o acto administrativo recorrido;
10. Todavia, o acórdão recorrido não entendeu assim, aplicando erradamente o elemento constitutivo – “justa causa” – previsto no n.º 4 do artigo 18º do Regulamento Administrativo n.º 3/2005, pelo que deve o mesmo ser anulado pelo Tribunal,
11. Analisados os autos (incluindo o processo administrativo em anexo), o recorrente considerou que o acto administrativo recorrido também devia ser anulado.
12. Se o Tribunal não entender assim, o recorrente irá manter a sua posição de desconformidade, apresentando os seguintes fundamentos.
13. Nos termos do n.º 4 do artigo 18º do Regulamento Administrativo n.º 3/2005, à Administração foi conferido o poder discricionário, isto é, o poder da decisão do cancelamento da autorização de residência temporária. Os órgãos judiciais não podem intervir nas matérias de competência da Administração, salvo haja violação do princípio da proporcionalidade previsto no n.º 2 do artigo 5º do Código do Procedimento Administrativo.
14. O douto T.U.I. citou a opinião preciosa do professor Vitalino Canas no acórdão do processo n.º 9/2000, de 3 de Maio de 2000, considerando que o princípio da proporcionalidade é dissecado em três subprincípios, da idoneidade, necessidade e proporcionalidade, em sentido estrito, ou de equilíbrio.
15. Portanto, é necessário de verificar se existe compatibilidade entre os referidos três subprincípios, mormente o princípio da proporcionalidade em sentido estrito, e o cancelamento da autorização de residência do recorrente determinado pela Administração na situação em que a alteração do estado do bem imóvel não excedia 4 meses, bem como não foi comunicada a dita alteração à Administração.
16. O recorrente só passou três meses em situação que tinha um bem imóvel vendido (na verdade, não se provou que o respectivo investimento, ou seja, o bem fosse transferido para um território fora de Macau), além disso, o recorrente não tinha conhecimento da venda do bem imóvel em causa e, posteriormente, este tomou iniciativa de explicar o assunto à Administração.
17. Tal como mencionado no acórdão recorrido que os investimentos referenciados no regime jurídico da fixação de residência por investimento são supervisionados pela Administração, com a finalidade de garantir a estabilidade dos investimentos. Concordamos que o conjunto de investimentos, incluindo bens imóveis e valores em numerário, deve ser declarado com sinceridade, sendo necessária a comunicação imediata, nos termos da lei, da sua alteração à Administração.
18. Todavia, se voltarmos a iniciar com o objectivo legislativo do regime jurídico da fixação de residência por investimento, é de admitir que, no processo da legislação, o legislador pretende que sejam atraídos novos capitais e incentivos para a economia fraca de Macau, incluindo o mercado de imobiliários da dada altura. O recorrente e o seu agregado familiar também contribuíram activamente para o mercado laboral e a actividade económica de Macau.
19. Quanto ao aspecto dos interesses protegidos e sacrificados, a aludida decisão da Administração só pode ter um resultado – a qualidade de fixação de residência por investimento do recorrente e do seu agregado familiar vai ser cancelada, e, em consequência, os mesmos devem sair de Macau. Por outro lado, não estão bem esclarecidos os interesses da R.A.E.M. neste aspecto, mas, podemos dizer que esta Região conseguiu manter a estabilidade de investimento e da força de supervisionamento de investimento defendidos pelo legislador.
20. Caso contrário, se não for cancelada a autorização de residência por investimento do recorrente, este e o seu agregado familiar poderão continuar a residir em Macau e gozar da protecção jurídica dos residentes de Macau. Por sua vez, para R.A.E.M., o sacrifício ou encargo poderá ser a acusação da falha no supervisionamento de investimento, desfavorecendo à estabilidade do conjunto de investimentos.
21. Todavia, tal como acima mencionado, a alteração de situação jurídica em apreço só durou 3 meses e 27 dias. É fácil de se notar a diferença entre o sacrifício e o benefício provenientes da continuação da concessão da autorização de residência ou do cancelamento do pedido da fixação de residência por investimento.
22. A par disso, a falta de comunicação do caso à Administração no prazo legal não é um acto doloso, mas sim, um acto culposo; e
23. O pedido de fixação de residência numa terra estrangeira é uma decisão e um acto muito importantes para um imigrante, além disso, tanto o próprio imigrante, como a terra em que admite o pedido de fixação de residência, necessitam de tratar do assunto com prudência e sinceridade, uma vez que a vida é limitada, é praticamente impossível que uma pessoa ande sempre a pedir fixação de residência em terras diferentes.
24. O legislador, ao estabelecer o disposto no artigo 18º do Regulamento Administrativo n.º 3/2005, não determinou diversas formas de sancionamento para o caso de violação da aludida disposição, mas sim, permitiu que a decisão de anulação ou de não anulação fosse liderada pelos princípios do direito administrativo. No direito administrativo, o subprincípio da idoneidade em sentido estrito do princípio da proporcionalidade é justamente a orientação dos princípios que é necessariamente seguida.
25. Assim sendo, a decisão tomada pela Administração perante o recorrente é demasiada grave, já que o acto do mesmo não é doloso, mas sim, meramente culposo.
26. Senão, face ao caso em que o interessado, depois de ter requerido a autorização de residência temporária, retirasse de Macau todos os capitais dedicados aos investimentos, ou alterasse todos os conjuntos de investimentos sem ter feito a respectiva comunicação por iniciativa própria, ou até omitisse dolosamente a alteração ou enganasse a Administração,
27. Se a gravidade dos actos supracitados fosse igual à do acto culposo do recorrente e, em consequência, produzisse o mesmo efeito jurídico – anula-se a autorização de residência temporária, isto significa que os actos ilícitos não foram distinguidos nem sancionados com base no grau de gravidade,
28. Para o recorrente, isto é administração excessiva, ficando o mesmo com uma cominação muito maior do que o interesse social protegido por leis.
29. Assim sendo, pelo exposto, o recorrente considerou que o acórdão recorrido violou o disposto no artigo 18º do Regulamento Administrativo n.º 3/2005 e o princípio da proporcionalidade previsto no n.º 2 do artigo 5º do Código do Procedimento Administrativo, padecendo do vício de ilegalidade, pelo que deve o mesmo ser anulado.
30. E, nos termos do mesmo fundamento, o aludido acto administrativo deve ser anulado, por padecer do vício de ilegalidade.
31. Enfim, o recorrente vem requerer ao Tribunal que conheça de todos os vícios encontrados nos autos que possam ser oficiosamente apreciados, bem como faça a tão acostumada justiça.

A entidade recorrida apresentou contra-alegações, terminando-as com as seguintes conclusões:
1. O despacho recorrido negou o pedido da renovação de autorização de residência com base no facto de que o recorrente não comunicou nos termos da lei às autoridades administrativas dentro de 30 dias a venda do seu bem imóvel, que fundamentou o seu requerimento da residência, e a sua justificação não foi admitida pela entidade recorrida.
2. Embora o recorrente justificasse a razão pela qual praticou o acto de delegação de poderes da venda do seu bem imóvel e tivesse comprado um bem imóvel de valor mais alto após 3 meses da respectiva venda, não tinham esses fundamentos nada a ver com o não cumprimento da obrigação de comunicação, pelo que, mesmo sendo verdadeiros, não se podia concluir que o acto recorrido padece de vícios na convicção dos factos ou na aplicação do direito.
3. Na verdade, a justificação do recorrente sobre o não cumprimento da obrigação de comunicação não passou de ser a ignorância e o não conhecimento da lei, mas essa justificação não constituiu justa causa daquele não cumprimento.
4. É de apontar que, mesmo sendo certo que o recorrente não sabia quando foi vendido o bem imóvel, de tal modo que não cumpriu oportunamente a obrigação de comunicação, não se explicou porque ainda não o cumpriu após 3 meses, altura em que bem conhecia a respectiva venda.
5. Mostra-se não convencível a alegação de ignorância e inaceitável a de não conhecimento da lei.
6. O recorrente impugnou que o despacho não aceitou a sua justificação de ignorância e de não conhecimento da lei. Entretanto, a aceitação ou não consiste em um dos poderes discricionários das autoridades administrativas, salvo a existência da total desrazoabilidade no exercício desses poderes, erro manifesto ou desvio de poder, o tribunal não pode apreciar a decisão feita no âmbito de poderes discricionários.
7. O recorrente não elencou factos para revelar a existência no despacho recorrido da total desrazoabilidade, erro manifesto ou desvio de poder, mas alegou que o acórdão recorrido violou o art.º 18.º n.º 4 do Regulamento Administrativo n.º 3/2005 por não admitir a justificação de ignorância e de não conhecimento da lei, não lhe assiste razão.
8. O recorrente alegou ainda que o despacho recorrido violou o princípio de proporcionalidade.
9. Dispõe a lei que o interessado, cuja autorização de residência por investimento é concedida, deve comunicar às autoridades administrativas a alteração da situação juridicamente relevante no prazo de 30 dias, de forma a permitir às autoridades apreciar se se aceita a alteração ou não, de modo que estas possam inspeccionar com a durabilidade e a estabilidade o respectivo investimento para garantir a realização dos interesses públicos que pretende atingir o regime da autorização de residência por investimento.
10. O recorrente não cumpriu a obrigação de comunicação sem justa causa após a venda do bem imóvel, associado com a sua autorização de residência, afectando a execução do regime de residência por investimento e prejudicando os interesses públicos.
11. Em face dessa conduta de prejudicar os interesses públicos, cabe somente às autoridades escolher entre a manutenção e o cancelamento da autorização de residência do recorrente. Para restaurar os interesses públicos prejudicados, a entidade recorrida decidiu cancelar a autorização, ou seja não autorizar a renovação da residência do recorrente.
12. Desde que seja uma escolha entre duas opções, não existe a questão de não proporcionalidade, pois não há uma solução que pode restaurar os interesses públicos prejudicados sem afectar a autorização de residência do recorrente, deste modo, não faz sentido falar da violação do princípio de proporcionalidade.
13. Na verdade, se o despacho recorrido, perante duas opções, pode apenas escolher a decisão favorável ao recorrente e não a desfavorável, não deixa de ser uma privação dos poderes discricionários atribuídos pela lei às autoridades administrativas, o que é totalmente inaceitável.
14. Os interesses individuais do recorrente têm de recuar em face da decisão do despacho recorrido, que tem como objectivo restaurar os interesses públicos prejudicados, sendo isso a interpretação certa do princípio de proporcionalidade no caso. Pelo que é improcedente a alegação do acórdão recorrido da violação do princípio de proporcionalidade.

O Exmo. Procurador-Adjunto do Ministério Público emitiu o douto parecer, pugnando pela improcedência do recurso.
Foram corridos os vistos.
   
2. Factos Provados
Nos autos foram considerados os seguintes factos com pertinência:
- O recorrente foi notificado do indeferimento do seu pedido de prorrogação de residência nos seguintes termos:
Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau

Vossa referência:
Data de emissão:
Nossa referência: XXXXX/GJFR/2011
Data: 28/11/2011
__
Assunto: Aviso de indeferimento - Pedido de residência temporária

Exmo. Senhor,
Nos termos da al. a) do art. 68.º do Código de Procedimento Administrativo, venho por este meio informar Vossa Excelência do despacho proferido pelo Secretário para a Economia e Finanças em 10 de Novembro de 2011 usando da faculdade conferida pelo Chefe do Executivo da RAEM, cujo conteúdo constitui o indeferimento do pedido de prorrogação de residência temporária em Macau dos indivíduos adiante listados. O parecer (5 páginas) de Vossa Excelência fundamentou esta decisão. Junto envio a respectiva cópia para explicitar as razões do indeferimento.

N.º
Nome
Documento de identificação e n.º
Termo de residência
1
A
Passaporte chinês
GXXXXXXXX
14/7/2012
2
B
Passaporte chinês
GXXXXXXXX
14/7/2012
3
C
Passaporte chinês
GXXXXXXXX
14/7/2012
4
D
Passaporte chinês
GXXXXXXXX
14/7/2012

De acordo com o Código do Procedimento Administrativo, se não concordar com a decisão acima referida, Vossa Excelência poderá reclamar junto do Secretário para a Economia e Finanças dentro do prazo de 15 dias (a contar do dia de notificação, sic passim), ou interpor recurso no espaço de 30 dias ao Tribunal de Segunda Instância nos termos da lei.

Com os melhores cumprimentos,

O Presidente do Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau
(Ass.: Vide o original)
E

*

INSTITUTO DE PROMOÇÃO DO COMÉRCIO E DO INVESTIMENTO DE MACAU

Parecer n.º XXXX/Residência/2006/01R
Investimento em Bens Imóveis – Prorrogação
Requerente: A
Ao abrigo do Regulamento Administrativo n.º 3/2005


Despacho do Secretário para a Economia e Finanças
Proposta deferida.
(Rubrica: vide o original)
10/11/11

Parecer da Comissão Executiva
do Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau

Ex.mo Sr. Secretário para a Economia e Finanças,

Após uma investigação e análise do assunto, sugiro que não seja deferido o pedido de prorrogação de residência temporária apresentado pelos interessados abaixo listados, visto que o requerente não efectuou a comunicação a este Instituto após a venda do bem imóvel que tinha detido, o que acarretou a posse de um valor inferior àquele mínimo legal por um espaço de tempo de três meses. Por isso, não se mostra conforme com os requisitos de prorrogação de autorização de residência temporária de forma contínua, pelo que entendo que não deve ser deferido o respectivo pedido.
  
  
  
N.º
Nome
Relação
1
A
Requerente
2
B
Esposa
3
C
Descendente
4
D
Descendente
  
À consideração superior.
  (Rubrica: Vide o original)
  O Presidente, E
  04/10/2011

Parecer do Director do Gabinete Jurídico e de Fixação de Residência
Subscrevo a proposta.
(Rubrica: Vide o original)
F
Director-Adjunto
27/09/2011

Assunto: Apreciação de pedido de fixação por investimento
Comissão Executiva:

1. Seguem a identificação dos interessados e o prazo sugerido das respectivas residências temporárias concedidas:


N.º
Nome
Relação
Título / Número
Período de validade
Data-limite de residência temporária
1
A
Requerente
Passaporte chinês
GXXXXXXXX
18/02/2019
14/07/2009
2
B
Esposa
Passaporte chinês
GXXXXXXXX
18/02/2019
14/07/2009
3
C
Descendente
Passaporte chinês
GXXXXXXXX
10/06/2020
14/07/2009
4
D
Descendente
Passaporte chinês
GXXXXXXXX
22/02/2019
14/07/2009

2. Em 14 de Julho de 2006, foi conferida pela primeira vez autorização de residência temporária ao Requerente, que na altura era proprietário dos bens imóveis como seguem:
1) Número de referência: XXXX
[Endereço(2)]
Quantia: HK$480.000,00, equivalente a MOP$494.400,00, cálculo efectuado à base da taxa de câmbio legal: HK$1,00 por MOP$1,03.
Data de registo: 21 de Dezembro de 2005 (XXX)
2) Número de referência: XXXX
[Endereço(3)]
Quantia: HK$650.000,00, equivalente a MOP$669.500,00, cálculo efectuado à base da taxa de câmbio legal: HK$1,00 por MOP$1,03.
Data de registo: 21 de Dezembro de 2005 (XXX)
3. Para os efeitos de prorrogação, o Requerente apresentou os seguintes documentos de bens imóveis, provas de não possuir de forma contínua os investimentos em bens imóveis tutelados por lei:
1) Número de referência: XXXX
[Endereço(2)]
Quantia: HK$480.000,00, equivalente a MOP$494.400,00, cálculo efectuado à base da taxa de câmbio legal: HK$1,00 por MOP$1,03.
Data de registo: 21 de Dezembro de 2005 (XXX)
2) Número de referência: XXXXX
[Endereço(4)]
Quantia: HK$838.000,00, equivalente a MOP$863.140,00, cálculo efectuado à base da taxa de câmbio legal: HK$1,00 por MOP$1,03.
Data de registo: 5 de Setembro de 2007 (XX)
4. O Requerente entregou o Certificado de Depósito a Prazo emitido por estabelecimento de crédito de Macau, servindo esse de prova de um depósito a prazo num valor não inferior a MOP$500.000,00:
Nome de estabelecimento: Banco
N.º de conta: XX-XX-XX-XXXXXX
Importância: HK$549.421,20, equivalente a MOP$565.903,84
Período de depósito: De 23 de Dezembro, 2005 a 29 de Dezembro, 2011
Modo de procedimento findo o prazo: renovação automática de capital mais juros
Natureza: Sem a instituição de qualquer encargo
Data de emissão: 28 de Julho de 2011
5. Em 14 de Julho de 2006, ao Requerente foi conferida a autorização de residência temporária pela primeira vez. Este Instituto já o comunicou o Requerente através da carta oficial n.º XXXXX/GJFR/P0034/2006, a Carta de Notificação de Autorização deixou explícito que durante o período de pedido ou mesmo depois de conseguir a autorização de residência, era imperativo manterem-se as situações jurídicas relevantes aquando da autorização de pedido. Uma vez extintas ou alteradas as situações, cabe ao Requerente informar o Instituto no prazo de 30 dias a contar do dia em que se deu a extinção ou a alteração. Caso contrário, a autorização de residência temporária pode ser cancelada (vide fl. 79).
6. Segundo o documento de bens imobiliários apresentado pelo Requerente para o fim de pedido de prorrogação, em 4 de Maio de 2007, o Requerente vendeu a propriedade sita na [Endereço(3)], a MOP$400.000,00, cujo registo predial foi efectuado em 10 de Maio de 2007 (vide fls. 72 a 76).
7. Segundo o documento de bens imobiliários apresentado pelo Requerente para o fim de pedido de prorrogação, em 31 de Agosto de 2007, o Requerente comprou a propriedade sita na [Endereço(4)], ao preço de MOP$863.140,00.
8. Ainda conforme mostra o documento, durante o período entre 4 de Maio de 2007 até 30 de Agosto de 2007, o Requerente era dono de apenas uma propriedade ([Endereço(2)]), no valor de MOP$494.440,00, prova de ele não possuir os bens imóveis de maneira contínua como prescreve a lei.
9. Em relação ao assunto referente, o Requerente entregou um documento para explicar a situação. Em 2006, devido à gestão descuidada, o seu negócio em cooperação com uma pessoa local de Macau caiu em apuros, pelo que ele resolveu vender parte das suas propriedades para conseguir um fundo de maneio. Depois, tendo verificando-se um melhoramento do seu negócio, a isso juntando-se o facto de na altura o seu filho acabar de se casar, o que levou novas pessoas à família, ele receava pela casa onde então morava pois era pequena demais para caberem todos os familiares. Portanto, comprou uma casa maior para morar nela. Ele próprio não sabia de proibição de converter propriedades, pelo que não notificou o Instituto. Por isso, pediu desculpa à entidade pelo que aconteceu (vide fl. 63).
10. Nestes termos, está provado que:
1) Ao abrigo do artigo 18.º do Regulamento Administrativo n.º 3/2005, o interessado deve manter, durante todo o período de residência temporária autorizada, a situação juridicamente relevante que fundamentou a concessão dessa autorização. O interessado deve comunicar ao Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau a extinção ou alteração dos referidos fundamentos no prazo de 30 dias, contados desde a data da extinção ou alteração. O não cumprimento sem justa causa da obrigação de comunicação, dentro do respectivo prazo, poderá implicar o cancelamento da autorização de residência temporária.
2) Em 4 de Maio de 2007, o Requerente vendeu a propriedade sita na [Endereço(3)], e em 31 de Agosto de 2007 adquiriu uma nova casa localizada na [Endereço(4)], prova de ele não possuir os bens imóveis de maneira contínua como prescreve a lei.
3) Ainda conforme mostra o documento, durante o período atrás referido, o Requerente era dono de apenas uma propriedade ([Endereço(2)]), no valor de MOP$494.440,00, prova de ele não possuir bens imóveis num valor total superior a MOP$100.000,00.
4) Em relação aos assuntos de venda e de aquisição decorridas respectivamente em 4 de Maio de 2007 e em 31 de Agosto de 2007, o Requerente não comunicou este Instituto, o que foi comprovado pelas suas próprias declarações.
5) Não constitui uma justificação a explicação dada pelo Requerente de que devido à gestão descuidada, o seu negócio caiu em apuros, pelo que resolveu vender parte das suas propriedades para conseguir um fundo de maneio.
6) Em consequência da venda acima mencionada, o Requerente só detinha apenas uma propriedade ([Endereço(2)]) durante o período supradito, no valor de MOP$494.440,00, prova de ele não possuir bens imóveis num valor total superior a MOP$100.000,00. Por conseguinte, a sua autorização de residência temporária devia ter sido cancelada, razão pela qual não se podem conseguir considerações positivas quanto à prorrogação de autorização.
7) Resumindo e concluindo, o Requerente vendeu uma propriedade relacionadas com o investimento no dia 4 de Maio de 2007, durante um período de mais de três meses não tinha na sua posse bens imóveis num valor exigido pela lei, do qual ele não comunicou este Instituto.
11. Nestes termos, por arrastamento da venda de uma propriedade, o Requerente não detinha investimento no valor mínimo prescrito na lei de forma contínua, do que ele não comunicou este Instituto. Esta conduta não condiz com os requisitos de prorrogação de autorização de residência temporária. Em conformidade com os artigos 18.º e 19.º do Regulamento Administrativo n.º 3/2005, sugerimos que não se aprove o pedido de prorrogação de autorização de residência temporária apresentado pelo interessado.
  
N.º
Nome
Relação
1
A
Requerente
2
B
Esposa
3
C
Descendente
4
D
Descendente

Pede-se visto.
O Técnico Superior,
(Ass.: Vide o original)
G
26 de Setembro de 2011

   
3. Direito
Coloca o recorrente a questão de saber se o Acórdão ora recorrido aplicou erroneamente o disposto no n.º 4 do art.º 18.º do Regulamento Administrativo n.º 3/2005 ao considerar inexistir justa causa para o não cumprimento da obrigação de comunicação prevista no n.º 3 da mesma norma e, subsidiariamente, violou o disposto no art.º 18.º do mesmo diploma e o princípio da proporcionalidade previsto no art.º 5.º n.º 2 do Código de Procedimento Administrativo.

3.1. Da obrigação de comunicação prevista no n.º 3 do art.º 18.º do Regulamento Administrativo n.º 3/2005
Constata-se nos autos que, em 14 de Julho de 2006 e a título de fixação de residência por investimento, foi concedida a autorização de residência temporária ao recorrente e à sua família e, aquando da notificação dessa autorização, o recorrente foi notificado da necessidade de manter inalterada, mesmo depois de conseguir a autorização de residência, a situação juridicamente relevante que fundamentou a concessão dessa autorização e do dever de comunicar ao Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau (IPCIM) a extinção ou alteração dessa situação no prazo de 30 dias, contados desde a data da extinção ou alteração, sob pena de ser cancelada a autorização de residência temporária, tudo conforme o estipulado no art.º 18.º do Regulamento Administrativo n.º 3/2005.
Acontece que, aquando da renovação dessa autorização e pelos documentos apresentados pelo recorrente, foi detectado que o recorrente chegou a vender um imóvel que fazia parte do seu investimento e comprar quase 4 meses depois um outro, ainda com o valor mais elevado, sem que tenha comunicado ao IPCIM, obrigação esta que é imposta por lei.
E não considerando como atendível a explicação dada pelo requerente sobre a venda do imóvel, devida à gestão descuidada do seu negócio e com vista à obtenção do fundo de maneio, o IPCIM emitiu parecer no sentido de indeferir o pedido de renovação da autorização de residência temporária apresentado pelos interessados, pela não comunicação da venda do bem imóvel e pelo não preenchimento dos respectivos requisitos para o efeito, proposta esta que foi autorizada pelo Exmo. Senhor Secretário para a Economia e Finanças.
Ora, o art.º 18.º do Regulamento Administrativo n.º 3/2005, que estabelece o regime de fixação de residência temporária de investidores, quadros dirigentes e técnicos especializados, dispõe o seguinte:
Artigo 18.º
Alteração da situação
1. O interessado deve manter, durante todo o período de residência temporária autorizada, a situação juridicamente relevante que fundamentou a concessão dessa autorização.
2. A autorização de residência temporária deve ser cancelada caso se verifique extinção ou alteração dos fundamentos referidos no número anterior, excepto quando o interessado se constituir em nova situação jurídica atendível no prazo que lhe for fixado pelo Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau ou a alteração for aceite pelo órgão competente.
3. Para efeitos do disposto no número anterior, o interessado deve comunicar ao Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau a extinção ou alteração dos referidos fundamentos no prazo de 30 dias, contados desde a data da extinção ou alteração.
4. O não cumprimento sem justa causa da obrigação de comunicação prevista no número anterior, dentro do respectivo prazo, poderá implicar o cancelamento da autorização de residência temporária.

Daí resulta que, uma vez que a autorização de residência temporária é concedida a indivíduos não residentes que satisfaçam os requisitos previstos por lei, estes indivíduos devem manter, durante todo o período de residência temporária autorizada, a situação juridicamente relevante que fundamentou a concessão dessa autorização.
No caso de extinção ou alteração da situação, o interessado deve cumprir o dever de comunicação, no prazo de 30 dias a contar da data da extinção ou alteração; e o não cumprimento, sem justa causa, dessa obrigação poderá implicar o cancelamento da autorização de residência temporária.
É muito clara a intenção do legislador, de manter estável, durante todo o período de residência temporária autorizada, a situação juridicamente relevante que esteve na base da concessão dessa autorização.
No caso de concessão da autorização de residência temporária por aquisição de imóveis, como é o nosso caso, o investidor deve cumprir os requisitos previstos no art.º 3.º do Regulamento Administrativo n.º 3/2005, incluindo a aquisição em Macau de bens imóveis por preço não inferior a um milhão de patacas e cujo valor de mercado, no momento da aquisição, não seja igualmente inferior a um milhão de patacas.
No caso em apreciação, o recorrente não possuiu, de forma contínua e estável, os investimentos que tinha feito em bens imóveis de Macau e não comunicou, no prazo legal, a alteração desta situação juridicamente relevante que tinha fundamentado a concessão da autorização de residência, o que conduziu ao cancelamento da autorização.

Alega o recorrente que efectivamente não cumpriu a obrigação de comunicação, mas com “justa causa”, pois o imóvel foi vendido, sem o seu conhecimento, pelo procurador que possuía uma procuração passada pelo recorrente que serviu como garantia das dívidas contraídas e que o recorrente não conhecia o regime jurídico de Macau.
Ora, é consabido que no recurso administrativo de acórdãos do Tribunal de Segunda Instância, o Tribunal de Última Instância não conhece de matéria de facto (art.ºs 47.º n.º 1 da Lei de Bases da Organização Judiciária e 152.º do Código de Processo Administrativo Contencioso).
E é evidente que não resulta da matéria de facto assente o alegado desconhecimento da venda do imóvel, invocado no recurso contencioso interposto para o Tribunal de Segunda Instância, e não no procedimento administrativo.
Na realidade, constata-se no processo administrativo instrutor que foi o próprio recorrente que declarou, por escrito, que devido à gestão descuidada do seu negócio, vendeu o imóvel para conseguir um fundo de maneio, nada se referindo à alienação do imóvel pelo procurador e sem o seu conhecimento (cfr. fls. 63 do processo Administrativo instrutor).
Ora, tratando-se dum facto novo que só foi alegado na fase judicial, cabe ao recorrente provar a veracidade desse facto, com a produção da prova, o que não sucedeu.
Não obstante a junção aos autos da referida procuração e da escritura de compra e venda do imóvel em causa, certo é que, atento ao seu teor, tais provas documentais não são susceptíveis de comprovar o alegado venda sem conhecimento do recorrente.
Daí que o facto que o douto Acórdão recorrido deu como provado como razão para o recorrente ter vendido o imóvel não pode ser agora impugnado e tem de se aceitar.

Por outro lado e no que concerne à invocação sobre não conhecimento do regime jurídico de Macau, afigura-se-nos que não pode assumir a relevância de justificar a não comunicação, por parte do recorrente, da alteração da situação juridicamente relevante.
Nos termos do art.º 5.º do Código Civil de Macau, “a ignorância ou má interpretação da lei não justifica a falta do seu cumprimento nem isenta as pessoas das sanções nela estabelecidas”.
Não é necessário ter conhecimentos jurídicos para saber quais as obrigações a que o interessado que obteve autorização de residência está sujeito, para manter o seu estatuto, pelo que o invocado desconhecimento do regime jurídico de Macau não se pode afigurar como justa causa para incumprimento da obrigação de comunicação imposta por lei.

3.2. Da aplicação do art.º 18.º do Regulamento Administrativo n.º 3/2005 e do princípio da proporcionalidade
É verdade que, segundo a norma contida no n.º 4 do citado art.º 18.º do Regulamento Administrativo n.º 3/2005, o não cumprimento sem justa causa da obrigação de comunicação da extinção ou alteração da situação, dentro do prazo de 30 dias, “poderá implicar o cancelamento da autorização de residência temporária”.
O legislador deixa assim à Administração uma margem de discricionalidade.
Como é sabido, o princípio da proporcionalidade previsto no n.º 2 do art.º 5.º do Código de Procedimento Administrativo exige que “as decisões da Administração que colidam com direitos subjectivos ou interesses legalmente protegidos dos particulares só podem afectar essas posições em termos adequados e proporcionais aos objectivos a realizar”.
De acordo com este princípio, as limitações de direitos e interesses das pessoas devem revelar-se idóneas e necessárias para garantir os fins visados pelos actos dos poderes públicos.
Impõe-se que o meio utilizado pela Administração seja idónea e necessária à prossecução do objectivo da decisão e proporcional à luz do interesse público em causa.
A aferição da proporcionalidade põe em confronto os bens, interesses ou valores perseguidos com o acto restritivo ou limitativo e os bens, interesses ou valores sacrificados por esse acto.
Ou seja, exige-se a ponderação e comparação dos bens, interesses ou valores prosseguidos e sacrificados com o acto concreto.
Nos casos em que a Administração actua no âmbito de poderes discricionários, não estando em causa matéria a resolver por decisão vinculada, a decisão tomada pela Administração fica fora de controlo jurisdicional, salvo nos casos excepcionais.
E a jurisprudência também entende assim, tendo este Tribunal de Última Instância decidido que a intervenção do juiz na apreciação do respeito do princípio da proporcionalidade, por parte da Administração, só deve ter lugar quando as decisões, de modo intolerável, o violem.1
Não se nos afigura, no caso ora em apreciação, inaceitável ou intolerável o sacrifício trazido ao recorrente pela não renovação da autorização de residência, tendo em consideração os interesses públicos que se prendem concretamente com a garantia da estabilidade do investimento feito e com o combate ao favorecimento do circunstancialismo especulativo, tal como salienta o douto Acórdão recorrido.
E não se vislumbra a manifesta injustiça na decisão tomada pela Administração, sem intenção de ignorar os interesses pessoais, estimáveis, do recorrente e da sua família em continuar a viver em Macau.
Na realidade, não se descortina no acto administrativo impugnado qualquer erro manifesto ou grosseiro no exercício do poder discricionário, sabendo que só o erro manifesto ou a total desrazoabilidade no exercício desse poder constituem uma forma de violação de lei que é judicialmente sindicável [art.º 21.º n.º 1, al. d) do CPAC].
Os interesses públicos subjacentes na ponderação de renovação ou não de autorização de residência prevalecem, em princípio, sobre os interesses individuais de interessados de residir em Macau.
Não se pode ainda perder de vista que, nos termos do art.º 18.º n.º 2 do Regulamento Administrativo n.º 3/2005, a Administração não tem outra alternativa a não ser cancelar a autorização de residência, nos casos em que se verifique extinção ou alteração da situação juridicamente relevante que fundamentou a concessão dessa autorização.
E não obstante as excepções previstas nesta mesma norma, certo é que, no caso dos autos, o recorrente não cumpriu a obrigação de comunicação nem a alteração da situação relevante foi aceite pelo órgão competente.
Não se vê como foi intoleravelmente violado o princípio da proporcionalidade.

Concluindo, é de manter a decisão recorrida.
   
4. Decisão
Pelo exposto, acordam em negar provimento ao recurso.
Custas pelo recorrente, com taxa de justiça fixada em 5 UC.
   
    Macau, 31 de Julho de 2013
   
   Juízes: Song Man Lei (Relatora) – Sam Hou Fai –
Viriato Manuel Pinheiro de Lima

O Magistrado do Ministério Público
presente na conferência: Chan Tsz King
   
1 Cfr. Acórdão do TUI, de 15 de Outubro de 2003, Proc. n.º 26/2003, entre outros.
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Processo n.º 30/2013