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Proc. nº 406/2012
(Autos de Recurso Jurisdicional Contencioso Administrativo)

Data: 11 de Outubro de 2012

Assunto:
- Autoridade do caso julgado
- Nulidade do acto por falta de objecto

SUMÁRIO:
- Nos termos do nº 1 do artº 574º do CPCM, ex vi do artº 1º do CPAC, “Transitada em julgado a sentença, a decisão sobre a relação material controvertida fica tendo força obrigatória dentro do processo” e “constitui caso julgado nos precisos limites e termos em que julga” (nº 1 do artº 576º do CPCM).
- Por outro lado, o nº 2 do artº 8º da Lei nº 9/1999 (Lei de Bases da Organização Judiciária” consagra que “As decisões dos tribunais são obrigatórias para todas as entidades públicas e privadas e prevalecem sobre as de quaisquer outras autoridades”.
- Uma vez declarada caducidade da licença de pejamento, a mesma já não é passível de renovação.
- Assim, ao indeferir o pedido da renovação da recorrente com fundamento diverso ao da falta de objecto, o acto é nulo por falta de objecto, nos termos da al. c) dos nºs 1 e 2 do artº 122º do CPA.
O Relator,
Proc. nº 406/2012
(Autos de Recurso Jurisdicional Contencioso Administrativo)

Data: 11 de Outubro de 2012
Recorrente: A
Entidade Recorrida: Vice Presidente do Conselho de Adminsitração do Instituto Para Os Assuntos Cívicos e Municipais

ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:

I – Relatório
Por sentença de 19/01/2012, o Tribunal Administrativo da RAEM julgou improcedente o recurso contencioso interposto pelo recorrente.
Dessa decisão, vem o recorrente interpor o presente recurso jurisdicional, alegando, em sede de conclusão, o seguinte:
I. O recorrente é titular da licença de pejamento de carácter permanente n.º 310/1991, para colocação de um grelhador na porta traseira do prédio n.º XX da R. do XX, Taipa, que ocupa a área de 0.70 m2, desde 1991, que lhe foi renovada até ao ano de 2006.
II. O recorrente requereu aos serviços competentes, o Instituto dos Assuntos Cívicos e Municipais, a renovação da referida licença de pejamento para o ano de 2007, no tempo designado na mesma (meses de Janeiro e Fevereiro de 2007).
III. O último acto válido praticado nesse procedimento administrativo tem o seguinte conteúdo: Por despacho de 24.08.2007 o Sr. Presidente do Conselho de Administração revogou o seu anterior despacho de 28.05.2007, pelo qual, havia cancelado a licença de pejamento de carácter permanente no. 310/1991, pelo que, para efeitos de renovação da referida licença, o recorrente deveria apresentar certos documentos (que o recorrente, no tempo que lhe havia sido designado, apresentou)
IV. Após tal acto, e sem que o mesmo haja sido revogado, foi praticado novo acto de sentido diverso, declarado nulo por sentença transitada em julgado que considerou procedente o recurso contencioso que o recorrente do mesmo apresentou.
V. O acto administrativo recorrido é um acto praticado no mesmo procedimento administrativo que decide um "inexistente pedido de licença de pejamento" para o mesmo local e para o mesmo fim da que é detida pelo recorrente, tendo pois um objecto impossível, já que o único pedido formulado pelo recorrente é o de renovação da licença de pejamento n.º 310/1991- o acto recorrido é nulo, por nos termos do art. 122.°, n.º 2, al. c) do Código de Procedimento Administrativo, ter objecto impossível.
VI. O acto administrativo recorrido foi praticado sem procedimento, em caso em que a lei o prescreve, pois o acto de deferimento ou indeferimento de urna eventual emissão de licença para pejamento permanente dependeria de requerimento para o efeito do interessado- o acto recorrido é nulo, por nos termos do art. 122.°, n.º 2, al. f) do Código de Procedimento Administrativo, carecer em absoluto da forma legal.
VII. O acto administrativo recorrido é inintelegível, nos termos do art. 114.°, n.º 2, al. c) do Código de Procedimento Administrativo, pois se o seu fim é revogar a licença de pejamento permanente, com um ou mais dos fundamentos previstos na lei, da sua epígrafe e do seu teor nada se consegue apreender desse sentido, pois declara que se encontra a decidir de um pedido de colocação de um fomo metálico para grelhados na traseira de um estabelecimento similar, sito na Rua do XX n.º XX, Taipa, ocupando àrea do espaço público.
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O Ministério Público é de parecer pela improcedência do recurso.
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Foram colhidos os vistos legais dos Mmºs Juizes-Adjuntos.
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II – Factos
Foi assente a seguinte factualidade pelo Tribunal a quo:
1) O recorrente era titular, desde 1991, da licença especial de pejamento de carácter permanente, n.º 310/1991, através da qual se autorizava a colocação de um grelhador na porta traseira do prédio n.º XX da R. do XX, Taipa, que ocupava a área de 0.70 m2.
2) A referida licença foi renovando até ao ano de 2006.
3) Antes do mês de Fevereiro de 2007, o recorrente solicitou ao IACM a renovação da supra mencionada licença de pejamento.
4) A final, em 25/01/2008, o Presidente do CA do IACM, ao concordar ao conteúdo da proposta n.º 270/DLA/SAL/2008, decidiu indeferir a renovação da supra mencionada licença de pejamento (fls. 100 a 101 do P.A.).
5) Dessa decisão o recorrente recorreu contenciosamente para Tribunal Administrativo.
6) Por sentença de 03/04/2009, proferido no processo de recurso contencioso n.º 505/08-ADM, foi declarada nula a supra mencionada decisão tomada pelo Presidente do CA do IACM em 25/01/2008.
7) Em consequência dessa sentença de 03/04/2009, o recorrente, em 12/05/2009, requereu ao IACM a renovação da referida licença de pejamento para os anos de 2007 a 2009, solicitando que se informassem quais as posteriores diligências e documentos pretendidos para procederem às renovações da mesma licença (fls. 168 a 170 do P.A., cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
8) Em 16/09/2009, o recorrente, ao expor que tinha apresentado o requerimento no IACM no dia 12/05/2009 mas não tinha recebido qualquer reposta, requereu que o IACM lhe informasse sobre o andamento dos procedimentos solicitados (fls. 175 a 176 do P.A., cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
9) Relativamente aos requerimentos apresentados pelo recorrente em 12/05/2009 e 16/09/2009, foi o mesmo notificado, através do ofício n.º 19375/2658-K/DLA/SAL/2009, de que: “foi actualmente e legalmente lançado o procedimento administrativo sobre a viabilidade de emissão da licença de pejamento, e estamos a aguardar pelos pareceres técnicos doutras entidades, pelo que iremos comunicar brevemente sobre a decisão.” (fls. 223 a 228 do P.A.).
10) Em 16/03/2010, o Vice-Presidente do CA do IACM concordou ao teor da proposta n.º 806/DLA/SAL/2010 e decidiu notificar o recorrente para o efeito de audiência escrita (fls. 246 a 247 do P.A., cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
11) Através do ofício n.º 03874/522-K/DLA/SAL/2010, foi o recorrente notificado para, no prazo de 10 dias, apresentar audiência por escrito (fls. 249 e 251 do P.A.).
12) Em 25/03/2010, o recorrente apresentou a sua audiência escrita a fls. 258 a 262 do P.A. (cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
13) Em 02/06/2010, o técnico do IACM elaborou a proposta n.º 2215/DLA/SAL/2010, sugerindo o indeferimento da renovação requerida pelo recorrente (fls. 264 a 265 do P.A., cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
14) Em 04/06/2010, o Vice-Presidente do CA do IACM decidiu concordando ao teor da proposta n.º 2215/DLA/SAL/2010 (fls. 265 do P.A.).
15) Em 11/06/2010 e através do ofício n.º 08772/1088-K/DLA/SAL/2010, foi o recorrente notificado da decisão tomada pelo Vice-Presidente do CA do IACM em 04/06/2010.
16) Em 07/07/2010, o recorrente interpôs o recurso contencioso.
Mais se provaram os seguintes factos no Proc. nº 505/08-ADM do Tribunal Administrativo:
a) 上訴人A自1991年起為編號310/1991的長期佔用公地准照的持有人,該准照用以讓“B葡式餐廳”的燒烤用鐵爐佔用公地 (行政卷宗第154頁)。
b) 2001年12月05日,“C餐廳有限公司”成立,上訴人為該公司的行政成員之一 (行政卷宗第153頁),該公司自2003年起成為“B葡式餐廳”的牌照持有人 (行政卷宗第146頁)。
c) 於2007年02月前,上訴人口頭向民政總署提出上述公地佔用准照的續期申請。
d) 2007年01月05日,上訴人向被訴當局提出申請,要求將因經營“B葡式餐廳”而曾向上訴人本人發出的所有牌照一律自該申請之日起轉歸“C餐廳有限公司”持有 (行政卷宗第145頁)。
e) 2007年03月05日,被訴當局就2007年3月1日的第705/DLA/SAL/2007的報告書作出同意決定,該報告書指出『由於根據GJN第003/GJN/2007號報告書對同類個案所發表的意見,倘准照持之持有人發生改變時,場所之新持牌人便應作出相關准照之重新申請,而非將准照轉名;因此,建議通知新持牌人“C餐廳有限公司”重新申請長期佔用公地准照』 (行政卷宗第143至144頁)。
f) 2007年03月12日,上訴人以“C餐廳有限公司”的名義就“B葡式餐廳”所佔用的公地向被訴當局申請發出長期佔用公地准照 (行政卷宗第140頁)。
g) 於2007年04月20日,民政總署管理委員會代主席作出批示,批准第1238/DLA/SAL/2007號建議書第2點之建議,有關建議內容如下:
『根據申請者所遞交的文件中所示,由於申請者已為業務准照及營業稅單辦理轉名手續,故本處並沒條件為由A先生所持有的第310/1991號長期佔用公地准照辦理續期手續。另外,根據本署批給長期佔用公地准照第4點規定:“佔用公地准照是屬個人性質且不可移轉,禁止准照持有人以任何名義將之轉移,如沒有為准照續期,場所結業或改變業務性質,准照便會失效。”因此,建議收回A先生長期佔用公地之權利,及宣告第310/1991號長期佔用公地准照失效,並透過公函通知利害關係人有關之行政決定。』(行政卷宗第98至99頁)
h) 上述決定並沒有通知上訴人。
i) 2007年06月06日,被訴當局向上訴人發出第11043/1212-X/DLA/SAL/2007號公函,通知上訴人有關當局於2007年04月20日根據第1190/DLA/SAL/2007號建議書不批准向“C餐廳有限公司”發出長期佔用公地准照,原因是在有關公地使用燒烤鐵爐燒製食物而產生的油煙氣味會對鄰近還境及現存的休憩區構成影響,並指出上訴人可提起聲明異議、任意訴願及司法上訴的期間 (行政卷宗第115頁)。
j) 2007年06月08日,透過第11091/1226-X/DLA/SAL/2007公函,上訴人被通知被訴當局於2007年5月28日所作出的決定,就上訴人欲將編號第310/1991的長期佔用公地准照的持牌人轉名為“C餐廳有限公司”的事宜,根據民政總署批給長期佔用公地准照第四點的規定:“佔用公地准照是屬個人性質且不可移轉,禁止准照持有人以任何名義將之轉移,如沒有為准照續期,場所結業或改變業務性質,准照便會失效”,因而不接納上訴人轉名的申請,並指出上訴人可提起聲明異議、任意訴願及司法上訴的期間 (行政卷宗第85及86頁)。
k) 同日,透過第11092/1226-X/DLA/SAL/2007公函,上訴人被通知被訴當局於2007年5月28日所作出的另一決定,根據民政總署批給長期佔用公地准照第4點的規定,且考慮到上訴人已非B葡式餐廳的持牌人,其本人所持有編號第310/1991的長期佔用公地准照將會被取消,因而可根據《行政訴訟法典》第94條的規定,自收到該通知之日起10日內就有關實況筆錄的事宜向被訴當局作出書面聽證 (行政卷宗第85及87頁)。
l) 2007年06月20日,上訴人透過其訴訟代理人就其擬被取消長期用公地准照的事宜向被訴當局提交了其書面申辯 (行政卷宗第76至78頁),並於2007年6月22日以相同的方式增加其意見的內容 (行政卷宗第73頁)。
m) 2007年11月21日,被訴當局向上訴人發出第24072/2286-O/DLA/SAL/2007號公函,通知上訴人有關當局於2007年08月24日根據第2503/DLA/SAL/2007號建議書所作的決定,經考慮上訴人所提出的聲明異議的理由,決定廢止於2007年5月28日所作出關於取消編號第310/1991的長期佔用公地准照的決定,因而告知上訴人需在15日期間內向有關當局提交公函所指的相關文件,以便處理有關准照續期的事宜 (行政卷宗第66及67頁)。
n) 同日,被訴當局向上訴人發出第24073/2285-O/DLA/SAL/2007號公函,通知上訴人有關當局於2007年08月24日根據第2503/DLA/SAL/2007號建議書所作的決定,經考慮上訴人所提出的聲明異議的理由,決定廢止有關當局於2007年5月28日不批准對第310/1991的長期佔用公地准照轉名的批示,因而重新啓動處理有關請求的程序 (行政卷宗第66及68頁)。
o) 2007年11月22日,上訴人向被訴當局遞交第24072/2286-O/DLA/SAL/2007號公函所指的相關文件,以便處理有關准照續期的事宜 (行政卷宗第57頁)。
p) 2008年01月28日,被訴當局向上訴人發出第01916/144-O/DLA/SAL/2008號公函,通知上訴人有關當局於2008年1月25日根據第270/DLA/SAL/2008號建議書對編號第310/1991的長期佔用公地准照作出否決續期的決定,原因是在有關公地使用燒烤鐵爐燒製食物而產生的油煙氣味會對鄰近還境及現存的休憩區構成影響,並指出上訴人可提起聲明異議、任意訴願及司法上訴的期間 (行政卷宗第54頁)。
q) 同日,被訴當局向上訴人發出第01917/144-O/DLA/SAL/2008號公函,通知上訴人有關當局於2008年1月25日根據第270/DLA/SAL/2008號建議書不批准上訴人更改編號第310/1991的長期佔用公地准照持有人的申請,理由在於准照是發給私人以便其可從事某一受限制之活動或事宜,即除非法律有特別規定,否則應理解准照是以「人」(包括自然人或法人)為授予的對象;倘准照的持有人發生改變時,場所的新持牌人便應作出相關准照的重新申請;並指出上訴人可提起聲明異議、任意訴願及司法上訴的期間(行政卷宗第53頁)。
r) 2008年02月11日,上訴人透過其訴訟代理人就第01916/144-O/DLA/SAL/2008號公函及第01917/144-O/DLA/SAL/2008號公函的兩項決定向被訴當局提出聲明異議 (行政卷宗第46至51頁)。
s) 2008年05月03日,透過第07901/710-O/DLA/SAL/2008公函及第07902/710-O/DLA/SAL/2008公函,上訴人被通知被訴當局於2008年4月2日維持被聲明異議的兩項決定。
t) 2008年05月30日,上訴人A就民政總署管理委員會主席於2008年01月25日否決對編號第310/1991的長期佔用公地准照作出續期的決定向行政法院提起司法上訴。
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III – Fundamentos
Nos termos do nº 1 do artº 149º do CPAC, o recurso jurisdicional ordinário é “admitido e processado como o correspondente recurso para o Tribunal de Segunda Instância em processo civil”.
Assim, aplica-se ao caso sub justice, as regras previstas no artº 598º do CPCM, nos termos do qual ao recorrente cabe apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão recorrida, nomeadamente:
- as normas jurídicas violadas;
- o sentido com que, no entender do recorrente, as normas que constituem fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas; e
- invocando-se erro na determinação da norma aplicável, a norma jurídica que, no entendimento do recorrente, devia ter sido aplicada.
Não nos parece que o recorrente cumpriu integralmente o seu ónus de alegar e formular conclusões em conformidade com o citado preceito legal do processo civil, já que em vez de alegar e concluir os eventuais vícios da sentença recorrida, voltou a insistir nos vícios do acto recorrido.
Contudo e salvo o devido respeito, não se nos afigura que esta deficiência da motivação do recurso implique desde logo a rejeição ou o não conhecimento do mesmo, pois, o legislador admitiu de forma expressa o respectivo aperfeiçoamento – nº 4 do citado artº 598º do CPCM.
Por outro lado, entendemos que o recorrente ao dizer que o acto recorrido é nulo nos termos do artº 122º, nº 2, al. c) e f) do CPA está implicitamente a imputar à sentença recorrida ter violado tais preceitos legais ao julgar improcedente o seu recurso contencioso.
Nesta conformidade, passamos então a analisar a questão de fundo, que consiste em saber se o recorrente pode renovar a licença de pejamento nº 310/1991.
A resposta não deixa de ser negativa.
Vejamos.
Sobre esta questão já houve caso julgado, pois, por sentença de 03/04/2009, proferido no Proc. nº 505/08-ADM e transitada em julgado em 30/04/2009, o Tribunal Administrativo já resolveu a questão em causa.
Porém e infelizmente, tanto o recorrente como a entidade recorrida, não perceberam integralmente o alcance da mesma.
No âmbito do identificado processo, o Tribunal Administrativo declarou a nulidade do acto pelo qual se indeferiu o pedido da renovação da licença do ora recorrente, por entender não haver objecto da renovação, uma vez que a licença de pejamento em causa já tinha sido declarada caducada pela Administração em 20/04/2007.
Além disso, o Tribunal Administrativo apontou ainda que, mesmo que a licença em causa não fosse declarada caducada, a pretensão do recorrente também não poderia proceder, visto que ele, em 2003, deixou de ser titular do estabelecimento de comida portuguesa “O Santos”
Repare-se, a licença de pejamento nº 310/1991 foi emitida a favor do recorrente na qualidade de titular do estabelecimento de comida portuguesa “O Santos” e tem a natureza pessoal e intransmissível, nos termos do ponto nº 4 das condições fixadas na sua emissão/autorização (fls. 16 dos autos).
É certo que o recorrente continua a gerir o estabelecimento de comida portuguesa “O Santos” na qualidade de administrador da sociedade comercial exploradora, porém, como é sabido, quer o administrador, quer o sócio, ambos gozam de personalidade jurídica própria e têm autonomia patrimonial em relação à sociedade.
Assim sendo, ao deixar de ser titular e explorador do estabelecimento de comida em causa, o recorrente já não possui legitimidade substantiva para continuar a ocupar o pejamento em questão.
Nesta conformidade, não se nos afigura que a entidade recorrida tenha procedido de forma correcta no tratamento do pedido do recorrente no sentido da reconstituição da situação hipotética em consequência da aludida decisão judicial, já que sem revogar o acto da declaração da caducidade da licença de pejamento, continua a não haver objecto para a renovação.
Como é que vai renovar uma licença que já foi declarada caducada?
Em bom rigor, a entidade recorrida deveria rejeitar o pedido da renovação do recorrente com fundamento na impossibilidade de objecto e não indeferí-lo com fundamento na falta de legitimidade substantiva do recorrente e na poluição do ambiente, pois estes dois últimos fundamentos pressupõem a existência do objecto de renovação.
Ao indeferir a pretensão do recorrente com fundamento diverso ao da falta de objecto, a entidade recorrida volta a cometer o mesmo erro que cometeu no acto anterior, que já foi objecto da anulação judicial.
Ou seja, o acto ora recorrido, tal como o anterior, é nulo por impossibilidade do seu objecto – artº 122º, nºs 1 e 2, al. c), do CPA.
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Este Tribunal, à cautela e a fim de saber se existir a revogação superveniente, solicitou à entidade recorrida para informar se o seu acto de 20/04/2007, proferido na Informação/Proposta nº 1238/DLA/SAL/2007, pelo qual se declarou a caducidade da licença de pejamento em referência, foi revogado ou não (fls. 125v.).
Em resposta, a entidade recorrida veio informar de que “foi revogado por acto datado de 24/08/2007” (fls. 128).
Trata-se duma informação infeliz, o que demonstra que a entidade recorrida continua a não saber onde residem o problema e os erros por si cometidos, nem percebe o valor duma sentença transitada em julgado.
Na sentença proferida no Proc. nº 505/08-ADM, o Tribunal Administrativo considerou de forma expressa e clara que o acto de 24/08/2007 não revogou o acto de 20/4/2007 (acto da declaração de caducidade da licença), o que revogou foi o acto de 28/05/2007, o qual em si não continha qualquer decisão da declaração da caducidade.
Para melhor esclarecimento, transcreve-se aqui o conteúdo da sentença que a esta parte diz respeito:
    “…根據已審理查明之事實,本院認為被訴行為的標的確實在法律上是不可能的,但並非如上訴人所說那樣因為續期已獲批准,而是被訴當局於2007年4月20日在第1238/DLA/SAL/2007號建議書中,已宣告第310/1991號的長期佔用公地准照失效。
    該決定並沒有通知上訴人,因此對其不產生效力,但這並不表示不約束被訴當局。
    在准照已被宣告失效及有關決定沒有被廢止的情況下,被訴當局不能對有關事項再作決定,更不能邀請上訴人遞交文件辦理續期手續,因有關標的已不復存在。
    被訴當局於2007年8月24日在第2503/DLA/SAL/2007號建議書所作出的廢止決定,只是廢止於2007年5月28日所作出之行為,並非上述2007年4月20日之決定。2007年5月28日之決定本身不存有任何取消長期佔用公地之准照的決定,只是決定就擬取消第310/1991號准照的事宜向上訴人作書面聽證。
    該決定與上述2007年4月20日宣告准照失效的決定互相矛盾,既已宣告失效,何以為此又展開聽證程序?
    而2007年8月24日關於重新展開有關准照續期並通知上訴人辦理續期手續的決定同樣與上述2007年4月20日的決定互相矛盾。….”
Nos termos do nº 1 do artº 574º do CPCM, ex vi do artº 1º do CPAC, “Transitada em julgado a sentença, a decisão sobre a relação material controvertida fica tendo força obrigatória dentro do processo” e “constitui caso julgado nos precisos limites e termos em que julga” (nº 1 do artº 576º do CPCM).
Por outro lado, o nº 2 do artº 8º da Lei nº 9/1999 (Lei de Bases da Organização Judiciária” consagra que “As decisões dos tribunais são obrigatórias para todas as entidades públicas e privadas e prevalecem sobre as de quaisquer outras autoridades”.
Neste contexto, nunca pode a entidade recorrida prestar a informação no sentido de que o acto da declaração da caducidade da licença “foi revogado por acto datado de 24/08/2007”, sob pena de violar a força e autoridade do caso julgado.
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Tudo visto, resta decidir.
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IV – Decisão
Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam em conceder provimento ao recurso interposto, revogando a decisão recorrida e declarando a nulidade do acto recorrido.
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Sem custas, por a entidade recorrida gozar da isenção subjectiva.
Notifique e registe.
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RAEM, aos 11 de Outubro de 2012.


_________________________ _________________________
Ho Wai Neng Vitor Manuel Carvalho Coelho
(Relator) (Presente)
(Magistrado do M.oP.o)

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José Cândido de Pinho
(Primeiro Juiz-Adjunto)

_________________________
Lai Kin Hong
(Segundo Juiz-Adjunto)




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406/2012