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Processo nº 253/2012


Acordam na Secção Cível e Administrativa do Tribunal de Segunda Instância da RAEM

I

A devidamente identificado nos autos, instaurou no Tribunal Judicial de Base acção de processo comum do trabalho, contra a SOCIEDADE DE TURISMO E DIVERSÕES DE MACAU, devidamente identificada nos autos, doravante abreviadamente designada STDM.

Citada a Ré, contestou deduzindo excepção de prescrição e pugnando pela improcedência da acção.

A final veio a acção julgada parcialmente procedente e condenada a Ré a pagar ao Autor a quantia de MOP$3.331,75, acrescida de juros vencidos e vincendos, a contar a partir da data da sentença de primeira instância.

Inconformado com a decisão final, recorreu o Autor alegando em síntese que:

I- 本上訴所針對者為初級法院合議庭判決在2011年10月28日所作出的判決中認為基於上訴人的薪酬結構由固定及非固定(本卷宗所指"小費")兩部份組成,而非固定部份非為組成薪酬的部份。因此,上訴人不能以"小費"作為基數,計算出被告須向上訴人就年假日工作及強制性假日工作的補償(該合議庭判決的第7頁至16頁);
II- 上訴人不同意上述合議庭判決對薪酬結構組成的理解,並認為應將上訴 人薪酬固定部份及非固定部份(即"小費")均同時納入成為薪酬組成的部份,並以此作為計算基數,計算出被上訴人須向上訴人就年假日工作及強制性假日工作的補償;
III- 根據上訴人與被上訴人的薪酬協議為每日收取HKD$10.00的固定金額 外,另可以收取按照被上訴人分配顧客在其賭場所給予的小費作為上訴人薪酬的不固定金額部份;
IV- 上訴人向被上訴人提供勞務期間,持續收取該"小費"作為其薪酬的不固定金額,這些事實已在本卷宗中獲得證明;
V- 此外,按第24/89/M號法令第25條第2款的規定:「所有得以金錢計算而無論其名稱及計算方式若何;按服務的提供應有及由僱主與工作者之間的協議、章程、慣例或法律規定而訂出的支付,即為工資。」;
VI- 按照上述的事實部份及相關法律的規定,即使上訴人的薪酬結構份成固定及非固定部份,但根據被上訴人與上訴人間的協議,應理解為上訴人透過被上訴人所收取的"小費"構成上訴人薪酬的部份。
VII- 再者,澳門司法實務中亦有認為"小費"亦應構成薪酬的一部份,根據澳門中級法院在過往同類案件對"小費"理解為工人對有關"小費"沒有任何的話語權,只能服從雇主的決定時,必須計算在工人的薪金內(參見中級法院卷宗編號890/2010及906/2010)。
VIII- 這亦與葡國司法實務的理解是相同(參見Abílio Neto所著的 Contrato de Trabalho, Notas Práticas,8ª edição actualizada,第229頁)
IX- 倘若認為原審法院的合議庭判決為正確,並以上訴人每日的固定工資 HKD$10元作為計算基準,這結果將與工資的功能概念有所出入,因為對工作者而言工資主要為滿足工作者的生活及家庭所需。
X- 倘若對上述的陳述並不同意,根據第24/89/M號法令第五條第一款的較有利原則規定及第六條有關傳統制度的優先原則均規定第24/89/M號法令並不影響適用對工作者較有利的工作條件,只要適用後較該法令更為有利便可。
XI- 基於在這兩原則的前提下,法院亦應將"小費"納入為上訴人薪酬的構成部份,並以薪酬固定部份(HKD$10.00)及非固定部份(客人給予被上訴人的"小費")作為其計算年假日工作的補償及強制性假日工作的補償的計算基準。
XII- 總結而言,應將原審法院有關認定排除上訴人薪酬非固定部份為其計算週假日、年假日及強制性假日工作的補償基準違反第24/89/M號法令第25條1款及2款,以及第5條及第6條的規定。
XIII- 並應認定上訴人薪酬固定部份(HKD$10.00)及非固定部份(客人給予被上 訴人的"小費")均為計算年假日工作的補償及強制性假日工作的補償的計算基準,並以上訴人年度收定出其每日薪金的平均值,從而定出被上訴人應對上訴人應分別支付週假工作日之補償MOP$69,689.18、年假工作日之補償MOP$16,415.58及強制性假日之補償MOP$15,313.92合共MOP$101,418.68。
XIV- 上訴人為澳門居民且目前處於失業的狀況,故沒有收入來源,從而沒有足夠的經濟能力去負擔本司法訴訟所帶來的所有必要費用,色括聘請訴訟代理人。
XV- 根據《勞動訴訟法典》第六條的規定在要求清償因勞動關係而產生的債權的訴訟的勞工推定其為經濟力不足,並可獲得司法援助。
XVI- 因而,根據8月1日通過的第41/94/M號法令第4條及隨後條文,上訴人除有權享有司法援助外,亦免除支付預付金及訴訟費用。

因此
應接納本上訴,並應認為本上訴所載的全部理由均成立,同時廢止初級法院合議庭判決在2011年10月28日所作出的判決中有關薪酬非固定部份非為組成上訴人薪酬及計算上訴人週假、年假及強制假期工作的補償基準的部份;
此外,
根據8月1日通過的第41/94/M號法令第4條及隨後條文,給予上訴人司法援助外並免除其支付預付金及訴訟費用。

Ao que respondeu a Ré pugnando pela improcedência do recurso.

E na mesma peça interpôs recurso subordinado concluindo e pedindo que:

21. Assim, na eventualidade de vir a ser confirmada a obrigação de indemnizar o Recorrente, devem ser aplicadas as seguintes as fórmulas para o cálculo do quantum indemnizatório a título de trabalho em dias de descanso anual:
  i. Decreto-Lei n.º 101/84/M: salário diário x0 (porque uma parcela já foi paga);
ii. Decreto-Lei n.º 24/89/M: salário diário x0 (porque uma parcela já foi paga e a R. não impediu o A. de gozar quaisquer dias de descanso);
iii. Decreto-Lei n.º 32/90/M: salário diário x0 (porque uma parcela já foi paga e a R. não impediu o A. de gozar quaisquer dias de descanso).
22. Caso assim não se entenda, devem ser aplicadas as fórmulas adoptadas nos Acórdãos do Tribunal de Última Instância proferidos no âmbito dos Processos n.º 28/2007, 29/2007 e 58/2007, datados de 21 de Setembro de 2007, 22 de Novembro de 2007 e 27 de Fevereiro de 2008, respectivamente;
23. Conforme resulta da posição defendida e mantida pela ora Recorrente Subordinada nestes autos, não merece qualquer censura a fórmula de cálculo adoptada pelo Tribunal a quo para apurar os montantes putativamente devidos ao ora Recorrido Subordinado, na parte em que a mesma faz relevar para efeito do cálculo apenas a remuneração fixa (ou base) deste.
24. No entanto, atenta a factualidade assente nos autos e o Direito ao qual é subsumível tal factualidade, andou mal o Tribunal a quo quando determinou os multiplicadores aplicáveis ao cálculo do quantum indemnizatório a título de descansos anuais.
25. Assim, na eventualidade de vir a ser confirmada a obrigação de indemnizar o ora Recorrido Subordinado, devem ser os seguintes os multiplicadores aplicáveis na fórmula destinada ao cálculo do quantum indemnizatório:
iv. Decreto-Lei n.º 101/84/M: salário diário x0 (porque uma parcela já foi paga);
v. Decreto-Lei n.º 24/89/M: salário diário x0 (porque uma parcela já foi paga e a R. não impediu o A. de gozar quaisquer dias de descanso);
vi. Decreto-Lei n.º 32/90/M: salário diário x0 (porque uma parcela já foi paga e a R. não impediu o A. de gozar quaisquer dias de descanso).
26. Caso assim não se entenda, devem ser aplicadas ao referido cálculo as fórmulas adoptadas nos Acórdãos do Tribunal de Última Instância proferidos no âmbito dos Processos n.º 28/2007, 29/2007 e 58/2007, datados de 21 de Setembro de 2007, 22 de Novembro de 2007 e 27 de Fevereiro de 2008, respectivamente.
27. Salvo melhor entendimento e posições doutrinais e jurisprudenciais em contrário, a ora Recorrente subordinada entende que não se encontra em mora relativamente a quaisquer compensações enquanto o crédito reclamado não se tomar líquido, com o trânsito em julgado da decisão condenatória,
28. É que, como se sabe, nos termos do disposto no número 4 do artigo 794º do CC, se o crédito for ilíquido não há mora enquanto não se tornar líquido e, no entendimento da ora Recorrente subordinada, tal iliquidez não lhe é imputável.
29. Quanto à natureza ilíquida do crédito não restam dúvidas, pois logo na P. I. e na Contestação, A. e R. deixaram bem patente que não estão de acordo quanto ao quantum de um montante indemnizatório eventualmente devido.
30. Na esteira do Acórdão do TUI proferido no âmbito do Processo n.º 69/2010, em 02/03/2011 "( ... ) em caso de litígio judicial quanto ao valor dos danos, o crédito só se torna líquido quando o juiz o fixa, seja na sentença em 1.ª Instância, seja na decisão em recurso, quando o valor fixado anteriormente é alterado ou quando em 1.ª Instância, por uma razão ou por outra, nenhum valor é fixado. Podendo mesmo acontecer que o devedor só entre em mora na execução, se o montante dos danos só nesta fase for liquidado (art. 564.°, n.º 2 do Código de Processo Civil) "
Nestes termos, e nos melhores de direito aplicáveis que Vossas Excelências doutamente suprirão, deve o recurso apresentado pelo Recorrente ser julgado improcedente por não provado, procedendo o recurso subordinado, deste modo fazendo Vossas Excelências a habitual e costumada Justiça.

Foram colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

A fim de nos habilitar a apreciar as questões levantadas nos recursos, passam-se a transcrever infra os factos que ficaram provados na primeira instância:

  O A. trabalhou para a R. entre 21 de Outubro de 1997 e 6 de Dezembro de 2001. (A)
  O A. foi admitido como empregado de casino (糾察), recebendo de dez em dez dias da entidade patronal, como contrapartida da sua actividade laboral, desde o início da relação contratual até à sua cessação, duas quantias, uma fixa, no valor de HKD$10.00/dia, e ainda outra parte variável, em função do dinheiro recebido dos clientes de casino vulgarmente designado por gorjetas. (B)
  As gorjetas eram distribuídas pela entidade patronal segundo um critério por esta fixado. (C)
  As gorjetas eram distribuídas por todos os empregados de casino da R., e não apenas aos que têm "contacto directo" com clientes nas salas de jogo. (D)
  Os empregados que não trabalhavam directamente nas mesas ou os que não lidavam com clientes tinham também direitos a receber a distribuição das gorjetas. (E)
  Os empregados recebiam quantitativo diferente das gorjetas, consoante a respectiva categoria profissional, tempo de serviços e o departamento onde trabalha, fixada previamente pela entidade patronal. (F)
  As gorjetas eram provenientes do dinheiro recebido dos clientes dos casinos. (G)
  Dependentes, pois, do espírito de generosidade desses mesmos clientes. (H)
  Pelo que o rendimento dos trabalhadores da R. tinha um componente quantitativamente incerta. (I)
  O A. foi admitido como empregado de casino (糾察), foi expressamente avisada pela R. que era proibido guardar com quaisquer gorjetas entregues pelos clientes de casinos. (J)
  As gorjetas oferecidas a cada um dos seus trabalhadores pelos seus clientes eram reunidas e contabilizadas diariamente pelos seguintes indivíduos: um funcionário do Departamento de Inspecção de Jogos de Fortuna ou Azar, um membro do departamento de tesouraria da R., um "floor manager" (gerente do andar) e trabalhadores das mesas de jogo da R., e depois distribuídas, de dez em dez dias, por todos os trabalhadores dos casinos da R. (K)
  O A. prestou serviços em turnos, conforme os horários fixados pela R. (L)
  A ordem e o horário dos turnos são os seguintes:
  1) 1° e 6° turnos: das 07H00 até 11H00, e das 03H00 até 07H00;
  2) 3° e 5° turnos: das 15H00 até 19H00, e das 23H00 até 03H00 (dia seguinte);
  3) 2° e 4° turnos: das 11H00 até 15H00, e das 19H00 até 23H00. (M)
  O A. podia pedir à R. o gozo de dias de descanso, nos quais não auferia qualquer remuneração. (N)
  Durante o período em que prestava serviço à R., o A. recebeu nos anos de 1997 a 2001 (doc. n.º 1 junto com a p.i.), os seguintes rendimentos:
a) 1997 = MOP$26.440,00;
b) 1998 = MOP$124.015,00;
c) 1999 = MOP$111.312,00;
d) 2000 = MOP$120.432,00;
e) 2001 = MOP$97.901,00. (1º)
  O A. e a R. acordaram verbalmente, aquando da sua contratação, que o salário do primeiro fosse conforme descrito em B). (6°)
  Nele foi acordado que o A. tem direito a receber as gorjetas conforme o método vigente na sua entidade patronal. (7º)
  E foi considerado, do ponto de vista do A., o recebimento das gorjetas uma das suas expectativas da remuneração do próprio trabalhador. (8°)
  E o tal modo de pagamento (do rendimento variável) foi sempre regular e periodicamente cumprido pela R., o que se evidencia que, do ponto de vista da R., nunca deixou de considerar, quer a parte fixa, quer a parte variável da remuneração do A., como contrapartida do serviço por este prestado. (9°)
  Durante a vigência da relação contratual, o A. nunca gozou os seus descansos semanais. (10°)
  Nem a R. pagou ao A. qualquer compensação pecuniária adicional pelo serviço prestado nesses dias. (11°)
  Nem a R. lhe concedeu outro dia de descanso. (12°)
  Durante a vigência da relação contratual, o A. nunca gozou os seus descansos anuais. (13°)
  Nem a R. pagou ao A. qualquer compensação pecuniária adicional pelo serviço prestado nesses dias. (14°)
  Durante a vigência da relação contratual, o A. prestou serviços nos feriados obrigatórios de 1 de Janeiro, 3 dias do Ano Novo Chinês, 1 de Maio e 1 de Outubro dos anos 1998, 1999, 2000 e 2001. (15°)
  Nem a R. lhe pagou ao A. qualquer compensação pecuniária adicional pelo serviço prestado nesses dias. (16°)
  Até ao momento, a R. ainda não procedeu ao pagamento das quantias em dívida ao A. referentes aos dias de descanso semanal, descanso anual e feriados obrigatórios não gozados. (17°)
  O A. era livre de pedir o gozo de dias de descanso sempre que assim o entendesse, desde que tal gozo não pusesse em causa o funcionamento da empresa da R. (22º)

II

Recurso principal do Autor e recurso subordinado da Ré na parte que diz respeito à compensação devida pelo trabalho prestado nos dias de descanso anual

De acordo com o alegado nas conclusões dos recursos, principal e subordinado, as questões levantadas que delimitam o thema decidendum na presente lide recursória são a de saber se as chamadas gorjetas são ou não parte integrante do salário para efeitos de compensações ora reclamadas pelo Autor e os multiplicadores para o cálculo da compensação do trabalho prestado nos descansos semanais e anuais e nos feriados obrigatórios remunerados, assim como o terminus a quo da contagem dos juros moratórios.

Da materialidade fáctica assente resulta que:

* o trabalhador recebia uma quantia fixa (HKD$10,00), desde o início até à cessação da relação de trabalho estabelecida com a entidade patronal STDM;

* recebia uma quantia variável proveniente das gorjetas dadas pelos clientes, as quais são contabilizados e distribuídas segundo um critério fixado pela entidade patronal STDM de acordo com a categoria dos beneficiários;

1. Natureza das “gorjetas” e do salário justo e adequado;

Tanto o Decreto-Lei nº 101/84/M como o Decreto-Lei nº 24/89/M, a lei impõe que o salário seja justo.

Diz o artº 27º do Decreto-Lei nº 101/84/M que “pela prestação dos seus serviços/actividade laboral, os trabalhadores têm direito a um salário justo”.

Ao passo que o D. L. nº 24/89/M de 03ABR estabelece no seu artº 7º, como um dos deveres do empregador, que o empregador deve, a título da retribuição ao trabalho prestado pelo trabalhador, paga-lhe um salário que, dentro das exigências do bem comum, seja justo e adequado ao seu trabalho.

A este dever da entidade patronal, o mesmo decreto faz corresponder simetricamente o direito do trabalhador de auferir um salário justo – artº 25º do mesmo decreto.

A retribuição pode ser certa, variável ou mista consoante seja calculada em função do tempo, do resultado ou daquele e deste (artº 26º do Decreto-Lei nº 24/89/M). E pode ser paga em dinheiro e, ou, em espécie (artº 25º, nº 3, do Decreto-Lei nº 24/89/M); mas apenas pode ser constituída em espécie até ao limite de metade do montante total da retribuição, sendo a restante metade paga em dinheiro (idem, artº 25º, nº3) – vide Augusto Teixeira Garcia, in Lições de Direito do Trabalho ao alunos do 3º ano da Faculdade de Direito da Universidade de Macau, 1991/1992, Capítulo III, ponto 1 e 2.

In casu, o trabalhador era remunerado em dinheiro.

Se levássemos em conta apenas a quantia fixa que o trabalhador recebia da entidade patronal STDM, esta quantia “tão diminuta” (no valor de HKD$10,00) ser-nos-ia obviamente muito aquém do critério imperativamente fixado na lei que impõe o dever ao empregador de pagar ao trabalhador um salário que, dentro das exigências do bem comum, seja justo e adequado ao seu trabalho.

Admitindo embora que variam as opiniões sobre o que se deve entender por salário justo e adequado, mesmo com referência ao parâmetro das exigências do bem comum, o certo é que podemos afirmar, com a razoável segurança, que salário justo e adequado nesse parâmetro deve ser aquele que, além de compensar o trabalhador, é capaz de prover um trabalhador das suas necessidades de vida, garantindo-lhe a subsistência com dignidade e até permitir-lhe assumir compromissos financeiros pelo menos de curto ou até médio prazo.

Na esteira desse entendimento, a parte da quantia fixa do rendimento que o trabalhadora auferia está muito longe de ser capaz de prover o trabalhador das suas necessidades mínimas, muito menos garantir-lhe a subsistência com dignidade ou permitir-lhe assumir compromissos financeiros.

Só não será assim se o salário do trabalhador estiver composto por essa parte fixa e por uma outra parte variável que consiste nas quantias denominadas “gorjetas”, que tendo embora a sua origem nas gratificações dadas pelos clientes, eram primeiro colectadas e depois distribuídas periodicamente pela entidade patronal ao trabalhador, segundo os critérios por aquele unilateralmente definidos, nomeadamente de acordo com a categoria e a antiguidade do trabalhador.

Ora, para qualquer homem médio, se o salário não fosse o assim composto, ninguém estaria disposto a aceitar apenas a quantia fixa tão diminuta como seu verdadeiro e único salário, para trabalhar por conta da entidade patronal STDM, que como se sabe, pela natureza das suas actividades e pela forma do seu funcionamento exige aos seus trabalhadores, nomeadamente os afectados a seus casinos, a trabalhar por turnos, diurnos e nocturnos.

Pelo que, as denominadas gorjetas não podem deixar de ser consideradas parte integrante do salário, pois de outro modo, a entidade patronal STDM violava o seu dever legal de pagar ao trabalhador um salário justo e adequado.

2. Os factores de multiplicação para efeitos de cálculos de indemnização pelo trabalho prestado nos descansos semanais e anuais e nos feriados obrigatórios.

Pelo que vimos, fica decidida a inclusão das “gorjetas” no conceito do salário, cremos que é altura para apurar os factores de multiplicação para efeitos de cálculos das quantias devidas pelo trabalho prestado nos descansos semanais e anuais e nos feriados obrigatórios.

a) compensação do trabalho em descansos anuais

Antes da entrada em vigor do Decreto-Lei nº 101/84/M em 01SET1984, vigorava plenamente o princípio da liberdade contratual e da autonomia privada, sem quaisquer condicionalismos garantísticos legais, não havia lugar a quaisquer compensações senão as contratualmente convencionadas.

Já na vigência do Decreto-Lei nº 101/84/M, ou seja, no período compreendido entre 01SET1984 e 02ABR1989, já foram estabelecidas algumas garantias aos trabalhadores, nomeadamente a compensação obrigatória pelo trabalho prestado em dias do descanso anual – artºs 24º/2 e 23º/1 (que são 6 dias).

Acerca do descanso anual, os artºs 23º e 24º prescrevem:
Artigo 23.º (Aquisição do direito a descanso anual)
1. O trabalhador permanente tem direito a seis dias de descanso anual, sem perda de salário, para além dos períodos de descanso semanal e dos feriados obrigatórios.
2. Nos casos em que a duração da relação de trabalho for inferior a 12 meses, mas superior a 3 meses, o período de descanso anual a que o trabalhador tem direito é o proporcional, na medida de 1/2 dia por cada mês ou fracção de duração da relação de trabalho.
3. Para os efeitos do disposto no número anterior, cada mês considerar-se-á completo às 24 horas do correspondente dia do mês seguinte; mas se no último mês não existir dia correspondente ao inicial, o prazo finda no último dia desse mês.
Artigo 24.º (Marcação do período do descanso anual)
1. O período ou períodos de descanso anual a gozar por cada trabalhador será fixado pelo empregador, de acordo com as exigências de funcionamento da empresa.
2. No momento da cessação da relação de trabalho, se o trabalhador não tiver ainda gozado o respectivo período de descanso anual, ser-lhe-á pago o salário correspondente a esse período.
Assim, no âmbito do Decreto-Lei nº 101/84/M, para cálculo de quantia a pagar ao trabalho prestado em dias de descanso anual vencidos mas não gozados, a fórmula é:

1 X o salário diário médio X número de dias de descanso anual vencidos mas não gozados.

Nos termos do disposto no artº 21º/1 do Decreto-Lei nº 24/89/M, os trabalhadores têm direito a seis dias úteis de descanso anual, sem perda de salário, em cada ano civil.

Nos termos do disposto no artº 24º do mesmo diploma, o empregador que impedir o trabalhador de gozar o período de descanso anual pagará ao trabalhador, a título de indemnização, o triplo da retribuição correspondente ao tempo de descanso que deixou de gozar.

In casu, não resulta da matéria de facto provada que o trabalhador foi impedido pela entidade patronal de gozar os seus descansos anuais, não se deve aplicar assim a forma de multiplicação a que se refere o citado artº 24º.

E na falta de norma expressa para compensar o trabalhador pelo não gozo de dias de descanso anual mas sem impedimento por parte da entidade patronal, afigura-se-nos correcto aplicar por analogia o regime previsto para a situação análoga no caso de descanso semanal, prevista no artº 17º/5 e 6.

Isto é, o trabalho prestado pelo trabalhador em dias de descanso anual, sem constrangimento da entidade patronal, deve dar analogicamente ao trabalhador o direito de ser pago pelo dobro da retribuição normal.

Assim, no âmbito do Decreto-Lei nº 24/89/M, para cálculo de quantia a pagar ao trabalho prestado em dias de descanso anual, vencidos mas não gozados, a fórmula é:

2 X o salário diário médio X número de dias de descanso anual vencidos mas não gozados, caso o trabalhador não tenha sido impedido pela entidade patronal de os gozar.

b) compensação do trabalho em descanso semanal

Como vimos supra, na vigência do Decreto-Lei nº 101/84/M, não há lugar à compensação do trabalho prestado em dias de descanso semanal.

Ao passo que no âmbito do Decreto-Lei nº 24/89/M, a lei já regula as condições do trabalho prestado em dias de descanso semanal e as diferentes formas de compensações desse trabalho consoante as variadas circunstâncias que o justificam.

Diz o artº 17º deste diploma que:

1. Todos os trabalhadores têm direito a gozar, em cada período de descanso de vinte e quatro horas consecutivas, sem prejuízo da correspondente retribuição, calculada nos termos do disposto sob o artigo 26º.
2. O período de descanso semanal de cada trabalhador será fixado pelo empregador, com devida antecedência, de acordo com as exigências do funcionamento da empresa.
3. Os trabalhadores só poderão ser chamados a prestar trabalho nos respectivos períodos de descanso semanal:
a) Quando os empregadores estejam em eminência de prejuízos importantes ou se verifiquem casos de força maior;
b) Quando os empregadores tenham de fazer face a acréscimos de trabalho não previsíveis ou não atendíveis pela admissão de outros trabalhadores;
c) Quando a prestação de trabalho seja indispensável e insubstituível para garantir a continuidade do funcionamento da empresa.

4. Nos casos de prestação de trabalho em período de descanso semanal, o trabalhador tem direito a um outro dia de descanso compensatório a gozar dentro dos trinta dias seguintes ao da prestação de trabalho e que será imediatamente fixado.
5. A observância do direito consagrado no nº 1 não prejudica a faculdade de o trabalhador prestar serviço voluntário em dias de descanso semanal, não podendo, no entanto, a isso ser obrigado.
6. O trabalho prestado nos termos do número anterior dá ao trabalhador o direito a ser pago pelo dobro da retribuição normal.

Em face dos factos que ficaram provados nos presentes autos, não se mostrando que o trabalho em dias de descanso semanal foi prestado em qualquer das situações previstas no nº 3 e na falta de outros elementos fácticos, a compensação deve processar-se nos termos consagrados no nº 6, isto é, o trabalhador tem direito a ser pago pelo dobro da retribuição normal.

Assim, no âmbito do Decreto-Lei nº 24/89/M, para cálculo de quantia a pagar ao trabalho prestado em dias de descanso semanal, a fórmula é:

2 X o salário diário médio X número de dias de prestação de trabalho em descanso semanal, fora das situações previstas no artº 17º/3, nem para tal constrangido pela entidade patronal.

c) compensação do trabalho em feriado obrigatório

Tal como vimos supra, na vigência do Decreto-Lei nº 101/84/M, só é de compensar o trabalho prestado naqueles três dias de feriados obrigatórios remunerados (o dia 1 de Janeiro, o dia 1 de Maio e o dia 1 de Outubro), mas apenas nas situações previstas no artº 21º/1-b), já não também na hipótese prevista no artº 21º/1-c), que é justamente a situação dos presentes autos, ou seja, a prestação do trabalho seja indispensável para garantir a continuidade do funcionamento da entidade patronal.

Portanto, in casu, como a entidade patronal, enquanto concessionária da exploração dos jogos, obrigava-se por lei e pelos termos do contrato de concessão a manter em funcionamento contínuo, não há lugar a compensações do trabalho prestado em dias de feriados obrigatórios na vigência da Lei nº 101/84/M.

No âmbito do Decreto-Lei nº 24/89/M, o trabalho em feriados obrigatórios e a forma das suas compensações encontram-se regulados no artº 20º que prescreve:

1. O trabalho prestado pelos trabalhadores nos dias de feriado obrigatório, referidos no nº 3 do artigo anterior, dá direito a um acréscimo salarial nunca inferior ao dobro da retribuição normal e só pode ser executado:
a) Quando os empregadores estejam na eminência de prejuízos importantes ou se verifiquem casos de força maior;
b) Quando os empregadores tenham de fazer face a um acréscimo de trabalho não previsível;
c) Quando a prestação de trabalho seja indispensável para garantia a continuidade do funcionamento da empresa, nos casos em que, de acordo com os usos e costumes, esse funcionamento deva ocorrer nos dias de feriados.
2. Nos casos de prestação de trabalho em dia feriado obrigatório não remunerado, ao abrigo da alínea b) do nº 1, o trabalhador que tenha concluído o período experimental tem direito a um acréscimo de salário nunca inferior a 50% do salário normal, a fixar por acordo entre as partes.

Nos termos do disposto no artº 19º/3, os trabalhadores têm direito à retribuição nos seis dias de feriado obrigatório (1 de Janeiro, os primeiros 3 dias do Ano Novo Chinês, 1 de Maio e 1 de Outubro).

Perante a materialidade fáctica assente, o trabalho prestado pelo trabalhador em dias de feriados obrigatório integra-se justamente na circunstância prevista no artº 20º/1-c), pois o trabalhador estava afectado aos casinos explorados pela entidade patronal, que como vimos supra, se obrigava legalmente a manter os seus casinos em funcionamento contínuo.

Assim, ao abrigo do disposto no artº20º/1, o trabalhador tem direito a um acréscimo salarial nunca inferior ao dobro da retribuição normal.

A propósito da interpretação da expressão “acréscimo salarial”, ensina o Dr. Augusto Teixeira Garcia que “......A prestação de trabalho nestes dias dá o direito aos trabalhadores de receberem um acréscimo de retribuição nunca inferior ao dobro da retribuição normal (artº 20º, nº1). Assim, se um trabalhador aufere como remuneração diária a quantia de MOP$100, por trabalho prestado num dia feriado obrigatório e remunerado ele terá o direito de auferir MOP$300, ou seja, MOP$100 que corresponde ao dia de trabalho mais MOP$200, correspondente ao acréscimo salarial por trabalho prestado em dia feriado.” – vide, op. cit., Capítulo V, ponto 9.2.

Cremos que essa é única interpretação correcta da expressão “acréscimo salarial”.

Assim, no âmbito do Decreto-Lei nº 24/89/M, para cálculo da quantia a pagar ao trabalho prestado em dias de feriado obrigatório remunerado, a fórmula é:

3 X o salário diário médio X número de dias de prestação de trabalho em feriado obrigatório remunerado, nas situações previstas no artº 20º/1-c).

Foram fixados na sentença recorrida os multiplicadores X 1, X 3 e X 2 para o cálculo das compensações do trabalho prestado nos dias de descanso semanal, de descanso anual e de feriado obrigatório remunerado, respectivamente.

Tendo sido objecto de impugnação o multiplicador referente ao descanso anual por via de recurso subordinado, é de adoptar infra o multiplicador X 2 para efeitos do cálculo da compensação do trabalho prestado nos dias de descanso anual.

Apesar de o Autor ter pedido apenas no recurso subordinado a fixação do multiplicador em X 2 para o cálculo das compensações devidas pelo trabalho prestado nos dias de feriado obrigatório, é de passar a adoptar o multiplicador X 3 por força do disposto no artº 42º/3 do CPT.

E em face do acima concluído, há que revogar a sentença recorrida na parte que diz respeito aos quantitativos do salário diário médio para efeitos do cálculo da compensação do trabalho prestado pelo Autor nos dias de descansos semanal e anual e de feriado obrigatório remunerado, assim como os multiplicadores para o cálculo da compensação do trabalho prestado pelo Autor nos dias de descanso semanal, de descanso anual e de feriado obrigatório remunerado, e passar a condenar a Ré no pagamento da compensação ao Autor conforme os mapas infra:

Trabalho em descanso semanal


Ano
Retribuição diária média em MOP$
Número de dias não gozados
Fórmula de cálculo
Quantia indemnizatória em MOP$
21/10/1997 - 31/12/1997
MOP367,22
10
367,22 x 10 x 2
MOP7.344,40
1998
MOP344,49
52
344,49 x 52 x 2
MOP35.826,96
1999
MOP309,20
52
309,20 x 52 x 2
MOP32.156,80
2000
MOP334,53
52
334,53 x 52 x 2
MOP34.791,12
01/01/2001 - 06/12/2001
MOP287,94
49
287,94 x 49 x 2
MOP28.218,12



TOTAL:
MOP138.337,40








Trabalho em descanso anual


Ano
Retribuição diária média em MOP$
Número de dias não gozados
Fórmula de cálculo
Quantia indemnizatória em MOP$
21/10/1997 - 31/12/1997
MOP367,22
1.5
367,22 x 1,5 x 3
MOP1.652,49
1998
MOP344,49
6
344,49 x 6 x 3
MOP6.200,82
1999
MOP309,20
6
309,20 x 6 x 3
MOP5.565,60
2000
MOP334,53
6
334,53 x 6 x 3
MOP6.021,54
01/01/2001 - 06/12/2001
MOP287,94
0.5
287,94 x 0,5 x 3
MOP431,91



TOTAL:
MOP19.872,36





Trabalho em feriado obrigatório


Ano
Retribuição diária média em MOP$
Número de dias não gozados
Fórmula de cálculo
Quantia indemnizatória em MOP$
21/10/1997 - 31/12/1997
MOP367,22
0
367,22 x 0 x 2
MOP0,00
1998
MOP344,49
6
344,49 x 6 x 2
MOP4.133,88
1999
MOP309,20
6
309,20 x 6 x 2
MOP3.710,40
2000
MOP334,53
6
334,53 x 6 x 2
MOP4.014,36
01/01/2001 - 06/12/2001
MOP287,94
6
287,94 x 6 x 2
MOP3.455,28



TOTAL:
MOP15.313,92

III

Recurso subordinado da Ré (na parte que diz respeito ao juros)

Pelo que ficou decidido pelo TUI no douto Acórdão de 02MAR2011, tirado no processo nº 69/2010, é de proceder o Recurso subordinado da Ré na parte que diz respeito ao juros moratórios.

IV

Apoio judiciário

Beneficiando o Autor da presunção de insuficiência económica por força do disposto no artº 6º do CPT, é de deferir o pedido de apoio judiciário na modalidade da dispensa total do pagamento de custas e do patrocínio oficioso..

V

Pelo exposto, acordam em julgar procedente o recurso principal do Autor e parcialmente procedente o recurso subordinado da Ré, passando a condenar a Ré no pagamento ao Autor do somatório das quantias apuradas nos mapas supra, com juros moratório calculados de acordo com a forma definida pelo TUI no seu douto Acórdão de 02MAR2011, tirado no processo nº 69/2010, e conceder ao Autor o apoio judiciário na modalidade da dispensa total do pagamento de custas e do patrocínio oficioso.

Custas pelas partes na proporção de decaimento em ambas as instâncias, sem prejuízo do apoio judiciário já concedido ao Autor.

RAEM, 19JUL2012

_________________________
Lai Kin Hong
(Relator)

_________________________
Choi Mou Pan
(Primeiro Juiz-Adjunto)
(Subscrevo a decisão da parte que não estão em desconformidade com a nova posição assumida após o acórdão proferido no processo nº 780/2007.)

_________________________
João Augusto Gonçalves Gil de Oliveira
(Segundo Juiz-Adjunto)


Ac. 253/2012-1