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Recurso nº 900/2012/A
( Suspensão de eficácia )

Requerentes: B (B)
C (C)
D (D)
Entidade Requerida : Secretário para a Economia e Finanças
(經濟財政司司長)




Acordam no Tribunal de Segunda Instância da R.A.E.M.:

I – Relatório
   
   B, casada, recepcionista, residente em Macau e C e D, respectivamente “vallet ambassador” e assistente operacional, residentes no mesmo endereço, vieram requerer procedimento cautelar de suspensão de eficácia de acto administrativo ao abrigo dos artigos 120º e seguintes do Código de Processo Administrativo Contencioso (CPAC), porquanto:
De facto
- A 1ª Requerente contraiu matrimónio no interior da China com F em 31.12.2004.
- Em 31.01.2005, F requereu junto do Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau autorização para fixação de residência ao abrigo do Decreto-Lei n.º 14/95/M, de 27 de Março, diploma então em vigor, com fundamento na aquisição de imóvel para investimento.
- Aproveitando a faculdade concedida pelo artigo 4.° do mesmo diploma, F estendeu o pedido de fixação de residência a pessoas do seu agregado familiar, designadamente, à 1ª Requerente, sua mulher, e aos 2.ºs Requerentes, pais da sua mulher.
- Em 18.10.2005, os ora Requerentes obtiveram as respectivas autorizações de residência, enquanto membros do agregado familiar do investidor F.
- Entretanto, em 26.10.2006, a 1ª Requerente e o investidor F tiveram um filho, G, nascido em Macau, ao qual, por força do Regime Jurídico do Direito de Residência (Lei n.º 4/2003), foi concedida a qualidade de residente permanente da Região Administrativa Especial de Macau.
- Em 2008, passados três anos sobre a autorização de fixação de residência, e verificados os requisitos legais, F requereu para si e para os membros do seu agregado familiar, ora Requerentes, as respectivas renovações, tendo o pedido sido deferido.
- Acontece, porém, que chegados a Agosto de 2011, altura em que novo processo de renovação deveria ter lugar, F, na qualidade de investidor, sem motivo aparente, se recusou a estender o pedido de renovação da autorização de residência aos ora Requerentes, na qualidade de membros do seu agregado familiar.
- Pese embora as tentativas feitas pelos Requerentes no sentido de demover F da sua intenção de não renovação, este manteve-se irredutível.
- Os Bilhetes de Identidade de Residentes de Macau dos Requerentes caducaram em 23 de Agosto de 2012.
- Nos termos do artigo 23.° do Regulamento Administrativo n.º 5/2003, aplicável por força do artigo 11.° do Decreto-Lei n.º 14/95/M, de 27 de Março, “findo o prazo de validade da autorização de residência, os interessados ainda podem requerer a renovação no prazo máximo de 180 dias (...)”.
- A não apresentação do requerimento para renovação no prazo referido no artigo anterior implica, por regra, a caducidade da autorização de residência e a perda do tempo para efeitos de aquisição da qualidade de residente permanente, tal como o dispõe o n.º 3 do artigo 23.° do Regulamento Administrativo n.º 5/2003.
- Desta forma, aos Requerentes não restou outra hipótese que não fosse, antes do termo dos 180 dias posteriores ao prazo de validade da autorização de residência, requerer ao Senhor Secretário para a Economia e Finanças que, no uso das competências que lhe foram delegadas por Sua Excelência o Senhor Chefe do Executivo, através da Ordem Executiva nº 49/2010, e nos termos do artigo 11.° da Lei n.º 4/2003, aplicável por força do artigo 11.° do Decreto-Lei n.º 14/95/M, lhes fosse renovada, a título excepcional e por razões humanitárias, a autorização de residência.
- Na base do pedido formulado esteve sobretudo em causa a situação do filho da 1ª Recorrente e de F, G, uma criança, então com cinco anos de idade, nascida e criada em Macau que é, por força do Regime Jurídico do Direito de Residência, residente permanente da Região Administrativa Especial de Macau.
- Paralelamente, a situação específica dos Requerentes serviu também de fundamento ao pedido, porquanto já contavam à altura mais de seis anos de residência em Macau, tendo uma vida produtiva, com profissões que lhes asseguravam e asseguram os meios de subsistência suficientes, pagando os seus impostos e contribuições para o Fundo de Segurança Social, não tendo nunca, nestes anos de residência em Macau, tido qualquer problema do foro criminal, cumprindo sempre escrupulosamente as leis da RAEM.
- Conforme já mencionado, o Senhor Secretário para a Economia e Finanças indeferiu o pedido alegando incompetência para apreciar o mesmo.
Do Direito
- A decisão em causa configura um acto administrativo gerador de efeitos externos de conteúdo lesivo para os Requerentes, pelo que apto a ser contenciosamente recorrível (cf. artigo 28º do CPAC).
- Determina o artigo 120.°, alínea a), do CPAC que a eficácia de actos administrativos pode ser suspensa quando estes tenham conteúdo positivo.
- Os actos positivos são descritos como sendo “aqueles que produzem uma alteração na ordem jurídica. Por exemplo, uma nomeação, uma demissão, uma autorização: esses actos introduzem uma modificação na ordem jurídica, tal como existia no momento em que o acto foi praticado” (itálico no original) (cf. Diogo Freitas do Amaral, Curso de Direito Administrativo, Vol. II, Almedina, 2006, pág. 279).
- A decisão do Senhor Secretário para a Economia e Finanças implica a caducidade da autorização de residência dos Requerentes, introduzindo alterações na esfera jurídica dos mesmos, lesando os seus direitos, consistindo assim num acto positivo puro.
- Assim, os Requerentes têm um interesse pessoal, directo e legítimo para interpor recurso contencioso e, consequentemente, requerer a presente suspensão de eficácia do acto do Despacho de indeferimento.
- Simultaneamente, estão preenchidos os requisitos previstos nas três alíneas do artigo 121º do CPAC, ou seja,
- A execução do acto, isto é, a eliminação do estatuto de residentes, implica a perda dos direitos inerentes a esse estatuto, entre os quais se destacam a perda do tempo já decorrido para efeitos de aquisição da residência permanente, a perda dos respectivos empregos e a impossibilidade de permanência no Território na qualidade de residentes.
- Pelo que, comprovadamente, a execução do acto causa prejuízo de difícil, ou melhor, de impossível reparação para os Requerentes enquanto não é decidido o recurso (cf. alínea a) do artigo 121.°).
- Por outro lado, na suspensão do acto do Senhor Secretário para a Economia e Finanças não se divisa grave lesão do interesse público concretamente prosseguido pelo acto (cf. alínea b) do artigo 121.° do CPAC), e, finalmente,
- Não decorrem do recurso apresentado fortes indícios de ilegalidade, sendo convicção dos Requerentes que o Senhor Secretário para a Economia e Finanças, por força da delegação de competências feita por Sua Excelência o Senhor Chefe do Executivo, ao abrigo da Ordem Executiva n.º 49/2010, tem competência para decidir sobre o pedido, na medida em que o artigo 11.° do Decreto-Lei n.º 14/95/M, de 27 de Março, faz uma remissão para o Regime geral de entrada, permanência e fixação de residência em Macau, hoje regulado pela Lei n.º 4/2003.
- Não se podendo argumentar, como o faz o Senhor Secretário para a Economia e Finanças, que o artigo 11.° da Lei n.º 4/2003 não se enquadra no escopo de aplicação do Decreto-Lei n.º 14/95/M, de 27 de Março.
    Pede-se conceder a requerida suspensão de eficácia de acto administrativo e, em consequência, ser a decisão do Senhor Secretário para a Economia e Finanças relativa à sua competência suspensa até decisão final do recurso.
   
   Citada a entidade requerida, limitou-se esta a oferecer o merecimento dos autos.
   
   O Digno Magistrado do Ministério Público emitiu o seu douto parecer que se transcreve nos termos seguintes:
   “Lançado pelo Exmo. Sr. Secretário para Economia e Finanças na Informação n.º0853/GJFR/2012 (doc. de fls 151 1 155 do P.A.), o despacho suspendendo determina só《批准建議》. À luz do art. 115° n.º 1 do CPA, faz parte integrante do despacho em causa tal Informação.
   O n.º 2 dessa Informação menciona que foi deferido em 20/04/2012 o Pedido de Renovação do indivíduo F, quem solicitou que a Renovação não aproveitaria aos ora Requerentes. O que denota que fico caduca, desde 20/04/2012, a autorização da residência temporária dada aos Requerentes como membro do agregado familiar de F.
   Ora, o n.º 5 da dita Informação demonstra que o despacho em causa tem por objecto o Requerimento apresentado, pela primeira vez, pelos Requerentes em 14/02/2012 (cfr. fls. 147 a 150 do P.A.), não tendo a ver com a renovação da anterior autorização que, repita-se ficou já caduca.
   Daí decorre que com esse Requerimento de 14/02/2012, o que eles pretenderam, no fundo, não é a renovação, mas sim concessão da autorização excepcional de residência temporária por razões humanitárias, contemplada no art. 11° da Lei n.º 4/2003.
   Analisado em consonância com o n.° da mesma Informação, o despacho in quesito consiste em declarar a incompetência prevista na a) do nº 1 do art. 82° do CPA, abstendo-se de decidir das questões de mérito colocadas pelos Requerentes no Requerimento de 14/02/2012.
   Quer isto dizer que no despacho em crise, o Exmo. Sr. Secretário para Economia e Finanças não indeferiu o pedido, formulado pelos três Requerentes, de concessão da autorização excepcional de residência temporária por razões humanitárias.
   Assim, importa realçar que nos termos do art. 120° do CPAC, não é passível da medida preventiva “suspensão de eficácia” qualquer acto administrativo cujo conteúdo é puramente negativo, que se configura em deixar intocada a esfera jurídica do interessado, a ponto de com ele, ou por ele, nada ter sido criado, modificado, retirado ou extinto relativamente a um status anterior.
   Exemplificando o chamado《acto negativo puro》e interpretando a razão de ser deste art. 120° do CPAC, sustenta, de forma exponente e proficiente, o Venerando TSI designadamente no douto Acórdão decretado no Processo n.º 41/2011/A:
   O indeferimento de uma pretensão constitutiva, por exemplo, cabe perfeitamente na figura: se alguém pede o licenciamento para iniciar a exploração de um bar, o indeferimento deixa o requerente exactamente como se encontrava antes; nada na sua esfera mudou. Sendo assim, trata-se de um acto administrativo que para o interessado é neutro, do ponto de vista dos efeitos imediatos e consequentes, uma vez que para si tudo permanece como anteriormente.
   A jurisprudência tem considerado que a eficácia de tais actos não é susceptível de ser suspensa, com a justificação de que não seria possível extrair de uma sentença favorável um efeito contrário ao que eles emanava (no exemplo fornecido, a suspensão nunca permitiria que o requerente pudesse dar início à exploração do negócio) porque isso poderia representar uma usurpação de poderes administrativos pelos tribunais, e na medida em que, portanto, dessa suspensão não adviria qualquer efeito útil para o interessado, nomeadamente o afastamento do espectro de uma situação de facto danosa com a caracterização qualificativa e quantitativa que o art. 121º, nº 1 nº 1, al. a), estabelece. Por isso, são actos normalmente arredados da susceptibilidade (cfr. a contrario, art. 121º, al. a) do CPAC).
   Em homenagem com tal sensata jurisprudência, entendemos que se trata in casu dum acto puramente negativo, pois é incontestável que o acto suspendendo não provoca nem tem virtude de provocar qualquer modificação do status anterior dos Requerentes.
   O que toma manifestamente infundado o argumento no art. 22° do Requerimento inicial, e seguro que não se verifica, no caso sub judice, o pressupostos estabelecido no art. 120° do CPAC. Daí não pode deixar de ser improcedente o pedido de suspensão de eficácia.
   Por cautela, sublinhemos que o próprio Requerimento Inicial revela que de todo em todo lado, os Requerentes não demonstram o 《prejuízo de difícil reparação》exigido na alínea a) do n.º 1 do art. 121° do CPAC, pois não alegaram nenhum facto concreto que possam integrar neste conceito.
   No actual ordenamento jurídico de Macau, forma-se jurisprudência pacífica e constante que são, em regra, cumulativos os requisitos no n.º 1 do art. 121º do CPAC, a não verificação de qualquer um deles torna desnecessária a apreciação dos restantes por o deferimento exigir a verificação cumulativa de todos os requisitos e estes são independentes entre si. (Acórdão do TUI no Processo n.º 2/2009).
   E, em princípio, cabe a requerente o ónus de demonstrar, mediante prova verosímil e susceptível de objectiva apreciação, o preenchimento do requisito consagrado na alínea a) do referido n.º 1, por aí não se estabelecer a presunção do prejuízo de difícil reparação. (cfr. Acórdão do TUI no Processo n.º 2/2009, Acórdãos do TSI nos Processos n.º 799/2011 e n.º 266/2012/A)
   Não fica tal ónus cumprido com a mera utilização de expressões vagas e genéricas irredutíveis a factos a apreciar objectivamente. Terá de tornar credível a sua posição, através do encadeamento lógico e verosímil de razões convincentes e objectivos. (Acórdãos do ex-TSJM de 23/06/1999 no Processo n.º 1106, do TUI no Processo n.º 33/2009, do TSI no Processo n.º 266/2012/A)
   E, apenas relevam os prejuízos que resultam directa, imediata e necessariamente, segundo o princípio da causalidade adequada, do acto cuja inexecução se pretende obter, ficando afastados os prejuízos conjecturais, eventuais e hipotéticos. (Acórdãos do ex-TSJM de 15/07/1999 no Processo n.º 1123, do TSI no Processo n.º 17/2011/A)
   O que significa, sem margem para dúvida, que não se preenche in casu o requisito previsto na alínea a) do n.º 1 do art. 121° do CPAC e, deste molde, reforça a insubsistência e, em consequente, a improcedência do pedido em apreço.
   Pelo exposto, propendemos pela improcedência do presente pedido de suspensão de eficácia.”
   
   Sem vistos – artº 129º/2 do CPAC, cumpre apreciar e decidir.

II – Pressupostos processuais
Este Tribunal é o competente.
As partes são dotadas às personalidades e capacidades judiciárias e mostram-se legítimas.
As partes são regularmente patrocinadas.
Não há questões-prévias e outras nulidades que cumprem conhecer.

II – Fundamentação
- A 1ª Requerente contraiu matrimónio no interior da China com F em 31.12.2004.
- Em 31.01.2005, F requereu junto do Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau autorização para fixação de residência.
- O titular F estendeu o pedido de fixação de residência as pessoas do seu agregado familiar, designadamente, à 1ª Requerente, sua mulher, e aos 2.ºs Requerentes, pais da sua mulher.
- Em 18.10.2005, os ora Requerentes obtiveram as respectivas autorizações de residência, enquanto membros do agregado familiar do investidor F.
- Em 26.10.2006, a 1ª Requerente e o investidor F tiveram um filho, G, nascido em Macau, ao qual, foi concedida a qualidade de residente permanente da Região Administrativa Especial de Macau.
- Em 2008, passados três anos sobre a autorização de fixação de residência, e verificados os requisitos legais, F requereu para si e para os membros do seu agregado familiar, ora Requerentes, as respectivas renovações, tendo o pedido sido deferido.
- Em 3 de Março de 2011, o titular F requereu a renovação da residência provisória mas não estendeu o pedido de renovação aos ora Requerentes, na qualidade de membros do seu agregado familiar, pedido da renovação daquele que foi deferido em 20 de Abril de 2012, com a duração da validade até aos 23 de Agosto de 2014.
- E no mesmo dia o mesmo requereu o cancelamento da residência provisória dos ora requerentes.
- No decurso do processo de renovação, a 1ª requerente entregou várias cardas, pedindo o deferimento de 6 meses para resolverem-se entre si os conflitos familiares.
- Por não ter conseguido resolver o problema familiar, a 1ª requerente pediu, em 14 de Fevereiro de 2012, a renovação da sua residência provisória por razão humanitária, nos termos do artigo 11º do D.L. nº 14/95/M e artigo 11º da Lei nº 4/2003, dada a necessidade da mãe no crescimento do seu filho menor, residente permanente da RAEM.
- O Senhor Secretário para a Economia e Finanças indeferiu o pedido alegando incompetência para apreciar o mesmo.
- Os Bilhetes de Identidade de Residentes de Macau dos Requerentes caducaram em 23 de Agosto de 2012.
   
Nos presentes autos, o requerente veio pedir a suspensão de eficácia do acto de indeferimento do pedido de renovação da residência temporária da requerente com razão humanitária dela e os seus familiares e, para tal, alegando que a execução imediata do acto causaria prejuízos de difícil reparação e a suspensão não causará grave lesões para o interesse público e não se indicia ser ilegal o recurso.
Vejamos.
Como se sabe, o mecanismo de suspensão da eficácia do acto administrativo tem a natureza e a estrutura do processo cautelar, tendo como requisitos a instrumentalidade (artigo 123º do CPAC), o fumus bonni juris, o periculum in mora, e, até certo posto, a proporcionalidade.1
Para que possa ser concedida a dita suspensão da eficácia terão de satisfazer-se, cumulativamente, o pressuposto do artigo 120º e os três requisitos gerais do nº 1 do artigo 121º do Código de Processo Administrativo Contencioso.
Vejamos em primeiro lugar o pressuposto.
Dispõe o artigo 120º:
“Artigo 120º
(Suspensão de eficácia de actos administrativos)
A eficácia de actos administrativos pode ser suspensa quando os actos:
a. Tenham conteúdo positivo;
b. Tendo conteúdo negativo, apresentem uma vertente positiva e a suspensão seja circunscrita a esta vertente.
Como se vê, a suspensão da eficácia de um acto administrativo pressupõe a existência do acto de conteúdo positivo.
Os actos positivos são aqueles que alteram a ordem jurídica, relativamente ao momento em que foram praticados, e os actos negativos são aqueles que não alteram a relação jurídica preexistente, deixando-a na mesma, ou seja, na palavra do Prof. Freitas Amaral, são “aqueles que consistem na recusa de introduzir uma alteração na ordem jurídica”. 2
Há três exemplos típicos destes actos negativos: a omissão de um comportamento devido, o silêncio perante um pedido apresentado à Administração por um particular, e o indeferimento expresso ou tácito duma pretensão apresentada. E a destruição de um acto negativo implica a necessidade de praticar os actos positivos que por lei deviam ter sido praticados e não foram (é o chamado dever de praticar o contrarius actus).3
Razão por que só os actos positivos é que podem ser objecto da suspensão de eficácia e os actos de conteúdo negativo podem ser objecto de dita suspensão desde que contiver vertente positiva e a suspensão só se cinge nesta vertente (al. b) do artigo 120º do CPAC).
Assim, perante um pedido de um acto de conteúdo negativo, deve ser sempre analisado caso a caso para se determinar se se trata de um acto negativo puro ou se coexistem efeitos secundários positivos.
De um modo geral, apontam-se vários requisitos necessários para que uma situação de facto, anteriormente existente à prática de um acto negativo, possa ser objecto de suspensão:4
1. Só podem relevar situações de facto pré-existente que se tenham constituído ou se mantenham à sombra da ordem judicial;
2. O requerente deve poder suscitar uma vocação ou expectativa de alguma forma reconhecida ou protegida com vista à manutenção da situação;
3. A modificação da situação de facto em causa deve ser uma consequência imediata e necessária do acto negativo; e
4. A suspensão da eficácia do acto negativo traduz-se apenas na paralisação, a título provisório, dos efeitos ablativos e, em determinadas condições, na salvaguarda do efeito prático do recurso, ou da utilidade da sentença.
Como se sabe, a suspensão de eficácia de um acto administrativo traduz-se, aí, tão somente, na paralisação provisória dos efeitos ablativos do acto, aguardando-se que o recurso contencioso conheça da sua legalidade intrínseca, ou seja, tratando-se de um provisório "congelamento" da situação, de uma conservação da res integra, como é típico das medidas cautelares, visando assegurar que a sentença de mérito a proferir possa ter eficácia prática.
Uma decisão que indeferiu uma pretensão, em princípio, não vem a alterar-se as suas respectivas situações jurídicas anteriormente existentes e a suspensão da eficácia também não lhe viria a alterar as situações preexistentes, mas em alguns casos, este tipo de acto de conteúdo negativo pode ter, para além do seu efeito típico principal, ligado a um efeito secundário, ou acessório, que modifica a situação jurídica e de facto preexistente, que se mantivera antes, sendo essa modificação uma consequência imediata e necessária do acto negativo5.
Sendo o acto ora suspendendo um indeferimento de renovação da fixação de residência temporária, diferente do caso de mero indeferimento do pedido de fixação de residência (acto de conteúdo negativo puro), , pois, a decisão de não renovação da residência em Macau, independentemente o seu fundamento do indeferimento (embora a entidade requerida declarasse incompetente em apreciar o pedido de residência provisória por razão humanitária, trata-se o acto sempre uma decisão tomada no contexto da renovação da residência provisória6), vem necessariamente alterar a sua situação actual e pre-existente, e a suspensão do mesmo acto teria potencialidade para determinar, ela mesma, a produção dos efeitos jurídicos negados ao administrado com a prática do acto suspendendo, pelo que do decretamento da suspensão da eficácia poderia resultar para o requerente efeito útil, ou evitar os prejuízos para a sua esfera jurídica.
Ou seja, com a suspensão da eficácia da não renovação da fixação de residência, podem tão só ver-se a manutenção do status quo, como se fosse a situação antes de renovação – estadia em Macau, e, com a pretendida suspensão da execução do indeferimento, a obter um efeito útil até à decisão do recurso contencioso em que se apreciará a legalidade e adequação do indeferimento do título de residência não permanente.
Nesta conformidade, verifica-se efectivamente um acto de conteúdo negativo com a vertente positiva, satisfazendo o pressuposto do pedido de suspensão de eficácia.

E quanto aos requisitos, digamos o seguinte:
Prevê o artigo 121° do CPAC que:
“Artigo 121º (Legitimidade e requisitos)
1. A suspensão de eficácia dos actos administrativos, que pode ser pedida por quem tenha legitimidade para deles interpor recurso contencioso, é concedida pelo tribunal quando se verifiquem os seguintes requisitos:
a. A execução do acto cause previsivelmente prejuízo de difícil reparação para o requerente ou para os interesses que este defenda ou venha a defender no recurso;
b. A suspensão não determine grave lesão do interesse público concretamente prosseguido pelo acto; e
c. Do processo não resultem fortes indícios de ilegalidade do recurso.
2. Quando o acto tenha sido declarado nulo ou juridicamente inexistente, por sentença ou acórdão pendentes de recurso jurisdicional, a suspensão de eficácia depende apenas da verificação do requisito previsto na alínea a) do número anterior.
3. Não é exigível a verificação do requisito previsto na alínea a) do n.º 1 para que seja concedida a suspensão de eficácia de acto com a natureza de sanção disciplinar.
4. Ainda que o tribunal não dê como verificado o requisito previsto na alínea b) do n.º 1. a suspensão de eficácia pode ser concedida quando, preenchidos os restantes requisitos, sejam desproporcionadamente superiores os prejuízos que a imediata execução do acto cause ao requerente.
5. Verificados os requisitos previstos no n.º 1 ou na hipótese prevista no número anterior, a suspensão não é, contudo, concedida quando os contra-interessa-dos façam prova de que dela lhes resulta prejuízo de mais difícil reparação do que o que resulta para o requerente da execução do acto.”
Em conformidade com o disposto no artigo 121º ora citado, para obter uma autorização da suspensão da eficácia de um acto administrativo deve satisfazer cumulativamente os requisitos, um positivo e dois negativos.
O requisito positivo é a possibilidade de ocorrer prejuízo de difícil reparação, enquanto os requisitos negativos a inexistência de grave lesão de interesse público pelo facto da suspensão e o não resultarem do processo fortes indícios da ilegalidade do recurso.

Quanto aos requisitos negativos, não se apresentam a sua verificação, pois, por um lado a entidade requerente não apresentou a contestação, limitando-se a oferecer o merecimento dos autos, facto este que levou à aplicação do disposto no nº 1 do artigo 129º do CPAC e para este Tribunal, é óbvio que não se divisam mínimos indícios de ilegalidade na interposição do recurso, ao contrário, não é menos lícito interpor o recurso do acto administrativo que não renovou a fixação da residência provisória.
Por outro lado, também não se mostra existente, nem a entidade requerida, ter alegado prova bastante de que dessa circunstância decorra grave lesão do interesse público pela sua permanência na Região até decisão do recurso.

Quanto ao requisito positivo, os requerentes alegaram tão só que “a eliminação do estatuto de residentes, implica a perda dos direitos inerentes a esse estatuto, entre os quais se destacam a perda do tempo já decorrido para efeitos de aquisição da residência permanente, a perda dos respectivos empregos e a impossibilidade de permanência no Território na qualidade de residentes” e “pelo que, comprovadamente, a execução do acto causa prejuízo de difícil, ou melhor, de impossível reparação para os Requerentes enquanto não é decidido o recurso”.
Embora este Tribunal ordenasse oficiosamente a junção dos documentos comprovativos da estadia e do estudo do seu filho menor (ao que foram juntados a declaração da Escola em que o menor está a frequentar), não foram alegados nos autos factos concretos comprovativos da afectação dos direitos e interesses dos requerentes e do filho menor da 1ª requerentes pela execução imediata do acto, dos quais se poderiam concluir que a execução imediata do acto causaria prejuízos de difícil reparação, quer económicos quer do índole escolar do menor, que resultam directa, imediata e necessariamente, segundo o princípio da causalidade adequada, do acto cuja inexecução se pretende obter, ficando afastados os prejuízos conjecturais, eventuais e hipotéticos,7 razão pela qual se afigura ser inverificada a existência da possibilidade de ocorrer prejuízo de difícil reparação.
Assim sendo, dão-se por não verificados totalmente os requisitos da suspensão de eficácia do acto administrativo ora em causa, indeferindo o pedido.
Ponderado resta decidir.

Pelo exposto, acordam neste Tribunal de Segunda Instância em indeferir a requerida suspensão de eficácia.
  Custas pelos requerentes.
Macau, RAE, aos 13 de Dezembro de 2012

Choi Mou Pan Presente (Relator) Vítor Manuel Carvalho Coelho
João A. G. Gil de Oliveira (Primeiro Juiz-Adjunto)

Ho Wai Neng (Segundo Juiz-Adjunto)
1 Acórdão do TSI do processo 30/00/A.
2 F. Amaral, in “Direito Administrativo” III, pp. 155-156.
3 F. Amaral, in “Direito Administrativo” III, pp. 155-156.
4 Maria Fernanda dos Santos Maçãs, A suspensão judicial da eficácia dos actos administrativos e a garantia constitucional da tutela judicial efectiva, in Boletim da Faculdade de Direito de Universidade de Ciombra, Stvdia Ivridica, 22º, 1996, p. 85.
5 Cfr., a propósito, Drs. Cláudio Monteiro, “Suspensão de Eficácia dos Actos Administrativos de Conteúdo Negativo” ed. A.A.F.D.L. 1990, e Pedro Machete, “Suspensão Jurisdicional da Eficácia dos Actos Administrativos e a Garantia Constitucional do Tutela Efectiva, 45-107). Neste sentido também o Acórdão deste TSI de 21 de Fevereiro de 2002 do Processo nº 190/2001/A
6 Diferente é o caso em que a entidade recorrida se vendo incompetente para apreciar o pedido de residência provisória por razão humanitária, remeteu o pedido à entidade competente e a decisão tomada por esta entidade competente seria um acto de conteúdo negativo puro.
7 Acórdãos, entre outros, do TSJM de 15/07/1999 no Processo n.º 1123, e do TSI no Processo n.º 17/2011/A.
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