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Proc. nº 888/2012
Relator: Cândido de Pinho
Data do acórdão: 29 de Novembro de 2012
Descritores:
-STDM
-Declaração de remissão/quitação


SUMÁRIO:

I- A remissão consiste no que é vulgarmente designado por perdão de dívida

II- A quitação (ou recibo, no caso de obrigação pecuniária) é a declaração do credor, corporizada num documento, de que recebeu a prestação.

III- O reconhecimento negativo de dívida é o negócio pelo qual o possível credor declara vinculativamente, perante a contraparte, que a obrigação não existe.

IV- O reconhecimento negativo da dívida pode ser elemento de uma transacção, se o credor obtém, em troca do reconhecimento, uma concessão; mas não o é, se não se obtém nada em troca, havendo então um contrato de reconhecimento ou fixação unilateral, que se distingue da transacção por não haver concessões recíprocas.

V- A remissão ou quitação de créditos do contrato de trabalho é possível após extinção das relações laborais.





Proc. nº 888/2012

Acordam no Tribunal de Segunda Instância da RAEM

I – Relatório
A, com os demais sinais dos autos, moveu contra a STDM acção de processo comum de trabalho pedindo a condenação desta no pagamento da indemnização no valor de Mop$ 823.153,80, correspondente aos dias de descanso semanal, anual e feriados obrigatórios não gozados desde o início da relação laboral até ao seu termo.
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Na contestação, a ré suscitou a excepção de prescrição, defendeu-se por impugnação e deduziu reconvenção contra a autora.
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No despacho saneador, o tribunal de 1ª instância julgou prescritos os créditos anteriores a 25/10/1991, e decidiu pela absolvição da instância do autor em razão da procedência da excepção dilatória da falta de interesse em agir por parte da ré/reconvinte STDM.
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O processo prosseguiu, entretanto, os seus normais trâmites e, a final, foi proferida sentença que julgou a acção improcedente e, em consequência, absolveu a ré do pedido.
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É dessa sentença que o autor da acção interpôs o presente recurso, tendo concluído do seguinte modo as suas alegações:
“A - Ao caso sub judicio apenas se pode aplicar o R.J.R.T. da R.A.E.M., uma vez que o mesmo não contém lacuna que deva ser integrada, não se podendo fundar a Sentença recorrida no art. 854º do Código Civil - art. 3º do D.L. 39/99/M e art 6º, nº 3, 8º, 9º do CC e 25º e 33º do R.J.R.T.
B - De acordo com o disposto no art. 33º do Decreto-Lei nº 84/89/M, de 03 de Abril, os direitos dos trabalhadores a créditos laborais, designadamente a salários por trabalho efectivamente prestado, são inalienáveis e irrenunciáveis.
C - Ao não aplicar ao caso concreto a norma do art. 33º do R.J.R.T., a Douta Sentença recorrida sofre de nulidade - art. 571º, nº 1 alínea d) do C.P.C.
D - Os créditos laborais dos trabalhadores da R.A.E.M. não têm um tratamento diferenciado, i.e., indisponíveis na vigência do contrato de trabalho e disponíveis após essa vigência.
E - Uma tal interpretação, no sentido da sua disponibilidade após a cessação da relação laboral, não resulta nem da letra da Lei, nem do seu espírito, nem das circunstâncias efectivas e históricas em que foi criada.
F - Bem como violaria o Princípio da Igualdade, pois os direitos dos trabalhadores nas mesma circunstâncias do recorrente têm vindo a ser acauteladas pelas Tribunais da R.A.E.M., existindo sobre a questão Jurisprudência Assente.
G - A “Declaração” assinada pelo recorrente não constitui, por falta de todos os legais requisitos e por violação do art. 33º do R.J.R.T. uma remissão ou renúncia abdicativa, sendo nula e de nenhum efeito.
H - O recorrente, embora tenha cessado o seu contrato de trabalho com a recorrida, continuou a exercer funções para a sua subsidiária, existindo entre aquela e a SJM, subsidiária da recorrida e por ela controlada, uma relação de trabalho, que o impedia de, livremente, formar uma vontade, com o que os documentos que suportam a Decisão recorrida são nulos e inquinam a mesma art. 259º do C.C..
I - A Jurisprudência portuguesa que suporta a Decisão recorrida não tem aplicação ao caso concreto, pela que padece a mesma de ausência de fundamentação - art. 571º, nº 1, alíneas b) e d) do C.P.C.
J - A “Declaração” assinada pelo recorrente é vaga e imprecisa, sendo certo que os requisitos do art. 854º do CC, sem conceder, são a existência de um direito e não a mera hipótese de existência ou probabilidade de existência do mesmo, e a certeza, pela concretização, do direito a que se renúncia, quer pela sua especificação exacta, quer pela reconhecimento da sua existência, o que não acontece in casu.
L - A “Declaração” do recorrente e documentos constantes dos autos, reportam-se a um “prémio de serviço” e não a um qualquer direito efectivado, não representando, ainda, a perda de um valor pecuniário/patrimonial, por si só e sem contrapartida.
M - Ainda, para que se dê a remissão/renúncia consensual do direito, nos termos do art. 854º do C.C., é condição essencial o consentimento do devedor na remissão, que inexiste nesta concreta situação.
N - Ninguém pode dar quitação de um crédito que ignora e cuja titularidade nem sequer lhe é reconhecida, donde, não existindo qualquer remissão/renúncia abdicativa da recorrente aos seus créditos laborais e não sendo permitido retirar qualquer efeito liberatório de uma “Declaração” viciada, está a Decisão recorrida ferida de nulidade - cfr. arts. 854º, 239º e 240º do C.C. e art. 571º, nº 1 alíneas b) e d) do C.P.C..
O - Atento o inderrogável Princípio do Favor Laboratoris, elaborado atentas as especificidades do Direito de Trabalho e a necessidade de proteger o trabalhador, encontrando-se a solução jurídica que lhe seja mais favorável, uma vez que é a parte débil em qualquer relação laboral, deve sempre entender-se a “Declaração” sub judicio como declaração retratável na senda da Jurisprudência da R.A.E.M., sob pena de violação do art. 6º do D.L. nº 24/89/M, de 3 de Abril.
P - Sem conceder, mesmo que a “Declaração” assinada tivesse feito surgir o contrato de remissão de dívida, de acordo com as normas imperativas dos arts. 6º e 2º, alínea d) do R.J.R.T., não podia este surtir qualquer efeito, pois é, em concreto, muitíssimo desfavorável à recorrente.
Termos em que, e nos melhores de Direito, sempre com o mui Douto suprimento de V.Exªs, Venerando Juízes, deverá ser declarada nula e de nenhum efeito a Douta Sentença proferida, com as legais consequências, designadamente, ser a presente Acção julgada, in totum, procedente por provada, assim se fazendo a esperada JUSTIÇA!”.
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A STDM respondeu ao recurso, nos seguintes termos conclusivos:
“1. Nos termos da Sentença de fls. 234 e ss., a Ré e ora Recorrida foi integralmente absolvida do peticionado e do valor monetário decretado pela Sentença recorrida porquanto, nas palavras do Tribunal a quo, “tendo já recebida da ré quantia superior para pagamento do mesmo crédito, tem a ré de ser absolvida, procedendo a excepção de pagamento” (cfr. fls.249).
2. Cabe à Recorrente o ónus de suscitar a apreciação da matéria em que decaiu, prevenindo a hipótese de vir a ser revogada a decisão na parte ou segmento que lhe tinha sido favorável, ganhando então pertinência e actualidade a reapreciação do segmento da decisão que lhe havia sido desfavorável no tribunal recorrido.
3. Se tal ónus de impugnação não for cumprido, deixando o interessado de deduzir a pertinente impugnação, a decisão recorrida consolida-se inteiramente quanto a tal segmento decisório, o qual não poderá ser objecto de reapreciação oficiosa no momento em que o Tribunal ad quem inflectir o sentido da decisão recorrida.
4. In casu, o ora Recorrente apresentou recurso quanto a matéria que não foi apreciada na decisão recorrida, pelo que, no que toca à matéria decidida pelo Tribunal a quo e não abrangida pelo referido recurso, deverá a mesma considerar-se como consolidada porque aceite pelo Recorrente.
5. O recurso tem, necessária e logicamente, de se centrar sobre a matéria efectivamente decidida pelo Tribunal recorrido, sob pena de se ver desrespeitado o ónus de formular alegações quanto ao concluído na douta Sentença ora recorrida.
6. Não se discute a necessidade formal de apresentar, no recurso da decisão a quo, as conclusões do que foi articulado na referida peça, mas antes a total ausência de alegações quanto a determinada matéria que, in casu, foi decidida pelo Tribunal Judicial de Base e não foi objecto de recurso por parte do A., ora Recorrente.
7. Pelo exposto, deverá o recurso ser considerado deserto por aplicação do artigo 598º n.º 3 do Código de Processo Civil, por falta de alegação quanto ao efectivamente decidido pelo Tribunal a quo, mantendo-se na totalidade a Decisão constante da douta Sentença, o que se requer.
Não sendo procedentes as alegações ora deduzidas, o que não se concede mas se admite por mera cautela de patrocínio, e sem prejuízo da decisão recorrida não versar sobre a matéria exposta no recurso do A., sempre se dirá o seguinte quanto ao conteúdo do mesmo:
8. Conforme foi exposto, a douta Sentença recorrida não se debruçou sobre na consideração da “Declaração” como extintiva dos eventuais créditos do Autor sobre a Ré, decorrentes da relação laboral mantida entre ambas e já cessada.
9. Ficou no entanto provado que, em 11 de Julho de 2003, o Autor assinou um documento no qual declarou que “recebido o valor referido [i.e. MOP$29,790.10], nenhum outro direito decorrente da relação de trabalho com a STDM subsiste e, por consequência, nenhuma quantia é por mim exigível, por qualquer forma, à STDM, na medida em que nenhuma das partes deve à outra qualquer compensação relativa ao vínculo laboral.” [cfr. a douta matéria assente a fls.238]:
10. Refira-se a este respeito o entendimento do TUI, mormente ao expresso no Acórdão n.º 46/2007, de 27 de Fevereiro de 2008, no âmbito do qual se declara que “A remissão de créditos do contrato de trabalho é possível após a extinção das relações laborais”;
11. Autor e Ré chegaram a um acordo quanto às eventuais compensações decorrentes da prestação de trabalho em dias de descanso, consubstanciando-se na assinatura da “Declaração” aqui em causa;
12. O Autor sabia e estava consciente do que assinava, aliás nada em contrário resulta da prova constante dos autos, ou seja, estava plenamente consciente de que se encontrava a dispor de eventuais direitos que eram disponíveis, porquanto a relação laboral com a Ré já tinha cessado;
13. Este entendimento é também perfilhado por este douto Tribunal de Segunda Instância (TSI), tal como decidido no Acórdão n.º 1003/2010, de 30 de Junho de 2011, no âmbito do qual se julgou uma situação idêntica com um outro ex-trabalhador da Ré;
14. No tocante à questão fundamental da validade da declaração remissiva e a sua consequência jurídica, sabe-se que também é entendimento deste douto Tribunal de Recurso que a mesma é válida e extintiva de toda e qualquer compensação emergente da relação laboral1 (cfr. o Acórdão do TSI, de 24 de Julho de 2008, no âmbito do processo n.º 491/2007);
15. Trata-se de uma remissão que se traduz numa causa de extinção das obrigações e na renúncia do credor ao direito de exigir a prestação que lhe é devida, feita com a aquiescência da contraparte2, revestindo, por isso, a forma de “contrato”, como claramente se preceitua no artigo 854.º, n.º 1 do Código Civil, onde consta que o credor pode remitir a dívida por contrato com o devedor; ou, tal como entende o Alto Tribunal de Última Instância, trata-se de uma questão de “quitação acompanhada de reconhecimento negativo de dívida” que se prevê no disposto no artigo 776.º do Código Civil, versando, portanto, sobre direitos disponíveis;
16. Seja qual for a qualificação, visa a mesma “Declaração” a produção dos efeitos de extinção da dívida do devedor e o reconhecimento definitivo da inexistência da prestação devida ao credor;
17. No caso dos presentes autos, encontrando-se a “Declaração” assinada, e cessada que estava a relação laboral entre as aqui Ré e Autor, nada mais deve aquela a esta;
18. Nestes termos, porque a declaração produz efeitos extintivos sobre a eventual dívida resultante das compensações por trabalho prestado em dias de descanso, deve o presente recurso ser julgado improcedente, mantendo-se, na íntegra, o doutamente decidido em Primeira Instância;
Ainda concluindo,
19. A “Declaração” não é subsumível à figura da cessão ou cedência de créditos. Aliás, bem pelo contrário, no âmbito da cessão de créditos o crédito continua a existir, não se extingue, apenas operando-se mudanças quanto à sua titularidade. No caso dos autos e da “Declaração” em concreto, discute-se a extinção do crédito;
20. Por outro lado, o artigo 33.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril, não tem aplicabilidade no caso dos presentes autos, porquanto o preceito refere-se a valores resultantes de créditos ao salário e não a valores resultantes de eventuais compensações por trabalho prestado em dias de descanso;
21. Esta posição da Recorrida tem, inclusivamente, acolhimento neste douto Tribunal de recurso, mormente no recente Acórdão proferido no Processo n.º 1003/2010, de 30 de Junho de 2011, no âmbito do qual se julgou uma situação de todo idêntica, envolvendo uma “Declaração” assinada por um outro ex-trabalhador da Ré;
22. Nestes termos, não tendo o artigo 33.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril, aplicabilidade no caso dos presentes autos, deverá o presente recurso ser considerado improcedente, mantendo-se na totalidade a douta Decisão recorrida;
Ainda concluindo,
23. Não há na matéria assente qualquer facto que se possa subsumir a um hipotético Erro-vício na declaração de vontade do Autor expressa na “Declaração” remissiva, ou a qualquer outra tipologia de falta ou vício da vontade, sendo que a prova de tais hipotéticos factos sempre caberia ao Autor;
24. Realce-se que o Autor nem sequer o alegou na sua Petição Inicial, nem em qualquer outra fase do processo. Repescando o Acórdão do TUI de 30 de Julho de 2008, proferido no processo n.º 27/2008, transcreve-se o aí doutamente decidido quanto a esta matéria: “Quanto à alegação de que o Autor não teve uma vontade livre e esclarecida quando assinou a declaração, a mesma é irrelevante nesta fase, já que o Autor não alegou no momento próprio factos integradores de vícios da vontade.”;
25. Sem necessidade de mais, estamos em crer, deverá o recurso improceder também no que a esta parte se refere, mantendo-se na totalidade a Decisão constante da douta Sentença, o que se requer”.
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Em recurso subordinado, a mesma STDM concluiu as alegações como segue:
“A. Na Sentença proferida a fls. 234 e ss. o Tribunal a quo entendeu que o ora Recorrido Subordinado tinha direito a ser compensado pela Recorrente Subordinada a título de “descansos não gozados” mas, como já tinha recebido desta uma quantia superior ao valor da indemnização calculada pelo Tribunal, não podia a Recorrente Subordinada ser condenada, novamente, nesse pagamento.
B. Ou seja, o Tribunal a quo entendeu que assistia razão ao Recorrido Subordinado e só não condenou formalmente a Recorrente Subordinada no pagamento de uma indemnização porque resultou provado dos autos que esta já tinha pago ao Recorrido Subordinado um montante superior ao calculado por aquele Tribunal como devido.
C. No entanto, ao longo de toda a sua defesa, a Recorrente Subordinada sempre manteve que o Recorrido Subordinado não tinha direito a receber quaisquer quantias a título de compensação por “descansos não gozados”, porque a elas renunciara aquando da celebração do contrato de trabalho; e, ainda, através da Declaração junta como doc. n.º 1 junto à Contestação.
D. Ao inverter a ordem de julgamento das questões que lhe foram submetidas e não tendo primeiro julgado do mérito da excepção peremptória de pagamento invocada pela Recorrente Subordinada - a qual importaria imediata e inteiramente a absolvição desta do pedido - o Tribunal a quo errou, violando a lei substantiva e prejudicando a Recorrente Subordinada.
E. Aliás, não tendo apreciado devidamente na Sentença recorrida uma questão fundamental e da qual o Tribunal a quo não poderia deixar de conhecer, a Sentença recorrida é nula nos termos do disposto na al. d) do n.º 1 do art. 571º do Código de Processo Civil, nulidade que aqui se alega para os devidos efeitos legais.
F. In casu, apesar de não ter havido, a final, um prejuízo pecuniário directo para a Recorrente Subordinada, a verdade é que esta sucumbiu no pedido formulado pelo Recorrido Subordinado tendo, consequentemente, “saído vencida” e sido prejudicada pela decisão.
G. Logo, a Recorrente Subordinada tem legitimidade para recorrer da Sentença.
H. Conforme resulta da posição defendida e mantida pela ora Recorrente Subordinada nestes autos, não merece qualquer censura a fórmula de cálculo adoptada pelo Tribunal a quo para apurar os montantes putativamente devidos ao ora Recorrido Subordinado, na parte em que a mesma faz relevar para efeito do cálculo apenas a remuneração fixa (ou base) deste.
I. No entanto, atenta a factualidade assente nos autos e o Direito ao qual é subsumível tal factualidade, andou mal o Tribunal a quo quando determinou os multiplicadores aplicáveis ao cálculo do quantum indemnizatório.
J. Assim, na eventualidade de vir a ser confirmada a obrigação de indemnizar o ora Recorrido Subordinado, devem ser os seguintes os multiplicadores aplicáveis -na fórmula destinada ao cálculo do quantum indemnizatório:
a) Trabalho prestado em dias de descanso semanal:
i. Decreto-Lei n.º 101/84/M: salário diário x0;
ii. Decreto-Lei n.º 24/89/M: salário diário x1; e
iii. Decreto-Lei n.º 32/90/M: salário diário x0;
b) Trabalho prestado em dias de descanso anual:
i. Decreto-Lei n.º 101/84/M: salário diário x0;
ii. Decreto-Lei n. º 24/89/M: salário diário x0; e
iii. Decreto-Lei n.º 32/90/M: salário diário x0;
c) Trabalho prestado em dia feriado obrigatório:
i. Decreto-Lei n.º 101/84/M: salário diário x0;
ii. Decreto-Lei n.º 24/89/M: salário diário x1; e
iii. Decreto-Lei n.º 32/90/M: salário diário x1.
K. Caso assim não se entenda, devem ser aplicadas as fórmulas adoptadas nos Acórdãos do Tribunal de Última Instância proferidos no âmbito dos Processos n.º 28/2007, 29/2007, 58/2007, 46/2011 e 47/2011 datados de 21 de Setembro de 2007, 22 de Novembro de 2007, 27 de Fevereiro de 2008 e 23 de Setembro de 2011, respectivamente.
Nestes termos, e Das melhores de direito aplicáveis, deve o presente recurso subordinado ser julgado procedente, conhecendo o Tribunal ad quem da excepção peremptória deduzida pela Recorrente Subordinada na sua Contestação e, em qualquer caso devem os cálculos da eventual indemnização do ora Recorrente ser efectuados em conformidade com as fórmulas referidas, Fazendo V. Exas., mais uma vez, a devida e costumada JUSTIÇA!”.
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Cumpre decidir.
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II- Os Factos
A sentença recorrida deu por assente a seguinte factualidade:
“1. A Ré tem por objecto social a exploração de jogos de fortuna ou azar, e a indústria hoteleira, de turismo, transportes aéreos, marítimos e terrestres, construção civil, operações em títulos públicos e acções nacionais e estrangeiros, comércio de importação e exportação.
2. O Autor A começou a trabalhar para a Ré STDM, em 27 de Janeiro de 1979 e deixou de trabalhar para a mesma Ré em 25 de Julho de 2002, data em que acordou com a SJM trabalhar para esta.
3. Inicialmente o autor exerceu as funções de Assistente de Clientes e em 1980 a 25/6/2002 as de croupier.
4. O rendimento do Autor era constituído por uma quantia fixa diária e por uma quantia variável correspondente a uma quota-parte das gorjetas diárias recebidas dos clientes do casino e distribuídas pela ré de acordo com critérios por esta estabelecidos.
5. O Autor, entre os anos de 1991 a 2002, recebeu da ré as seguintes quantias:
a)1991: 182.604,00;
b)1992: 172.029,00;
c)1993: 196.700,00;
d)1994: 199.300,00;
e)1995: 199.399,00;
f)1996: 208.616,00;
g)1997: 191.530,00;
h)1998: 174.466,00;
i) 1999: 163.642,00;
j) 2000: 174.242,00;
k) 2001: 174.486,00;
l) 2002: 90.939,00.
6. O Autor prestou serviços em turnos, conforme horários fixados pela entidade patronal.
7. Os turnos eram os seguintes:
1. 1º e 6º turnos, das 07h00, às 11h00 e das 03h00 até às 07h00:
2. 3º e 5º turnos, das 15h00 às 19h00 e das 23h00 às 03h00 (do dia seguinte);
3. 2º e 4º turnos, das 11h00 às 15h00 e das 19h00 às 23h00
8. O Autor podia pedir à ré dias de descanso não remunerados e nunca gozou dias de descanso remunerados.
9. No dia 11 de Julho de 2003, o A. declarou por escrito o seguinte:
“Eu, (A), titular do BIR nº (XXX) recebi, voluntariamente, a título de prémio de serviço, a quantia de MOP$ (29,790.10) da STDM, referente ao pagamento de compensação extraordinária de eventuais direitos relativos a descansos semanais, anuais, feriados obrigatórios, eventual licença de maternidade e rescisão por acordo do contrato de trabalho, decorrentes do vínculo laboral com a STDM.”.
Mais declaro e entendo que, recebido o valor referido, nenhum outro direito decorrente da relação de trabalho com a STDM subsiste e, por consequência, nenhuma quantia é por mim exigível, por qualquer forma, à STDM, na medida em que nenhuma das partes deve á outra qualquer compensação relativo ao vinculo laboral.”.
10. Além de ter recebido aquele valor, o A. recebeu ainda uma outra quantia a título de compensação por descansos arbitrada pela então DSTE.
11. Enquanto esteve ao serviço da Ré, esta nunca autorizou o Autor a gozar descansos semanais.
12. E também nunca o autorizou a gozar, naquele período, descansos anuais.
13. Apesar de ter trabalhado nos períodos referidos em 1) e 3), nunca a Ré pagou à Autora qualquer acréscimo salarial.
14. Autor e Ré acordaram que aquele auferiria uma remuneração diária fixa por cada dia de trabalho efectivo e uma quota nas gorjetas doadas pelos clientes da Ré.
15. A referida quantia fixa foi de MOP$ 4,10 por dia, desde o início da relação laboral até 30/06/1989, de HKD$ 10,00 por dia, desde 01/07/1989 até 30/04/1995, e de HKD$ 15,00 por dia, desde 01/05/1995 até ao fim da relação laboral.
16. Acordaram ainda Autor e Ré que caso o trabalhador pretendesse gozar 1 dias de descanso ou se por qualquer motivo não pudesse prestar o seu trabalho, perdia o direito aos montantes referidos em 7).”
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III- O Direito
1- Introdução
A sentença partiu do pressuposto de que as gorjetas não fazem parte do salário. E assim sendo, fez o cálculo dos valores indemnizatórios a que o autor teria direito pelo não gozo dos dias de descanso semanal, anual e feriados obrigatórios remunerados. Mas, por ter dado por assente que o autor já tinha recebido quantia superior ao valor indemnizatório global apurado, por força da declaração contida no ponto nº9 da matéria de facto, acabou por absolver a ré do pedido.
É contra essa decisão que o autor da acção se insurge. Aponta-lhe a nulidade do art. 571º, nº1, als. b) e d), do CPC, por não ter aplicado o art. 33º do DL nº 84/89/M, de 3/04 e por ter feito uso de jurisprudência estranha ao caso concreto; defende ainda que a declaração referida no ponto 9 dos factos é nula, vaga e imprecisa e não contém nenhuma quitação ou renúncia.
A STDM, nas suas alegações de resposta ao recurso, defendeu que o recurso interposto pelo autor deixou consolidar questões que a sentença havia tratado por não as haver impugnado. E quanto à declaração citada, defende que ela tinha o valor de quitação ou remissão e, portanto, extintiva da reclamada compensação emergente da relação laboral.
Sem prejuízo disso, também subordinadamente recorreu, desde logo imputando à sentença a nulidade do art. 571º, al. d), do CPC, por ela não ter conhecido a questão fundamental concernente aos efeitos da dita declaração. Por fim, manifestou-se contra os factores utilizados na fórmula de cálculo da indemnização.
Cumpre, então, apreciar.
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2- Da nulidade da sentença
2.1 - O recorrente autor acha que a sentença fez uso de jurisprudência portuguesa deslocada do caso concreto e, portanto, a ele inaplicável. Por isso, estaria cometida a nulidade a que se refere o art. 571º, nº1, al. b), do CPC.
Claramente, sem razão. Qualquer uso de normas, regras e princípios que não sirvam de suporte à decisão apenas a pode fazer enfermar de erro de julgamento: a decisão pode vir a ser errada, porque radicada em fundamentos inapropriados e incapazes de acudir à solução do pleito. Dir-se-á, nessa hipótese, que o direito foi mal aplicado. Ora, isto é extensível à deslocada utilização de citação doutrinária ou jurisprudencial.
Assim, sem mais, diremos que a nulidade invocada não pode proceder.
*
2.2 - Ambas as partes imputaram, ainda, à sentença a nulidade a que se refere o art. 571º, nº1, al. d), do CPC, nos termos acima sintetizados.
Também aqui, sem êxito. Com efeito, a sentença não tomou em consideração a referida declaração, nem lhe atribuiu qualquer efeito de renúncia ou remissão, isto é, não lhe estudou o seu alcance excludente “a se” da responsabilidade indemnizatória imputada à STDM, uma vez que apenas se serviu dos valores apurados no cálculo indemnizatório e da quantia que o autor nela declarou ter recebido. Ou seja, a sentença fez somente uma operação de aritmética para concluir que a ré nada já devia ao demandante.
Pode a sentença ter errado no raciocínio efectuado, mas o que não se pode dizer é que seja nula por ter omitido a apreciação daquela matéria. Em sua opinião, tal questão estava “prejudicada”, tal como expressamente a sentença deixou consignado a fls. 16, “in fine”: não precisou de estudar o alcance da declaração, por dela ter extraído praticamente o mesmo efeito extintivo ao fazer abarcar no valor de Mop$ 27.919,10 - que nela é mencionado como reportado a quaisquer direitos relativos a dias de descanso não gozados - o “quantum” indemnizatório apurado de HK$ 9.742,50.
Ora, esta visão do problema, mesmo que se não concorde com ela, não se reflecte em nulidade de julgado, mas sim em eventual erro de julgamento, o que adiante já se averiguará.
Como assim, claudica a imputação de nulidade com este fundamento.
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3- Da matéria dos recursos
Como vimos, há dois recursos: um principal, interposto pelo autor, defendendo que o salário deve englobar as gorjetas recebidas e manifestando o desacordo relativamente à formula de cálculo da compensação; outro, subordinado, interposto pela ré, insistindo na natureza renunciativa e abdicativa da quitação ou remissão traduzida na declaração assinada pelo autor.
Ora, tendo em conta que o recurso subordinado pode prejudicar a análise do recurso principal, por aquele haveremos de começar.
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4- Do recurso subordinado
Está em causa saber se a declaração contida no ponto 9 da matéria de facto pode ou não ser levado à conta de uma remissão ou quitação.
Trata-se de um tema sobejamente debatido neste TSI e não vemos agora razão para alterar a posição que nele tem sido uniformemente adoptado, na sequência, aliás, de um acórdão do TUI lavrado no Processo nº 27/2008, em 30/07/2008, com o qual concordamos e que, por essa razão e mais uma vez, aqui fazemos nosso.
Eis o seu teor:
“A remissão é o contrato pelo qual o credor, “com a aquiescência do devedor”, renuncia ao poder de exigir a prestação devida, afastando definitivamente da sua esfera jurídica os instrumentos de tutela do seu interesse”.
E acrescenta ANTUNES VARELA, “o interesse do credor a que a obrigação se encontra adstrita não chega a ser satisfeito, nem sequer indirecta ou potencialmente.
A obrigação extingue-se sem haver lugar a prestação”.
A remissão consiste no que é vulgarmente designado por perdão de dívida.
Aliás, remitir significa perdoar.
Ora, não parece ter sido isto que sucedeu, em face da declaração da autora.
A autora declarou que recebeu a prestação, que quantificou. E reconheceu mais nada ser devido em relação à relação laboral que já se tinha extinguido.
Mas não quis perdoar a totalidade ou mesmo parte da dívida, ou pelo menos não é isso que resulta da declaração, nem foi alegado ter sido essa a sua intenção.
Parece, portanto, tratar-se de quitação ou recibo, que é a declaração do credor, corporizada num documento, de que recebeu a prestação, prevista no art. 776.º do Código Civil.
Explicam PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA que a “quitação é muitas vezes, como Carbonnier (Droit civil, 4, 1982, n.º 129, pág. 538) justamente observa, não uma simples declaração de recebimento da prestação, mas a ampla declaração de que o solvens já nada deve ao accipiens, seja a título do crédito extinto, seja a qualquer outro título (quittance pour solde de tout compte)”.
Poderá, desta maneira, a quitação, ser acompanhada de reconhecimento negativo de dívida, que é, na lição de ANTUNES VARELA, o negócio “pelo qual o possível credor declara vinculativamente, perante a contraparte, que a obrigação não existe.
...
O reconhecimento negativo de dívida, assente sobre a convicção (declarada) da inexistência da obrigação, não se confunde com a remissão, que é a perda voluntária dum direito de crédito existente”.
Claro que o reconhecimento negativo da dívida pode dissimular uma remissão, mas para isso há que alegar e provar o facto, o que não aconteceu.
Explica VAZ SERRA nos trabalhos preparatórios do Código Civil de 1966, que “o reconhecimento negativo propriamente dito distingue-se da remissão, pois, ao passo que, nesta, existe apenas a vontade de remitir (isto é, de abandonar o crédito), naquele, a vontade é a de pôr termo a um estado de incerteza acerca da existência do crédito”.
E, como ensina o mesmo autor, noutra obra dos mesmos trabalhos preparatórios, a remissão não é de presumir, “dado que, em regra, a quitação não é passada com essa finalidade”.
O reconhecimento negativo da dívida pode, de outra banda, “ser elemento de uma transacção, se o credor obtém, em troca do reconhecimento, uma concessão; mas não o é, se não se obtém nada em troca, havendo então um contrato de reconhecimento ou fixação unilateral, que se distingue da transacção por não haver concessões recíprocas”.
Mas a transacção preventiva ou extrajudicial não dispensa “uma controvérsia entre as partes, como base ou fundamento de um litígio eventual ou futuro: uma há-de afirmar a juridicidade de certa pretensão, e a outra negá-la”.
Mas nem da declaração escrita, nem das alegações das partes no processo, resulta tal controvérsia.
Em conclusão, afigura-se-nos mais preciso qualificar a declaração da autora como uma quitação acompanhada de reconhecimento negativo de dívida.
Seja como for, trate-se de quitação, de remissão ou de transacção, os efeitos são semelhantes, já que, como se verá, se está perante direitos disponíveis, uma vez que a relação laboral já havia cessado, pelo que a consequência é a inexistência do direito de crédito contra a ré.
4. Insusceptibilidade de cessão de crédito de salário. Impossibilidade de renúncia a salário. Vícios da vontade
Nas alegações de recurso para o TSI, a autora veio defender que o art. 33.º do RJRL não permite a cedência de créditos, por força do princípio do tratamento mais favorável para o trabalhador. E os trabalhadores estiveram sempre sob alçada económica e disciplinar da ré, já que a B controla a C, pelo que a autora não teve uma vontade livre e esclarecida quando assinaram as declarações.
Mas a declaração de quitação não constitui qualquer cedência de créditos (a quem?).
Acresce que a cedência de créditos só está vedada enquanto durar a relação de trabalho e esta já se tinha extinguido quando foi emitida a quitação.
Por outro lado, ainda que tivesse havido renúncia a créditos, ou seja remissão, ela seria possível porque efectuada após extinção da relação de trabalho.
É o que defende a generalidade da doutrina. Escreve PEDRO ROMANO MARTINEZ:
“Relacionada com a irredutibilidade encontra-se a impossibilidade de renúncia, de cessão, de compensação e de penhora da retribuição. Estas limitações, excepção feita à penhora, só têm sentido na pendência da relação laboral; cessando a subordinação jurídica, o trabalhador deixa de estar numa situação de dependência, que justifica a tutela por via destas limitações”.
Quanto à alegação de que a autora não teve uma vontade livre e esclarecida quando assinou a declaração, a mesma é irrelevante nesta fase, já que a autora não alegou no momento próprio factos integradores de vícios da vontade.
5. Normas convencionais e declarações negociais. O princípio do tratamento mais favorável para o trabalhador
O Acórdão recorrido considerou que o art. 6.º do RJRL não permitia o acordo das partes pelo qual a autora, trabalhadora, declarasse remitir a dívida para com a ré, tendo esta declaração violado o princípio de tratamento mais favorável dos trabalhadores.
E acrescentou o mesmo Acórdão, referindo-se ao princípio de tratamento mais favorável, ele “deve ser tido pelo menos também como farol de interpretação da lei laboral, sob o qual o intérprete-aplicador do direito deve escolher, na dúvida, o sentido ou solução que mais favorável se mostre aos trabalhadores no caso considerado, em virtude do objectivo de protecção do trabalhador que o Direito do Trabalho visa prosseguir”.
Na feliz síntese de BERNARDO LOBO XAVIER “o princípio do tratamento mais favorável, no plano da hierarquia das normas, significa que as normas de mais alto grau valem como estabelecendo mínimos, podendo ser derrogadas por outras subalternas, desde que mais favoráveis para o trabalhador. No plano da interpretação, na dúvida sobre o sentido da lei, deverá eleger-se aquele que seja mais benéfico para o trabalhador. Na aplicação no tempo, aplicar-se-ão imediatamente todas as regras do trabalho, no pressuposto de que, havendo um constante progresso social, as novas normas são mais favoráveis para o trabalhador, conservando este, ainda, as regalias adquiridas à sombra de anterior legislação”.
O art. 6.º do RJRL dispõe o seguinte:
“Artigo 6.º
Prevalência de regimes convencionais São, em princípio, admitidos todos os acordos ou convenções estabelecidos entre os empregadores e trabalhadores ou entre os respectivos representantes associativos ainda que disponham de modo diferente do estabelecido na presente lei, desde que da sua aplicação não resultem condições de trabalho menos favoráveis para os trabalhadores do que as que resultariam da aplicação da lei”.
Esta norma prevê que as normas convencionais, estipuladas entre empregadores e trabalhadores ou entre os respectivos representantes associativos, podem afastar o regime das normas legais desde que o regime convencional não seja menos favorável para os trabalhadores do que o regime legal.
Assim, e em primeiro lugar, as normas convencionais de que fala o preceito são normas relativas ao regime do trabalho, para vigorarem enquanto durar a relação laboral.
O acordo dos autos entre a autora e a antiga entidade patronal não é integrado por normas, isto é, não constituem nenhuma regulamentação normativa atinente às condições de trabalho. São antes declarações negociais, pelas quais a autora declara ter recebido as quantias devidas pela relação laboral já extinta e nada mais ter a receber da antiga entidade patronal.
Parece, portanto, que o art. 6.º do RJRL nada tem que ver com a matéria em apreço.
Por outro lado, o art. 6.º do RJRL prescreve, na verdade, o princípio do tratamento mais favorável para o trabalhador, no que respeita à prevalência dos acordos sobre a lei, ao plano da hierarquia das normas.
Mas, no caso dos autos, embora exista um acordo entre partes (entre um ex-trabalhador e uma ex-entidade patronal) não existe nenhuma lei mais favorável ou menos favorável aos trabalhadores ou a ex-trabalhadores, pelo que não se vislumbra, qualquer aplicação do princípio do tratamento mais favorável para o trabalhador, na vertente que o art. 6.º do RJRL consagra, que é o da prevalência dos acordos sobre a lei.
Há, é certo, outras vertentes do mesmo princípio do tratamento mais favorável para o trabalhador, por exemplo, no art. 5.º, n.º 1 do RJRL, que é o da manutenção das regalias adquiridas sobre o regime constante do RJRL.
Mas, no caso em apreço não está em causa nenhuma alteração de regime convencional para um regime legal, pelo que a vertente do princípio do tratamento mais favorável para o trabalhador, constante do art. 5.º, n.º 1 do RJRL, não aproveitaria à autora.
O Acórdão recorrido invoca, ainda, em abono da sua tese o art. 60.º do Decreto-Lei n.º 40/95/M, de 14 de Agosto, que institui o regime aplicável à reparação dos danos emergentes dos acidentes de trabalho e doenças profissionais.
Tal preceito, no seu n.º 2 fere com a nulidade os actos e os contratos que visem a renúncia aos direitos estabelecidos naquele diploma. Ora, nem nos autos está em causa qualquer acidente de trabalho ou doença profissional, nem a quitação operou qualquer renúncia a direitos da autora.
O art. 60.º do Decreto-Lei n.º 40/95/M é, pois, inaplicável.
Em suma, a autora não tem o direito que invocou, pelo que a acção estava condenada ao insucesso”.
Por esta autorizada posição se vê que a referida declaração, mais consentânea com uma quitação, tal como se pode ler no aresto, implica que o autor/credor nada mais tenha a exigir do devedor, seja qual for a composição do salário (questão que haveria de discutir-se no recurso do então autor).
Trata-se, de resto, de uma posição que noutras ocasiões temos já subscrito. Veja-se, por exemplo, e por mais recentes, os Acs. do TSI lavrados nos Processos nºs. 265/2012 e 317/2011, ambos de 6/10/2011; 316/2010 e 318/2010, ambos de 28/07/2011, 233/2011, de 20/10/2011, entre outros. No mesmo sentido, ver ainda o Ac. de 29/09/2011, Proc. nº 490/2010.
E como esta conclusão torna inútil, por prejudicado, o recurso principal, não o iremos apreciar, independentemente do êxito que ele merecesse sobre a composição do salário e qualquer que fosse o valor a apurar na compensação a atribuir ao autor.
***
IV- Decidindo
Nos termos expostos, acordam em:
1 - Conceder provimento ao recurso subordinado, em consequência do que se revoga a sentença na parte correspondente e, declarando procedente a excepção peremptória, se julga improcedente a acção e se absolve a ré da acção, STDM, do pedido.
2 - Julgar prejudicado o conhecimento do recurso principal.
Custas pelo recorrente em ambas as instâncias.
TSI, 29 / 11 / 2012

José Cândido de Pinho
Choi Mou Pan
Lai Kin Hong (com declaração de voto)










Processo nº 888/2012
Declaração de voto de vencido

Vencido pois não vejo razão para alterar a minha posição já assumida na declaração de voto que juntei aos vários Acórdão do TSI, nomeadamente os Acórdãos tirados nos processos nºs 210/2010, 216/2011, 223/2010 e 252/2008, isto é, dada a natureza imperativa da norma do artº 6º do Decreto-Lei nº 24/89/M, um contrato mediante o qual se convencionaram as condições de trabalho aquém do mínimo da protecção dos trabalhadores não pode deixar de ser julgado nulo, por força do disposto no artº 287º do Código Civil, nos termos do qual, salvo excepção expressa em contrário resultante da lei, são nulos os negócios jurídicos celebrados contra disposição legal de carácter imperativo.

RAEM, 29NOV2012

Lai Kin Hong




1 Vide os Acórdãos do Tribunal de segunda Instância proferidos nos Processos nºs 207/2008, 249/2008, 335/2008, 380/2008, 407/2008 e 428/2008, todos de 18 de Setembro de 2008.
2 Vide Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Vol.II, Coimbra Almedina, 7.ª Edição, 1995, p. 203 e ss.
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