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Processo nº 614/2012
(Autos de Recurso Jurisdicional Contencioso Administrativo)

Data: 18 de Outubro de 2012

ASSUNTO:
- Fundamentos da oposição à execução por embargos
- Princípio da taxatividade de fundamentos
- Prescrição da liquidação
- Prescrição da quantia exequenda
- Indicação da residência para efeitos de notificação fiscal

SUMÁRIO:
- Nos termos do artº 169º do Código das Execuções Fiscais (CEF), são apenas fundamentos da oposição por simples requerimento os seguintes:
a) a ilegitimidade da pessoa citada;
b) o pagamento da dívida exequenda ou a sua anulação devidamente comprovada;
c) A prescrição da dívida;
d) A duplicação da colecta; e
e) A falta ou nulidade da primeira citação para a execução.
- Na oposição por embargos, além dos fundamentos acima expostos, são ainda os seguintes (artº 176º do CEF):
a) Ilegalidade da contribuição lançada ao executado, por essa espécie não existir nas leis em vigor ou por não estar autorizada a sua cobrança na lei orçamental;
b) Falsidade do documento que servir de base à execução;
c) Litígio pendente ou instaurado depois da penhora acerca dos bens penhorados; e
d) Não pertencerem ao executado os bens penhorados.
- Vigora na oposição/embargos à execução fiscal o princípio da taxatividade de fundamentos, daí que os fundamentos que poderiam ser invocados em sede de impugnação contenciosa do acto subjacente à dívida apresentada à execução, não podem servir de fundamentos à oposição, salvo aqueles que determinam a nulidade ou inexistência do acto, visto que o acto nulo ou inexistente, por natureza, não produz qualquer efeito, pelo que não é executório – artºs 123º, nº 1 e 136º, nº 2 do CPA.
   - A prescrição da dívida diferencia-se da prescrição da liquidição: a primeira reporta-se à dívida, ou seja, a quantia exequenda em si, cujo prazo, no caso sub judice, é de 20 anos nos termos do artº 251º do referido CEF (ou 15 anos, considerando que aquele prazo de 20 anos foi revogado e substituído pelo prazo ordinário da prescrição previsto no artº 302º do Código Civil de Macau), a correr desde a autuação do processo executivo; e a última refere-se ao acto de liquidação, que é de 5 anos sobre aquele a que o rendimento colectável respeitar (artº 91º, nº 1 do RCP).
- O fundamento invocado – a prescrição da liquidação –, caso subsista, implica simplesmente o vício da violação da lei, o que determina a anulação, e não nulidade, do acto, pelo que não pode servir de fundamento à oposição.
   - Prevê o art.º 3º n.º 1º do DL nº 16/84/M que “Os avisos ou notificações deverão ser enviados para a residência indicada pelo contribuinte nas declarações por si apresentadas no âmbito do respectivo imposto ou contribuição.”.
   - Na falta de indicação da residência acima em referência, não andou mal a entidade fiscal em proceder à notificação no local da situação do imóvel.
O Relator,

Ho Wai Neng










Proc. nº 614/2012
(Autos de Recurso Jurisdicional Contencioso Administrativo)

Data: 18 de Outubro de 2012
Recorrente: A Lda. (Embargante)
Entidade Recorrida: Direcção dos Serviços de Finanças (Entidade Fiscal)

ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:

I – Relatório
Por sentença de 20/03/2012, o Tribunal Administrativo da RAEM julgou improcedente a oposição por embargos à execução deduzida pela embargante.
Dessa decisão, vem a embargante interpor o presente recurso jurisdicional, alegando, em sede de conclusão, o seguinte:
a) Foi o presente recurso interposto da decisão do Tribunal “a quo” de 20/03/2012 que julgou improcedente a oposição formulada à execução movida à embargante, ora recorrente, na qual esta havia sido citada para pagar à Recebedoria da Repartição de Finanças de Macau a quantia de MOP$459,558.00, acrescida de encargos legais, referente à Contribuição Predial Urbana (C.P.U.) dos anos de 2004 a 2008 da fracção “AR/C” do art.° matricial n° 71829 de que a recorrente é proprietária;
b) Não se conforma a recorrente com a decisão do Tribunal “a quo” porquanto, salvo o devido respeito, a recorrente não foi notificada para o pagamento dos acréscimos, alegadamente referentes à C.P.U. da fracção em causa dos anos de 2004 a 2008; e, também, a decisão recorrida não considerou a prescrição daquela contribuição predial, dos anos de 2004, 2005 e 2006;
c) Por um lado, afigura-se óbvio à recorrente que a prescrição por si invocada cabe nos fundamentos de oposição por meio de embargos, o que, aliás, também resulta do art.º 21° do C.P.A.C. e dos art.ºs 412º n° 3, 415° do C.P.C. - normas subsidiariamente aplicáveis - já que a prescrição é excepção peremptória do que o tribunal até deve conhecer oficiosamente;
d) Por outro lado, não tem razão a sentença recorrida, sempre salvo o devido respeito, quando refere que a prescrição invocada se interrompeu “no momento da liquidação do imposto” e que a notificação para o pagamento da C.P.U. à recorrente foi feita em 25/11/2009, não tendo, nesta data, “decorrido o prazo de 5 anos desde o ano fiscal de 2004”;
e) Nada se referindo no art.º 91° da C.P.U. quanto à forma como se processa legalmente a interrupção da prescrição, então, deverão seguirse as regras do Código Civil (C.C.);
f) O art.º 315º do C.C. refere expressamente que a prescrição se interrompe “pela citação ou notificação judicial de qualquer acto que exprima, directa ou indirectamente, a intenção de exercer o direito...”; o que se não verificou na situação “subjudice” porquanto, por um lado, as cinco cartas expedidas à recorrente em 25/11/2009, não são uma notificação judicial (ou equiparada); e, por outro lado, está provado que a recorrente não foi notificada do respectivo conteúdo porque as mesmas foram devolvidas à D.S.F.;
g) Isto é, a recorrente nunca foi notificada para pagamento da “liquidação adicional” da C.P.U. referente aos anos de 2004 a 2008;
h) E este facto - a não notificação da recorrente - sempre foi do conhecimento da D.S.F. que, na posse daquelas cinco cartas devolvidas, nunca usou de outro meio ao seu alcance para a respectiva notificação que, isso sim, interromperia a prescrição que ora se invocou;
Assim, face ao exposto,
i) Resulta que a C.P.U. alegadamente em dívida por parte da recorrente, em relação aos anos de 2004, 2005 e 2006, não poderia ter sido coactivamente exigida, em virtude da ocorrência do prazo prescricional da mesma;
Por outro lado,
j) A recorrente invocou a sua não notificação para o pagamento dos valores constantes das “certidões de dívida” que são os títulos executivos da execução a que se opôs;
Ora,
k) Como se disse supra, a recorrente nunca foi notificada para o pagamento daqueles valores aí referidos, pelo que nunca lhe foi dada a hipótese de os contestar ou, eventualmente, os pagar voluntariamente;
l) E este facto - a não notificação da recorrente para o efeito - sempre foi do conhecimento da D.S.F. que, bem sabendo que havia omitido uma indispensável diligência, sempre o “escondeu” processualmente, até ao despacho do Mº Juiz do Tribunal “a quo” de fls, 78, a requerimento da recorrente datado de 16/12/2011;
m) Seria, pois, imperioso que a D.S.F., na posse da devolução dos documentos de notificação da recorrente supra aludidos, tivesse então notificado a recorrente, para o efeito, no local que é a sua sede social desde 07/11/2001, onde, aliás, foi citada para os termos da execução fiscal;
n) Nunca tendo sido notificada para aquele efeito, então, nunca foi dada à recorrente a possibilidade de contestar aquelas “certidões de dívida” e, como tal, nunca se constituíu em mora perante a administração fiscal da R.A.E.M.;
o) A D.S.F., entidade exequente, tinha perfeito conhecimento da alteração do local da sede social da recorrente;
p) E tanto assim é que, para efeitos da presente execução fiscal, mandou citar a executada, ora recorrente, na sua actual sede social;
q) Ao contrário do que refere a sentença recorrida, era exigível à D.S.F., no caso em apreço, que garantisse ao contribuinte a sua notificação para pagamento de uma contribuição, já que tinha conhecimento da devolução das notificações que tentou fazer, em 25/11/2009, e não fez;
Consequentemente,
r) Deverá ser anulado todo o processado desde a não notificação da recorrente para o pagamento das “liquidações adicionais” referente à C.P.U. dos anos de 2007 e 2008 - uma vez que, como se disse, as demais se encontram prescritas - ordenando-se em conformidade à D.S.F. que proceda àquela notificação na actual sede social da recorrente.
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A Entidade Fiscal respondeu à motivação do recurso da Recorrente nos termos constantes a fls. 120 a 126 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, pugnando pela improcedência do recurso.
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O Ministério Público é de parecer pela improcedência do presente recurso contencioso, a saber:
“Nas alegações do recurso jurisdicional em apreço (cfr. fls.106 a 117 dos autos), a executada «A Lda.», embargante e ora recorrente, assacou o erro de direito à douta sentença recorrida (cfr. fls.95 a 100 dos autos), que julgara improcedente por completo a oposição à execução fiscal (cfr. fls.3 a 7 dos autos).
   Ora bem, os fundamentos invocados nas alegações do recurso sub judice - a prescrição e a falta de notificação - encontraram-se já cabal e profundamente analisados pela nossa ilustre colega (cfr. fls.67 a 68 verso dos autos), e pelo Memo. Juiz. a quo na douta sentença em causa.
   Sem prejuízo do devido respeito pela opinião diferente, afigura-senos que não merecerá provimento o presente recurso.
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   Em sede da oposição à execução fiscal das contribuições prediais urbanas em dívida, a executada e ora recorrente invocou a prescrição contemplada no art.91° do RCPU - prescrição da liquidação da contribuição predial, equiparando-a à “prescrição da dívida exequenda” prevista na c) do art.169° do CEF, prescrição que, nos termos do 251° do mesmo diploma legal, é de 20 anos.
   Inquestionável é que a executada não tem razão.
   Em sintonia com a doutrina propugnada pelo ex-TSJM (vide. Acórdão no Processo n.º927, in Jurisprudência 1998, II Tomo, pp. 13 a 24), o prazo para a Administração Fiscal proceder à liquidação tem a natureza de caducidade., pelo que se distingue da “prescrição da dívida exequenda”, que pressupõe e incide na dívida fiscal já liquidada.
   No ordenamento jurídico de Portugal, divisamos que constitui doutrina consolidada a tese de que só a prescrição da dívida exequenda, e não também a caducidade do direito à liquidação do imposto, pode servir de fundamento de oposição à execução. (Alfredo José da Sousa, José da Silva Paixão: Código de Processo Tributário - Comentado e Anotado, 2ª ed., Coimbra 1994, p.574)
   No caso vertente, a execução fiscal visa a cobrar coercivamente as contribuições prediais dos anos de 2004 a 2008. O que torna indiscutível a insubsistência das conclusões b) a f) das referidas alegações. Tudo isto permite-nos concluir que é sã a douta sentença recorrida nesta parte
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   Quanto ao facto de não notificação, cumpre mencionar que apesar de não constar do art.169° do CEF, a falta de notificação para pagamento voluntário vê aceite como fundamento da oposição à execução fiscal pela jurisprudência do Venerando TS1 em harmonia com o princípio da tutela jurisdicional efectiva. (cfr. Acórdãos nos processo n.º126/2003, n.º130/2003 e n.º527/2006)
   No caso “sub judice”, é verdade que foram devolvidas as notificações (das liquidações adicionais) enviadas à executada. Quer dizer que ela não recebeu tais notificações.
   Porém, a executada nunca conseguiu ilidir, com êxito, a presunção consagrada no n.º4 do art.2° do D.L. n.º16/84/M, não comprovando que não lhe fosse imputável o facto de não ter sido pessoalmente notificado para pagamento voluntário da dívida exequenda.
   Assim, tal facto é irrelevante e inoperante para os efeitos pretendidos pela executada. No fundo, o facto de ela não receber efectivamente aquelas notificações não determina a ineficácia da liquidação, nem gera a inexigibilidade coerciva da dívida exequenda.
   O que implica que não merece censura a douta sentença recorrida na parte de decidir irrelevante o mencionado facto.
***
   Por todo o expendido acima, propendemos pela improcedência do presente recurso.”
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Foram colhidos os vistos legais dos Mmºs Juizes-Adjuntos.
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II – Factos
Foi assente a seguinte factualidade pelo Tribunal a quo:
1. A embargante, A LDA., em chinês “A有限公司” é uma sociedade por quotas com sede na RAEM.
2. A sede da embargante situava-se, desde o seu início das operações em 07/06/1994 até 07/11/2001, na Avenida XX, XX, Edifício XX, “X”, na RAEM (fls. 18 a 19 dos autos).
3. A partir de 07/11/2001, ficou averbado ao registo comercial de que a sede da embargante foi mudada para a Rua XX, n.º X, Edifício XX, X° andar X, na RAEM (fls. 18 a 19 dos autos).
4. A embargante efectuou o pagamento da Contribuição Predial referente aos anos de 2004 a 2008, da fracção situada na Avenida XX, XX, XX, Edif. XX, Macau, inscrito na matriz da Direcção dos Serviços de Finanças, sob o n.º 71829-RC-ARC, em 09/08/2005, 21/08/2006, 10/08/2007, 25/08/2008 e 11/08/2009, respectivamente (fls. 8 a 12 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
5. Os conhecimentos de cobrança “M/8” da contribuição predial referente aos anos de 2004 a 2008, foram remetidos à “AVENIDA XX XX, XX, EDIF. XX MACAU”.
6. A embargante é proprietária da fracção autónoma referida no ponto 4).
7. Em 17/02/2009, a embargante efectuou o pagamento das diferenças da Contribuição Predial, referente aos anos de 2004 a 2007, da fracção autónoma supra mencionada (fls. 13 a 16 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
8. Em 25/11/2009, a Direcção dos Serviços de Finanças expediu à embargante cinco “Notificações para Pagamento” (N.º de registo: RR000022451MO, RR000022452MO, RR000022453MO, RR000022454MO e RR000022455MO), respeitantes a Contribuição Predial Urbana dos anos de 2004 a 2008 da fracção autónoma em causa, apurado devido ao aumento do rendimento colectável resultante do contrato de arrendamento (fls. 46 a 50 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
9. As notificações supra aludidas, através das cartas registadas, foram dirigidas para o endereço da Avenida XX, No. XX XX, XX, Edif. XX, Macau (fls. 44, 87 a 91 dos autos).
10. Posteriormente, as referida cartas foram devolvidas à Direcção dos Serviços de Finanças pelos Correios com a menção de escrita em chinês “在以下時間無人在家....”(“NÃO FOI ENCONTRADO EM CASA ÀS ....” em português) (fls. 87 a 91 dos autos).
11. Em 08/03/2010, a Direcção dos Serviços de Finanças passou cinco certidões de relaxe n.º 2010-03-900225, n.º 2010-03-900228, n.º 2010-03-900234, n.º 2010-03-900279 e n.º 2010-03-900322, em relação à Contribuição Predial Urbana mencionado no ponto 8), no valor total de MOP$459.558,00 (fls. 2 dos autos n.º 2010-03-900225-00 / n.º 2010-03-900228-00 / n.º 2010-03-900234-00 / n.º 2010-03-900279-00 e n.º 2010-03-900322-00, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
12. Em 12/05/2011, a Repartição das Execuções Fiscais da Direcção dos Serviços de Finanças enviou uma carta registada, acompanhada das cinco certidões de relaxe à embargante, para Rua XX nº X, Edif. XX, X andar, X, Macau, destinada à citação da mesma (fls. 4 a 6 dos autos n.º 2010-03-900225-00, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
13. Em 13/05/2011, foi a embargante citada.
14. Até o ano fiscal de 2011, a embargante não indicou à Direcção dos Serviços de Finanças uma residência para o efeito de notificação fiscal (fls. 71 a 72 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
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III – Fundamentos
Nos termos do artº 169º do Código das Execuções Fiscais (CEF), são apenas fundamentos da oposição por simples requerimento os seguintes:
f) a ilegitimidade da pessoa citada;
g) o pagamento da dívida exequenda ou a sua anulação devidamente comprovada;
h) A prescrição da dívida;
i) A duplicação da colecta; e
j) A falta ou nulidade da primeira citação para a execução.
Na oposição por embargos, além dos fundamentos acima expostos, são ainda os seguintes (artº 176º do CEF):
e) Ilegalidade da contribuição lançada ao executado, por essa espécie não existir nas leis em vigor ou por não estar autorizada a sua cobrança na lei orçamental;
f) Falsidade do documento que servir de base à execução;
g) Litígio pendente ou instaurado depois da penhora acerca dos bens penhorados; e
h) Não pertencerem ao executado os bens penhorados.
No caso em apreço, um dos argumentos invocado pela embargante – a prescrição da liquidação – não é algum dos fundamentos legalmente previstos.
Note-se que a prescrição da dívida diferencia-se da prescrição da liquidição: a primeira reporta-se à dívida, ou seja, a quantia exequenda em si, cujo prazo, no caso sub judice, é de 20 anos nos termos do artº 251º do referido CEF (ou 15 anos, considerando que aquele prazo de 20 anos foi revogado e substituído pelo prazo ordinário da prescrição previsto no artº 302º do Código Civil de Macau), a correr desde a autuação do processo executivo; e a última refere-se ao acto de liquidação, que é de 5 anos sobre aquele a que o rendimento colectável respeitar (artº 91º, nº 1 do RCP).
Em regra, vigora na oposição/embargos à execução fiscal o princípio da taxatividade de fundamentos, daí que os fundamentos que poderiam ser invocados em sede de impugnação contenciosa do acto subjacente à dívida apresentada à execução, não podem servir de fundamentos à oposição, salvo aqueles que determinam a nulidade ou inexistência do acto, visto que o acto nulo ou inexistente, por natureza, não produz qualquer efeito, pelo que não é executório – artºs 123º, nº 1 e 136º, nº 2 do CPA.
O que se compreende.
Na hipótese de ter sido interposto recurso contencioso em tempo, a admitir-se a possibilidade de repetição de fundamentos no processo de execução, teríamos aberto o caminho para a eventual produção de decisões repetidas ou até contraditórias, o que os institutos de caso julgado e da litispendência visam precisamente evitar.
Para a hipótese de ainda não ter sido interposto recurso contencioso, estaria descoberta a forma fácil de ultrapassar os prazos fixados por lei para impugnação de actos anuláveis.
No presente caso, a embargante não imputa ao acto tributário qualquer vício que o possa afectar de nulidade ou inexistência jurídica.
O fundamento invocado – a prescrição da liquidação –, caso subsista, implica simplesmente o vício da violação da lei, o que determina a anulação, e não nulidade, do acto, pelo que não pode servir de fundamento à oposição.
Ainda que se admitisse, por mera hipótese, que a prescrição da liquidação constituiria fundamento da oposição/embargos à execução, a pretensão da embargante também não podia proceder.
Apesar de não se saber a data exacta da liquidação, mas sabemos que em 27/11/2009, a entidade fiscal enviou 5 cartas registadas à ora recorrente para cobrança da contribuição predial urbana (em aditamento resultante do aumento do rendimento colectável no âmbito do contrato do arrendamento) respeitante à fracção autónoma em referência relativo aos anos de 2004 a 2008 (fls. 87 a 91 dos autos).
O que demonstra, sem qualquer margem de dúvida, que a liquidação havia sido já efectuada antes da data da expedição das referidas cartas, pois, como é sabido, a liquidação precede sempre a cobrança, sem a qual nunca pode haver lugar a essa cobrança.
Neste contexto, podemos concluir que a liquidação da contribuição predial urbana em causa, mesmo respeitante ao ano de 2004, foi realizada dentro do prazo prescricional legalmente previsto.
Quanto ao argumento da falta de notificação, também não assiste razão à embargante, ora recorrente.
A sentença recorrida decidiu a questão em causa pela forma seguinte:
“...
   - Da não notificação da embargante para os pagamentos dos acréscimos da contribuição referente aos anos de 2004 a 2008:
    Alega a embargante que nunca foi notificada para o pagamento de qualquer daqueles valores objecto da presente execução.
    Não obstante esse fundamento invocado pela embargante não constitui nenhum dos fundamentos taxativamente previstos no Código das Execuções Fiscais, sendo que, a sua dedução, em regra, não é passível nos processos de oposição à execução fiscal. Todavia, devido a que os actos tributários só geram a sua eficácia após as respectivas notificações, tem-se entendido que a não eficácia do acto, em virtude de não notificação, pode ser apreciado mesmo na fase de oposição.
    Antes de mais, convém analisar o regime de notificação respeitante a matéria fiscal, consagrado no DL n.º 16/84/M, de 24/3.
    Preceitua-se no art.º 1º deste DL que: “Às notificações ou avisos que devam ser efectuados sob registo postal, por virtude do disposto em legislação de natureza fiscal, aplica-se o regime previsto no presente diploma.”
    Prevê, no art.º 3º n.º 1º, que “Os avisos ou notificações deverão ser enviados para a residência indicada pelo contribuinte nas declarações por si apresentadas no âmbito do respectivo imposto ou contribuição.”
    Prevê o art.º 2º do DL n.º 16/84/M o seguinte:
   “1. As notificações ou avisos, referidos no artigo anterior, serão efectuados sem aviso de recepção.
   2. Na emissão de qualquer aviso ou notificação mencionar-se-á no canto superior esquerdo do seu rosto ou do correspondente sobrescrito, o serviço competente, bem como o nome do respectivo funcionário, que assinará estas menções.
   3. As notificações e avisos efectuados nos termos dos números anteriores, presumem-se feitos no quinto dia posterior ao do registo postal, ou no primeiro dia útil seguinte a esse, quando o não seja.
   4. A presunção do número anterior só pode ser ilidida pelo avisado ou notificado quando o facto da recepção do aviso ou notificação ocorra em data posterior à presumida, por razões imputáveis aos serviços postais, para o que aqueles requererão que, à sua custa, seja requisitada aos mesmos serviços informação sobre a data em que foi promovida a entrega.”
    A primeira questão que cumpre responder: será sempre obrigatória uma indicação por parte do contribuinte?
    Entendemos que não. A indicação de uma residência para efeitos fiscais é um ónus para os devedores tributários. Há casos em que os contribuintes nunca indicam uma residência à DSF, e perante este embaraço, a DSF há-de procurar meios adequados para concretizar as notificações a fim de deixar os contribuintes tomar conhecimento das liquidações de imposto (vg. através do local da situação do ímovel).
    Ora, a nosso ver, o citado art.º 3º n.º 1º só constituirá um dever legal para o DSF quando o contribuinte tenha efectivamente indicado uma residência para onde as notificações devam ser dirigidas.
    In casu, as partes aceitam que, à matéria da CPU, a embargante nunca indicou uma residência para o efeito de notificação (cfr. fls. 71 e 77 dos autos).
    Suscita daí outra questão: incumbe à DSF notificar a embargante na morada do imóvel em causa, ou pelo contrário, na sede social da embargante?
    Resulta dos documentos a fls. 44, 87 a 91 dos autos que a DSF enviou as respectivas cartas de notificação ao local da situação do ímovel em questão - Avenida Dr. XX No. XX, XX, XX, Edif. XX1.
   Segundo os documentos juntos pela embargante a fls. 8 a 12 dos autos e a conhecida prática da DSF, é razoável presumir que o local de “Edif. Royal Centre” tinha sido sempre a morada para onde as notificações da DSF foram enviadas.
    Esta opção da DSF afigura-se-nos correcta, já que:
a) É uma opção lógica e habitual que a DSF envie a notificação, no que toca à liquidação da CPU, para o local onde situa o imóvel, quando o proprietário, i.e., o devedor tributário nunca cumpriu o seu ónus de indicação duma residência;
b) No caso vertente, como bem salienta a Digna Magistrada do M.P., o mesmo local funcionou como sede da embargante desde 07/06/1994 até 6/11/2001.
    Na óptica da embargante, na falta de indicação de uma residência fiscal”, os contribuintes têm de ser notificados no seu domicílio legal, no caso, a sede social da embargante (desde 2001) - Rua XX, n.º XX, Edifício XX, Xº Andar X, em Macau (cfr. fls. 19 dos autos).
    Não se assiste razão à embargante, visto que:
1) A embargante nunca indicou uma residência para o efeito da notificação;
2) Assim, não resta outra hipótese senão a de enviar as notificações para o local da situação do imóvel em causa, onde ficava, aliás, a sede da embargante até o ano de 2001;
3) A embargante não informou a DSF da sua mudança da sede social ocorrida em 2001.
   Assim, afigura-se-nos que a DSF não andou mal ao notificar a embargante através do local da situação do imóvel, mesmo após o ano de 2001 (mudança do local da sede da embargante). No fundo, se a embargante pretender que as notificações lhe sejam dirigidas através de determinada morada por ela escolhida (vg. que as notificações a partir de 2001 sejam enviadas para a nova sede), tem que assumir o ónus de o indicar à DSF, nos termos do art.º n.º 3º do DL n.º 16/84/M, e uma vez que não o fez, não andou mal a DSF ao continuar a sua prática de envio das notificações ao local do imóvel.
    Não pode deixar de ser assim. Não tendo cumprido o seu ónus de indicação de residência a que o art.º 3º n.º 1º do DL n.º 16/84/M diz respeito, a embargante não pode agora vir questionar porque é que a DSF não enviou as cartas para a sua nova sede, justamente porque ela própria não tinha assim indicado...”.
Trata-se duma decisão ajuizada e correcta, pelo que é de louvar a sentença recorrida nesta parte, fazendo, com a devia vénia, os fundamentos nela constantes como nossos.
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Tudo visto, resta decidir.
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Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam em negar provimento ao presente recurso jurisdicional, confirmando a sentença recorrida.
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Custas pela embargante, com taxa de justiça de 8UC.
Notifique e registe.
*
RAEM, aos 18 de Outubro de 2012.
Ho Wai Neng
José Cândido de Pinho Estive presente
Lai Kin Hong Mai Man Ieng
1 Como bem nota a Digna Magistrada do M.P. que o edifício “Royal Centre” é conhecido também por “Pou I Centre” – nome romanizado do nome chinês do edifício.
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614/2012