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Processo n.º 778/2011
(Recurso de Decisões Jurisdicionais)

Relator: João Gil de Oliveira
Data : 21/Fevereiro/2013
ASSUNTOS:
    - Erro médico
    - Legitimidade passiva dos médicos em casos de responsabilidade extra-contratual da Administração
    - Depoimento de parte
    - Responsabilidade médica
    - Prova da culpa

SUMÁRIO:
    1. Se os respectivos actos médicos foram praticados pelos recorrentes no local e na hora de trabalho, e no exercício das suas funções, integrando-se a sua actividade numa actividade dispensada pelos Serviços de Saúde, não obstante a Administração responder pelos actos dos seus agentes, configurada pelo lesado uma situação de culpa grave, os médicos demandados e a quem se assaca tal culpa não deixam de ser parte legítima.
    2. Resulta do DL n.º 28/91/M, do artigo 2º e artigo 5º, um regime que realça uma diferença entre as situações de mera culpa ou negligência leve e a culpa grave. Na primeira situação só a Administração se configura como responsável e como tal só ela deverá ser demandada. Já não assim nos casos de culpa grave.
    3. O depoimento de parte é um meio processual (arts. 477º a 489º do CPC) destinado a provocar a confissão judicial, ou seja, o reconhecimento que a parte faz da realidade de um facto que lhe é desfavorável e favorece a parte contrária (art. 345º do CC). Destinando-se o depoimento de parte à obtenção de confissão, tem necessariamente que incidir sobre factos desfavoráveis ao depoente.
    4. Facto pessoal é o facto conhecido pela parte, trate-se de facto por ela própria praticado, ou praticado com a sua intervenção, de acto de terceiro perante ela praticado ou de mero facto ocorrido na sua presença.
    5. O erro médico pode ser definido como a conduta profissional inadequada resultante da utilização de uma técnica médica ou terapêutica incorrectas que se revelam lesivas para a saúde ou vida de um doente.
    6. Pode acontecer que o dano se mostre consequência de um facto que simultaneamente viole uma relação de crédito e um dos chamados direitos absolutos, como o direito à vida ou à integridade física.
    7. Nesses casos, verifica-se, simultaneamente, a violação dum contrato e de um dever geral de conduta. Então há que averiguar se o doente poderá invocar simultaneamente as normas correspondentes à responsabilidade contratual e à responsabilidade aquiliana, consoante lhe sejam mais favoráveis.
    8. Na maior parte dos casos, a responsabilidade do médico, exercendo clínica em regime de profissão liberal, em princípio, é de natureza contratual, sendo tal obrigação de meios e não de resultados.
    9. A responsabilidade do médico, prestando serviço em hospital público, e, bem assim, a do próprio hospital, assume uma natureza extracontratual, por decorrer do exercício da função administrativa que aquele desempenha.
     10. As acções ou omissões de um médico, enquanto agente de actos de gestão pública, serão consideradas ilícitas se violarem normas legais e regulamentares ou princípios gerais e basilares; infringirem regras de ordem técnica; infringirem deveres de prudência comum; devam ser tidas em consideração, isto é, se de tais acções ou omissões resultar uma ofensa de direitos ou interesses legalmente protegidos, designadamente, da saúde ou da vida do doente.
    11. Se num dado caso concreto, ninguém obrigou o A. a realizar a intervenção cirúrgica dos autos, se, não obstante a não realização de alguns exames de rotina que não se mostrariam definitivos e conclusivos quanto à despistagem de cancro, sendo certo que alguns exames igualmente inconclusivos foram feitos em hospital de Hong Kong, se se impunha urgência perante uma suspeita de tumor maligno e perigo de propagação, que o A. estava esclarecido de que só após a realização da cirurgia e da extracção da totalidade do tumor é que poderia formular-se uma conclusão definitiva quanto à existência ou não da sua malignidade, não implicando o direito à informação que o recorrente fosse inteirado de todos os detalhes da abordagem médica e técnica que um leigo não compreende, não fazendo sentido informar da possibilidade de realização de exames que os técnicos consideravam inconclusivos e dispensáveis, juízo esse sufragado por um conjunto de peritos e especialistas, tem-se a extracção de lóbulo pulmonar e alguns nódulos como uma prática médica aceitável.
    12. Se a rotura de vasos quilíferos é um risco de uma intervenção cirúrgica, não se comprovando de qualquer forma, ainda que abstractamente admissível, o nexo causal entre os padecimentos subsequentes, nomeadamente com o enfraquecimento do lesado, o que alegadamente motivou a sua reforma antecipada e as lesões advindas desse risco, não se observam os diferentes pressupostos da responsabilidade civil, referentes à ilicitude, à culpa e ao nexo causal, justificativos da indemnização superior a doze milhões de patacas peticionada nos autos.
    
    Relator,
    João A. G. Gil de Oliveira

Processo n.º 778/2011
(Recurso de Decisões Jurisdicionais)

Data : 21 de Fevereiro de 2013

Recorrentes:
Recursos Principal e Interlocutório
- A

Recurso Interlocutório
- B
- C
- D

Recorridos:
- Os mesmos
- Serviço de Saúde de Macau
    
    ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
    I - RELATÓRIO
1. A, mais bem identificado nos autos, intentou acção para efectivação de responsabilidade civil extracontratual contra B, C, D e os Serviços de Saúde, solicitando que os réus pagassem ao autor a indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais no montante de MOP$12.660.765,30.
A acção veio a ser julgada improcedente.
Vêm os autos a esta Instância, importando conhecer de três recursos; dois interlocutórios e um da sentença proferida a final.

2. Recurso A
Recorrem os três primeiros réus da decisão que os julgou parte legítima, alegando, em síntese conclusiva:
     I. Os recorrentes são médicos do Centro Hospitalar Conde de São Januário, subunidade da 4ª ré.
     II. Os serviços médicos prestados ao autor são actos praticados pelos recorrentes no local e na hora de trabalho, e no exercício das suas funções.
     III. Por isso, os supracitados actos médicos praticados pelos recorrentes devem ser considerados actos funcionais.
     IV. Em caso de actos funcionais praticados pelos trabalhadores dos serviços públicos, mesmo que tais actos causem danos a direitos de terceiros e responsabilidade de indemnização, de acordo com o art.º 2.º do Decreto-Lei n.º 28/91/M, a 4ª ré, ou seja os Serviços de Saúde, deve assumir a obrigação de indemnização.
     V. Os recorrentes entendem que apesar da culpa ou omissão nos respectivos serviços médicos, a Administração Pública e os agentes não assumem responsabilidade comum ou se encontram no mesmo grau.
     VI. Tendo em consideração os artigos 2.º e 3.º do supracitado Decreto-Lei, quanto ao cumprimento da responsabilidade de indemnização, a Administração Pública tem sempre a prioridade para assumir a responsabilidade de indemnização, e depois de cumprimento das obrigações de indemnização, segundo o art.º 5.º do mesmo Decreto-Lei, pode exercer o direito de regresso contra os trabalhadores que praticaram actos ilícitos.
     VII. Nos termos do art.º 5.º do supracitado Decreto-Lei, “quando satisfizerem qualquer indemnização, a Administração do Território e demais pessoas colectivas públicas gozam do direito de regresso contra os titulares do órgão ou agentes culpados, se estes houverem procedido com dolo, ou com negligência e zelo manifestamente inferior àqueles a que se achavam obrigados em razão do cargo.”
     VIII. Porém, não se verificam neste processo os requisitos previstos no artigo anterior, porque a 4ª ré não indicou na sua contestação a culpa ou omissão nos serviços médicos prestados ao autor, nem exerceu o direito de regresso.
     IX. Ao contrário, a 4ª ré disse expressamente na sua contestação que não se verifica culpa ou omissão nos serviços médicos prestados ao autor, e que os actos médicos praticados pelos recorrentes correspondem às devidas regras.
     X. De acordo com a conclusão da investigação feita pelo Centro de Avaliação das Queixas Relativas a Actividades de Prestação de Cuidados de Saúde, subunidade da 4ª ré, “analisando todo o processo de tratamento, o Centro não verifica qualquer erro médico e falha na operação dos dois médicos impugnados do CHCSJ.”
     XI. Desde que a 4ª ré tem prioridade para assumir a responsabilidade de indemnização resultante dos actos ilícitos praticados pelos seus trabalhadores, e disse expressamente que não se verificou qualquer culpa ou omissão nos respectivos actos, os recorrentes não são sujeitos da relação material controvertida nem têm interesse de intervenção, pelo que não possuem legitimidade passiva os recorrentes.
     XII. Por isso, os recorrentes entendem que o tribunal recorrido violou os artigos 3.º e 5.º do Decreto-Lei n.º 28/91/M e art.º 58.º do Código de Processo Civil ao entender que os recorrentes possuem legitimidade e interesse processual.
    
    Pelo exposto, pedem seja julgar procedente o presente recurso e declarado que os recorrentes não possuem legitimidade passiva.
3. Recurso B
3.1. A, notificado do despacho proferido em 8 de Setembro de 2009 e constante das fls. 1107 dos autos, que indeferiu parcialmente o pedido do autor de prestação de depoimento de parte pelos 1º a 3º réus, dele recorre, alegando em síntese:
      a) Interpõe-se recurso da decisão de não admitir o pedido do autor que solicitou o 1º réu a prestar depoimento sobre os quesitos n.º 13 a n.º 18 da base instrutória, porque o 1º réu é médico especialista de pneumologia do CHCSJ e é um dos médicos que acompanharam o caso do autor, pelo que é importante que ele presta depoimento sobre o seu entendimento profissional, e ele deve ter conhecimento dos factos correspondentes. De facto, nos termos do art.º 479.º do Código de Processo Civil, o depoimento só pode ter por objecto factos pessoais ou de que o depoente deva ter conhecimento, porém, não é admissível o depoimento sobre factos criminosos ou torpes, de que a parte seja arguida, não se encontrando disposição expressa de que o depoimento tem que ser desfavorável ao próprio relator.
      b) Interpõe-se recurso da decisão de não admitir o pedido do autor que solicitou o 2º réu a prestar depoimento sobre os quesitos 1º a 5º-a, 7º a 9º, 12º, 12º-a, 13º a 18º, 20º a 27º, 29º, 31º e 32º da base instrutória, porque o supracitado depoimento tem por objecto factos pessoais do depoente e de que deve ter conhecimento segundo os seus conhecimentos profissionais, nomeadamente os quesitos 7º e 8º, apesar de serem palavras do 3º réu, o 2º réu também estava presente e concordava com as palavras do 3º réu, acenando confirmativamente com a cabeça. Por isso, desde que o 3º réu pode prestar depoimento sobre os factos nos quesitos 7º e 8º acima referidos, o 2º réu também pode prestar o seu depoimento.
      c) De acordo com a jurisprudência e a doutrina de Macau, nas actividades médicas, os lesados não são capazes de fazer prova por causa das tecnologias profissionais aplicadas pelos médicos, pelo que nas disputas médicas, cabo aos médicos o ónus probatório. De facto, o supracitado entendimento corresponde completamente ao art.º 486.º, n.º 2 (responsabilidade da presunção de culpa) do Código Civil, e as actividades médicas são perigosas por sua própria natureza e pela natureza dos meios utilizados, pelo que cabe ao agente o ónus probatório.
      d) Além disso, por envolverem instrumentos médicos tais como broncoscópio, e a respectiva operação de excisão ser realizada com apoio de toracoscópio videoassistido, deve-se aplicar o disposto de presunção de culpa; quer dizer, devem os médicos (agentes) fazer prova que não têm culpa.
      e) De facto, nos termos do art.º 479.º do Código de Processo Civil, o depoimento só pode ter por objecto factos pessoais ou de que o depoente deva ter conhecimento, porém, não é admissível o depoimento sobre factos criminosos ou torpes, de que a parte seja arguida, não se encontrando disposição expressa de que o depoimento tem que ser desfavorável ao próprio relator.
      f) Tem-se a mesma razão para interpor recurso da decisão de não admitir o pedido do autor que solicitou o 3º réu a prestar depoimento sobre os quesitos 1º a 5º-a, 9º, 10º, 10º-a, 12º, 12º-a, 13º a 18º, 20º a 27º, 29º, 31º e 32º da base instrutória, não incluindo o conteúdo sobre os quesitos 7º e 8º da base instrutória.
      g) Pelo exposto, o despacho recorrido violou o art.º 479.º do Código de Processo Civil,
     pelo que pede a revogação do despacho.
    
     3.2. A este recurso responderam os Serviços de Saúde de Macau, em síntese:
    1. O A., ora Recorrente, insurge-se contra o despacho do Meritíssimo Juiz do Tribunal Administrativo que decidiu o seu requerimento de depoimento de parte da seguinte forma:
    2. 1° Réu: admitido o depoimento de parte sobre os quesitos 1) a 5-a) e 6 da Base Instrutória; indeferido o depoimento sobre os quesitos 13) a 18).
    3. 2° Réu: admitido o depoimento de parte sobre os quesitos 6), 10), 10-a), 11), 11a), 19), 28) e 30) da Base Instrutória; indeferido o depoimento sobre os quesitos 1) a 5-a), 7) a 9), 12), 12-a), 13) a 18), 20) a 27), 29), 31) e 32).
    4. 3° Réu: admitido o depoimento de parte sobre os quesitos 6), 7), 8), 11), 11-a), 19), 28) e 3 O) da Base Instrutória; indeferido o depoimento sobre os quesitos 1) a 5-a), 9), 10), 10-a), 12), 12-a), 13) a 18), 20) a 27), 29), 31) e 32).
    5. Com o devido respeito por opinião contrária, nada há a apontar à decisão do Meritíssimo Juiz a quo, devendo o presente recurso improceder.
    6. Conforme se refere no douto despacho recorrido, o depoimento de parte só pode ter por objecto factos pessoais ou de que o depoente deva ter conhecimento (cfr. artigo 479°, n.º 1, do CPC).
    7. A função primordial do depoimento de parte é a obtenção de uma confissão do depoente - a qual consiste no "reconhecimento que a parte faz da realidade de um facto que lhe é desfavorável e favorece a parte contrária" (cfr. artigo 345º do Código Civil).
    8. Por esse motivo, não é admissível o depoimento sobre factos criminosos ou torpes, de que a parte seja arguida (cfr. artigo 479º n.º 2 do CPC).
    9. Assim, sempre que o depoimento de parte recaia sobre factos não pessoais ou de que o depoente não deva ter conhecimento - em que, portanto, o objectivo não seja o de extrair uma confissão - o requerimento de parte deve ser indeferido1.
    10. No caso dos autos, porque nem todas as matérias sobre as quais foi requerido o depoimento de parte se continham nos limites definidos pelo artigo 479°, n.º 1, do CPC, o requerimento do A., ora Recorrente, foi apenas parcialmente admitido pelo douto Tribunal a quo, não podendo o A. pretender que o depoimento recaia sobre toda a matéria da Base Instrutória.
    11. Neste contexto, deve o presente recurso ser julgado totalmente improcedente e mantida a decisão a quo em conformidade.

Do depoimento do 1ºRéu
    
    12. Relativamente ao 1° Réu, o A., ora Recorrente, pretende que seja admitido o requerimento de parte sobre os quesitos 13) a 18) da Base Instrutória.
    13. Ora, compulsando os quesitos 13) a 18) da douta Base Instrutória, verifica-se que estes versam sobre matéria de natureza técnica e não sobre factos pessoais do 1º R. ou de que este deva ter conhecimento.
    14. Porque assim é, a R., ora Recorrida, requereu que sobre tal matéria fosse produzida prova pericial (cfr. Perguntas 9 a 16 do Anexo I ao requerimento probatório da R.).
    15. Aliás, em requerimento apresentado ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 499° do CPC, o A., ora Recorrente, pronunciou-se no sentido de que a perícia requerida incidisse sobre a mesma matéria (cfr. ponto 2 do requerimento do A. apresentado em 17.09.2009).
    16. Neste contexto, nem se compreende que o A., ora Recorrente, tenha requerido o depoimento de parte sobre a matéria dos quesitos 13) a 18) e insista nessa pretensão, quando, em momento anterior, a considerou matéria técnica, não factual.

Do depoimento do 2º Réu
    
    17. Relativamente ao 2° Réu, o A., ora Recorrente, pretende que seja admitido o requerimento de parte sobre os quesitos 1) a 5-a), 7) a 9), 12), 12-a), 13) a 18), 20) a 27), 29), 31) e 32) da Base Instrutória.
    18. Os quesitos 1) a 5-a) reportam-se todos a um período temporal anterior a 19 de Novembro de 2005 e, por conseguinte, anterior ao primeiro contacto que o 2° Réu teve com o caso do A., ora Recorrente.
    19. Assim, os factos constantes dos quesitos 1) a 5-a), não sendo factos pessoais do 2º R., também não são factos de que este deva ter conhecimento.
    20. Compulsando os quesitos 7) a 9) da douta Base Instrutória, verifica-se que correspondem a matéria que respeita: ao 3° Réu e não ao 2° Réu [quesito 7) e 8)]; a matéria de natureza técnica [quesito 8), 2ª parte]; e ao próprio A., ora Recorrente [quesito 9)] - i.e., matéria que não versa sobre factos pessoais do 2º R. ou de que este deva ter conhecimento.
    21. ora Recorrida não se opõe a que o 2° Réu deponha sobre os quesitos 12) e 12a), embora entenda que tal não será decisivo para a descoberta da verdade.
    22. Os quesitos 13) e 18), 20) a 27), 29), 31) e 32) versam sobre matéria de natureza técnica e não sobre factos pessoais de qualquer dos Réus nos presentes autos, incluindo do 2° R., ou de que este deva ter conhecimento.
    23. Porque assim é, a R., ora Recorrida, requereu que sobre parte dessa matéria fosse produzida prova pericial (cfr. Perguntas 9 a 16, 17 a 21 e 23 e 24 do Anexo I ao requerimento probatório da R.).
    24. Aliás, em requerimento apresentado ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 499° do CPC, o A., ora Recorrente, pronunciou-se no sentido de que a perícia requerida incidisse sobre a mesma matéria (cfr. ponto 2 do requerimento do A. apresentado em 17.09.2009).
    25. Neste contexto, nem se compreende que o A., ora Recorrente, tenha requerido o depoimento de parte sobre os quesitos 13) e 18), 20) a 27), 29), 31) e 32) e insista nessa pretensão, quando, em momento anterior, a considerou matéria técnica, não factual.

Do depoimento do 3º Réu
    
    26. Relativamente ao 3° Réu, o A., ora Recorrente, pretende que seja admitido o requerimento de parte sobre os quesitos 1) a 5-a), 9), 10), 10-a), 12), 12-a), 13) a 18), 20) a 27), 29), 31) e 32) da Base Instrutória.
    27. Porquanto a pretensão e fundamentos apresentados relativamente ao 3° Réu são semelhantes aos formulados relativamente ao 2° Réu, dão-se aqui por reproduzidas as conclusões relativas ao depoimento do 2° Réu supra, com as necessárias adaptações.
    
    Nestes termos, entende, deve o presente recurso ser julgado improcedente.

4. Recurso C
     4.1. A, o A., inconformado com a sentença que julgou improcedente a acção vem recorrer, alegando em sede de conclusões, o seguinte:
    I. A ilicitude
    1. A ilicitude consiste na violação do direito de outrem ou de uma disposição legal destinada a proteger os seus interesses. 2. Serão também considerados ilícitos os actos jurídicos que violem as normas legais e regulamentares ou os princípios gerais aplicáveis e os actos materiais que infrinjam estas normas e princípios ou ainda as regras de ordem técnica e de prudência comum que devam ser tidas em consideração.
    2. Assim pode-se saber que o médico deve cumprir “artis medis” – indicando que o médico deve tratar o paciente com técnicas mais sólidas, ou seja prestar a assistência médica com qualidade de acordo com o procedimento e regulamento de medicina, combinado com o seu próprio nível de conhecimentos, bem como indicando no momento de tratamento a aplicação da técnica e da forma mais completa, incluindo actos de tratamento prestados a tempo oportuno e conveniente consoante as situações.
    3. A jurisprudência e a doutrina também consideram que estes actos materiais ilícitos são idênticos aos actos ilegais, ou seja, os primeiros abrangem a violação das leis ou dos regulamentos aplicáveis: normas ou princípios, ou actos que violam as regras técnicas ou a prudência devida.
    4. Em palavras simples, se o médico não preste a assistência médica de acordo com as regras gerais de medicina, ou a sua conduta revele a não prudência, verificar-se-ia ilicitude.
    II. Apreciação da culpa
    5. São aplicáveis neste caso os artigos 480, 486, n.ºs 1 e 2, 335, n.º 2, 478, n.º 2, 566 e 788 do Código Civil, bem como as disposições sobre o termo de consentimento de intervenção cirúrgica previstas no DL n.º 111/99/M, A Convenção para a Protecção dos Direitos do Homem e da Dignidade do Ser Humano face às Aplicações da Biologia e da Medicina, e os respectivos dispostos previstos na Lei n.º 17/92/M, “As cláusulas contratuais gerais”.
    6. Apesar disso, nos termos do artigo 486, n.º 2 do Código Civil, há situações em que o lesante no exercício de uma actividade perigosa é obrigatório assumir “a responsabilidade de presunção legal de culpa”.
    7. A responsabilidade da presunção de culpa acima referida “é uma responsabilidade de culpa especial, com a sua especialidade a revelar designadamente no âmbito de distribuição do ónus da prova. Isto quer dizer que a pessoa que fique obrigatória indemnizar deve assumir o ónus da prova para comprovar a sua não culpa. Caso contrário, assumiria consequências jurídicas desfavoráveis.”
    8. Como se sabe, sendo o direito básico ou direito comum de Macau, para além dos casos expressamente previstos na lei, o Código Civil de Macau pode ser aplicável supletivamente nas situações gerais, incluindo o caso de violação de direitos causado pela actividade médica.
    9. Caso as actividades médicas no domínio de gestão pública padeçam de qualquer teor ou factor especial previsto nos artigos 484, 485 e 486 do CCM, aplicar-se-ia de imediato a responsabilidade de presunção de culpa para determinar o responsável.
    10. Nos casos de disputas médicas, os lesados enfrentam o grande número de pessoas profissionais da parte do hospital (que tem muitos médicos). Além disso, as testemunhas dos médicos apresentadas pelo hospital geralmente prestar, intencionalmente ou não, depoimentos que contenham em si imprecisões, fazendo com que as vítimas, mesmo tenham como testemunhas peritos médicos, convidem-nos em vão.
    11. Por isso, vê-se a jurisprudência do Tribunal de Segunda Instância, como segue: “…Mas, de qualquer maneira, basta comprovar a existência de um ou mais erros ou negligência na técnica profissional (com ajuda da técnica de medicina, ou comprovando que o médico não praticou acção que o mesmo deve aplicar outras formas sob as respectivas situações concretas), para conduzir à respectiva responsabilidade. Sem dúvida, o médico possui em si as melhores condições para comprovar a situação acima mencionada, assim é inevitável que existe doutrina que considera que deve ser o médico que assume o ónus da prova. … Assim, em caso de lesão, como por exemplo comprovar a existência de erro culposo de tratamento típico, de acordo com a experiência médica, deve presumir como uma negligência na lei, cabendo ao médico a responsabilidade de apresentar contraprova.” Isso é a jurisprudência tradicional.
    12. A violação de direito causada por “actividades no domínio de gestão pública” ou “actividades médicas” é exemplo típico da violação especial, por isso, a violação de direito causada por “actividades médicas no domínio de gestão pública” é o exemplo mais típico. Com base nisto, deve “presunção de culpa” ser mais aplicável nas actividades médicas da Administração.
    13. O artigo 486, n.º 2 do CCM) não indicar de forma clara quais as actividades de natureza perigosa, pode-se identificá-las de acordo com a sua “natureza” ou a “natureza dos meios utilizados”. São enumeradas as situações a seguir: a perigosidade deriva da natureza dos meios utilizados, tais como tratamentos médicos com raios X, ondas curtas, isto quer dizer que a utilização das máquinas de examinar, endoscópicos, dos aparelhos de ressonância magnética deve ser considerada actividades perigosas, pelo que deve ser aplicável a “presunção de culpa” referido no artigo 486, n.º 2 do CCM.
    14. Em qualquer actividade médica, quando verificar-se perigosidade por sua própria natureza (aplica-se o artigo 486, n.º 2), aplica-se a responsabilidade de “presunção legal de culpa”, cabendo ao lesante o ónus da prova.
    15. Isto quer dizer que para a exclusão da responsabilidade, o lesante é obrigado a provar que empregou todas as providências exigidas pelas circunstâncias com o fim de prevenir danos, caso contrário, presumir-se-ia a culpa daquele.
    16. Além disso, por o mesmo ser obrigado a provar a sua não culpa, a falta da prova faz com que ele assuma consequências jurídicas desfavoráveis e responsabilize-se pela indemnização.
    17. As sentenças de vários processos relativos a acto médico do Supremo Tribunal de Justiça de Portugal (anexo 1) entendem que a transfusão de sangue, as operações cirúrgicas relativas ao abdómen, a doação de sangue, as máquinas de anestesia, os tratamentos médicos com raios X e ondas curtas são actividades perigosas a que se aplica o artigo 493, n.º 2 do CC (ou seja o artigo 486, n.º 2 do CCM), cabendo ao médico provar a não culpa.
    18. Algumas das circunstâncias concretas nesta causa envolvem questões relativas à responsabilidade civil contratual, por exemplo, porque não se realizou “o exame de broncoscopia + exame de biopsia”, a celebração do termo de consentimento de intervenção cirúrgica e o cumprimento das obrigações de notificação, todas as quais que se diz respeito à efectividade do consentimento informado.
    19. Independentemente de a responsabilidade ser contratual ou não, não se exclui a “prudência comum” do acto médico.
    20. Isto quer dizer que mesmo que o Tribunal não acompanhe a aplicação da presunção de responsabilidade acima referida, deveriam os réus assumir a responsabilidade civil por violação ao dever de prudência e cautela.
    III. Vício na apreciação dos factos, ilicitude e culpa concreta, impugnação e análises jurídicas (as alíneas 42 a 556 da motivação)
    21. Nos termos dos artigos 563 e 430 do Código de Processo Civil, o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, nomeadamente o conteúdo dos factos que considera assentes e os que integram a base instrutória indicados no despacho saneador, por serem “factos relevantes”.
    22. Neste processo, o acórdão a quo não deu importância aos factos relevantes acima referidos, até alterou arbitrariamente o objecto destes. O que se revele incompreensível é que o objecto foi alterado para o com conteúdos violadores da razão comum e manifestamente diferentes da opinião e do pensamento do juiz que proferiu despacho saneador.
    23. No acórdão a quo, formou-se conclusão só para parte das questões que devem ser apreciadas. Quanto aos factos tido como provados escolher alguns para formar conclusão, revelando-se incompatíveis entre si as provas nesta. Não se explicou de forma específica os fundamentos de facto e de direito, nem se declarou a posição quanto às questões a ser apreciadas.
    24. Além disso, encontra-se deficiências e confusões no acórdão, sendo a maioria dos factos de que depende errados ou contraditórios entre si.
    25. O Tribunal superior não deve questionar a livre apreciação da prova produzida do Tribunal inferior, no entanto, de acordo com algumas jurisprudências do TSI e TUI: “o erro notório na apreciação da prova existe quando se dão como provados factos incompatíveis entre si, isto é, que o que se teve como provado ou não provado está em desconformidade com o que realmente se provou, ou que se retirou de um facto tido como provado uma conclusão logicamente inaceitável. O erro existe também quando se violam as regras sobre o valor da prova vinculada ou as regras da experiência. E tem de ser um erro ostensivo. Ou mais prosaicamente: “é proibido por lei a livre convicção que viole as regras da experiência.”
    26. Neste processo encontram-se vários erros ostensivos e uma conclusão logicamente inaceitável acima referidos, que se vêem a seguir,
    (1) Exame médico de rotina antes da operação cirúrgica (alíneas 47 a 146 da motivação)
    27. Falta o devido “exame médico de rotina” antes da intervenção cirúrgica. “Não foi feito o relatório patológico”. Sugeriu-se de forma arbitrária que o autor fosse submetido a uma intervenção cirúrgica irreversível, isto é, a excisão do lóbulo pulmonar superior esquerdo. Todo isto constitui de forma suficiente a diagnóstico errado:
    Primeiro, o acórdão a quo reconheceu que “o exame de broncoscopia + exame de biopsia” e “exame de rotina de expectoração” trata-se de exames médicos de rotina devidos antes da operação cirúrgica; também reconheceu que não houve prova de tais exames ser inviáveis ou não efectivos neste caso. No entanto, a ilicitude e culpa dos réus foram excluídas por logo entender-se no acórdão não provada a necessidade dos exames no diagnóstico médico. Isso é difícil de compreender e viola a razão comum;
    Segundo, não se apresentou fundamentos de facto e de direito concretos de porque se substituiu a “viabilidade” exigida pelos exames de rotina para a “necessidade”, ou encontrou-se erro no fundamento de direito usados;
    Terceiro, a “necessidade” considerada pelo Tribunal a quo é ostensivamente errada e não razoável.
    28. A alínea 3 da dúvida provada não foi a verdade. O autor tinha tido nenhuma ideia de que ele iria ser submetido a exame de broncoscopia em 25 de Novembro de 2005, pelas 8h30 de manhã, por o mesmo nunca ter recebido nenhuma comunicação.
    29. No entanto, o Tribunal Colectivo presumiu que o autor sabia claramente o tempo de exame acima referido tomando como fundamento de que o tempo foi escrito no documento de computador prestado pelo 1º arguido e constante de fls. 1376, e que a comunicação foi normalmente realizado pelo secretário, no caso de não conseguir avisar, o secretário informaria o médico, mas no presente caso, o respectivo médico não foi notificado. Presunção essa é demasiado arbitrária.
    30. Em primeiro lugar, o tempo marcado mostrado em tal documento constante de fls. 1376 não revelou o “Book Date” marcado na mesma página. Não se sabe que quando foi escrito no documento o chamado “tempo de exame”.
    31. Segundo, a alínea 4) da Base Instrutória: “o autor não compareceu na hora marcada, nem requereu de forma qualquer a mudança da hora do exame”, esse objecto do facto não foi provado. Deve os réus responsabilizar-se pelo ónus da prova desta dúvida porque com base numa relação de acordo, cabe a parte de réu o ónus da prova nos termos dos artigos 566 e 788 do Código Civil.
    32. De facto, a questão chave é que em 21 de Novembro de 2005 o autor ficou internado no Hospital Conde de S. Januário. Em 25 de Novembro de 2005, pelas 8h00, o autor foi sob anestesia geral para ser submetido a operação cirúrgica.
    33. A data de operação cirúrgica, isto é, 25 de Novembro de 2005 é idêntica à de “exame de broncoscópia”. (Matéria Assente J e T, fls. 944 – “o autor foi internado no hospital em 21 de Novembro de 2005 e foi submetido, em 25 de Novembro de 2005 no bloco operatório de Hospital Conde de S. Januário afecta ao 4º réu, à operação de torascopia vídeo-assistida para a realização da operação de excisão do lóbulo pulmonar superior esquerdo, tendo a intervenção começado às 8h35 de manhã e tendo terminado às 14h05, isto é, durou 5 horas e 30 minutos.”)
    34. Na verdade, o autor não sabia a hora marcada acima referida.
    Fundamentos do diagnóstico errado (as alíneas 57 a 76)
    35. Vê-se a partir das regras da experiência comum, o autor aceitou operação de excisão do lóbulo pulmonar. Se o médico entendesse necessário uns exames antes da operação, por que o autor se recusaria? Caso assim, violar-se-ia a razão comum.
    36. Antes da operação cirúrgica de excisão que tem tanto risco e que é irreversível, devem ser realizados exames de rotina, designadamente: “o exame de broncoscopia + exame de biopsia” e “exame de rotina de expectoração”.
    37. Falta o devido método de diagnóstico.
    38. Antes da operação cirúrgica, invés de formar-se junta médica, sugeriu-se temerariamente que o autor aceitasse a intervenção cirúrgica.
    Pode tomar como referência a contestação de Fong Kin Fou (馮建埠) pontos 42 a 46, nos quais se refere várias vezes que 1º réu nunca sabia que o autor seria submetido a intervenção cirúrgica em 25/11/2005.
    De acordo com o conteúdo dos pontos 38 a 46 da mesma contestação, os 2º e 3º réus não tiveram antes da intervenção nenhuma contacto com o 1º réu para conhecer se a realização de “o exame de broncoscopia + exame de biopsia” foi viável, e discutir a viabilidade ou necessidade da intervenção.
    Os dados no documento de registo da junta médica apresentado pelo Hospital Conde de S. Januário (vd. fls. 150 dos autos) não foram do autor, mas sim dum paciente de sexo masculino que se chama E
    39. Caso entenda-se que os 2º e 3º réus cortaram o nódulos linfático de forma razoável por achar subjectivamente que o cancro tinha proliferado, e considerou a conduta prudente, porque os dois réus não realizaram, antes da intervenção que tem tanto risco e que é irreversível, a broncoscopia+exame de biopsia para verificar se o cancro proliferou para brônquio ou que tipo de cancro foi?!
    40. A dúvida 14-b já provada comprovou a importância do exame de broncoscopia. No entanto, os réus abandonaram verificar o tipo de cancro e o grau de violação deste, o que revelou que aqueles violaram gravemente a obrigação de prudência e responsabilidade do médico.
    41. Além disso, segundo a Matéria Assente D) e F), em 19/11/2005, o 2º réu indicou que “o exame PEC-CT” não é uma forma de detectar com exactidão o cancro, que não se pode recorrer precipitadamente à intervenção cirúrgica.
    42. Facto provado H), em 20/11/2005, a mulher do autor suscitou que a massa do autor foi provavelmente inflamação.
    43. 5-a) que foi parcialmente provado: não se excluiu completamente a possibilidade de tuberculose.
    44. Isso constitui de forma suficiente “o diagnóstico errado”.
    45. Caso não se entendam, de acordo com o n.º 3 (sic.) do artigo 480 do Código Civil, a culpa é apreciada pela diligência de um bom pai de família. De acordo com os factos acima referidos pode-se reconhecer de forma suficiente que os réus padecem de ilicitude e culpa.
    A importância do exame de rotina - Não se substituem mutuamente, quando muito, complementam-se, não havendo entre si diferença absoluta de mérito (alíneas 77 a 93)
    46. A alínea 14-b da dúvida provada: O exame de broncoscopia e biopsia é um exame de rotina feito antes de qualquer operação aos pulmões, para recolher amostras para diagnóstico de casos de doenças brônquicas ou pulmonares impossíveis de diagnosticar ou casos de doenças pulmonares difusas difíceis de diagnosticar, para determinar o tipo de células cancerosas e o próprio tratamento.
    47. A alínea K) da Matéria Assente: antes da intervenção acima referida, não se tinha realizado o exame de broncoscopia + exame de biopsia.
    48. As alíneas 13), 14) e 14-b) das dúvidas provadas: no cancro pulmonar precoce a existência de células cancerosas pode não ser confirmada pelo exame de expectoração. Assim, quando o resultado for negativo, deve proceder-se a exames mais pormenorizados, como broncoscopia + biopsia.
    49. De facto, os três exames acima referidos não se substituem entre si, quando muito, complementam-se, também não há entre si diferença absoluta de mérito, por os três exames terem diferentes sentidos clínicos, tendo os resultados de cada um exame valor de referência. Pode-se saber isso através da regra de experiência, como se refere a seguir:
    50. Além disso, não se provou a conclusão de 14-a) dos factos a ser provados, isto quer dizer que não se exclui completamente a possibilidade de a inflamação do autor poder ser verificada através do exame de broncoscopia e exame de biopsia.
    51. Face ao exposto, a falta de qualquer dos dois exames antes da intervenção cirúrgica faz com que a conduta dos réus constituísse ilicitude e culpa.
    52. É arbitrária, errada, desrazoável e contraditório que o Tribunal a quo afastou a adequação e viabilidade dos exames de rotina tendo como fundamento a falso-negativo e depois a necessidade, fazendo com que o acórdão padecesse do vício (as alíneas 94 a 132)
    53. Como se refere no acórdão a quo (fls. 1440 dos autos): “também se provaram que o “exame de broncoscopia e exame de biopsia” é um dos exames rotinas, não havendo prova de aquele ser inviável ou não efectivo. No entanto, como se referiu anteriormente, verificou-se a situação de falso-negativo.”
    54. Como se refere no 2º parágrafo de fls. 1560 do acórdão de 07/07/2011, apesar de os 2º e 3º réus não ter realizado ao autor “exame de rotina de expectoração” e “exame de broncoscopia e exame de biopsia” antes da realização da operação de excisão do lóbulo pulmonar superior esquerdo, a Matéria Assente já comprovaram que no diagnóstico médico, o exame de rotina de expectoração realizado na fase inicial do cancro de pulmão possivelmente não pode comprovar a existência das células do cancro. Mesmo que o exame de broncoscopia e exame de biopsia fosse exames de rotina antes da intervenção de pulmão, não se provava que tais exames são necessários no diagnóstico médico. Falta a circunstância de que resultou erro ou desvio no juízo de doença pelos primeiros 3 réus.
    55. Do conteúdo acima referido pode-se saber que o Tribunal Colectivo a quo reconheceu que “os exame de rotina de expectoração” e “exame de broncoscopia e exame de biopsia” são exames de rotina antes da intervenção cirúrgica (dúvida provada 14-b2), e que não se encontrou neste processo prova de exame de broncoscopia e exame de biopsia ser inviáveis ou não efectivos. No entanto, substituiu subitamente no acórdão a “viabilidade e adequação” exigida pela Base Instrutória por “necessidade” (o 2º parágrafo de fls. 1560 do acórdão), devendo o autor comprovar que os exames são necessários para que o Tribunal reconhecesse a ilicitude e culpa dos réus. Ao mesmo tempo, o Tribunal abandonou o facto a ser provado 29): é necessária a excisão de 4 nódulos linfáticos do autor, entendendo que a conduta foi “razoável pode ser entendido”, de forma que os réus não padecessem de ilicitude ou culpa. Tendo critérios diferentes na apreciação de “ilicitude e culpa”, tal convicção livre revela-se contraditória em si, proibida pela regra de experiência comum e incompatível com o entendimento e pensamento do juiz HO WAI NENG que proferiu o despacho saneador.
    56. De facto, tal “método de rotina médico” não pode ser excluído ou alterado de forma arbitrária pelo Tribunal usando a convicção livre.
    57. Os réus neste processo violaram manifestamente o mínimo critério do procedimento e regulamento de medicina, isto é, a prudência.
    O ónus da prova de não se realizar exame de broncoscopia + biopsia (as alíneas 133 a 146)
    58. A alínea 4) da Base Instrutória no acórdão: “o autor não compareceu na hora marcada, nem requereu de forma qualquer a mudança da hora do exame?” A resposta desta dúvida: “só se provou que o autor entrou no hospital em 21 de Novembro de 2005 e preparou-se para se submeteu à intervenção cirúrgica. Mas a resposta é apenas uma repetição do conteúdo da alínea T) da Matéria Assente.
    59. De factos, não há prova de o autor ter expressado a vontade de abandonar tal exame.
    60. Faça a favor dar atenção de que a data do exame de broncoscopia + biopsia e a data da intervenção cirúrgica calharam no mesmo dia – 25/11/2005.
    61. Como se refere no anexo da alegação jurídica apresentada pelo autor em 13/05/2001, isto é, “extracto das sentenças relativas a responsabilidade civil dos actos médicos proferidas pelo Supremo Tribunal de Justiça de Portugal”, fls. 12, IV. Em palavras simples, a falta da observação da regra comum e prática devida invoca o funcionamento da presunção de culpa.
    62. Segundo a jurisprudência acima referida, cabe aos 2º e 3º réus o ónus da prova. Não se provaram os 14-a, 15, 16 e 17 dos factos a ser provados. Deve os 2º e 3º réus assumir a consequência jurídica do ónus da prova, isto é, a responsabilidade da indemnização.
    63. Caso assim não se entenda, os 2º e 3º réus ainda devem assumir o ónus da prova de acordo com os dispostos legais a seguir expostos.
    64. Este facto relaciona-se à questão de acordo dos exames, caso entenda-se que o autor tem culpa quanto aos exames, deve aplicar o artigo 566 e artigo 788 do Código Civil.
    65. Segundo as duas normas jurídicas acima referidas, incumbe aos réus a prova, mas de facto estes não a conseguiram.【vide 4 da Base Instrutória, que não foi provado, isto é, os 2º e 3º réus não conseguiram comprovar que o autor tinha renunciado ao exame.】Nestes termos, deve presumir de acordo com a lei que os réus tinham culpa e devem assumir o ónus da prova, de forma que assumam a consequência jurídica do ónus da prova, isto é, a responsabilidade da indemnização.
    (2) Em relação à abordagem conservadora (as alíneas 147 a 220)
    66. Os 2º e 3º réus não escolheram o meio comum geralmente optado por médico com cautela e prudência, isto é, uma abordagem conservadora. Os dados médicos também não foram suficientes para que eles sugerissem de forma arbitrária a “necessidade” de realizar cirurgia (as alíneas 147 a 179)
    67. Não se provou o teor do quesito 11º da Base Instrutória. É evidente que o quesito 11-a) da Base Instrutória não comprovou que os 2º e 3º réus tinham passado ao autor a mensagem nele escrita; isto quer dizer que a dúvida 11-a) comprovou que o respectivo conteúdo só era a intenção ou preferência subjectiva dos réus, mas não comprovou que aqueles a tinham expressado ao autor. Face ao exposto, em relação à informação relevante de “abordagem conservadora”, não se provou, lógica ou racionalmente, que os 2º e 3º réus tinham praticado o respectivo acto e tinham cumprido o devido dever de comunicação.
    68. Segundo os factos provados nos quesitos 6 e 9 da Base Instrutória, considerando a partir da razão comum, se houvesse dois meios para escolher, como seria explicada a sugestão objectiva de “necessidade” que tem tanta exactidão.
    69. A questão chave é o teor do aconselhamento.
    70. De facto, a realização da cirurgia é sugerida activamente pelos réus, o autor não tinha opção.
    71. Nos termos do artigo 480, n.º 2 do Código Civil, a culpa é apreciada pela diligência de um bom pai de família. Sendo médicos especialistas, os 2º e 3º réus não devem deixar o paciente decidir, mas sim que fazer um aconselhamento que se revele mais “normal e seguro” para o paciente.
    72. Por outro lado, o 3º réu já confessou que no caso do autor (confissão do 3º réu, a fls. 1373 a 1375 dos autos), podia ser aplicável a abordagem conservadora, mas ele tinha aconselhado a “necessidade” de o autor se submeter à excisão do lóbulo pulmonar. Assim sendo, a viabilidade da abordagem conservadora comprovou que não se deveu aconselhar o autor a submeter-se, necessariamente, à intervenção cirurgia. Isso é suficiente para provar que os 2º e 3º réus fizeram uma decisão precipitada e errada de aconselhar o autor a “necessidade” de submeter-se a intervenção.
    73. O autor reiterou que a sugestão referida pelos 2º e 3º réus de poder-se aplicar uma abordagem conservadora é outra mentira dos réus após a realização da cirurgia, por desde o dia de sugestão até o momento da cirurgia, nunca se referiu a sugestão.
    74. Pelo que os réus violaram o direito de saber (incluindo a interpretação incompleta) e de consentimento livre do autor.
    75. Antes da intervenção cirúrgica, os 2º e 3º réus não realizaram ao autor exames de rotina, tais como “o exame de broncoscopia + biopsia”, “exame de rotina de expectoração de 3 dias consecutivos” ou outros mais pormenorizados, de forma a verificar se o autor tinha tuberculose, inflamação ou outras doenças pulmonares, ou decretar o tipo do cancro, o grau da violação determinar o meio e âmbito da cirurgia (14-b) da dúvida provada, vide quesitos 14-b) a 17 do relatório de perícia, fls. 1164 dos autos). Os dois aconselharam o autor a submeter-se a intervenção cirúrgica, violando a razão comum, comprovando a falta de cautela e prudência.
    76. De acordo com muitas documentações, incluindo uma editada pelo 2º réu: “ a razão mais comum do resultado de falso positivo de PET-CT trata-se de infecções microbacterianas, infecções fúngicas, a pneumonia bacteriana e sarcoidose. …” De facto, os réus, sem nenhuma patologia de célula ou tecido mostrar o cancro, só tendo como fundamento o exame de PEC-CT, informação de imagem considerada pelos médicos como ter frequentemente resultado de falso positivo, aconselharam a necessidade de o autor submeter-se a cirurgia em que se realizou a excisão “integral do lóbulo pulmonar superior esquerdo” e vários nódulos linfáticos! Conduta essa é incrível.
    77. Se o exame de biopsia percutânea transtorácica tem resultado de falso negativo, será que PEC-CT tem mais resultado de falso positivo?! De facto a questão chave não é falso negativo ou positivo, mas a conclusão de inflamação mostrada no relatório supra referido, além disso, PEC-CT só é imagem. De facto, aquele é o exame de patologia de células e tecidos enquanto este ciência de imagem.
    Sobre o quesito 18º da Base Instrutória – substituir a “suficiente” por “razoável”
    (As alíneas 180 a 187)
    78. O quesito 18º da Base Instrutória, “de acordo com o resultado do exame da biopsia percutânea transtorácica e o do PET CT, foi “suficiente” para diagnosticar cancro pulmonar com elevada probabilidade antes da cirurgia?” No entanto, como se referiu na dúvida 18) do acórdão, “Pese embora o resultado do relatório da biopsia percutânea transtorácica tenha sido negativo, o resultado do PET CT foi positivo, assinalando cancro pelo que tal foi razoável para diagnosticar cancro pulmonar com elevada probabilidade antes da cirurgia.” Isto quer dizer que, para além de a resposta do acórdão em causa às dúvidas desviar-se do objecto substancial destas, o Tribunal Colectivo colocou no facto seu próprio parecer de forma “conclusiva”, violou o princípio da punição das partes, não respeitando o facto relevante apreciado pelo despacho saneador. De facto, a questão chave do quesito 18) da Base Instrutória é que se foi “suficiente” para diagnosticar cancro pulmonar com elevada probabilidade, sendo isso facto relevante do processo, e também facto objectivo. No entanto, o Tribunal Colectivo a quo não tomou partido quanto ao facto. Por isso, o acórdão tem deficiência e reconheceu de forma errada a relevância do facto.
    79. Além disso, no acórdão não se refere os fundamentos de direito e de facto de substituir “suficiente” por “razoável”. A palavra “razoável” só pode provar que a conduta dos réus encontrou-se em conformidade com a sua intenção, sendo a palavra uma apreciação subjectiva pessoal. Por outro lado, “suficiente” indica um estado de suficiência do facto, não podendo as duas palavras ser confundidas, caso contrário, verifica-se vício do erro no reconhecimento do facto do acórdão.
    80. Apesar de o acórdão em causa não ter tomado posição sobre o facto relevante “suficiente”, o Tribunal não conseguiu comprovar que o resultado do exame de biopsia percutânea transtorácica e o de PET-CT foi “suficiente” para diagnosticar cancro pulmonar com elevada probabilidade, caso contrário, o acórdão não substituiu “suficiente” por “razoável”.
    Fundamentos de “não foi suficiente” para diagnosticar cancro pulmonar com elevada probabilidade (as alíneas 188 a 194)
    81. O exame de biopsia percutânea transtorácica a que o autor se submeteu em Hong Kong foi o único “exame patológico dos tecidos e células” antes da cirurgia. Segundo o relatório patológico dos tecidos retirados, tais tecidos tinham inflamação ligeira, sem granulomas or indício de malignas (.. There is congestion and mild inflammatory infiltration but no granulomas or evidence of malignancy.) --- a seguir os tecidos foram diagnosticados: não-específico fibrose, não se verifica indício de cancro ou tuberculose (Non-specific fibrosis … There is no evidence of carcinoma or tuberculosis.)
    82. Segundo o resultado do exame de PET-CT scan: pode ser “tumor de início precoce (provavelmente maligno).
    83. Isto quer dizer que o 1º réu não excluiu a possibilidade de “tuberculose” (5-a da dúvida provada, fls. 1438); os 2º e 3º réus declararam que tinham entendido antes da cirurgia que a doença do autor foi “cancro pulmonar com elevada probabilidade”, quer dizer que estes não excluíram de forma absoluta a possibilidade de inflamação, tuberculose ou outras doenças pulmonares; Face ao exposto, pode-se provar que “não foi suficiente” diagnosticar o cancro pulmonar com elevada probabilidade referida na dúvida 18?
    84. Caso assim não se entenda, deve o acórdão em causa tomar partido sobre a questão da imputação do ónus da prova e explicar concretamente os fundamentos de facto e de direito.
    85. Os réus não aconselharam o autor abordagem conservadora, de acordo com a jurisprudência acima referida, acto esse deve ser considerado que os réus não cumpriram os deveres de cautela e prudência, pelo que eles têm culpa, incumbindo-lhes assim o ónus da prova.
    O ónus da prova da abordagem conservadora (alíneas 195 a 220)
    86. Pode-se saber que os réus não escolheram em primeiro lugar “abordagem conservadora” mesmo que soubessem que esta era o meio comum. De facto, caso se optasse por abordagem conservadora, o autor não precisava de submeter-se a cirurgia nem enfrentava todo o risco trazido por esta. A possibilidade da abordagem conservadora comprova que os réus não deviam aconselhar o autor a submeter-se a cirurgia. Isso é suficiente para comprovar que a sugestão de “necessidade” de submeter-se a cirurgia é precipitada e leviana, e que a defesa dos 2º e 3º réus encontra-se evidentemente incompatível com a sua conduta antes da cirurgia, tendo estes mentido.
    87. Vê-se a jurisprudência do Tribunal de Segunda Instância, como segue: “…Mas, de qualquer maneira, basta comprovar a existência de um ou mais erros ou negligência na técnica profissional (com ajuda da técnica de medicina, ou comprovando que o médico não praticou acção que o mesmo deve aplicar outras formas sob as respectivas situações concretas), para conduzir à respectiva responsabilidade. Sem dúvida, o médico possui em si as melhores condições para comprovar a situação acima mencionada, assim é inevitável que existe doutrina que considera que deve ser o médico que assume o ónus da prova. … Assim, em caso de lesão, como por exemplo comprovar a existência de erro culposo de tratamento típico, de acordo com a experiência médica, deve presumir como uma negligência na lei, cabendo ao médico a responsabilidade de apresentar contraprova.” Isso é a jurisprudência tradicional.
    88. Como se refere em fls. 9, III do “extracto das sentenças relativas a responsabilidade civil dos actos médicos proferidas pelo Supremo Tribunal de Justiça de Portugal”, apresentado pelo autor em 13 de Maio de 2011. Isto quer dizer, o médico deve usar meios ou mais adequados ou comuns mesmo que o resultado obtido seja inferior aos esperados.
    89. Como se refere em fls. 12, IV do “extracto das sentenças relativas a responsabilidade civil dos actos médicos proferidas pelo Supremo Tribunal de Justiça de Portugal”, apresentado pelo autor em 13 de Maio de 2011. Isso quer dizer que a falta da observação da regra comum e prática devida invoque o funcionamento da presunção de culpa. Isso também é a jurisprudência tradicional da presunção da culpa.
    90. Por não se ter provado o teor nos quesitos 11) e 11-a) da Base Instrutória, segundo a jurisprudência acima referida, os 2º e 3º réus devem assumir o ónus da prova. Pelo que, de acordo com a consequência jurídica do ónus da prova na responsabilidade civil, devem os 2º e 3º réus assumir a responsabilidade da indemnização.
    91. Caso assim não se entenda, de acordo com lei vigente, devem os 2º e 3º réus assumir o ónus da prova. Nos termos do artigo 335, n.º 2 do Código Civil, a prova dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito invocado compete àquele contra quem a invocação é feita.
    92. De facto, os dados dos registos médicos deviam ser suficientes e pormenorizados. Deve a parte do hospital escrever nos registos médicos todos os dados médicos do paciente, incluindo o diagnóstico da junta médica e os planos recomendados, para ser os fundamentos no caso da acção. Isso trata-se da obrigação comum da parte do hospital. No caso de não existência dos respectivos dados ou incompleto destes, violar-se-ia as regras médicas. Neste caso, não se encontra tais documentos, até na declaração do consentimento da intervenção cirúrgica não se revelou que os 2º e 3º réus tinham falado sobre abordagem conservadora além da cirurgia; isto quer dizer que antes da cirurgia não se encontrou recomendação pormenor do “plano de tratamento” nos registos médicos do autor, pelo que este não conseguiu citá-los, fazendo com que o seu direito invocado (direito de consentimento livre para decidir) fosse impedido. Pelo que, nos termos do artigo 335, n.º 2 do CC, a prova dos factos impeditivos compete àquele contra quem a invocação é feita, isto é, os 2º e 3º réus assumem o ónus da prova.
    93. Caso assim não se entenda, porque o consentimento ou recusa do tratamento conservadora trata-se dum acordo, isto é, uma relação de contrato, em que se aplica os artigos 566 ou 788 do CC, segundo os quais os réus (lesantes) assumem o ónus da prova. Por isso, no caso de não provado o acordo, devem os 2º e 3º réus assumir consequência jurídica do ónus da prova, isto é, responsabilidade da indemnização.
    (3) Em relação à prática na cirurgia, isto é, quando não se encontrou fundamento de cancro, não se realizou “exame de frozen section” (alíneas 221 a 294)
    94. O Tribunal Colectivo colocou no facto nos quesitos 21 a 24 da Base Instrutória o teor subjectivo e conclusivo, desviando-se completamento do conteúdo substancial da respectiva questão. (alíneas 231 a 235)
    95. O quesito 21) da Base Instrutória: “por a dimensão da massa ser relativamente grande, não é apropriado retirar amostrar através de TTNA (Transtoracic needle aspiration), isso é porque se a respectiva massa rompesse-se durante a recolha, causava no peito esquerdo inflamação ou infecção por propagação dos bacterianos, fazendo com que a situação fosse provavelmente mais grave?”;
    O quesito 22) da Base Instrutória: “também é impossível a excisão da massa através de abertura no pulmão, meio esse vai vazar o ar de forma que nenhum meio suture a incisão?”;
    O quesito 23) da Base Instrutória: dada a dimensão grande do tumor e o seu local, é impossível a excisão parcial do lóbulo pulmonar superior esquerdo, mesmo que seja possível, o resto do lóbulo pulmonar perderia a função?”;
    O quesito 24) da Base Instrutória: “também não é possível a excisão duma parte que só é um pouco maior que a massa, porque isso precisa duma abertura no local, no caso da infecção, a inflamação propagaria, se fosse cancro, as células cancerosas também propagariam?”
    96. Quanto aos 4 quesitos da Base Instrutória, o Tribunal Colectivo em causa só indicou na dúvida 21 que: “não se pode excluir a possibilidade de cancro só através de amostras retiradas por TTNA (Transtoracic needle aspiration)”; Também respondeu simplesmente e por uma só vez às dúvidas 22, 23 e 24, “só se provou que quanto ao caso do autor, dada a grande dimensão do tumor e o local onde o mesmo se encontra, no caso de tratar-se de cancro, é possível que a excisão da parte parcial do lóbulo pulmonar superior esquerdo ou tecido conduza a metástase de cancro.”
    97. De facto, “o exame de frozen section” trata-se dum exame de rotina realizado na operação ao cancro com probabilidade. Desde que seja cancro de pulmão com probabilidade, não se pode excluir a possibilidade de a massa padecer de cancro, mas o Tribunal Colectivo a quo alterou o objecto relevante da respectiva Base Instrutória tendo aquele como fundamento principal.
    98. O ponto-chave do respectivo facto trata-se, sem dúvida, da sua possibilidade. De facto, tais meios médicos profissionais com valor não são arbitrariamente alterados ou excluídos por tribunais em uso da livre convicção.
    99. De facto, invés de “operação de detectar cancro pulmonar” referida pelos 2º e 3º réus após a queixa, eles realizaram “operação radical de cancro pulmonar” (alíneas 25 e 28 do relatório da perícia); tal facto é suficiente para comprovar que os 2º e 3º réus tinham reconhecido que autor tinha cancro pulmonar e que o “cancro pulmonar com elevada probabilidade” referido antes da operação foi uma mentira.
    Erro no reconhecimento da relevância do facto (alíneas 236 a 245)
    100. Se a excisão parcial tenha o risco de propagação do cancro, será que a excisão integral do lóbulo pulmonar superior esquerdo e vários nódulos linfáticos aumenta mais o risco? Que lógica é isso?! Conclusão essa não pode ser admitida pela razão comum; além disso, a questão chave é que não se encontra fundamento de cancro, assim, porque não se realizou o exame de frozen section de acordo com a rotina? Porque excisou vários nódulos linfático?
    101. A livre convicção do Tribunal Colectivo a quo é demasiado arbitrária. Será que a operação radical realizada é 100 por cento segura? Já existe bom exemplo no caso. Se o autor tivesse o cancro pulmonar, as células cancerosas possivelmente propagavam com líquido linfático exsudado.
    102. Pode-se ver o “risco da excisão do lóbulo pulmonar”: “… o vaso turárcico também é a via principal da propagação de tumor e patógenos, pelo que alguns retiram líquido linfático no vaso turárcico de pescoço e peito para examinar celulares de tumor, como o meio importante de diagnóstico e orientação do tratamento e operação. 【causa da doença】(1) quilotórax traumático por causa da operação cirúrgica: o quilotórax é geralmente reportado nas operações ao peito, tais como operação cardíaca, …, excisão do cancro pulmonar, …Isso é principalmente porque o local onde se realize a operação tem relação estreita com os vasos turárcicos, …, a excisão causa facilmente lesão aos mesmos, fazendo com que a via principal ou ramo destes rompessem-se ou tivessem rotura …” Vide o anexo da contestação dos Serviços de Saúde - 【cirurgia ao peito prática(實用外科手術學)】, SOU IENG HENG (蘇應衡), KUOK LAM MAN (郭蘭敏), o 2º parágrafo, 4ª linha e o 3º parágrafo a fls. 379 (ou seja fls. 460 dos autos). Desta forma, pode-se saber que a excisão integral do lóbulo pulmonar causa de forma mais fácil lesão a via principal ou ramo dos vasos turárcicos.
    Sobre o “juízo profissional pessoal”. O registo cirúrgico trata-se do dado objectivo que mais reflecte o pensamento subjectivo (alíneas 246 a 251)
    103. O acórdão formou a conclusão: o decurso da operação deve depender do juízo profissional pessoal do médico aquando da sua realização, devendo ele considerar a possibilidade dos respectivos meios e avaliar o risco da propagação das células. No entanto, não se pode usar isso para negar toda a ilicitude e culpa dos médicos acima referidos.
    104. O registo cirúrgico trata-se do registo do integral decurso da operação, designadamente alguns teores relevantes. Deve o registo ser considerado como melhor reflectir a prática do médico e da operação, e usado para a apreciação objectiva.
    105. O registo do decurso da cirurgia foi escrito pelo 3º réu, em total uma página, cuja parte superior direita se encontra “registo cirúrgica” e “109”. É de crer que o registo reflecte melhor o pensamento do médico que realizou a operação. No entanto, não se encontra no registo conteúdo que se refere ao local da massa nem a “células atípicas”. No registo escreve-se que o 2º réu, notificado do resultado do exame de biopsia percutânea transtorácica, excluiu a possibilidade de cancro (“procedure: Perform True Cut Bispsy with No. 20 needle, no corfirm report of malignanacy. Performa lobectomy of left upper lobe of lung. …”), no entanto, realizou a excisão do integral lóbulo pulmonar superior esquerdo do autor e de vários nódulos linfáticos.
    106. Quando os registos médicos forem incompletos ou incorrectos, pode-se presumir que os meios não registados não foram realizados, e também que o esperado efeito de tratamento não foi alcançado por causa do acto médico inadequado.”
    Sobre “células atípicas” (alíneas 252 a 258)
    107. Foram deduzidas subitamente questões sobre “células atípicas” na parte final do acórdão (7ª linha do último parágrafo de fls. 1560), isso é evidentemente o facto erradamente reconhecido pelo Tribunal Colectivo através da livre convicção.
    108. De facto, o perito patológico que tinha emitido o parecer de “células atípicas” disse em 02/03/2011 no julgamento que através dos tecidos retirados não se pude diagnosticar cancro.
    109. O Tribunal Colectivo excluiu a culpa e ilicitude dos 2º e 3º réus de não ter realizado o exame de rotina de “frozen section” tendo primeiro como fundamento “com medo da propagação do cancro”, e logo “a existência de células atípicas”. Mas o Tribunal não atendeu às circunstâncias concretas do caso, fazendo com que existisse a incompatibilidade entre o acórdão e a razão. De facto, tais circunstâncias só podem comprovar que os 2º e 3º réus tinham reconhecidos que o autor tinha cancro pulmonar; pelo que deve provar-se o quesito 19 da Base Instrutória.
    O quesito 25 da Base Instrutória – falta fundamento de direito de “todas as sintomas (alíneas 259 a 274)
    110. Todos os exames de rotina antes da cirurgia trata-se de “exame patológico das células e tecidos”, a falta destes representa que o relatório patológico antes da operação não foi completo e suficiente. Nestas circunstâncias, provou-se que a alínea 25ª da dúvida provada: “provou-se que --- a exclusão da possibilidade do cancro pulmonar precisa da excisão do tumor para ser examinado, por todas as sintomas fazem com que a suspeita mais forte recaía sobre cancro de pulmão” é ilógica.
    111. Quer dizer que a chamada “todas as sintomas” não é suportada por qualquer dado subjectivo, sendo ela a reflexão subjectiva dos 2º e 3º réus.
    112. Além disso, este caso trata-se do conhecimento profissionalmente médico, é de crer que cada ciência tem o seu princípio e rotina, que deve ser observada. Deve realizar-se todos os exames de rotina acima referidos antes da operação com tanto risco e irreversível, para que os dados no relatório patológico sejam suficientes para ser analisados. De facto, sem tais exames, como podem os réus realizar “integral consideração e apreciação”?!
    113. Pelo que o Tribunal Colectivo não deve, baseando-se no seu conhecimento limitado, excluir a ilicitude dos réus, sendo o entendimento demasiado arbitrário e não acompanhado pela regra da experiência.
    Quesito 26) da Base Instrutória – erro no reconhecimento do facto (alíneas 275 a 294)
    114. Quando ainda não foi apurada a possibilidade de realização na operação de mais exame de biopsia percutânea transtorácica à massa que se encontrou no lóbulo pulmonar superior esquerdo e da excisão parcial do lóbulo pulmonar (quesitos 21 a 24 da Base Instrutória e 21ª a 24ª dúvidas); isto quer dizer que não se provou a impossibilidade da respectiva realização, o Tribunal Colectivo formou a conclusão de que a realização do exame de biopsia e da recolha das amostras “só” é possível após a excisão de integral lóbulo pulmonar superior (26ª dúvida); conclusão tão arbitrária é proibida pelo tanto direito como razão, e não admitido pelo auto. Pelo que 26ª dúvida não deve ser provada.
    (4) Sobre a excisão, sem fundamento de cancro e consentimento do autor, de vários nódulos linfático dele (6 segundo o perito), a qual causou dano e fez com que o autor assumisse o risco que não devia assumir:
    1. O Tribunal Colectivo reconheceu erradamente o objectivo da excisão dos nódulos linfáticos (quesito 28 da Base Instrutória).
    2. Não tomou partido sobre o quesito 29) da Base Instrutória: “é necessária a excisão de 4 nódulos linfáticos do autor?”;
    3.Não explicou os fundamentos de direito e de facto do acórdão em que a “necessidade” foi substituída por “ razoável e compreensível”;
    4. O Tribunal Colectivo substituiu a “necessidade” exigida no quesito 29) da Base Instrutória por “razoável e compreensível”, de forma que excluísse a ilicitude e culpa dos réus. No entanto, substituiu “adequação e viabilidade” exigidas pelos exames de rotina devidos antes da operação e referidos nos quesitos 14-a), 15) a 17) da Base Instrutória por “necessidade”, de forma que excluísse também a ilicitude e culpa dos réus. Os critérios e exigências revelam-se evidentemente incompatíveis, desrazoáveis e injustos, sendo difíceis para entender. Pelo que deve o Tribunal Colectivo explicou de forma pormenor os fundamentos de facto e de direito.
    Sobre o quesito 28) da Base Instrutória – erro no reconhecimento do objectivo da prática (alíneas 295 a 206)
    115. Em relação ao quesito 28) da Base Instrutória: “a excisão realizada pelos 2º e 3º réus de 4 nódulos linfáticos encontrados à esquerda do brônquio do autor trata-se de dissecção linfática para examinar se o cancro propagasse?” O acórdão entende: “só se provou que durante a operação não se pôde excluir a possibilidade do cancro pulmonar, pelo que os 2º e 3º réus procederam à excisão de 4 nódulos linfáticos encontrados à esquerda do brônquio do autor, para evitar a propagação do cancro, uma vez decretado.” (segundo o perito, 6 nódulos linfáticos foram excisados)
    116. Como se refere na última página de fls. 1560 do acórdão:”…; os 2º e 3º réus procederam à excisão de 4 nódulos linfáticos encontrados à esquerda do brônquio do autor, para evitar a propagação do cancro, uma vez decretado.”
    117. De facto, o 3º réu confessou no julgamento de 01/03/2011 (o presidente do Tribunal Colectivo mandou registar a confissão no processo, a fls. 1373 a 1375 nos autos): a excisão dos nódulos linfáticos visa a exame de biopsia para verificar a propagação ou não de cancro, mas não a impedimento da propagação. Isso pode comprovar que o Tribunal Colectivo padece do erro no reconhecimento do objectivo da respectiva prática, assim sendo, o fundamento do Tribunal revela-se evidentemente incompatível com o acórdão.
    118. Face ao exposto, prova-se o quesito 28) da Base Instrutória.
    119. O Tribunal Colectivo padece do erro no reconhecimento do objectivo da respectiva prática, e ignorou ou evitou o facto de os réus procederam à excisão dos nódulos linfáticos sem necessidade, prática que causou que o autor assumiu riscos desnecessários. O conceito médico não pode ser interpretado arbitrariamente por tribunal.
    Sobre o quesito 29 da Base Instrutória (alíneas 307 a 319) “Não respondeu a que foi perguntado” ou colocar parecer subjectivo “conclusivo”
    120. O quesito 29 da Base Instrutória: “foi necessário que os 2º e 3º réus procederam à excisão dos 4 nódulos linfáticos o autor?” No entanto, na 29ª) dúvida do acórdão refere-se que “só se provou que a prática dos 2º e 3º réus da excisão de 4 nódulos linfáticos foi “razoável e compreensível.” Quer dizer que para além de a resposta do acórdão em causa às dúvidas desviar-se do objecto substancial destas, o Tribunal Colectivo colocou no facto seu próprio parecer de forma “conclusiva”, causando que o acórdão padece do erro no reconhecimento do facto e deficiência.
    121. No indeferimento da reclamação contra a alínea 32) do relatório da perícia médica (fs. 1165 dos autos), o Tribunal indicando de forma clara o juiz que “a questão chave” é que se foi “necessidade” a excisão dos nódulos linfáticos; quer dizer que segundo o juiz, se não fosse necessidade, a excisão de qualquer número de nódulo linfático era ilícita e culposa.
    122. No entanto, o Tribunal deixou da apreciação e avaliação da necessidade com base de “razoável e compreensível”, de forma que excluísse a ilicitude e culpa dos réus.
    123. O Tribunal Colectivo tem contradição na sua lógica e interpretação, e padece do vício na presunção da apreciação do facto.
    124. Não se apresentou fundamento de facto e de direito de “razoável e compreensível” acima referido. Também não se explicou de forma pormenor os fundamentos de facto e de direito de substituir “necessidade” por “razão e compreensível”.
    125. Por outro lado, o Tribunal Colectivo entende “razoável e compreensível” o acto da excisão de vários nódulos linfáticos do autor praticado pelos 2º e 3º réus. De facto, as palavras “razoável e compreensível” só pode provar que “a prática dos réus revela-se compatível com a sua intenção”, nesta forma, deve verificar-se outro “requisito importante”, isto é, os 2º e 3º réus muito acreditaram e entenderam que o autor tinha cancro pulmonar, pelo que procederam à excisão dos nódulos linfáticos, caso contrário, a prática era desrazoável e incompreensível.
    126. Sendo assim, deve ser provado o quesito 19) da Base Instrutória. De facto, deve avaliar a intenção mostrada no quesito 19) da Base Instrutória considerando a conclusão dos quesitos 21) a 29) da Base Instrutória.
    127. Por isso, o Exmo. Juiz HO WAI NENG que proferiu o despacho saneador usou “necessidade” (quesito 29) da Base Instrutória --- fls. 948 dos autos) considerando de forma profissional, prudente e legal. De facto, “razoável e compreensível” trata-se duma apreciação subjectiva, enquanto “necessidade” um estado necessário do determinado facto, não podendo os dois ser confundidos. O caso trata-se da violação ao direito do bem jurídico pessoal, cuja disputa é que se o autor “necessariamente” assumir o risco cirúrgico trazido pela excisão dos nódulos linfáticos.
    Fundamento da “desnecessidade” da excisão dos nódulos linfáticos (alíneas 320 a 327)
    128. Em relação ao entendimento médico sobre a “desnecessidade” da excisão dos nódulos linfáticos, pode-se ver outra documentação da Sociedade Chinesa de Cirurgia Torácica e Cardiovascular (Chinese Society for Thoracic and Cardiovascular Surgery), constante de fls. 1020 a 1028 dos autos, que se chama “meio da dissecção do linfonodo mediastinal do cancro de pulmão de células não pequenas e aplicação do guia do exame do linfonodo sentinela”, fls. 4, 2º parágrafo: “aplicação no tratamento de cancro --- … a maioria dos estudiosos ocidentais entende que o objectivo de conhecer a situação de transferência dos nódulos linfáticos antes de operação é conhecer a fase de cancro para determinar o tratamento, tendo a dissecção linfática não muito valor quanto ao tratamento.”
    129. O exame de PET-CT trata-se do meio referido na documentação anterior: “o objectivo de conhecer a situação de transferência dos nódulos linfáticos antes de operação é conhecer a fase de cancro para determinar o tratamento” a que o autor se submeteu em Hong Kong às suas próprias custas.
    130. No entanto, da imagem e do relatório do exame de PET-CT não resulta nenhuma situação anormal encontrada nos nódulos linfáticos, desta forma, porque os 2º e 3º réus procederam à excisão destes?
    131. Mesmo que fosse o cancro, a excisão dos nódulos linfáticos não seria absolutamente necessária, para não falar que não se provou a existência de cancro no caso. Quer dizer que os 2º e 3º réus procederam à excisão de 4 nódulos linfáticos localizados à esquerda do brônquio do autor sem nenhuma necessidade (segundo o perito o número dos nódulos cortados foram 6).
    132. Assim foi causada a rotura de vasos quilíferos do autor que provocou complicações pós-operatórias de quilotórax.
    133. A alínea 32) do relatório da perícia médica: “o dano do vaso quilífero causa as complicações pós-operatórias de quilotórax… a operação de excisão do lóbulo pulmonar precisa duma ampla dissecção linfática, de forma que danifique vasos torácicos ou os seus pequenos ramos; alguns nódulos linfáticos são ligados aos vasos torácicos, a dissecção daqueles provavelmente causa vazamento do líquido linfático dos vasos linfáticos relativamente grandes ligados aos vasos torácicos, de forma que provoque tais complicações pós-operatórias.
    134. Isto quer dizer que todo o teor acima referido comprova que não só a excisão do integral lóbulo pulmonar causa dano ao vaso torácico ou os seus ramos, a excisão dos nódulos linfáticos causa dano aos mesmos de forma mais fácil, provocando também quilotórax. Assim sendo, porque os 2º e 3º réus determinaram o autor a assumir tal risco cirúrgico desnecessário e previsível?!
    Revela-se incompatibilidade entre o acórdão do Tribunal Colectivo e o entendimento médico do “exame de rotina de frozen section” (alíneas 328 a 354)
    135. O Tribunal Colectivo a quo reconheceu que “os exame de rotina de expectoração” e “exame de broncoscópia e exame de biopsia” são exames de rotina antes da intervenção cirúrgica (dúvida provada 14-b), e que não se encontrou neste processo prova de exame de broncoscópia e exame de biopsia ser inviáveis ou não efectivos (5ª parágrafo de fls. 1440). No entanto, substituiu subitamente no acórdão a “viabilidade e adequação” exigida pela Base Instrutória por “necessidade”, devendo o autor comprovar que os exames são necessários para que o Tribunal reconhecesse a ilicitude e culpa dos réus. Ao mesmo tempo, o Tribunal abandonou o facto a ser provado 29): é necessária a excisão de 4 nódulos linfáticos do autor, entendendo que a conduta foi “razoável pode ser entendido”, de forma que os réus não padecessem de ilicitude ou culpa. Tendo critérios diferentes na apreciação de “ilicitude e culpa”, tal convicção livre revela-se contraditória em si, proibida pela regra de experiência comum e incompatível com o entendimento e pensamento do juiz HO WAI NENG que proferiu o despacho saneador.
    136. Segundo a razão comum, quando não há cancro, não é necessário nem deve proceder-se a excisão de qualquer nódulo linfático. Também não devem os réu ignorar o risco causado ao paciente pela excisão só por causa do medo da propagação, isso deve ser considerado desrazoável e incompreensível, caso contrário, qual é o uso das regras médicas?
    137. Mesmo que a suspeita do cancro fosse forte, este não era certo. Pelo que deveu realizar-se o exame de frozen section para a verificação.
    138. Segundo o acórdão, fls. 1440, 3º parágrafo: “além disso, provou-se que antes da cirurgia, os dois réus analisaram o relatório de biopsia percutânea transtorácica assistido pelo TCA e o relatório de PET-CT, e a suspeita mais forte recaía sobre cancro de pulmão.)
    139. No entanto, deve-se saber que aquele exame trata-se do exame patológico das células e tecidos enquanto este trata-se duma ciência de imagem.
    140. Os 2º e 3º réus têm declarado que a suspeita mais forte recaía sobre cancro de pulmão por causa dos relatórios do exame de biopsia percutânea transtorácica e PET-CT. No entanto, o exame de biopsia percutânea transtorácica mostrou a inflamação mas não cancro; o relatório de PET-CT nunca mostrou nenhum objecto estranho nos nódulos linfáticos do autor.
    141. As palavras “razoável e compreensível” devem preencher um requisito, isto é, os 2º e 3º réus muito acreditaram e entenderam que o autor tinha cancro pulmonar, pelo que procederam à excisão dos nódulos linfáticos, caso contrário, não violava-se a lógica.
    142. A análise acima referida do Tribunal é logicamente inaceitável.
    143. A decisão excessiva (cortar nódulos linfático na intervenção) e a decisão arbitrária (não realizar-se exames de rotina antes da intervenção) mostram que a conduta dos réus e a sua alegação relevam-se contraditórias, isso é logicamente inaceitável e injusto.
    144. O Tribunal Colectivo entende que os réus não têm omissão, mas sim acto positivo, pelo que entende que eles não tinham ilicitude nem culpa, ignorando o “acto precipitado” ou “acto excessivo”, quer dizer o risco físico e mental trazido ao autor pela expansão da operação sem nenhuma necessidade. De facto o Tribunal Colectivo a quo reconheceu que a rotura de vasos quilíferos trata-se do risco previsível da respectivo operação, mas ignorou a apreciação da ilicitude e culpa do “acto precipitada” e “acto excessivo”, sendo este acórdão injusto.
    145. É logicamente inaceitável que não se provou o quesito 29) da Base Instrutória: “foi necessária a excisão dos 4 nódulos linfáticos do autor?”; isto quer dizer que tal prática não foi provada necessária ou o Tribunal também duvidou a necessidade da prática, caso contrário, o mesmo deve ser descrito como provado no acórdão, mas não que explicado por “razoabilidade” e “compreensível”.
    146. Face ao exposto, o acórdão do Tribunal Colectivo padece de deficiência e erro no reconhecimento dos factos, revelando-se incompatibilidade entre os fundamentos do acórdão e seu entendimento.
    O ónus da prova do acto na cirurgia (alíneas 355 a 371)
    147. Em relação ao ónus da prova do acto na cirurgia, nos termos do artigo 486 do CC, é ao lesante que cabe “a responsabilidade de presunção legal de culpa”, isto quer dizer que a pessoa que fique obrigatória indemnizar deve assumir o ónus da prova para comprovar a sua não culpa. Caso contrário, assumiria consequências jurídicas desfavoráveis.
    148. Quando verificar-se nos tratamentos médicos “actividades de natureza perigosa”, deve nos termos do artigo 486, n.º 2 do CC aplicar-se “presunção legal de culpa”, cabendo ao lesante o ónus da prova, isto quer dizer que para a exclusão da responsabilidade, o lesante é obrigado a provar que empregou todas as providências exigidas pelas circunstâncias com o fim de prevenir danos, caso contrário, presumir-se-ia a culpa daquele; além disso, por o mesmo ser obrigado a provar a sua não culpa, a falta da prova faz com que ele assuma consequências jurídicas desfavoráveis e responsabilize-se pela indemnização.
    149. As operações cirúrgicas que envolvam a abertura do abdómen trata-se de “actividades perigosas”.
    150. De facto, neste caso realizou-se a cirurgia torácica vídeo-assistida. Pelo que devem os réus 2º e 3º, com o fim de ficar exonerado de responsabilidade, e provar que estavam sem culpa na realização da operação cirúrgica.
    151. Caso assim não se entenda, os 2º e 3º réus não procederam ao exame de frozen section, mas consideraram precipitadamente que o autor tinha cancro pulmonar, de forma que procedessem à excisão dos nódulos linfáticos sem fundamento de cancro só para examinar se o cancro propagou, pelo que devem os dois assumir o ónus da prova.
    152. Nestes termos, dado que não se provou os quesitos 19) e 20) da Base Instrutória, que a necessidade referida no quesito 29) não se provou e que os quesitos 30) a 32) não foram provados, os 2º e 3º réus tinham culpa e devem assumir o ónus da prova. Pelo que os 2º, 3º e 4º réus assumem a consequência jurídica do ónus da prova, isto é, a responsabilidade da indemnização por dano causado ao autor pela operação.
    (5) “Dever de comunicação (dever de esclarecimento)” e “direito de consentimento livre” (alíneas 372 a 441)
    A assinatura da declaração do consentimento da operação não equivale ao cumprimento das obrigações; não respondeu ao que foi perguntado; só repetiu o facto no T) da Matéria Assente; deve comprovar que só o autor assinou o acordo. (alíneas 372 a 380)
    153. Violação ao “dever de comunicação (dever de esclarecimento)” indica que os 2º e 3º réus não notificaram de forma expressa ao autor o âmbito da operação, o seu risco e as complicações pós-operatórias, violando entanto o direito de saber do autor (esclarecimento não completo é uma das violações) e o “direito de consentimento livre” sobre a saúde física.
    154. A 12ª dúvida já provada: “só se provou que o autor assinou o consentimento a fls. 438.” Quer dizer que não se provou o quesito 12) da Base Instrutória: “antes da operação, o autor e a sua mulher foram notificados de forma expressa do conteúdo concreto da operação e o seu decurso, risco e complicações pós-operatórias?”
    155. O quesito 12) da Base Instrutória não se provou, e a 12-a) da dúvida foi parcialmente provada, mas não foi provado o quesito 12-a) da Base Instrutória: “… e ele (o autor) também sabia que o tumor é benigno…”; isto quer dizer que antes da operação, não se provou que “o autor e a sua mulher foram notificados de forma expressa do conteúdo concreto da operação e o seu decurso, risco e complicações pós-operatórias”, nem que “o autor também sabia que mesmo que o tumor fosse benigno, devia proceder-se a excisão para analisá-lo”.
    156. A assinatura do consentimento da operação não representou que os 2º e 3º réus tinham cumprido o dever de comunicação (esclarecimento) obrigatório aos médicos, só significou a repetição da alínea T) da Matéria Assente; caso contrário, deveria ser provado o teor da Base Instrutória no acórdão. Quer dizer que não se excluiria a responsabilidade do médico se ele não tenha procedido o esclarecimento claro, mesmo que o paciente tenha assinado a declaração do consentimento da operação.
    157. No entanto, o acórdão a quo tomou como fundamento a expressão “só se provou que o autor tinha assinado o termo de consentimento a fls. 438”, ignorando plenamente o teor substancial do problema. O acórdão também não tomou partido sobre se os 2º e 3º réus violaram o dever de comunicação. Pelo que o acórdão padece da deficiência.
    158. A falta da posição sobre o teor acima referido constitui vício no reconhecimento dos factos, por estes tratam-se de factos relevantes para apreciação de ilicitude e culpa. Se o Tribunal Colectivo a quo desse mais importância aos mesmos, existiria outra versão da decisão deste caso.
    159. Mesmo que se entenda não provados os factos, estes referiam-se à questão de imputação do ónus da prova, deve o Tribunal Colectivo tomar partido sobre isso e esclarecer pormenorizadamente os fundamentos de facto e de direito.
    Impugnação contra as alíneas 10-a) e 12-a) da dúvida (alíneas 381 a 400)
    160. Além disso, o autor não concorda com os factos nas alíneas 10-a) e 12-a) da dúvida. De facto, o autor concordou com a realização da operação sem escolha,
    - o autor entregou ao 2º réu em 19/11/2005 os dados dos exames de biopsia percutânea transtorácica e de PEC-CT aos quais o autor se submeteu em Hong Kong às suas próprias custas para que ele analisá-los. Altura em que o 2º réu concordou com o que disse o médico de Hong Kong, isto é, o exame de PEC-CT não é uma forma de detectar com exactidão o cancro, sendo utilizado para verificar se o cancro, caso detectado, propague ou não. O 2º réu mais disse que não se deveu realizar precipitadamente a operação e que se não havia cancro, ele não procedeu à cirurgia de forma leviana.
    - No dia seguinte, isto é, 20/11/2005, à tarde, os 2º e 3º réus requereram um encontro com o autor e a sua esposa e disseram que o autor tinha cancro pulmonar. Naquele tempo (20/11/2005, às 4h00 da tarde), os 2º e 3º réus manifestaram ao mesmo tempo a “necessidade” de o autor submeter-se à operação de excisão “integral do lóbulo pulmonar superior esquerdo”. (confissão do 3º réu, constante de fls. 1373 a 1375 dos autos; as alíneas 6 e 9 das dúvidas parcialmente provadas)
    - Naquele tempo, a esposa do autor duvidou que no dia anterior, quer dizer 19/11/2005, o 2º réu tinha dito que o exame de PEC-CT não é uma forma de detectar com exactidão o cancro, sendo utilizado para verificar se o cancro, caso detectado, propague ou não, que não deveu proceder a cirurgia de forma precipitada e que ele não procedeu à operação de forma leviana se não houvesse cancro; no entanto, porque é que no dia a seguir (20/11/2005) indicaram a “necessidade” de o autor submeter-se a cirurgia de excisão “integral do lóbulo pulmonar superior esquerdo” e qual foi o fundamento de cancro? Perguntados pela esposa do autor, os 2º e 3º réus indicaram que após a análise, excluiu-se a possibilidade de “inflamação” e de “benigno”, pelo que entenderam que o autor tinha cancro.
    - Naquele tempo o autor foi requerido para entrar no hospital no dia seguinte, quer dizer 21/11/2005, para submeter-se à operação da excisão em 25/11/2005, às 8h00 de manhã. (alínea T da Matéria Assente)
    - O autor submeteu-se à operação da excisão na hora acima referida. (alínea J da Matéria Assente)
    - No entanto, o autor e a sua mulher concordaram com a realização da excisão com base em que os 2º e 3º réus tinham indicado que a massa encontrada no lóbulo pulmonar superior esquerdo do autor foi cancro, e que acreditaram nas palavras dos réus, isto é, tinha se excluído a possibilidade de “inflamação” e “benigno”; quer dizer que se o fim da operação só fosse o exame ou diagnóstico, o autor e sua esposa nunca concordavam com a realização. Isso é porque se não fosse cancro, não havia naquele tempo “necessidade e urgência”.
    - De facto, pode-se ver a alínea 12-a) da dúvida parcialmente provada, que não inclui o quesito 12-a) da Base Instrutória: “… e ele (o autor) também sabia que o tumor é benigno…”; isto quer dizer que antes da operação, não se provou que “o autor também sabia que mesmo que o tumor fosse benigno, devia proceder-se a excisão para analisá-lo”.
    161. Quer dizer que o autor concordou com a realização da cirurgia por causa do cancro. Quer dizer que os 2º e 3º nunca referiram, de 20/11/2005 a data da operação, o teor das alíneas 10-a a 12-a das dúvidas, porque já disseram naquele tempo que o autor tinha cancro. Caso contrário, revela-se incompatível com o quesito F) da Base Instrutória.
    162. Os 2º e 3º réus nunca cumpriram o dever referido no artigo 5 do DL n.º 111/99/M ou no artigo 5 da Lei n.º17/92/M, sendo isso a razão principal da intenção desta acção. Porque caso os réus pudessem esclarecer de forma expressa, o autor não submetia-se à operação.
    163. Além disso, segundo a alínea 12 da dúvida provada: “só se provou que o autor assinou o termo de consentimento a fls. 438.” No entanto, o autor concordava com a excisão do lóbulo pulmonar superior esquerdo apenas quando detectasse cancro. Pelo que o Tribunal não pode entender que o autor também concordou com a excisão de nódulos linfáticos. Isso não se trata duma questão de razoável ou não, mas sim que o autor goza do direito de consentimento livre sobre a sua saúde e o risco a ser assumido.
    164. O direito de consentimento livre sobre a saúde trata-se do direito básico legalmente fixado que é estabelecido e protegido por lei da RAEM (artigos 1 a 5 do DL n.º 111/99/M), sendo o direito absolutamente inviolável, salvo a existência do perigo para a vida indicado no artigo 150 do CP, o qual não se encontra aqui neste caso. Pelo que o “direito de autodeterminação” não é privado por qualquer pessoa, incluindo tribunal, tomando como fundamento a “razoabilidade” da livre convicção.
    165. Face ao exposto, o acórdão em causa padece da deficiência e erro no reconhecimento do facto, e revela-se em si evidentes contradições.
    O ónus da prova da obrigação de comunicação (dever de esclarecimento)” e do “direito de consentimento livre” (Alíneas 411 a 441)
    166. Caso assim não se entendam, deve o acórdão em causa tomar partido sobre a questão da imputação do ónus da prova e explicar concretamente os fundamentos de facto e de direito; ou segundo a jurisprudência tradicional e as dispostos legais concretas, incumbe aos 2º e 3º réus o ónus da prova.
    167. “O dever de comunicação” é uma responsabilidade geral da parte médica, e uma atitude e obrigação que um médico com prudência e cautelar deve ter; de facto, em relação à parte de paciente, o teor acima referido trata-se do “direito de consentimento livre”, sendo isto um direito básico da parte de paciente que deve ser plenamente respeitado pela parte médica. O “direito de consentimento livre” também é um requisito legal da efectividade do consentimento informado, designadamente no que diz respeito a operação cirúrgica. (o artigo 11, alínea 2) da Lei n.º 10/2010 (Regime da carreira médica))
    168. Cabe aos devedores provar o cumprimento ou não do dever de comunicação.
    169. Pelo que os 2º e 3º réus devem assumir o ónus da prova das alíneas 12 e 12 a) das dúvidas. No caso de não provado, presume-se o não cumprimento do respectivo dever, de forma que os réus assumam as consequências jurídicas – a indemnização.
    170. O termo de consentimento da intervenção cirúrgica deve ser considerada uma forma de “contracto”, também “contracto apensado” e “contracto formato”, sendo as cláusulas consideradas “cláusulas contratuais gerais”. Pelo que o conteúdo concreto desta declaração deve seguir os dispostos na Lei n.º 17/92/M (cláusulas contratuais gerais), incluindo o artigo 5, n.º 3.
    171. Dos artigos 3 e 5 do DL n.º 111/99/M e artigos 5, 6, 8, 9, 12, 13 e 14 da Lei n.º 17/92/M resulta que incumbe aos réus o ónus da prova do dever da comunicação. No contrato devem ser compreendidos o objectivo concreto da cirurgia, a parte a ser cortada e a sua dimensão, o risco e as complicações pós-operativas, sendo os mesmos limitados aos precisos termos da sua formulação. Em relação aos que não estão previstos, presume-se que “os réus não cumpriram o dever”, incumbindo à parte médica o ónus da prova. Caso não consiga provar o cumprimento do respectivo dever, considerar-se-ia excluídas dos contratos singulares as cláusulas. Quer dizer que não se pode usar cláusulas generalistas para excluir a devida especificidade, nem palavras generalistas intentadas à exclusão da responsabilidade jurídica, como se refere nos artigos 12 e 13, e sendo aquelas proibidas nos termos do artigo 14.
    172. Caso assim não se entenda, nos termos do artigo 5, n.º 3 da Lei n.º 17/92/M, incumbe aos 2º e 3º réus o ónus da prova.
    173. Caso assim não se entenda, se considere-se que o autor concordou com a realização da operação por ter assinado tal “acordo” em que se escreveu expressamente “concordo com submeter-se à cirurgia da excisão do lóbulo pulmonar superior esquerdo”, nos termos do artigo 5, n.º 3 da Lei n.º 111/99/M: “Tratando-se de intervenção cirúrgica, o consentimento a que se refere o n.º 1 deve ser dado por escrito.” Nos termos do artigo 8, n.º 2 da Lei n.º 17/92/M, o sentido das cláusulas contratuais gerais deve ser limitado aos precisos termos da sua formulação. Também considera-se os dispostos nos artigos 12 e 13. Isto quer dizer que de acordo com os dispostos legais acima referidos, os 2º e 3º réus procederam à excisão de 4 nódulos linfáticos do autor (6 nódulos linfáticos provados pelo perito) sem o consentimento prévio do autor, porque não se encontrou no “acordo” tais palavras nem se pode presumir que o autor tinha aceitado a operação.
    174. Isto quer dizer que o autor só concordou com a excisão do lóbulo pulmonar superior esquerdo por causa do cancro. no entanto, não se encontra no acordo cláusula que se refere à excisão de qualquer nódulo linfático, sendo isto o direito de consentimento informado que se trata dum direito básico protegido por lei da RAEM e que não é excluído por qualquer indivíduo, incluindo tribunais, em uso da livre convicção, salvo a verificação do perigo para a vida. No entanto, o 3º réu confessou que a excisão dos nódulos linfáticos visou apenas verificar se o cancro propagou; quer dizer que a excisão não foi por causa da existência do perito para a vida do autor.
    175. Nestes termos, nos termos do artigo 5, n.º 3 do DL n.º 111/99/M, tratando-se de intervenção cirúrgica, o consentimento a que se refere o n.º 1 deve ser dado por escrito. Nos termos do artigo 8, n.º 2 da Lei n.º 17/92/M, o sentido das cláusulas contratuais gerais deve ser limitado aos precisos termos da sua formulação. Por isso, os 2º e 3º réus procederam à excisão de 4 nódulos linfáticos do autor (6 nódulos linfáticos provados pelo perito) sem o consentimento prévio do autor, conduta essa violadora do direito de consentimento livre referido no artigo 5 do DL n.º 111/99/M de 13 de Dezembro. Nestes termos, deve condenar os 2º e 3º réus a assumir responsabilidade da indemnização.
    (6) Outro vício do reconhecimento dos factos
    176. Em relação às alíneas 7, 8 e 19 da dúvida (as alíneas 7, 8 e 19 da motivação), a resposta do acórdão (fls. 1438 a 1440 dos autos) viola a razão comum: a alínea 7 da dúvida (o 3º réu excluiu a possibilidade de inflamação ao autor e sua esposa, indicando que “a sintoma de inflamação não é assim?”) a alínea 8 da dúvida (o 3º réu também disse que “ não é possível benigno, porque em 2003, quando o autor foi submetido a raios X aos pulmões, não existia nenhum objecto estranho e num período curte de 2 anos apareceu um tumor tão grande. Nesta circunstância não deve ser realizado exame de biopsia percutânea transtorácica que acelera o risco de propagação, deve proceder-se com brevidade a cirurgia de excisão.
    177. Segundo o facto provado H), em 20/11/2005, a mulher do autor suscitou que a massa do autor foi provavelmente inflamação.
    178. O 1º réu não excluiu completamente a possibilidade de tuberculose (alínea 5-a) da dúvida provada, a fls. 1438 dos autos) Segundo o relatório patológico dos tecidos retirados no exame de biopsia percutânea transtorácica realizado em Hong Kong, os tecidos padecem da “inflamação ligeira”; os 2º e 3º réus procuraram comprovar que antes da operação tinham entendido a forte suspeita recaía sobre o cancro pulmonar, quer dizer que segundo a razão comum, os réus não excluíram de forma completa a possibilidade de inflamação, tuberculose ou outras doenças pulmonares.
    179. Se os 2º e 3º não tinham excluído a possibilidade de inflamação, porque é que eles manifestaram a “necessidade” da realização da operação? Pelo que o quesito 7) e o quesito 8) da Base Instrutória devem ser provados. Caso contrário, seria desrazoável e contraditório aconselhar o autor a entrar no hospital no dia seguinte (21/11/2005) e submeter-se à cirurgia de excisão (25/11/2005) em quando não se afastou a possibilidade de inflamação e de tuberculose?
    180. Quando às alíneas 16 e 17 das dúvidas (acórdão – fls. 1438 a 1440 do autos), deve entender-se que os mesmos são exames de rotina antes da cirurgia, que não substituem com “o exame de broncoscopia + exame de biopsia”, quando muito, complementa destes, não havendo entre si diferença absoluta de mérito. O respectivo teor já se compreende nas alíneas 77 a 93.
    181. As dúvidas provadas 13), 14) e 14-b): no cancro pulmonar precoce a existência de células cancerosas pode não ser confirmada pelo exame de expectoração. Assim, quando o resultado for negativo, deve proceder-se a exames mais pormenorizados, como broncoscopia + biopsia. O exame de broncoscopia e biopsia é um exame de rotina feito antes de qualquer operação aos pulmões, para recolher amostras para diagnóstico de casos de doenças brônquicas ou pulmonares impossíveis de diagnosticar ou casos de doenças pulmonares difusas difíceis de diagnosticar, para determinar o tipo de células cancerosas e o próprio tratamento.
    182. Como se refere no acórdão (fls. 1440): também se provaram que “o exame de broncoscopia + exame de biopsia” é um dos exames rotinas, não havendo prova de aquele ser inviável ou não efectivo, …”
    183. De acordo com a Matéria Assente D) a H): o exame de biopsia percutânea transtorácica realizado em Hong Kong foi assistido pelo TAC (em total duas vezes, por a primeira vez não recolheu tecidos suficientes para o exame). De facto, da regra da experiência ou lógica resulta que o exame de biopsia percutânea transtorácica não pode substituir o exame de broncoscopia + exame de biopsia, por aquele recolher o tecido através de biopsia percutânea transtorácica no músculo das costas, assistido pelo TAC, enquanto este entra nos brônquios dos pulmões para realizar o exame e tem outras funções 3(tais como biopsia através de clampe brônquico, escove, lavagem, ou recolha de amostra através de lavagem broncoalveolar), não podendo confundir os dois. Pode-se saber isso através da regra da experiência desde que saiba o método de funcionamento dos exames.
    184. O exame de expectoração é o exame mais fácil para detectar a tuberculose, e pode distinguir “cancro de pulmão de pequenas células” do “cancro de pulmão de células não pequenas”. No entanto, os réus não procederam ao exame. O paciente de cancro de pulmão de células não pequenas deve ser submetido a intervenção cirúrgica. No caso do cancro de pulmão de pequenas células (também pode acontecer nos brônquios grandes), não é preciso a intervenção de excisão, só quimioterapia. Isto quer dizer que, mesmo que fosse cancro de pulmão, havia possibilidade de não dever realizar-se a intervenção cirúrgica.
    185. Pode-se comprovar assim a relevância do “exame de broncoscopia + exame de biopsia” e “exame de rotina de expectoração”, no entanto, os réus abandonaram a realização dos exames, o que revelou que os réus violaram gravemente o dever de prudência e as suas responsabilidades.
    186. Além disso, a dúvida 14-a) não provada representou que não foi completamente excluída a possibilidade de a doença ser verificada como “inflamação” através do “exame de broncoscopia + exame de biopsia”.
    187. Face ao exposto, os quesitos 16) e 17) da Base Instrutória devem reconhecer que estes não podem substituir “o exame de broncoscopia + exame de biopsia”, quando muito, complementa destes, não havendo entre si diferença absoluta de mérito.
    188. O quesito 25) da Base Instrutória – faltam os fundamentos de facto de “todas as sintomas”. O respectivo teor compreende-se nas alíneas 259 a 274.
    189. Sem os dados dos “exames de rotina”, como se pode haver o pressuposto de “todas as sintomas”, de forma que formasse a conclusão de “forte suspeita”.
    190. Por outro lado, pode-se ver o “mapa de avaliação antes do internamento no hospital” de 21/11/2005 (fls. 593 a 784 dos autos): “não tem nenhuma doença especial, história familiar da doença nem de cancro (de facto, naquele tempo o pai do autor ainda estava vivo e com boa condição física, faleceu em 13/04/2011 com 94 anos de idade), só ficou internado no hospital por uma vez (operação à otite média, com 10 anos de idade), não está medicação dependente, não fuma (pode-se ver através da imagem de pulmão), não bebe, respira bem, mover-se livremente, urinar normalmente, defecar normalmente, alimenta-se normalmente, com pele completa (não seca), está emocionalmente estável.”
    191. Isto quer dizer que o autor não fumava nem bebia, não tossiu por mais de dois dias nem com indício de tornar-se magro, sem história familiar de cancro. (alínea 39 da dúvida provada)
    192. O autor tinha naquela altura 42 anos de idade. Sendo agente policial, ele estava fisicamente forte e com energia e confidência. Participava por semana em vários treinos de futebol e sessões de “jogging”, tendo uma vida normal. (alínea 40 da dúvida provada)
    193. Será que as informações acima referidas devem ser consideradas no juízo de cancro pulmonar? Será as mesmas parte de “todas as sintomas?” “Todas as sintomas” deve incluir o exame de biopsia percutânea transtorácica por este ser o único aspecto relacionado com “patologia de células e tecidos”, sendo os demais dados apenas exames de imagem. No entanto, o resultado do exame de biopsia percutânea transtorácica mostra que “fibrose, sem cancro”, havendo no resultado dados a mostrar que tais tecidos trata-se duma “inflamação” (provou-se que a doença do autor foi inflamação)
    194. Além disso, como se pode fazer o juízo dependendo apenas dos dados do tratamento de emergência e dos exames realizados em Hong Kong, sem a realização de demais exames de rotina sobre “patologia das células e tecidos”?!
    195. De facto, o Tribunal Colectivo nunca fundamentou o seu reconhecimento do respectivo facto, designadamente “todas as sintomas”, fazendo com que o acórdão padecesse do vício de deficiência.
    196. Face ao exposto, a alínea 25 da dúvida provada é improcedente.
    197. Caso não se entenda, deve o Tribunal a quo fundamentar a procedência da 25ª da dúvida provada.
    198. Quer dizer que a chamada “todas as sintomas”não é suportada por qualquer dado subjectivo, sendo ela a reflexão subjectiva dos 2º e 3º réus.
    199. Quesito 26) da Base Instrutória – erro no reconhecimento do facto. O respectivo teor compreende-se nas alíneas 275 a 294.
    200. Quando ainda não foi apurada a possibilidade de realização na operação de mais exame de biopsia percutânea transtorácica à massa que se encontrou no lóbulo pulmonar superior esquerdo e da excisão parcial do lóbulo pulmonar (quesitos 21 a 24 da Base Instrutória e 21ª a 24ª dúvidas); isto quer dizer que não se provou a impossibilidade da respectiva realização, o Tribunal Colectivo formou a conclusão de que a realização do exame de biopsia e da recolha das amostras “só” é possível após a excisão de integral lóbulo pulmonar superior (26ª dúvida); conclusão tão arbitrária é proibida pelo tanto direito como razão, e não admitido pelo auto. Pelo que 26ª dúvida não deve ser provada.
    201. A situação acima referida só pode provar mais uma vez que as opiniões subjectivas dos 2º e 3º réus revelaram-se compatíveis com a sua prática, isto quer dizer que eles reconheceram que a massa foi cancro pelo que realizaram a excisão do integral lóbulo pulmonar superior esquerdo.
    202. O Tribunal Colectivo em causa formou a conclusão tão confirmativa sem “fundamentos de facto e de direito” devidos.
    203. Além disso, como se refere no parecer escrito pelo Dr. G quanto a este caso (fls. 1268 a 1271 dos autos): “alínea 26) --- não, de facto, antes da realização da operação pelos réus, pôde-se aplicar os 3 meios possíveis a seguir expostos para provar de forma histológica o cancro: a) repetir de biopsia percutânea transtorácica assistido pelo TAC (repeat CT guide biopsy); b) biopsia assistido pela toracoscópica (thoracoscopic guided biopsy) + frozen section; c) excisão parcial do pulmão assistido pelo V.A.T. (V.A.T. assisted partial lung resection) + frozen section”.
    204. A alínea 14º-b) da dúvida: “O exame de broncoscopia e biopsia é um exame de rotina feito antes de qualquer operação aos pulmões, para recolher amostras para diagnóstico de casos de doenças brônquicas ou pulmonares impossíveis de diagnosticar ou casos de doenças pulmonares difusas difíceis de diagnosticar, para determinar o tipo de células cancerosas e o próprio tratamento.”
    205. Além disso, os quesitos 14º-a), 15º), 16º) e 17º) da Base Instrutória não são provados impossíveis.
    206. Face ao exposto, pode-se recolher amostras da massa do autor através do exame de broncoscopia e biopsia, do “exame de rotina de expectoração não menos de 3 dias consecutivos” que pode ser realizado várias vezes, do exame de biopsia percutânea transtorácica e dos 3 meios indicados na alínea 26) do parecer do Dr. G.
    207. Além disso, a conclusão acima referida do Tribunal Colectivo padece do erro no reconhecimento do objecto, porque o objecto principal do exame de biopsia e recolha de amostras trata-se da massa encontrada no lóbulo pulmonar superior esquerdo, mas não todo o lóbulo.
    208. Pelo que a conclusão em causa é evidentemente errada e desrazoável.
    209. Face ao exposto, não se prova a alínea 26ª dúvida: “no processo do autor, a realização do exame de biopsia e da recolha das amostras só é possível após a excisão de integral lóbulo pulmonar superior; …”
    210. Sobre o quesito 28) da Base Instrutória – erro no reconhecimento do objectivo da prática. O respectivo teor compreende-se nas alíneas 259 a 274.
    211. A alínea 28 da dúvida do acórdão: “só se provou que durante a operação não se pôde excluir a possibilidade do cancro pulmonar, pelo que os 2º e 3º réus procederam à excisão de 4 nódulos linfáticos encontrados à esquerda do brônquio do autor, para evitar a propagação do cancro, uma vez decretado.” (segundo o perito, 6 nódulos linfáticos foram excisados)
    212. De facto, o 3º réu confessou no julgamento de 01/03/2011 (o presidente do Tribunal Colectivo mandou registar a confissão no processo, a fls. 1373 a 1375 nos autos): a excisão dos nódulos linfáticos visa a exame de biopsia para verificar a propagação ou não de cancro, mas não a impedimento da propagação. Isso pode comprovar que o Tribunal Colectivo padece do erro no reconhecimento do objectivo da respectiva prática, assim sendo, o fundamento do Tribunal revela-se evidentemente incompatível com o acórdão.
    213. A biopsia trata-se de um dos meios de dissecção linfática. (vide fls. 960 a 1101 dos autos, 1º parágrafo da documentação médica “meio da dissecção do linfonodo mediastinal do cancro de pulmão de células não pequenas e aplicação do guia do exame do linfonodo sentinela”, escritores: XXX, XXX)
    214. Face ao exposto, prova-se o quesito 28) da Base Instrutória.
    215. O vício das alíneas 10-a e 12-a da dúvida, cujo teor compreende-se nas alíneas 381 a 400.
    216. Além disso, a fim de evitar confusões, vem o autor deduzir impugnação contra as alíneas 10-a) e 12-a) da dúvida. O autor esclarece que: o autor reconhece a existência de tal conteúdo mas só antes 19/11/2005. Segundo as alíneas D) a F) da Matéria Assente, o autor entregou ao 2º réu em 19/11/2005 os dados dos exames de biopsia percutânea transtorácica e de PEC-CT aos quais o autor se submeteu em Hong Kong às suas próprias custas para que ele analisá-los. Altura em que o 2º réu concordou com o que disse o médico de Hong Kong, isto é, o exame de PEC-CT não é uma forma de detectar com exactidão o cancro, sendo utilizado para verificar se o cancro, caso detectado, propague ou não. O 2º réu mais disse que não se deveu realizar precipitadamente a operação e que se não havia cancro, ele não procedeu à cirurgia de forma leviana.
    217. No dia seguinte, isto é, 20/11/2005, à tarde, os 2º e 3º réus requereram um encontro com o autor e a sua esposa e disseram que o autor tinha cancro pulmonar.
    218. Naquele tempo (20/11/2005, às 4h00 da tarde), os 2º e 3º réus manifestaram ao mesmo tempo a “necessidade” de o autor submeter-se à operação de excisão “integral do lóbulo pulmonar superior esquerdo”. (confissão do 3º réu, constante de fls. 1373 a 1375 dos autos; as alíneas 6 e 9 das dúvidas parcialmente provadas)
    219. Naquele tempo, a esposa do autor duvidou que no dia anterior, quer dizer 19/11/2005, o 2º réu tinha dito que o exame de PEC-CT não é uma forma de detectar com exactidão o cancro, sendo utilizado para verificar se o cancro, caso detectado, propague ou não, que não deveu proceder a cirurgia de forma precipitada e que ele não procedeu à operação de forma leviana se não houvesse cancro; no entanto, porque é que no dia a seguir (20/11/2005) indicaram a “necessidade” de o autor submeter-se a cirurgia de excisão “integral do lóbulo pulmonar superior esquerdo” e qual foi o fundamento de cancro? Perguntados pela esposa do autor, os 2º e 3º réus indicaram que após a análise, excluiu-se a possibilidade de “inflamação” e de “benigno”, pelo que entenderam que o autor tinha cancro.
    220. Sem escolha, o autor e a esposa concordaram com a realização da operação.
    221. Naquele tempo o autor foi requerido para entrar no hospital no dia seguinte, quer dizer 21/11/2005, para submeter-se à operação da excisão em 25/11/2005, às 8h00 de manhã. (alínea T da Matéria Assente) O autor submeteu-se à operação da excisão na hora acima referida. (alínea J da Matéria Assente)
    222. Após a cirurgia, o autor deduziu impugnação administrativa, contra os 2º e 3º réus, que acabaram por declarar a forte suspeita de cancro pulmonar e alegar que a operação visou diagnosticar o cancro. No entanto, o autor e a sua mulher concordaram com a realização da excisão com base em que os 2º e 3º réus tinham indicado que a massa encontrada no lóbulo pulmonar superior esquerdo do autor foi cancro, e que acreditaram nas palavras dos réus, isto é, tinha se excluído a possibilidade de “inflamação” e “benigno”; quer dizer que se o fim da operação só fosse o exame ou diagnóstico, o autor e sua esposa nunca concordavam com a realização. Isso é porque se não fosse cancro, não havia naquele tempo “necessidade e urgência”.
    223. De facto, pode-se ver a alínea 12-a) da dúvida parcialmente provada, que não inclui o quesito 12-a) da Base Instrutória: “… e ele (o autor) também sabia que o tumor é benigno…”; isto quer dizer que antes da operação, não se provou que “o autor também sabia que mesmo que o tumor fosse benigno, devia proceder-se a excisão para analisá-lo”. Quer dizer que o autor concordou com a realização da cirurgia por causa do cancro.
    224. Quer dizer que os 2º e 3º nunca referiram, de 20/11/2005 à data da operação, o teor das alíneas 10-a a 12-a das dúvidas, porque já disseram naquele tempo que o autor tinha cancro. Caso contrário, revela-se incompatível com o quesito F) da Base Instrutória.
    225. Antes da operação, os 2º e 3º réu esclareceram por uma só vez (20/11/2005, às 4h00 da tarde) ao autor “o diagnóstico da doença” e “risco da operação”: naquele tempo, perguntados pela esposa do autor, os 2º e 3º réus disseram que tinha sido excluída de forma expressa a possibilidade de “inflamação” e de “benigno”, e afirmaram que o autor tinha cancro pulmonar.
    226. Antes da operação, os réus nunca disseram ao autor e sua esposa o risco da operação, nem as possíveis complicações pós-operatórias ou planos substituíveis, para não falar as palavras tais como “vasos liquíferos, vasos torácicos, vasos linfáticos, quilotórax e nódulos linfáticos. Aqueles também não disseram que iriam proceder à excisão de nódulos linfáticos na operação, nem manifestaram o local da massa.
    227. Já se provou no julgamento que só o autor assinou o acordo, sendo o nome e número de telefone da sua esposa escrito por aquele a pedido do 2º réu para o efeito da urgência na operação (vide a alínea 12 da dúvida: só se provou que o autor tinha assinado o termo de consentimento a fls. 438.)
    228. O mais importante é que os 2º e 3º réus nunca cumpriram o dever referido no artigo 5 do DL n.º 111/99/M ou no artigo 5 da Lei n.º17/92/M, sendo isso a razão principal da intenção desta acção. Porque caso os réus pudessem esclarecer de forma expressa, o autor não submetia-se à operação.
    229. O quesito 31 da Base Instrutória: “na realização da cirurgia de excisão do lóbulo pulmonar, os médicos devem ter em conta a existência dos vasos liquíferos e evitar a quebra destes?” (alíneas 506 a 509)
    230. Como se refere no parecer do Dr. Ma (fls. 1270 dos autos) e no relatório do perito (fls. 1165 dos autos), “devem ter em conta”.
    231. O entendimento do Tribunal viola a lógica e razão comum. Pelo que o quesito 31) da Base Instrutória deve ser provado.
    232. Sobre a alínea 31 da dúvida (acórdão – fls. 1439 dos autos), o teor do acórdão viola a razão comum, relevando-se incompatível o entendimento deste com a documentação médica: (alíneas 510 a 516)
    233. Antes da intervenção cirúrgica, isto é, antes de 25/11/2005, o autor tinha um corpo forte e enérgico, estava com confiança, nunca tinha alergias de pele nem alergia a medicamentos, foi internado no hospital por só uma vez quando era criança (operação de à otite média, com 10 anos de idade).
    234. No entanto, realizadas as duas operações, há problema no sistema de circulação linfática do autor, de forma que afectasse as funções de desintoxicação e de imunidade, pelo que ele era relativamente fácil de ser infectado que pessoa comum. Todos os acima referidos causaram ao autor grave prejuízo, mental e físico.
    235. Os Exmos. Juízes também ignoraram os depoimentos do irmão mais velho do autor e de F, nos quais se referem que o autor tem agora edema e é facilmente infectado por bacterianos.
    236. Se a sua (o paciente) condição física piorou, é ao médico que incumbe o ónus da prova de não ter culpa.
    237. Sobre a alínea 34) (acórdão- fls. 1439 dos autos), falta fundamentos no acórdão, designadamente (alíneas 517 a 531)
    238. Isto quer dizer que realizou-se em duas semanas duas operações grandes respectivamente no peito direito e esquerdo, o qual fez com que o paciente ficasse internado por quase um mês, podendo-se adivinhar a gravidade do assunto.
    239. Depois de o autor ter saído do hospital, o período compreendido entre 20/12/2005 e 31/08/2006 (cerca de 260 dias) corresponde a baixa para convalescença. (alínea T da Matéria Assente: “no período compreendido entre 21 de Novembro e 19 de Dezembro de 2005, o autor esteve hospitalizado, o período compreendido entre 20 de Dezembro de 2005 e 31 de Agosto de 2006 corresponde a baixa para convalescença e em 1 de Setembro de 2006 o autor aposentou-se)
    240. O incidente causou ao autor a perda do lóbulo pulmonar superior esquerdo, levando-o a ficar desanimado e a perder a confiança sólida que possuía, (alínea 44 da dúvida provada – fls. 1439 dos autos) e tornar-se fisicamente fraco (alínea 44 da dúvida provada – fls. 1439 dos autos), e sente dores na ferida (vide os documentos médicos nos autos que mostram que o autor ainda está a tomar analgésicos e medicamentos anti-depressivos - fls. 249 a 251, 1067 a 1079 e 1305 a 1329 dos autos), os quais fazendo com que ele não conseguisse continuar assumir o trabalho de polícia, pelo que se aposentou antecipadamente em 01/09/2006, o incidente é grave, não é?
    241. Por um lado, o Tribunal concorda com o facto de a condição física do autor piorar após duas operações, por outro lado o Tribunal ignorou plenamente a relevância de o trabalho de polícia precisa dum corpo forte.
    242. O trabalho de polícia não só se limita às horas de serviço normais, devendo os agentes policiais estar preparado a trabalhar 24 horas por dia, isto quer dizer que o risco físico é imprevisível.
    243. O Tribunal também ignorou o facto de que até ao presente tempo, o autor ainda sente dores na ferida e falta-lhe de ar aquando da respiração e é facilmente infectado por bacteriano.
    244. Além disso, mesmo que o autor voltasse para a Banda de Música da P.S.P. (saiu da Banda em 1998), em primeiro lugar, o autor já não está familiarizado com a música, por outro lado, ele foi trompetista (deve-se saber que mais pequeno o tamanho do instrumento, maior a capacidade vital precisa), agora já não consegue jogar o trompete por este precisa duma grande capacidade vital.
    245. Além disso, naquele tempo, o autor só precisava de trabalhar por mais 4 anos (para 07/2010) para aposentar-se com toda a pensão. Caso não fosse o acidente médico, o autor absolutamente não saía do trabalho policial naquele tempo.
    246. Além disso, de facto, o autor não tem, desde a sua aposentação, capacidade de entregar-se a outro trabalho, isso é por causa dos dores na ferida que o autor frequentemente sente e da falta do ar aquando da respiração e dos analgésicos e medicamentos anti-depressivos por ele tomados.
    247. Sobre a alínea 41) da dúvida (acórdão – fls. 1439 dos autos), o teor do acórdão viola a razão comum e revela-se incompatível com outros factos provados (as alíneas 40 e 34 das dúvidas provadas). (alíneas 532 a 537 da motivação)
    248. Sobre a alínea 42) da dúvida (acórdão – fls. 1439 dos autos), o teor do acórdão viola a razão comum e revela-se incompatível com outros factos provados (alínea X da Matéria Assente e alínea 34 das dúvidas provadas). (alíneas 538 a 543 da motivação)
    249. Sobre a alínea 43) da dúvida (acórdão – fls. 1439 dos autos), o teor do acórdão viola a razão comum:
    - O autor tem um filho e uma filha, que estão a frequentar escolas naquele tempo, andando a filha na universidade, factos esses que indicados pelo irmão mais velho do autor. (alíneas 544 a 548 da motivação)
    - O autor também tinha de pagar a hipoteca da habitação, tendo a seu cargo o pai (faleceu em 13/04/2011 no ano de 94.)
    - Desde a aposentação, auferia mensalmente o índice de 215 (55 patacas por ponto).
    250. Sendo um homem que era capaz de trabalhar, o autor aposentou-se antecipadamente por causa da saúde, fazendo com que a sua esposa responsabilizasse-se pela maioria da despesa, será que ele sente-se culposo?
    251. A alínea 44 da dúvida provada: “só se provou que o incidente causa ao autor a perda do lóbulo pulmonar superior esquerdo, levando-o a ficar desanimado e a perder a confiança sólida que possuía.” O Tribunal Colectivo já reconheceu o facto acima referido. Será que os Juízes do Tribunal não sabem que o lóbulo pulmonar não regenera? Será que o incidente causa a perda permanente de lóbulo pulmonar? Facto esse pode ser reconhecido através da razão comum e regra da experiência. (alíneas 549 a 552 da motivação)
    252. Sobre a alínea 45) da dúvida (acórdão – fls. 1439 dos autos), o teor do acórdão viola a razão comum e não dá importância aos documentos de lista de medicamentos com eficácia profissional médica: O Tribunal Colectivo ignorou completamente a prova documental pelo autor prestada muitas vezes, designadamente o documento médico entregue em 15/02/2011 a fim da prova da dúvida, bem como o analgésico prescrito varias vezes pelo Pr. Dr. H; além disso, também se encontra medicamentos para relaxamento e estupefacientes (tais como pílulas para dormir) e analgésico prescrito pela Dra. Teresa do Hospital Conde de S. Januário durante 15/01/2009 e 01/02/2011 (alíneas 553 a 556 da motivação)
    253. O quesito 45 da Base Instrutória deve ser provado.
    (4) Prática, dano e nexo de causalidade
    254. As alíneas L), N), O) a Q), R), S), T), X) da Matéria Assente e as alíneas 27, 28, 34, 34-a, 39, 40, 41, 42, 44, 45 e 48 das dúvidas provadas: todos os factos acima referidos comprovam que, além de a integridade física e o património do autor ter sido prejudicado, este e a sua esposa também sofrem o dano moral. Os factos também comprovam que a prática dos réus causou ao autor grave dano mental, de forma que o seu modo de vida normal fosse alterado, até se aposentou por causa do dano físico e moral. Também se prova que até à presente data, o dano causado pelo incidente ao autor e à sua esposa ainda não se extingue.
    255. Por isso, todos os danos sofridos pelo autor nesta vez têm um nexo de causalidade inquestionável com a prática dos réus.
    256. Os actos praticados pelos réus antes o julgamento, nomeadamente os após a queixa apresentado pelo autor aos Serviços de Saúde, e os feitos no julgamento a fim de cobrir a realização da excisão radical comprovaram pelo menos que falta absolutamente aos réus a atitude de cautela e prudência que um médico deve ter.
    257. Isto quer dizer que o acórdão em causa formou a conclusão de que: o decurso da operação depende do juízo profissional dos médicos que precisam ponderar a viabilidade das medidas correspondentes e avaliar o risco da propagação das células cancerosas.” Será que isso pode ser usado para negar toda a ilicitude e culpa dos médicos acima referidos?! Caso assim, para que serve as rotinas médicas? É de crer que ninguém reconheça que o médico pode agir de forma livre e arbitrária, sem observação de rotina, dependendo do seu reconhecimento subjectivo, caso contrário, não existiria no futuro acidente médico; além disso, ninguém sabe o pensamento do médico no momento da realização cirúrgica, porém, a prática reflecte melhor a intenção do agente; de facto, como pode ser considerado um médico com prudência e cautela que não realize os exames de rotina e de critério antes da operação cirúrgica?
    258. Também não deve ser ignorado o registo cirúrgico4. (o registo do decurso da cirurgia escrito pelo 3º réu, em total uma página, cuja parte superior direita se encontra “registo cirúrgica” e “109”) É de crer que o registo reflecte melhor o pensamento do médico que realizou a operação. No entanto, não se encontra no registo conteúdo que se refere ao local da massa nem a “células atípicas”. No registo escreve-se que o 2º réu, notificado do resultado do exame de biopsia percutânea transtorácica, excluiu a possibilidade de cancro (“procedure: Perform True Cut Bispsy with No. 20 needle, no corfirm report of malignanacy. Performa lobectomy of left upper lobe of lung. …”), no entanto, realizou a excisão do integral lóbulo pulmonar superior esquerdo do autor e de vários nódulos linfáticos. Das circunstâncias acima referidas resulta suficientemente que o 3º réu tinha reconhecido que o autor tinha doença pulmonar, senão, como é que pensou em propagação ou não do cancro sem o fundamento deste.
    259. No entanto, os réus não observaram a básica prática médica, por exemplo: 1) não realizaram exames de rotina antes da intervenção cirúrgica; 2) não se optaram por uma abordagem conservadora quando os dados do relatório patológico não foi suficiente, e aconselharam arbitrariamente a necessidade da operação; 3) durante a operação, quando não foi detectado cancro, não observaram o procedimento de rotina para fazer o exame de frozen section; 4) sem prova de cancro e sem consentimento prévio do autor, procederam à excisão de vários nódulos linfáticos, causando risco cirúrgico que o autor não deveria assumir e dano, violando também o direito de “consentimento livre” do autor sobre a sua saúde. 5) não cumpriram a “obrigação de comunicação” do médico legalmente fixada, violando “o direito de saber e direito de autodeterminação”
    260. Nestes termos, o acórdão recorrido padece de falta, repetição, contradição e erro, deve ser anulado.
    261. Caso assim não se entenda, os respectivos médicos não observaram nem deram importância às rotinas médicas e regras profissionais, fazendo com que o autor não gozasse do melhor serviço médico, quer dizer que a parte de hospital não cumpriu de forma completa as regras básicas ou comuns da técnica médica, até violou o dever legal (dever de esclarecimento). Isso é causado por causa dos médicos e do regime do hospital. Incumbe aos réus (médicos e os Serviços de Saúde) todas as responsabilidades. Os réus agiram sem ter observado as rotinas médicas e regras profissionais, faltando-lhes a devida atitude de “prudência e cautela”, pelo que os réus têm culpa e devem assumir a responsabilidade da indemnização civil. Por isso, deve julgar procedentes todos os pedidos do autor.
    262. Isto quer dizer que mesmo que não seja aplicável a presunção da culpa, de acordo com a alegação seguir exposta, confirmar-se-ia a culpa dos réus, de forma que eles assumam a responsabilidade civil.
    263. As circunstâncias do caso são relativamente complicadas, por os réus ter praticado várias violações.
    264. No entanto, os réus não observaram a básica prática médica, por exemplo: 1) não realizaram exames de rotina antes da intervenção cirúrgica; 2) não se optaram por uma abordagem conservadora quando os dados do relatório patológico não foi suficiente, e aconselharam arbitrariamente a necessidade da operação; 3) durante a operação, quando não foi detectado cancro, não observaram o procedimento de rotina para fazer o exame de frozen section, procedendo à expansão da cirurgia que causou a perda do integral lóbulo pulmonar superior esquerdo do autor; 4) sem prova de cancro e sem consentimento prévio do autor, procederam à excisão de vários nódulos linfáticos, causando risco cirúrgico que o autor não deveria assumir e dano, violando também o direito de “consentimento livre” do autor sobre a sua saúde. 5) não cumpriram a “obrigação de comunicação” do médico legalmente fixada, violando “o direito de saber e direito de autodeterminação”
    265. Se o médico não preste a assistência médica de acordo com as regras gerais de medicina, ou a sua conduta revele a não prudência, verificar-se-ia ilicitude.
    266. A culpa consiste em “arbitrária, negligência e descuidado” e é reconhecida de acordo com o princípio de bom pai de família previsto no artigo 480, n.º 2 do CC.
    Sobre exame de rotina
    267. Os quesitos 13), 14) e 14-b) da Base Instrutória já se provaram, os quesitos 14-a), 15), 16) e 17) não foram provados como “impossíveis ou sem efeitos”, e o relatório do exame de biopsia percutânea transtorácica realizado em Hong Kong mostrou “inflamação”. Pelo que, os 2º e 3º réus tinham culpa e ilicitude.
    Abordagem conservadora
    268. O pode-se tomar como referência fls. 9, III do “extracto das sentenças relativas a responsabilidade civil dos actos médicos proferidas pelo Supremo Tribunal de Justiça de Portugal”, apresentado pelo autor em 13 de Maio de 2011. Isto quer dizer, o médico deve usar meios ou mais adequados ou comuns mesmo que o resultado obtido seja inferior aos esperados.
    269. Se os réus aplicassem a abordagem conservadora, o autor não se submetia à operação nem sofria o risco por esta trazido; a viabilidade da abordagem conservadora significa que os réus não deveram aconselhar a “necessidade” de o autor submeter a cirurgia. Isso comprova suficientemente que tal sugestão é arbitrária e errada, e que se revela incompatível a autodefesa dos réus e a sua conduta antes da cirurgia, pelo que eles estiveram a mentir.
    270. De qualquer maneira, o 3º réu confessou que foi eles que aconselharam a “necessidade de submeter-se a cirurgia”. Nos termos do artigo 489.º, n.º 1 do CPC, a confissão é irretractável. Pelo que tal acto dos réus padece de ilicitude e culpa
    A prática na cirurgia
    271. É sem dúvida que cada operação tem a finalidade. Segundo os 2º e 3º réus, a operação realizada por eles foi “o exame de detecção do cancro de pulmão com probabilidade”, que visa escolher o tumor para o examinar, mas não a “operação de excisão do cancro de pulmão”. Enquanto à excisão do integral lóbulo pulmonar superior esquerdo, isto é porque o local e a dimensão da massa não permite a excisão parcial. No entanto, as alíneas A) e B) e as fotos de PET-Ctscan a fls. 1398 dos autos mostraram que a massa encontrou-se na parte superior do lóbulo pulmonar esquerdo, mas não a parte no meio como referida os 2º e 3º réus. O Dr. H e DR. G alegaram que devia ser realizado primeiro a abordagem conservadora, e disseram que a excisão parcial era segura dado o local da massa. Eles também indicaram que deve realizar-se de imediato o exame de frozen section¸ quando o relatório do exame mostra que não há cancro, pode-se concluir a cirurgia. Assim pode-se evitar o risco trazido pela expansão da cirurgia.
    272. Caso não se entendam assim, de facto, os réus já procederam à operação do integral lóbulo pulmonar superior esquerdo, sendo o tumor removido com o lóbulo. Nesta circunstância, mesmo que se considere necessária a excisão do integral lóbulo pulmonar, caso os réu observassem o meio de rotina da cirurgia do cancro pulmonar, aplicava o exame de frozen section, de forma que examinasse o tumor (segundo a alíena M da Matéria Assente, realiou-se o exame de frozen section antes da realização da cirurgia da excisão). Quando o relatório do exame mostra que o tumor não tem cancro, pode-se concluir a cirurgia.
    273. Assim, porque os réus mais procederam à excisão dos 4 nódulos linfáticos do autor (6 segundo o perito). Desta forma, será que a declaração acima referida do réus revela-se completamente incompatível com o acto praticado por eles?!
    274. Segundo a razão comum, quando não há cancro, não é necessário nem deve proceder-se a excisão de qualquer nódulo linfático. Também não devem os réu ignorar o risco causado ao paciente pela excisão só por causa do medo da propagação, isso deve ser considerado desrazoável e incompreensível, caso contrário, qual é o uso das regras médicas? Tais práticas comprovaram mais uma vez a ilicitude e culpa dos 2º e 3º réus.
    “Dever de comunicação (dever de esclarecimento)” e “direito de consentimento livre”
    275. Mais importante, o autor só concordou com a excisão do lóbulo pulmonar superior esquerdo por causa do cancro. No entanto, não se encontra no acordo cláusula que se refere à excisão de qualquer nódulo linfático, sendo isto o direito de consentimento informado que se trata dum direito básico protegido por lei da RAEM e que não é excluído por qualquer indivíduo, incluindo tribunais, em uso da livre convicção, salvo a verificação do perigo para a vida. No entanto, o 3º réu confessou que a excisão dos nódulos linfáticos visou apenas verificar se o cancro propagou; quer dizer que a excisão não foi por causa da existência do perito para a vida do autor.
    276. Nestes termos, nos termos do artigo 5, n.ºs 1, 2 e 3 do DL n.º 111/99/M e artigo 8, n.º 2 da Lei n.º 17/92/M, os 2º e 3º réus procederam à excisão de 4 nódulos linfáticos do autor (6 nódulos linfáticos provados pelo perito) sem o consentimento prévio do autor, conduta essa violadora do direito de consentimento livre referido no artigo 5 do DL n.º 111/99/M de 13 de Dezembro. Nestes termos, deve condenar os 2º e 3º réus a assumir responsabilidade da indemnização.
    Responsabilidade pelo risco
    277. Ultimamente, caso os Exm.os Juízes entendam que os réus não tinham culpa na prática médica deste caso, deveria condená-los a assumir “a responsabilidade pelo risco” nos termos do artigo 9 do DL n.º 28/91/M, porque os réus procederam a uma operação de excisão radical de cancro pulmonar extremamente perigosa que foi classificada pelo “perito” e “centro de queixa dos acidentes médicos” como “incidente raro”, que colocou em perigo a vida do autor e que causou que este e a sua esposa sofrem, até à presente data, danos graves psicológicos e morais (as alíneas 34, 41, 42, 44, 45 e 48 das dúvidas provadas – fls. 1433 a 1440 dos autos), pelo que aqueles mais procederam à ligadura do vaso geral linfático do autor que não tinha nenhum problema, causando-lhe prejuízos físicos e morais.
    278. De facto, para proteger os indivíduos lesados pelos actos especiais de violação ao direito, o legislador usou “tutela civil com dupla garantia”, isto é, “presunção legal de culpa” e “responsabilidade pelo risco”.
    279. A presunção legal de culpa presume que o lesante tem culpa, incumbindo-lhe o ónus da prova, podendo aquela ser ilidida só mediante prova em contrário; em relação à “responsabilidade pelo risco”, mesmo que o agente não tenha culpa, nas circunstâncias previstas na lei, tendo em conta o dano causado ao lesado pela prática de risco, caberia àquele a indemnização adequada de acordo com o princípio da equidade.
Por fim pede se julgue procedente o recurso, revogue ou anule o acórdão recorrido, e se julguem procedentes todos os pedidos deduzidos pelo recorrente na petição com base nos factos provados e de acordo com lei.
  
    4.2. B, C e D, os 1º a 3º réu, contra-alegam este recurso, dizendo:
     1. Os 1º a 3º réus opõem-se à posição da motivação do recorrente.
     2. Nos termos do artigo 29, n.º 1 do DL n.º 81/99/M, O Centro Hospitalar Conde de S. Januário, abreviadamente designado por Centro Hospitalar, é a estrutura dos SSM que presta os cuidados de saúde diferenciados. Isto quer dizer que o Centro Hospitalar Conde de S. Januário é um hospital público e uma entidade de saúde pública afecta aos Serviços de Saúde.
     3. Pode-se ter certeza de que a relação estabelecida através da deslocação do recorrente à entidade de saúde pública é absolutamente não contratual, isto é porque esta trata-se duma entidade que presta, de acordo com a lei, os serviços médicos ao recorrente.
     4. O entendimento acima referido revela-se completamente compatível com a doutrina citada e reconhecida pelo acórdão n.º 23/2005 do TUI, “na verdade, quem recorre a um estabelecimento de saúde pública, fá-lo ao abrigo de uma relação jurídica administrativa de utente, modelada pela lei, submetida a um regime jurídico geral e estatutário pré-estabelecido, aplicável, em igualdade, a todos os utentes daquele serviço público, que define o conjunto dos seus direitos, deveres e sujeições e não pode ser derrogada por acordo, com introdução de discriminações positivas ou negativas. Não o faz, portanto, na qualidade de parte contratante, ainda que num hipotético contrato de adesão ou ao abrigo de relações contratuais de facto.”
     5. Isso revela que o recorrente e os Serviços de Saúde não estão ao abrigo duma relação contratual. Segundo a petição e a motivação do recurso do recorrente, os réus procederam ao diagnóstico e tratamento na qualidade de pessoal médico de estabelecimento médico público no exercício da função pública, daqui pode-se saber que tal conduta trata-se de “actos de gestão pública”.
     6. Dado que não se verifica neste caso relações contratuais nem actos de gestão privada, não se aplica os dispostos sobre a responsabilidade civil contratual e a presunção de culpa dos devedores previstos no Código Civil.
     7. Isto quer dizer que nos termos do artigo 1 do DL n.º 28/91/M, quanto à respectiva responsabilidade civil só se aplica os dispostos no DL, quer dizer que o teor da responsabilidade civil é tratado com a responsabilidade produzida por facto ilícito prevista no Código Civil, salvo o disposto no DL ou em lei especial.
     8. Por outro lado, como referiu anteriormente o recorrente, os respectivos actos dos réus não excederam o seu âmbito da função nem foram praticados com dolo no exercício da função. Pelo que nos termos dos artigos 2 e 3 do DL, mesmo que se verifique o acto ilícito e dano por este causado, só o 4º réu do caso, isto é, os Serviços de Saúde deveria assumir a responsabilidade civil.
     9. Pelo que os 1º a 3º réus não são os sujeitos da relação jurídica substantiva impugnada no caso. Nos termos do artigo 1 do Código de Processo Administrativo Contencioso, aplicando-se subsidiariamente o disposto no artigo 58 do Código de Processo Civil, os réus não têm legitimidade.
     10. Pelo que os réus entendem que, nos termos do artigo 1 do Código de Processo Administrativo Contencioso, aplicando-se subsidiariamente o artigo 413, al. e) e artigo 412, n.º 2 do Código de Processo Civil, deve ser improcedentes os pedidos deduzidos aos réus neste caso.
     11. Em relação ao ónus da prova da culpa, tanto o Tribunal a quo como os réus entendem que nos termos do artigo 4, n.º 1 do DL n.º 28/91/M, é ao autor que incumbe provar a culpa.
     12. No entanto, segundo referiu o recorrente na conclusão da motivação, este entende que o Código Civil aqui aplica-se supletivamente, e que deve inverter o ónus da prova nos termos dos artigos 484, 485 e 486 do CC. Os réus não concordam com isso, porque, como se referiu anteriormente, a situação neste caso deve seguir o disposto no artigo 1 do DL n.º 28/91/M, isto é, salvo o disposto no DL ou em lei especial, o teor da responsabilidade civil é tratado com a responsabilidade produzida por facto ilícito prevista no Código Civil.
     13. De facto, prevê-se expressamente no artigo 4 do DL, “A culpa dos titulares dos órgãos ou dos agentes é apreciada nos termos do artigo 480.º do Código Civil.” Pode-se conhecer que nesta circunstância a culpa é apreciada nos termos do artigo 480.º do Código Civil, mas não os artigos seguintes ou outros artigos neste capítulo.
     14. Não é difícil de entender que se o legislador queira estabelecer o regime de inversão do ónus da prova da responsabilidade civil não contratual por actos de gestão pública, destacaria este pensamento legislativo pelo menos de forma expressa (indicando expressamente os artigos citados do CC ou estabelecendo concretamente regras) ou relativamente abstracta (aplicando directamente o integral regime da responsabilidade civil não contratual sem a citação concreta dos dispostos no CC ou com a citação geral dos dispostos no certo capítulo do CC).
     15. No entanto, tendo em conta os textos do DL, não se revela de forma qualquer que o legislador tem este pensamento. Pelo que, seja qual for o meio da interpretação da lei, nos termos do artigo 8 do CC, a interpretação da lei não pode ser separada dos textos ou do pensamento legislativo mostrado neles. Por outro lado, dado que a inversão do ónus da prova trata-se do disposto excepcional, nos termos do artigo 10 do CC, esta não pode ser aplicada por analogia.
     16. Face ao exposto, segundo o artigo 4º do DL. n.º 28/91/M, nos termos do artigo 480º do CC, é ao recorrente que incumbe provar a existência ou não da culpa neste caso.
     17. Por outro lado, o recorrente entende que mesmo que não se verifique culpa no caso, deveria julgar que os réus assumem a “responsabilidade pelo risco” nos termos do artigo 9 do DL. n.º 28/91/M. Os réus não acompanham.
     18. O artigo 9 do DL. n.º 28/91/M prevê a “responsabilidade civil pelo risco”, isto é, “responsabilidade sem culpa” referida na doutrina.
     19. No entanto, no caso não há “funcionamento de serviços administrativos excepcionalmente perigosos ou de coisas e de actividades da mesma natureza”.
     20. Como se sabe que as intervenções cirúrgicas, seja grandes ou pequenas, têm em si certos riscos que devem ser assumidos por paciente. Pelo que é natural que a cirurgia realizada pelos réus ao recorrente também tem certo risco.
     21. Após a intervenção cirúrgica, verificou-se rotura de vasos quilíferos do autor que lhe causou quilotórax. Segundo o relatório da perícia e os dados do centro de queixa dos acidentes médicos, tal complicação pós-operatória é “rara”, “com taxa de acontecimento de 0.2% a 0.8%”. Disso pode-se saber que, dada a baixa taxa de acontecer complicação pós-operatória na cirurgia em causa, o seu risco é relativamente baixo, pelo que a cirurgia não é “excepcionalmente perigosa” como descrita o recorrente.
     22. Ao mesmo tempo, deve-se enfatizar que as “actividades perigosas” previstas no artigo 9 acima referido trata-se do funcionamento de serviços administrativos excepcionalmente perigosos, tais como o reactor nuclear, chuvas artificiais, operações da mina na alta altitude e sob alta pressão, e exercícios militares, mas não a actividade médica neste caso.
     23. De facto, o recorrente usou a “responsabilidade pelo risco” prevista no artigo 9 do DL. n.º 28/91/M para pedir a indemnização, fundamento esse é evidentemente improcedente. Segundo o recorrente, no caso da falha da cirurgia, o estabelecimento médico público necessariamente assume a responsabilidade de indemnização, independentemente de os médicos ter culpa ou não no procedimento da cirurgia. Isto é porque se os médicos tivessem culpa, deveriam responsabilizar-se por indemnização por causa de facto ilícito, porém, se não tivessem culpa, também responsabilizar-se-iam por indemnização por ter assumido “a responsabilidade pelo risco”.
     24. A conclusão acima referida revela-se injusto para a parte médica e incompatível com o pensamento legislativo. Pelo que não se aplica neste caso a responsabilidade pelo risco prevista no artigo 9 do DL. n.º 28/91/M.
     25. O recorrente entende que o Tribunal a quo padece do vício na apreciação de facto e do erro na análise de facto. Os réus também não concordam com isso.
     26. Em primeiro lugar, é preciso enfatizar mais uma vez que o chamado exame de rotina trata-se de meio de tratamento optado pelo médico na situação normal para o diagnóstico. No entanto, tal meio de rotina não obsta que o médico avalia, dependendo a sua técnica profissional, o valor do respectivo exame no caso concreto, nem que ele opta-se por outro meio que se revele com mais valor diagnóstico.
     27. Além disso, segundo a alínea 14-b da dúvida provada, “O exame de broncoscopia e biopsia é um exame de rotina feito antes de qualquer operação aos pulmões, para recolher amostras para diagnóstico de casos de doenças brônquicas ou pulmonares impossíveis de diagnosticar ou casos de doenças pulmonares difusas difíceis de diagnosticar, para determinar o tipo de células cancerosas e o próprio tratamento.” Isto revela que o Tribunal a quo também entende que o exame de rotina não tem a natureza de “deve ser” referida pelo recorrente.
     28. Segundo os factos provados, a decisão de proceder-se à respectiva operação foi feita após os réus ter considerado o resultado dos exames realizados ao recorrente, altura em que eles entenderam que a suspeita mais forte recaía sobre cancro de pulmão.
     29. Como se refere a alínea 25 da dúvida provada, “a exclusão da possibilidade do cancro pulmonar precisa da excisão do tumor para ser examinado …” Disso resulta que nesta circunstância, os exames de rotina (incluindo “o exame de broncoscopia + exame de biopsia” e “exame de rotina de expectoração”) perderam o valor diagnóstico, pelo que não foi necessário considerar a questão de “viabilidade”.
     30. Em geral, o diagnóstico antes da operação preencheu completamente os critérios médicos e foi praticado pelos réus com cautela e prudência, pelo que não há “ilicitude”.
     31. Além disso, o recorrente mais alegou que os réus não se optaram por uma abordagem conservadora para o tratamento e que eles violaram o dever de comunicação por não ter notificado o recorrente do conteúdo da alínea 11-a da dúvida provada “os 2º e 3º réus também disseram ao autor que, naquele tempo acharam mais adequado fazer a operação cirúrgica para excisar a massa, no sentido de fazer o diagnostico o mais depressa possível, uma vez que, na eventualidade de se tratar de cancro, não vai causar, pelo atraso, o resultado inútil da operação e aceleração da propagação do cancro do autor”.
     32. No entanto, mesmo que o recorrente fosse notificado do entendimento acima referido, ponderando segundo a razão comum, caso os réus dissessem-lhe que a abordagem conservadora causa provavelmente o atraso da operação e a propagação do cancro, o recorrente devia ser mais determinado a submeter-se à operação.
     33. Além disso, antes de ter se submetido à cirurgia, o recorrente assinou o termo de consentimento na que se descreveu expressamente que o recorrente iria submeter-se à cirurgia de “excisão do lóbulo pulmonar superior esquerdo”. O recorrente assinou tal declaração e concordou com a realização da operação.
     34. Segundo a conclusão da perícia, tal termo de consentimento preenche as exigências da área médica. A assinatura da mesma representa que os recorridos tinham cumprido ao recorrente o dever de comunicação, e que o recorrente conheceu a situação da operação e concordou com submeter-se à operação. Pelo que o direito de saber do recorrente não foi violado.
     35. Como se refere anteriormente, a “viabilidade” e o “valor diagnóstico” não são vinculados juntos. Neste caso, a abordagem conservadora foi na verdade possível, mas a questão nuclear é que quanto é o seu valor diagnóstico e o risco de atraso da operação e de propagação do cancro. Por isso, ponderando os dois meios, os réus aconselharam o autor a submeter-se à cirurgia de acordo com a sua experiência médica e o juízo profissional.
     36. Pelo que os réus ofereceram informação adequada ao recorrente.
     37. Segundo a alínea 12-a da dúvida provada, “o autor conheceu que existiria provavelmente resultado diagnóstico diferente”. Na verdade, o conhecimento do recorrente revela mais uma vez que os réus tinham cumprido adequadamente o dever de comunicação.
     38. Além disso, o recorrente entende que a conduta do Tribunal a quo de ter substituído “suficiente” por “razoável” no quesito 18º da Base Instrutória, “de acordo com o resultado do exame da biopsia percutânea transtorácica e o do PET CT, foi “suficiente” para diagnosticar cancro pulmonar com elevada probabilidade antes da cirurgia?” causou a deficiência do acórdão e reconhecimento errado da relevância do facto.
     39. Os réus não concordam com a acusação acima referida e entendem que é preciso considerar mais uma vez a alínea 25 da dúvida provada, “a exclusão da possibilidade do cancro pulmonar precisa da excisão do tumor para ser examinado, por todas as sintomas fazem com que a suspeita mais forte recaía sobre cancro de pulmão”. Disso resulta que o Tribunal a quo conheceu que segundo a situação do recorrente naquele tempo, os meios de diagnóstico já perderam o valor diagnóstico relevante.
     40. Isto quer dizer que além da excisão do tumor para ser examinado, outros meios de exame não conseguem diagnosticar com cem por cento de certeza o cancro.
     41. Pelo que o Tribunal a quo entende que “só se provou que apesar de o relatório do exame de biopsia percutânea transtorácica mostrar o resultado negativo, o resultado de “PET-CT” foi positivo, o que revelou a possibilidade de cancro, pelo que foi razoável o diagnóstico de forte suspeita de cancro pulmonar antes da operação.” Essa conclusão é lógica, não impugnável nem se desviou do objecto da questão.
     42. O mesmo raciocínio aplica-se também na reclamação deduzida pelo recorrente contra o quesito 19 da Base Instrutória. O quesito 19 da Base Instrutória “é necessária a excisão de 4 nódulos linfáticos do autor pelos 2º e 3º réus?” foi eventualmente considerado pelo Tribunal a quo como “só se provou que é razoável e compreensível a excisão de 4 nódulos linfáticos do autor pelos 2º e 3º réus”. O recorrente entende que essa conduta viola a lógica e padece do vício.
     43. No entanto, deve-se notar que a “necessidade” ou não da conduta depende de se foi detectado naquele tempo cancro. Como se refere anteriormente, naquele tempo não houve qualquer situação para afastar com certeza a possibilidade de cancro, pelo que o Tribunal não tinha fundamento para o juízo de “necessidade” ou não.
     44. Além disso, a decisão da excisão dos nódulos linfáticos teve em consideração o provável risco de propagação do cancro e visou cooperar com o tratamento provável.
     45. Uma vez que, na eventualidade de se tratar de cancro, os réus não procedessem à excisão dos nódulos linfáticos, causar-se-ia provavelmente a propagação do cancro e o resultado inútil da operação realizada, sendo também impossível a realização de outra cirurgia da excisão de nódulos linfáticos.
     46. Por isso, como entende o Tribunal a quo, apesar da impossibilidade de comprovar a necessidade ou não da conduta, esta é na verdade razoável e compreensível. Quer dizer que o entendimento do Tribunal é inquestionável.
     47. Dado que, quanto ao quesito 28 da Base Instrutória, o 3º réu confessou em 1 de Março de 2011 no julgamento que “a excisão dos nódulos linfáticos visa ao exame de biopsia, que detecta que se as células cancerosas propagaram, mas não visa prevenir a propagação”, o recorrente entende que a decisão feita pelo Tribunal a quo, isto é, “só se provou que dado que não se tinha afastado a possibilidade de cancro pulmonar no momento da cirurgia, os 2º e 3º réus procederam à excisão de 4 nódulos linfáticos junto do lado esquerdo brônquio do autor, para evitar a provável propagação do cancro do autor uma vez que, na eventualidade de se tratar de cancro” foi um reconhecimento errado da finalidade da excisão. Os réus também não concordam com a posição acima referida do recorrente.
     48. Em primeiro lugar, o 3º réu expressou pormenorizadamente na confissão que, durante a operação, os 4 nódulos linfáticos encontram-se maiores que antes, pelo que procedeu à excisão destes a fim de realizar o exame de biopsia, e de evitar afectações para o tratamento uma vez que se tratar de cancro maligno. Além disso, caso não se procedesse à excisão naquele tempo, não seria possível a realização de outra cirúrgica da excisão se a situação torne-se maligno. (vide a audio-gravação (1) – SIDE A)
     49. Disso resulta que segundo alegou o 3º réu, a finalidade da excisão de nódulos linfáticos não só se limita ao exame de biopsia.
     50. Na verdade, o 3º réu reconheceu o teor do quesito 28 da Base Instrutória, quer dizer que tal excisão não visou evitar a propagação do cancro. No entanto, deve notar que no quesito 28 da Base Instrutória não só foi referido o 3º réu, mas também o 2º réu, cuja confissão não foi adquirida durante o julgamento.
     51. Como se refere na conclusão da motivação do recurso, o critério, teor e conhecimento médicos não são interpretados de forma arbitrária por tribunal. Por isso, segundo a posição acima referida do recorrente, não se provam completamente os factos em relação ao critério, teor e conhecimento médicos só por causa da confissão do 3º réu. Pelo que tal facto é indisponível pelo 3º réu.
     52. Isso revela-se que o Tribunal a quo formou a respectiva conclusão usando todas as provas adquiridas no julgamento em conjunto com a confissão acima referida do 3º réu. Pelo que reitera-se mais uma vez que a convicção livre do Tribunal a quo é inquestionável.
     53. O recorrente mais entende que a conduta dos réus de proceder à excisão de 4 nódulos linfáticos excedeu ao âmbito do consentimento do recorrente e violou a sua vontade, porque no termo de consentimento assinado por aquele só se descreve que “concordar com submeter-se à cirurgia de excisão do lóbulo pulmonar superior esquerdo.
     54. No entanto, como referiu a testemunha Dr. H, o juízo de dissecção linfática ou biopsia linfática depende do número dos nódulos linfáticos que o médico excisa. Aquele mais disse que no que toca à dissecção, o número é pelo menos 20. (audio-gravação (3) – SIDE B)
     55. Dr. H também indicou que no caso os réus só procederam à excisão de 4 nódulos linfáticos, conduta que se trata da excisão de amostragem que visa à determinação da fase do cancro. (audio-gravação (3) – SIDE B)
     56. Isso revela que a biopsia linfática de “amostragem” realizada da pelos réus foi um dos meios de diagnóstico, mas não tratamento de dissecção que proceda à excisão de grande quantidade de nódulos linfáticos. Isto quer dizer que a biopsia linfática de “amostragem” não é de natureza operativa, mas só um meio do exame de biopsia, pelo que aquele não precisa de ser expressamente indicada no termo de consentimento bem como o exame de frozen section realizado antes da operação.
     57. Deve ter em conta que os réus entendem que o âmbito do consentimento da operação não deve ser interpretado de forma restrita como fez o recorrente, isso é porque o consentimento cirúrgico do paciente trata-se, na verdade, dum consentimento geral para a intervenção cirúrgica a certo órgão, em que o paciente concorda com outros meios relacionados com o tratamento e de relevante valor aplicados pelo médico na cirurgia.
     58. Quer dizer que não se deve interpretar o consentimento por letras, caso contrário, o mesmo seria interpretado erradamente como “o autor só concorda com que os réus procedem à excisão do seu lóbulo pulmonar superior esquerdo. Contudo, dado que no termo de consentimento não se escreve o consentimento para a excisão de outro órgão, os réus não podem proceder à cirurgia aos seus tecidos tais como o peito e a pele.”
     59. Além disso, apesar de que a excisão de nódulos linfáticos causou ao recorrente a rotura de vasos quilíferos, que provocou a complicação pós-operatória de quilotórax, deve-se entender que tal complicação pós-operatória é um dos riscos da operação. Apesar do nexo de causalidade entre a excisão de nódulos linfáticos e tal complicação, a rotura dos vasos quilíferos absolutamente não é o dano inerente causado por biopsia linfática de “amostragem”.
     60. Também não há suficientes provas de as funções corporais do recorrente ter sido danificadas ou o seu sistema da circulação linfática ter sido afectado por causa da excisão dos 4 nódulos linfáticos.
     61. Por isso, os réus não violaram o dever da comunicação dos médicos, nem o direito de saber do recorrente na qualidade de paciente. O âmbito do consentimento para a operação também não deve ser interpretado de forma restrita.
     62. O recorrente também indicou na parte final da conclusão da sua motivação que o Tribunal a quo padece de vários vícios no reconhecimento de facto. Os réus opõem-se a este entendimento, porque na verdade não se verifica nenhuma ilegalidade ou inadequação durante formação da convicção do Tribunal nem no seu teor, também bem não há “violação à razão comum”, “não razoabilidade”, “erro notório”, “violação à lógica” e “contradição” indicados pelo recorrente.
     63. Face ao exposto, os réus entendem que este caso refere-se da “responsabilidade da Administração do Território e demais pessoas colectivas públicas” prevista no artigo 2 do DL n.º 28/91/M, pelo que os 1º a 3º réus não têm legitimidade de ser réus.
     64. Caso assim não se entenda, os réus entendem que o acórdão proferido pelo Tribunal a quo não padece de qualquer inadequação e vício, o respectivo reconhecimento de facto e entendimento jurídico também são inquestionável, pelo que nos termos do artigo 4 do DL em causa aplicando o artigo 480 do CC, é ao recorrente que incumbe o ónus da prova.
     65. Tendo em conta que os réus não violaram a lei nem os dispostos de regulamentos, também considerando as regras técnicas e gerais que devem ser ponderados, e o facto de o respectivo acto ter sido praticado com prudência e cautela, o acto dos réus neste caso não tem ilicitude nem culpa, pelo que eles não respondem pela indemnização, e os pedidos do recorrente devem ser rejeitados.
    Face ao exposto, pedem se julguem procedentes os fundamentos de facto e de direito descritos na alegação e se rejeitem todos os pedidos do recorrente.

4.3. Os Serviços de Saúde da Região Administrativa Especial de Macau, Ré nos autos acima identificados, notificada das alegações de recurso do Autor, ora Recorrente, A, vem, nos termos do artigo 613, n.º 2 do Código de Processo Civil, apresentar as suas contra-alegações de recurso, concluindo:
    1. O A., ora Recorrente, não fez prova alguma de que a R., aqui Recorrida, ou os seus agentes tenham praticado qualquer acto ilícito, tal como definido pela lei.
    2. Os resultados dos exames realizados no CHCSJ, em 11.11.2005, e dos exames realizados no Hospital St. Teresa’s de Hong Kong, no período compreendido entre 17 a 19 de Novembro de 2005, conjugados com a rapidez com que cresceu o tumor do A. no período de 2 anos, permitiam suspeitar que, muito provavelmente, o tumor seria maligno.
    3. Considerando essa circunstância, os médicos da R. aconselharam o A. a submeter-se a cirurgia para remoção do tumor.
    4. O A. consentiu na realização da cirurgia, estando perfeitamente consciente de que poderia ser necessário realizar a excisão do lóbulo superior do pulmão esquerdo e que a hipótese de cancro poderia só ser confirmada após exame patológico de toda a massa do tumor, após esta ser extraída.
    5. O A. também sabia que, nestes casos, em que o diagnóstico de cancro não se confirma, a cirurgia acaba por ser o meio de diagnóstico mais seguro.
    6. A eventual realização de biopsia com endoscopia não poderia afastar com certeza alguma a hipótese de cancro, porque o resultado poderia configurar o que em medicina é conhecido como falso negativo.
    7. Que pode ocorrer porque numa biopsia não se retira toda a massa do tumor, mas apenas uma ínfima amostra desse tumor, que pode não apresentar sinais de malignidade, não obstante outras partes do tumor estarem, efectivamente, atacadas por células cancerígenas.
    8. O que poderia resultar em o cancro não ser tratado convenientemente e em uma eventual propagação das células cancerígenas a outros tecidos e órgãos, culminando na eventual morte do paciente, como causa necessária e directa do tumor.
    9. Durante a intervenção cirúrgica dos autos, realizou-se o exame de frozen section, tendo o respectivo resultado sido igualmente inconclusivo. Em qualquer caso, tal como na biopsia, os resultados negativos, de não malignidade, poderiam corresponder a falsos negativos, pelos mesmos motivos que apresentámos acima.
    10. Ficou provado que, dada a dimensão e do local onde se encontrava, a excisão parcial do tumor poderia conduzir à metástase de cancro, pelo que foi necessário remover o lóbulo superior esquerdo do pulmão do A..
    11. Ficou provado que os 2º e 3º Réus excisaram 4 nódulos linfáticos ao A. para evitar a possibilidade de metástase de cancro caso o tumor do A. fosse cancerígeno e que tal opção é razoável e compreensível.
    12. Ficou igualmente provado que a rotura dos vasos quilíferos do A. é uma complicação possível da cirurgia, é um risco médico.
    13. Considerando o exposto, forçoso é concluir que as opções médicas e os vários actos realizados foram os mais adequados face à situação clínica do A., não podendo o A. apontar a prática de qualquer acto ilícito à ora Recorrida ou aos seus agentes.
    14. Antes de se saber que o tumor do A. não era cancerígeno, a “abordagem conservadora” (que consistia em apenas observar a evolução do tumor), era, na opinião dos médicos da R. pouco prudente, dadas as características do tumor e os resultados dos exames efectuados.
    15. Em qualquer caso, o A. sabia que a hipótese de cancro era só uma hipótese e não um diagnóstico definitivo, que apenas seria possível através do exame de toda a massa do tumor.
    16. Querendo o A. poderia ter optado pela dita abordagem conservadora. Se não o fez foi porque assim decidiu.
    17. Em qualquer caso, mesmo que se entendesse que o tratamento conservador era comparativamente mais vantajoso do que retirar o tumor para análise patológica, o que não se concede e apenas admite para efeitos do presente raciocínio, nenhuma prova credível foi produzida pelo A. que demonstrasse que a opção pela cirurgia foi errada ou negligente, que é o que está em causa nos presentes autos.
    18. Não era possível obter-se um diagnóstico seguro de inexistência de malignidade do tumor do A. através do exame de frozen section durante a cirurgia, dada a possibilidade de obter-se um resultado de falso negativo.
    19. O A. não logrou provar, de modo nenhum, que por banda da R. ou dos seus agentes tenha existido qualquer comportamento que se subtraia à diligência que teria, em face da situação concreta, um bom pai de família.
    20. Ainda que se considere a prática de actos médicos uma actividade perigosa por natureza, o que não se concede, essa prática não pode ser subsumida à situação regulada no n.º 2 do artigo 486 do CC, conforme explicitado na douta sentença recorrida, devendo aplicar-se a regra geral prevista no n.º 1 do artigo 480 do mesmo Código, por força do disposto no artigo 335, n.º 1 do CC.
    21. A tese defendida pelo A. é absolutamente minoritária na jurisprudência e na doutrina.
    22. Não custa imaginar os efeitos nefastos que teria na saúde pública o entendimento segundo o qual quaisquer potenciais danos ocorridos durante a execução de actos médicos teriam sido praticados com culpa.
    23. Será razoável que, em geral e no caso dos autos, se presuma a culpa dos médicos? Tem esse entendimento alguma correspondência no espírito do n.º 2 do artigo 486 do CC e do n.º 1 do artigo 4 do DL n.º 28/91/M, de 22 de Abril? A nosso ver não.
    24. Em qualquer caso, o Autor deve ter presente que a presunção de culpa prevista no n.º 2 do artigo 486 do CC não equivale a uma presunção de verificação dos restantes pressupostos de que depende a responsabilidade civil, incluindo a prática de facto ilícito, dos danos e do nexo de causalidade entre facto e danos.
    25. E, no caso dos autos, os outros pressupostos de que depende a responsabilidade civil não ficaram provados.
    26. A responsabilidade civil por actos ou omissões na prestação de cuidados de saúde em estabelecimentos públicos aos utentes referidos no n.º 2 do artigo 3 do DL n.º 24/86/M, de 15 de Março, tem natureza extracontratual, conforme ficou definido no acórdão de Uniformização de Jurisprudência do TSI de Macau, proferido no Processo n.º 23/2005.
    27. De todos os pressupostos de aplicação do regime da responsabilidade civil, apenas um poderá ter existido: o dano conexo com a alegada deterioração da condição física resultante da intervenção cirúrgica realizada e com algumas despesas incorridas.
    28. Mas, quanto à produção destes danos, nenhuma responsabilidade pode ser assacada à ora R. ou aos seus agentes, conforme ficou demonstrado.
    29. Pelo que o nexo de causalidade necessário é também ele inexistente.
    30. As respostas à douta Base Instrutória não merecem qualquer censura, uma vez que os vícios lhes não apontados pelo A. ou são ininteligíveis ou não têm qualquer fundamento, pelo que devem manter-se inalteradas, salvo melhor opinião.
   Termos em que requer a improcedência do presente recurso, por totalmente infundado.

5. O Exmo Senhor Procurador Adjunto emite o seguinte douto parecer:
São, ao que conseguimos descortinar, 3 os recursos a apreciar por este Tribunal:
- Um, interposto pelos 1° a 3° R.R. contestando o despacho que, indeferindo as suas pretensões, os considerou com legitimidade (passiva) na acção;
- Outro, accionado pelo A., inconformado com o despacho que indeferiu seu pedido de depoimento de parte (3 primeiros R.R.) relativamente a alguns factos constantes da Base Instrutória ;
- O último, da decisão final.

Por partes:
Da legitimidade
De acordo com o disposto no art° 58°, CPC, inexistindo lei em contrário, possuem legitimidade os sujeitos da relação material controvertida, tal como é configurada pelo autor, sendo que, atentando no previsto nos art°s 2° e 3° do Dec.- Lei 28/911M, sem prejuízo de a Administração do Território e demais pessoas colectivas públicas responderem civilmente perante os lesados pelos actos ilícitos culposamente praticados pelos respectivos órgãos ou agentes administrativos no exercício das suas funções e por causa desse exercício, estes últimos respondem civilmente pela prática e actos ilícitos, se tiverem excedido os limites das suas funções, ou se, no desempenho destas e por sua causa, tiverem procedido dolosamente, ao que acresce que, nos termos de art° 7°, para além da violação do direito de outrem ou de uma disposição legal destinada a proteger os seus interesses, são também considerados ilícitos "... os actos jurídicos que violem as normas legais e regulamentares ou os princípios gerais aplicáveis e os actos materiais que infrinjam estas normas e princípios ou ainda as regras de ordem técnica e de prudência comum que devam ser tidas em consideração.".
Ora, no caso, o A. intentou acção assumindo, além do mais, que os R.R. em questão, no exercício da actividade médica no CHCSJ, por ineficiência, negligência e ofensa das regras técnicas clínicas, violaram com as condutas ou omissões respectivas, o regime de responsabilidade civil extracontratual das entidades públicas, seus titulares e agentes, por actos de gestão pública, precisamente à luz do citado Dec.- Lei 38/91/M de 22/4.
Nestes parâmetros, afigura-se-nos não merecer qualquer reparo o despacho a aceitar a legitimidade dos R.R. em causa na presente acção.

Do depoimento de parte
Também a este nível não topamos com qualquer atropelo legal com o decidido.
Com efeito, sendo certo que nos termos do n.º 1 do art° 479°, CPC, o depoimento de parte só pode ter por objecto factos pessoais ou de que o depoente deva ter conhecimento, a verdade é que os factos constantes da Base Instrutória acerca dos quais o tribunal o tribunal "a quo" não autorizou os pretendidos depoimentos dos R.R, não se reportam a factos pessoais ou de que os mesmos devam ter conhecimento, antes se tratando de quesitos por vezes respeitantes a outros R.R. que não o concretamente indicado, ou ao próprio A., ou a versar sobre matéria de natureza técnica, relativamente a alguma da qual, o próprio A., inclusive, requereu que fosse produzida prova pericial.
Donde, não assistir, também neste específico, razão ao recorrente, Autor na acção.

Da decisão final
Da matéria de facto assente, bem como das respostas aos quesitos, é, em nosso critério, possível concluir que:
- Os resultados dos exames realizados no CHCSJ a 11/11/05, conjugados com os obtidos no hospital St. Teresa's de Hong Kong entre 17 e 19 do mesmo mês e ano e com a rapidez do crescimento da "massa" tumoral detectada no ápice do lóbulo pulmonar superior esquerdo do A., permitiam, clinicamente, alicerçar a suspeita de que se poderia tratar de tumor maligno, não obstante o 1° R. não excluir a hipótese de se tratar de tuberculose – als. A), D) e E) da Matéria Assente e respostas aos quesitos 5° e 8° da Base Instrutória ;
- Nestes parâmetros, os 2° e 3° R.R., em 20/11/05, manifestaram perante o A. e sua esposa a necessidade de aquele se submeter a cirurgia para excisão integral do lóbulo pulmonar superior esquerdo por, havendo suspeitas de cancro no pulmão e não apresentando o exame patológico células cancerosas, constituir esta excisão meio de diagnóstico rápido, sendo que, a tratar-se efectivamente de cancro, a operação impediria a sua propagação - respostas aos quesitos 6°, 9°, 10° e 11°;
- O A. aceitou submeter-se à operação, declarando expressamente, com a sua mulher, por escrito, tal consentimento, sendo que, aquando dessa declaração, sabia que podiam surgir diversos resultados de diagnóstico, sendo o mais forte de cancro do pulmão, mas, para o confirmar, havia que retirar a "massa" tumoral para análise – al. I) e respostas aos quesitos 9° e 12° ;
- No cancro pulmonar precoce, a existência de células cancerosas pode não ser confirmada pelo exame de expectoração, devendo, quando o resultado for negativo, proceder-se a exames mais pormenorizados como a broncoscopia + biopsia - respostas aos quesitos 13°e14°;
- Pese embora o resultado da biopsia percutânea transtorácica ("Transtoracic Needle Aspiration") tenha sido negativo, tal não pode excluir a possibilidade de cancro, podendo tratar-se de "falso negativo", sendo que, apresentando-se o resultado do PET CT como positivo, tal se revelava suficiente para diagnosticar cancro pulmonar com elevada possibilidade antes da cirurgia - respostas aos quesitos 18° e 21º ;
- Dada a grande dimensão do tumor e o local onde o mesmo se encontrava, a tratar-se de cancro, com a excisão de apenas parte do lóbulo pulmonar superior esquerdo, existia a possibilidade da ocorrência de metástases - respostas aos quesitos 22°, 23° e 24° ;
- Antes da realização da excisão, foi efectuado exame de "frozen section" tendo sido extraída uma amostra na qual se detectaram algumas células atípicas insuficientes para análise, havendo que retirar mais tecidos – al. M) ,
- Durante a operação, foi, para além do lóbulo pulmonar superior esquerdo, efectuada a excisão de 4 nódulos linfáticos próximos à parte lateral dos brônquios, para evitar a possibilidade de metástases caso se tratasse de cancro do pulmão, sendo razoável e compreensível tal excisão – al. N) e quesitos 28° e 29° ;
- Após a operação registou-se a ruptura de vasos quilíferos do A. causando complicações pós operatórias do quilotórax, tendo exsudado entre 27/11 e 6112-2005 um total de 2.930 ml de líquido linfático – als. O) e P).
Analisando :
Como já se referiu, a responsabilidade civil extracontratual da Administração da RAEM e demais pessoas colectivas no domínio de actos de gestão pública, rege-se pelo disposto no Dec Lei 28/91/M de 22/4, com as alterações introduzidas pelo Dec Lei 110/99/M de 13/12, resultando dos normativos respectivos que o "nascimento" da obrigação de indemnizar carece do registo cumulativo de acto ilícito, culpa, dano e nexo de causalidade entre o acto e o dano.
Tal como a situação se apresenta no presente caso, importará, em nosso critério, para escrutínio da ilicitude e da culpa, tal como configuradas nos art° 7° e 3° do supra citado diploma legal, a aferição sobre se as opções e os vários actos médicos praticados pelos primeiros 3 R.R. foram ou não os mais adequados à situação clínica apresentada pelo A., ou, dito de outra forma, se a opção pela cirurgia e forma como a mesma foi levada a cabo, revelam alguma ineficiência ou negligência médica, ou se apresentam contrários às regras técnicas clínicas exigíveis.
Não nos parece.
Da matéria factual apurada resulta claramente que, pese embora através dos exames de expectoração e de biopsia percutânea transtorácica se não tenha detectado a existência de células cancerosas, tais exames revelam-se inconclusivos, não sendo tal tipo de resultados passíveis de afastar, com rigor, a hipótese de cancro, podendo constituir falsos negativos, razão por que, tendo o resultado do "PET CT" sido positivo, a hipótese de cancro se mantinha, apresentando-se a cirurgia como o meio mais seguro de diagnóstico.
Por outra banda, pelo facto de no decurso já da intervenção cirúrgica, o exame de "frozen section" ter apresentado também resultados inconclusivos, justificava-se a opção pela excisão integral do lóbulo pulmonar superior esquerdo para realização da biopsia, revelando-se razoável e compreensível a excisão dos 4 lóbulos linfáticos para evitar a possibilidade de metástases para outros tecidos e órgãos, caso de cancro se tratasse.
Quanto à ruptura, no decurso da operação, dos vasos quilíferos, causando complicações pós-operatórias com exsudação de líquido linfático, atentas as respostas aos quesitos 30°, 31° e 32°, mal se vê a conclusão "tout court" extraída na douta decisão sob escrutínio de que "pertence a risco cirúrgico". De todo o modo, na verdade não se prova que a ocorrência tenha derivado da violação do dever de cuidado ou das regras técnicas clínicas de qualquer dos intervenientes na cirurgia, sendo que, como adiante melhor adiantaremos, caberia ao A. o ónus dessa prova.
Acresce que a matéria factual apurada aponta também claramente no sentido de o A. e sua esposa terem sido perfeitamente esclarecidos que só após a realização da cirurgia e extracção do tumor poderia formular-se conclusão definitiva sobre a existência ou não e cancro, e que, a tratar-se do mesmo, a mera observação da evolução do tumor poderia implicar a criação de metástases para outros tecidos e órgãos, sendo na posse de todos esses informes que o A. concedeu expressa anuência à efectivação da operação.
Finalmente, é inequívoco que, ao contrário do sustentado pelo A., não se pode considerar o exercício da medicina uma actividade perigosa pela sua própria natureza, não podendo, assim, beneficiar aquele da presunção de culpa estatuída no n.º 2 do art° 486°, C.C., pelo que lhe incumbia a prova dos factos constitutivos do seu direito, designadamente os atinentes à ilicitude e culpa dos R.R.
Assim não tendo sucedido, por carência do registo de tais pressupostos essenciais e cumulativos na efectivação da responsabilização civil extracontratual por factos ilícitos, somos a entender não merecer provimento o presente recurso, havendo que manter o decidido.
    
    5. Foram colhidos os vistos legais.
    
    III - FACTOS
    Vêm provados os factos seguintes:
   
   “No dia 11 de Novembro de 2005, o autor dirigiu-se ao Serviço de Urgência do Centro Hospital Conde de S. Januário, subunidade da 4ª ré. O pessoal médico e de enfermagem, depois de ter realizado o exame de raio X e um exame de TAC, descobriu que no ápice do lóbulo pulmonar superior esquerdo do autor existia uma massa com a dimensão de 3cm x 4cm, mas não foi confirmado o que era.
Para perceber do que se tratava a massa evidenciada no ápice do lóbulo pulmonar superior esquerdo do autor, o Hospital marcou uma consulta para a manhã do dia 15 de Novembro de 2005 para efectuar outros exames, especialmente, analisar a possibilidade da realização do “exame de broncoscopia”.
O 1º réu mencionou ao autor que, segundo os exames que lhe foram realizados, os sintomas e a sua idade, havia suspeita de que o autor tivesse cancro do pulmão, mas não excluía a hipótese de ser tuberculose.
Não foi efectuado o exame de broncoscopia em 15 de Novembro de 2005, uma vez que tendo em consideração o local onde a massa se encontrava e a necessidade de acrescentar o exame de biopsia, o respectivo exame seria realizado mais adequadamente com o apoio e monitorização de um aparelho de raio X e havia insuficiência de recursos humanos no hospital no período das Corridas do Grande Prémio.
O supracitado exame de broncoscopia foi adiado para o dia 25 de Novembro de 2005, pelas 08h30 de manhã.
O autor sabia bem da data e do local do supracitado exame.
De 17 a 19 de Novembro de 2005, o autor foi submetido a exames no Hospital St. Teresa’s de Hong Kong, que incluíram biopsia percutânea transtorácica e PET CT, e o respectivo resultado encontra-se no relatório do exame constante das fls. 36 a 40 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
Após o regresso a Macau, o autor entregou os resultados dos exames acima referidos ao 2º réu.
O 2º réu disse que o exame de PET CT não é uma forma de detectar com exactidão o cancro, que não se pode recorrer precipitadamente à intervenção cirúrgica e que este tipo de operação não pode ser feita de forma leviana, mais disse que da imagem que lhe foi facultada, verificou que existia um objecto com a forma de uma linha que parecia ser canceroso e prometeu que iria analisar a situação com outros médicos.
Na manhã do dia 20 de Novembro de 2005, com o intuito de apoiar a análise do caso realizada pelo 2º réu, a esposa do autor, a Senhora I forneceu os seguintes elementos: o exame de “biopsia percutânea transtorácica” realizado ao autor em Hong Kong tinha sido feito duas vezes, e a mesma perguntou ao 2º réu se o objecto com forma de uma linha suspeita de ser cancro foi ou não causado pelo exame.
A Senhora Tam ainda disse ao 2º réu que, em Setembro de 2004, o autor tinha feito o transplante de um dente molar na maxila e, durante o período de transplante, apareceu um inchaço na face esquerda e na parte esquerda do pescoço que perdurou duas semanas e o respectivo dentista não prescreveu nenhum anti-inflamatório ao autor, bem como a mesma colocou mais uma dúvida ao 2º réu no sentido de saber se a inflamação nos pulmões poderia ter sido causada pela invasão de micróbios.
No dia 20 de Novembro de 2005, cerca das 16 horas, no encontro entre os 2º e 3º réus e o autor e a sua esposa no CHCSJ, os dois réus manifestaram a necessidade de o autor se submeter à cirurgia.
O 3º réu mencionou ao autor e a sua esposa que os tecidos na parte superior esquerda do seu pulmão podem ser de um tumor maligno, porque em 2003, quando o autor foi submetido ao exame de raio X aos pulmões, não existia nenhum objecto estranho e num período curto de 2 anos apareceu um tumor tão grande.
Os 2º e 3º réus analisaram o relatório de biopsia percutânea transtorácica assistido pelo TAC à parte superior do pulmão superior esquerdo feito em Hong Kong e o relatório de PET-CT, e a suspeita mais forte recaía sobre o cancro pulmonar, por isso aconselharam o autor a submeter-se à cirurgia de excisão “integral do lóbulo pulmonar superior esquerdo”, e o autor aceitou submeter-se à operação.
O 2º réu disse ao autor que, quando há fortes suspeitas de cancro do pulmão, mas o exame patológico não revela células cancerosas, a cirurgia de excisão acaba por ser um meio de diagnóstico.
Os 2º e 3º réus acharam mais adequado fazer a operação cirúrgica para excisar a massa, no sentido de fazer o diagnóstico o mais depressa possível, uma vez que, na eventualidade de se tratar de cancro, não vai causar, pelo atraso, o resultado inútil da operação e aceleração da propagação do cancro do autor.
O autor assinou a declaração de consentimento constante das fls. 438 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
O autor e a sua esposa assinaram a declaração de consentimento antes de cirurgia, e concordaram submeter-se à cirurgia da excisão “integral do lóbulo pulmonar superior esquerdo”.
Antes de assinar a declaração de consentimento, o autor sabia que podiam surgir diversos resultados de diagnóstico e, naquele momento, a suspeita mais forte era a de cancro do pulmão, e para se saber foi necessário retirar a massa para análise.
No dia 21 de Novembro de 2005, o autor entrou no hospital e preparou-se para se submeter à cirurgia.
O autor sabia bem da data e do local do supracitado exame.
No dia 25 de Novembro de 2005, realizou-se uma torascopia assistida por vídeo no bloco operatório de CHCSJ, subunidade da 4ª ré, tendo começado às 8h35 da manhã e tendo terminado a cerca das 2h05 da tarde, isto é, durou 5 horas e 30 minutos.
Antes da realização da supracitada operação, o autor nunca tinha sido submetido aos exames de “broncoscopia e biopsia”.
A operação acima referida foi da responsabilidade dos 2º e 3º réus.
Antes de realizar a excisão acima referida, foi efectuado o exame de frozen section para análise, tendo sido extraída uma amostra de 0,3cm x 0,3cm x 0,1cm de dimensão, e cujo resultado foi “detectaram-se algumas células atípicas, mas não são suficientes para análise; deve-se retirar mais tecidos.
Durante a operação, foi efectuada a excisão do lóbulo pulmonar superior esquerdo e de 4 nódulos linfáticos próximos à parte lateral esquerda dos brônquios.
No cancro pulmonar precoce, a existência de células cancerosas pode não ser confirmada pelo exame de expectoração.
Assim, quando o resultado for negativo, deve-se proceder a exames mais pormenorizados, como broncoscopia e biopsia.
Os exames de broncoscopia e biopsia são exames de rotina feitos antes de qualquer operação aos pulmões, para recolher amostras para diagnóstico de casos de doenças brônquicas ou pulmonares impossíveis de diagnosticar ou casos de doenças pulmonares difusas difíceis de diagnosticar, para determinar o tipo de células cancerosas e o próprio tratamento.
Pese embora o resultado do relatório da biopsia percutânea transtorácica tenha sido negativo, o resultado de PET CT foi positivo, assinalando cancro, pelo que tal foi suficiente para diagnosticar cancro pulmonar com elevada probabilidade antes da cirurgia.
Através de TTNA (Transtoracic Needle Aspiration), para extrair amostras, não pode excluir-se a possibilidade de cancro.
Dada a grande dimensão do tumor e o local onde o mesmo se encontra, no caso de tratar-se de cancro, é possível que a excisão da parte parcial do lóbulo pulmonar superior esquerdo ou tecido conduza a metástase de cancro.
Se não se proceder à excisão do tumor para análise, impossibilita-se a eliminação do cancro, uma vez que todos os sintomas levam os 2º e 3º réus a pensar que o autor sofre de cancro pulmonar com elevada probabilidade.
No caso do autor, apenas se procede à excisão integral do lóbulo pulmonar superior esquerdo para poder realizar a biopsia e a recolha de amostra.
Por isso, os 2º e 3º réus continuaram a proceder à excisão de acordo com os procedimentos propostos.
Como no momento da cirurgia não pôde excluir-se a possibilidade de cancro do autor, os 2º e 3º réus excisaram 4 nódulos linfáticos juntos à parte lateral esquerda dos brônquios do autor, para evitar a possibilidade de metástase de cancro caso se tratasse de cancro de pulmão.
É razoável e compreensível a excisão de um total de 4 nódulos linfáticos do autor durante a cirurgia realizada pelos 2º e 3º réus.
Após a operação, verificou-se a rotura dos vasos quilíferos do autor, causando complicações pós-operatórias de quilotórax.
No período compreendido entre 27 de Novembro e 6 de Dezembro de 2005, o autor exsudou um total de 2.930,00ml de líquido linfático.
No dia 6 de Dezembro de 2005, o autor foi autorizado pela Junta para os Serviços Médicos no Exterior a ser enviado ao Union Hospital de Hong Kong para tratamento, tendo sido submetido a uma cirurgia invasiva de ligamento dos ductos linfáticos realizada pelo Professor H no dia 7 de Dezembro de 2005.
No dia 19 de Dezembro de 2005, antes do regresso a Macau, o autor e a sua esposa receberam o relatório da biopsia feita em 9 de Dezembro de 2005, emitido pelo Serviço de Anatomia Patológica do CHCSJ. O relatório mostrava que no lóbulo pulmonar superior esquerdo e nos vasos linfáticos excisados não foram encontradas mutações malignas, mas apenas uma inflamação. O respectivo relatório encontra-se nas fls. 61 a 63 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
O Union Hospital de Hong Kong obteve as referidas lâminas da biopsia do CHCSJ para fazer uma nova análise e confirmou a inflamação do pulmão do autor. O respectivo relatório encontra-se nas fls. 64 a 66 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
No período compreendido entre 21 de Novembro e 19 de Dezembro de 2005, o autor esteve hospitalizado, o período compreendido entre 20 de Dezembro de 2005 e 31 de Agosto de 2006 corresponde à baixa para convalescença e em 1 de Setembro de 2006 o autor aposentou-se.
Na altura de aposentação, o autor tinha 43 anos.
No momento da ocorrência do caso, o autor era guarda-ajudante (músico).
Desde Junho de 2006, o autor auferia mensalmente o índice de 275.
No período compreendido entre 9 de Fevereiro de 1981 e 31 de Agosto de 2006, o autor prestou serviço nas Forças de Segurança, com menção de muito bom na classificação, o nível de comportamento pertence ao tipo de modelo, não tendo registo de processo disciplinar.
Antes da aposentação, o autor auferia mensalmente subsídio de refeição de MOP$250 e uma remuneração adicional equivalente a 50 pontos da tabela indiciária (vulgarmente designado por subsídio de risco).
O autor encontrava-se em gozo de faltas por doença no período compreendido entre 12 de Novembro e 19 de Dezembro de 2005, durante o qual foi-lhe descontado um sexto do vencimento.
Como o autor se submeteu a duas cirurgias, a sua condição física piorou.
O autor não fuma nem bebe.
Antes da ocorrência do caso, o autor tinha uma vida normal, gostava de futebol, participava, em média, em dois a três treinos de futebol por semana e em não menos de duas a três sessões de “jogging” por semana.
Depois da ocorrência do caso, o autor parou de jogar futebol.
O autor renunciou à força policial, sentindo-se desprezado por si mesmo.
O incidente causou-lhe a perda do lóbulo pulmonar superior esquerdo, levando o autor a ficar desanimado e a perder a confiança sólida que possuía.
Até à presente data, o autor ainda sente dores na ferida, bem como ainda necessita de deslocar-se ao médico.
No dia 4 de Maio de 2006, o autor requereu um relatório médico ao CHCSJ, mas só obteve um “Atestado Médico” e a respectiva despesa foi de MOP$225.
As despesas de aluguer de camas para acompanhamento do Union Hospital de Hong Kong da Senhora I, no período entre 6 de Dezembro e 18 de Dezembro de 2005, foram de MOP$2.600,00.
A fim de cuidar do autor que se encontrava em pós-operatório, a Senhora I requereu licença sem vencimento no período de 12 de Dezembro de 2005 a 10 de Janeiro de 2006, daí resultando uma perda de vencimento mensal e de 4 prémios de antiguidade, num total de MOP$25.348,30.
No dia 14 de Junho de 2007, o autor deslocou-se a Hong Kong para tratamento e pagou por conta própria despesas de barco de MOP$258, de táxi MOP$327 e de consulta médica de MOP$1.146,00.
Em relação ao tratamento para recuperação por alimentação à base de medicamentos chineses, incluindo a aquisição de “cordyceps sinesis” e de outros medicamentos chineses, o autor gastou no mínimo MOP$30.510,00.
A Senhora I, esposa do autor, ama-o muito, participou em todo este processo e sempre esteve com o autor. Como o autor foi lesado, ela entrou num estado de colapso mental necessitando em muitas noites de tomar hipnóticos para induzir o sono.
No dia 29 de Outubro de 2007, o autor intentou acção ao Tribunal.
    
    IV - FUNDAMENTOS
A - Do recurso interlocutório

1. Interpõem os 1º a 3º réus, B, C e D, recurso do despacho que os considerou partes legítimas na acção.

2. O douto despacho proferido foi do seguinte teor:
“Os 1º a 3º RR apresentaram excepção dilatória na contestação, entendendo que não possuem legitimidade.
  Nos termos do art.º 58.º do Código de Processo Civil, “na falta de indicação da lei em contrário, possuem legitimidade os sujeitos da relação material controvertida, tal como é configurada pelo autor.” A parte legítima é estabelecida na instauração de acção por autor, e para os efeitos normais e úteis, possuir legitimidade passiva quem assume obrigações na relação material controvertida configurada pelo autor.
  O autor intentou acção de responsabilidade civil extracontratual, entendendo que os réus violaram o regime da responsabilidade civil extracontratual das entidades públicas, dos seus titulares e agentes por actos de gestão pública previsto pelo Decreto-Lei n.º 28/91/M de 22 de Abril.
  O legislador não tem regulamento especial para a legitimidade passiva no Decreto-Lei n.º 28/91/M. Ao abrigo dos dispostos nos artigos 2.º e 3.º do mesmo Decreto-Lei, a Administração do Território e demais pessoas colectivas públicas respondem civilmente perante os lesados, pelos actos ilícitos culposamente praticados pelos respectivos órgãos ou agentes administrativos no exercício das suas funções e por causa desse exercício, e os órgãos ou agentes administrativos só respondem civilmente pela prática de actos ilícitos, se tiverem excedido os limites das suas funções ou se, no desempenho destas e por sua causa, tiverem procedido dolosamente. Por isso, possuem legitimidade passiva os 1º a 3º réus e a acção tem valor.
  Com base nisso, julga-se improcedente a excepção dos 3 réus.
  In casu, os supracitados réus disseram na sua contestação que não possuíam legitimidade passiva e pediram ao tribunal recorrido para indeferir a pronúncia e os pedidos contra os réus, porém, o tribunal recorrido indeferiu o pedido dos réus no despacho saneador.”

    3. Cumpre apreciar
    Os recorrentes entendem que o entendimento do tribunal recorrido viola os artigos 3.º e 5.º do Decreto-Lei n.º 28/91/M e art.º 58.º do Código de Processo Civil.
    Nos termos do art.º 58.º do Código de Processo Civil, “Na falta de indicação da lei em contrário, possuem legitimidade os sujeitos da relação material controvertida, tal como é configurada pelo autor.”
    Os recorrentes entendem que a relação material controvertida no presente processo envolve apenas o autor e a 4ª ré – ou seja os Serviços de Saúde, não incluindo os recorrentes.
    
    4. Importa mencionar que os respectivos actos médicos foram praticados pelos recorrentes no local e na hora de trabalho, e no exercício das suas funções.
    Nos termos do art.º 2.º do Decreto-Lei n.º 28/91/M, “a Administração do Território e demais pessoas colectivas públicas respondem civilmente perante os lesados, pelos actos ilícitos culposamente praticados pelos respectivos órgãos ou agentes administrativos no exercício das suas funções e por causa desse exercício.”
     No artigo 4º prevê-se:
    “1. A culpa dos titulares dos órgãos ou dos agentes é apreciada nos termos do artigo 480.º do Código Civil.
    2. Se houver pluralidade de responsáveis, é aplicável o disposto no artigo 490.º do Código Civil.”
     E no artigo 5º:
    “Quando satisfizerem qualquer indemnização, a Administração do Território e demais pessoas colectivas públicas gozam do direito de regresso contra os titulares do órgão ou os agentes culpados, se estes houverem procedido com dolo, ou com diligência e zelo manifestamente inferiores àqueles a que se achavam obrigados em razão do cargo.”
     Por sua vez o artigo 480º do CC preceitua:
    “1. É ao lesado que incumbe provar a culpa do autor da lesão, salvo havendo presunção legal de culpa.
    2. A culpa é apreciada, na falta de outro critério legal, pela diligência de um bom pai de família, em face das circunstâncias de cada caso.”
    E o artigo 490ª:
    “1. Se forem várias as pessoas responsáveis pelos danos, é solidária a sua responsabilidade.
    2. O direito de regresso entre os responsáveis existe na medida das respectivas culpas e das consequências que delas advieram, presumindo-se iguais as culpas das pessoas responsáveis.”
    
    5. A questão está em saber em que situações é apenas a Administração que assume a responsabilidade por tais faltas.
    Em princípio, tal não acontece se os agentes, nos casos em que tenham excedido os limites das suas funções ou se, no desempenho destas e por sua causa, tiverem procedido dolosamente, mas é de mencionar que a aplicação deste artigo não deve prejudicar o disposto no art.º 2.º do mesmo Decreto-Lei.
    O direito de regresso previsto naquele diploma, é questão diversa, não obstante a 4ª ré entender na sua contestação que não se verifica culpa ou omissão nos serviços médicos prestados ao autor, e que os actos médicos praticados pelos recorrentes correspondem às devidas regras.
    Analisar o tipo e grau de culpa que houve também é questão diversa e o importante é integrar tal culpa na configuração feita pelo autor.
    
    6. Mas antes disso vamos ver o que se passa em termos de Jurisprudência Comparada.
    No ac. do STA, de 28/9/06, proc. n.º 855/04, decidiu-se que “Não são inconstitucionais as normas dos artºs 2º e 3º, nos 1 e 2 do DL 48.051, de 21.11.67, enquanto eximem de responsabilidade, no plano das relações externas, os titulares dos órgãos, funcionários e agentes do Estado e demais entidades públicas pelos danos causados pela prática de actos ilícitos e culposos (culpa leve ou grave) no exercício das suas funções e por causa delas.”
    E no ac. do STA, de 3/6/04, processo n.º 047722, em que foi relator, o Conselheiro Cândido Pinho, ora 1º adjunto neste processo: “O art. 22º da CRP não consagra uma responsabilidade solidária automática do Estado e demais pessoas colectivas públicas com os titulares dos seus órgãos, funcionários e agentes, antes se mostrando compatível com os pressupostos mantidos pelo legislador ordinário no DL nº 48051, de 21/11/1967.”
    Aí mais se escreveu:
    “Para a recorrente, apenas o Hospital podia ser demandado. A sua demanda só se aceitaria caso tivesse excedido os limites das suas funções ou se tivesse agido com dolo, o que, na sua opinião, não teria acontecido.
A decisão recorrida foi a de a julgar parte legítima, de acordo com o art. 22º da CRP. E isto por a disciplina do DL nº 48051, de 21/11/1967 só se encontrar em vigor em tudo o que não seja incompatível com o citado art. 22º, o que seria, precisamente, o caso do nº1 do art. 2º.
Vejamos.
Na petição dizia-se que seria solidária a responsabilidade dos RR, nos termos do art. 22º da CRP e 2º, nº1 do DL nº 48 051, sendo que a dos médicos demandados resultava de actos materiais ilícitos a título de mera culpa (negligência).
O art. 2º, nº1, do DL nº 48 051 dispõe o seguinte:
«1- O Estado e demais pessoas colectivas públicas respondem civilmente perante terceiros pelas ofensas dos direitos destes ou das disposições legais destinadas a proteger os seus interesses, resultantes de actos ilícitos culposamente praticados pelos respectivos órgãos ou agentes administrativos no exercício das suas funções e por causa desse exercício.
2- Quando satisfizerem qualquer indemnização nos termos do número anterior, o Estado e demais pessoas colectivas públicas gozam do direito de regresso contra os titulares ou os agentes culpados, se estes houverem procedido com diligência e zelo manifestamente inferiores àqueles a que se achavam obrigados em razão do cargo».
Com a publicação da Constituição de 1976, designadamente o seu art. 22º passou a haver necessidade de compatibilizar os respectivos regimes, face ao disposto no art. 290º, nº2 da CRP.
E art. 22º estabelece:
«O Estado e as demais entidades públicas são civilmente responsáveis, em forma solidária com os titulares dos seus órgãos, funcionários ou agentes, por acções ou omissões praticadas no exercício das suas funções e por causa desse exercício, de que resulte violação dos direitos, liberdades e garantias ou prejuízo para outrem».
Quererá esta disposição constitucional dizer que a solidariedade ali estabelecida é abrangente e desligada do aspecto material concreto (tese que parece colher-se da decisão ora impugnada)? Ou seja, teria o preceito efectuado um alargamento “sub-reptício” da responsabilidade solidária dos funcionários do Estado a todas as situações, independentemente do grau de culpa destes?
A responsabilidade dos funcionários e agentes é regulada no art. 271º da CRP. E é o nº4 desse artigo que prescreve ser a lei ordinária a regular «os termos em que o Estado e as demais entidades públicas têm direito de regresso contra os titulares dos seus órgãos, funcionários e agentes».
A tese da inconstitucionalidade do DL nº 48 051 teria começado com o Ac. do STJ de 6/5/1986, ao defender a caducidade do diploma na parte em que limita a responsabilidade dos titulares dos órgãos, funcionários e agentes do Estado e demais entidades públicas (Proc. Nº 73 710, in BMJ nº 357/392; no mesmo sentido, ver a obra Responsabilidade Civil Extracontratual da Administração Pública, coordenação de Fausto de Quadros, Almedina, 1995, pag. 118). Ou seja, como regra geral, teria desaparecido a responsabilidade exclusiva da Administração, para passar a ser solidária (Rui Medeiros, in Ensaio sobre a Responsabilidade Civil do Estado por Actos legislativos, pag. 92/122).
No sentido ainda da incompatibilização do DL nº 48 051 com o art. 22º da CRP, face ao princípio da responsabilidade solidária ali prescrito, ver ainda: Freitas do Amaral, Direito Administrativo, vol. III, 1989, pág. 500 e segs. e "Natureza da responsabilidade civil por actos médicos praticados em estabelecimentos públicos de saúde" in Direito da Saúde e Bioética, 1991, pág. 121; Maria da Glória Garcia, A Responsabilidade Civil do Estado e demais Pessoas Colectivas Públicas, in Conselho Económico e Social, 1997, pag. 69 e 70 e José Luís Moreira da Silva, Da Responsabilidade Civil da Administração Pública por Actos Ilícitos, na obra Responsabilidade Civil Extracontratual da Administração Pública, acima citada, 1995, Almedina, pag. 160; Fernandes Cadilhe, in Responsabilidade da Administração Pública, in «Revista do Ministério Público», nº 86, pág. 8).
(…)
No entanto, para outros, da conjugação dos mencionados arts. 22º e 271º não resulta que, em momento algum, o regime do DL nº 48 051 esteja posto em causa e, portanto, não se pode falar em inconstitucionalidade (Jorge Miranda, in Manual de Direito Constitucional, tomo IV, Direitos Fundamentais, Coimbra Editora, 3ª ed., pag. 291; no sentido ainda de que o legislador constituinte não pretendeu condensar no art. 22º todo o regime jurídico da responsabilidade extracontratual do Estado por danos decorrentes da sua actividade, v. Dimas Lacerda, in Contencioso Administrativo, Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado, pag.258; ainda G. Canotilho e Vital Moreira, in Constituição República Portuguesa Anotada, IV, pág. 953, ao defenderem a continuação da vigência do DL nº 48 051 enquanto não houver nova intervenção legislativa ordinária).
(…)
No mesmo sentido, Vieira de Andrade opinou que, quando haja violação de direitos, liberdades e garantias de um indivíduo, este tem direito a indemnização sendo nesse caso o Estado e demais entidades públicas solidariamente responsáveis com os respectivos órgãos ou agentes.
    (…)
A nível jurisprudencial, a favor da inconstitucionalidade superveniente, pode ver-se o Ac. do STA de 3/05/2001, Proc. Nº 47 084.
Mas, favoráveis à conciliação, pode ler-se os Acórdãos do STA de:
- 22/05/90, Proc. Nº 28 120;
- 29/10/92, Proc. Nº 29 994;
- 28/02/2002, Proc. Nº 048 178.
Em nossa opinião, e em resumo, o propósito do art. 22º não é senão o de conceder dignidade constitucional ao princípio da responsabilidade do Estado, não já o de disciplinar os pressupostos do dever de responder por parte dos funcionários e agentes (assim também, Margarida Cortez, Responsabilidade Civil da Administração por Actos Administrativos Ilegais e Concurso de Omissão Culposa do Lesado, BFDC, pag.25).
Por isso, estamos com aqueles que postulam uma ideia de conformidade ou compatibilidade entre o comando do art. 22º da Constituição e os pressupostos mantidos pelo legislador ordinário no DL nº 48 051 sobre a repartição do dever de indemnizar.
Estabelece-se no art. 2º daquele articulado legal uma culpa funcional, isto é, decorrente do exercício do cargo (para o facto ilícito praticado fora do exercício de funções, responde o art. 3º do diploma).
Sendo leve a culpa do funcionário, incurso nesse caso em mera negligência, apenas responderá civilmente a Administração (art. 2º, nº1).
Mas, se agiu com dolo (art. 3º), ou se for grave a sua culpa funcional por ter procedido com diligência e zelo manifestamente inferiores aos que dele se esperava em razão do cargo ocupado (art. 2º, nº2), então a sua responsabilidade será solidária com a da Administração. O autor poderá demandar apenas o Estado e demais entes públicos (nessa hipótese, a Administração condenada ficará com o direito de regresso sobre aquele: arts. 3º, “in fine”, 4º, nº2, do cit. dip.; arts. 497º e 507º do C.C.) ou esta e, simultaneamente, o agente culpado (F. Amaral, Direito Administrativo, III, pag. 508; Maria José Rangel de Mesquita, Da Responsabilidade civil extracontratual da Administração no ordenamento jurídico-constitucional vigente, in «Responsabilidade Civil Extracontratual da Administração Pública», Almedina, 1995, pag. 101 a 124 ".

    7. Esta doutrina afigura-se-nos ser válida na RAEM à luz dos diplomas e normas aqui vigentes.
    Desde logo não temos uma norma na Lei Básica como as acima apontadas o que facilita o entendimento e a interpretação do regime não estar sujeita a tal condicionamento.
    Depois, analisando o regime do DL n.º 28/91/M, do artigo 2º e artigo 5º decorre um regime que não se afasta do estabelecido no referido Decreto-lei n.º 48051, de 21 de Novembro de 1967.
    Assim, no artigo 2º estabelece-se que a Administração responde pelos actos ilícitos culposos dos titulares dos órgãos e seus agentes no exercício das funções e no artigo 5º estabelece-se o direito de regresso contra os titulares dos órgãos e agentes nos caos de dolo ou com diligência e zelo manifestamente inferiores àqueles a que se achavam obrigados em razão do cargo.
    Donde resulta uma diferença de regime entre as situações de mera culpa ou negligência leve e a culpa grave. Na primeira situação só a Administração se configura como responsável e como tal só ela deverá ser demandada. Já não assim nos casos de culpa grave.
    
    8. Ora, lendo a petição do A., só uma culpa desta natureza é configurada.
    A negligência consiste na omissão da diligência a que o agente estava obrigado ou, por outras palavras, na inobservância do dever objectivo de cuidado que lhe era exigível e, segundo a terminologia clássica, pode revestir várias formas: culpa levíssima, culpa leve e culpa grave. A primeira (culpa levíssima) ocorre quando o agente tiver omitido os deveres de cuidado que uma pessoa excepcionalmente diligente teria observado. A segunda (culpa leve) acontece quando o agente tiver deixado de observar os deveres de cuidado que uma pessoa normalmente diligente teria observado. A terceira (culpa grave) existirá quando o agente deixar de usar a diligência que só uma pessoa especialmente descuidada e incauta não teria observado.5
    No nosso caso, o A. imputa aos réus médicos uma conduta caracterizada por mera culpa, ao alegar na petição inicial “Os 1º, 2º e 3º réus trataram o autor com negligência, não respeitaram a integridade física do autor, abandonaram os devidos meios de exame, e não exerceram as atribuições dos médicos nem o dever de prudência”(artigo 58º da p. i.); “Os réus cometeram vários erros, antes da confirmação da doença, omitiram por negligência o exame de broncoscopia marcado ou decidiram de forma vaidosa não realizar este exame, e também omitiram de forma imprudente e leviana o exame de rotina de expectoração. Além disso, durante a operação, abandonaram de novo ou não completaram processos devidos do exame de frozen section, só fizeram a biopsia com agulha, e não procederam à excisão segmentar do chamado lóbulo pulmonar suspeito de ser cancro para a examinação de células cancerosas” (artigo 59º); “Os réus violaram a praxe médica e não tiveram a devida atitude prudente, e as suas condutas imprudentes, vaidosas e inadequadas causaram danos ao autor, pelo que houve culpa grave nas referidas condutas” (artigo 60º); “Os 3 réus devem cumprir “artis medis” - indicando que o médico deve tratar o doente com técnicas mais sólidas, ou seja prestar a assistência médica com qualidade de acordo com o procedimento e regulamento de medicina, combinado com o seu próprio nível de conhecimentos, bem como indicando no momento de tratamento a aplicação da técnica e da forma mais completa, incluindo actos de tratamento prestados a tempo oportuno e conveniente consoante as situações. Porém, obviamente os 3 réus não observaram o supracitado princípio” (artigo 73º); “No dia 25 de Janeiro de 2007, o autor e a Senhora I apresentaram queixa ao director do CHCSJ. Na representação, eles contaram o decurso de todo o assunto, entenderam que as condutas dos réus constituíram “negligência”, “erro de diagnóstico” e “falha na operação”…” (artigo 80ª); “De acordo com os factos e circunstâncias no presente caso, os respectivos réus não observaram nem prestaram atenção à praxe médica que devia ser tida em consideração, não prestando o melhor serviço médico ao autor. Por outra palavra, o respectivo hospital não observou rigorosamente as regras fundamentais e gerais de “técnica médica”, isso é causado pelos réus e também pelo regime do hospital.” (artigo 139º); “… In casu, são óbvias a violação da regra de prestação de melhor assistência e a falta de atitude prudente.(artigo 140ª); A responsabilidade civil extracontratual por facto ilícito culposo tem de reunir ao mesmo tempo os seguintes requisitos… culpa (que é moralmente e juridicamente censurável, e no caso de mera culpa, significa que o agente deve ser censurado por não tomar medidas adequadas que qualquer pessoa normal devia tomar numa circunstância concreta)… “(artigo 155º).
    
    9. Perante isto, estamos em crer que se imputa aos referidos médicos violação de regras básicas da profissão e da arte médica, sendo que o A. não deixa até de qualificar a culpa de grave.
    Imputando-se uma violação de regras fundamentais, aponta-se para uma violação que excede o grau de uma falta de diligência normal, que raia já um especial e censurável descuido, razão por que somos a considerar que os três apontados réus são partes legítimas na acção, contando para esse efeito a relação jurídica tal como configurada pelo A. na acção, tal como decorre do artigo 58º do CPC.
    Improcede assim este recurso interlocutório, mantendo-se o despacho recorrido quanto à legitimidade passiva dos 3 primeiros réus.
    
    B - Recurso interlocutório
    1. Recorre o autor A do despacho que indeferiu o depoimento de parte dos 3 réus, prolatado que foi nos seguintes termos:
    
     “Pedidos nas fls. 954 a 959 dos autos:
     Notifique os réus da prova documental apresentada pelo autor para estes emitirem os pareceres.
     Admite-se a lista de testemunhas apresentada pelo autor, mas a 3º testemunha não reside em Macau, pelo que o autor deve participar na audiência junto com esta testemunha.
     Admite-se o requerimento do autor de gravar a audiência.
     Em relação ao requerimento de depoimento de parte apresentado pelo autor, nos termos do art.º 479.º do Código de Processo Civil, o depoimento só pode ter por objecto factos pessoais ou de que o depoente deva ter conhecimento, e estes factos mostram-se desfavoráveis ao relator. Por isso, admitem-se os seguintes factos:
     1) O 1º réu pode prestar depoimento sobre factos constantes dos quesitos 1º a 5º-a e 6º da Base Instrutória, e os factos constantes dos quesitos 13º a 18º da Base Instrutória não podem ser envolvidos no depoimento de parte e não são admitidos.
     2) O 2º réu pode prestar depoimento sobre factos constantes dos quesitos 6º, 10º, 10º-a, 11º, 11º-a, 19º, 28º e 30º da Base Instrutória. Os factos constantes dos quesitos 1º a 5º-a, 7º a 9º, 12º, 12º-a, 13º a 18º, 20º a 27º, 29º, 31º a 32º da Base Instrutória não podem ser envolvidos no depoimento de parte e não são admitidos.
     3) O 3º réu pode prestar depoimento sobre factos constantes dos quesitos 6º, 7º, 8º, 11º, 11º-a, 19º, 28º e 30º da Base Instrutória. Os factos constantes dos quesitos 1º a 5º-a, 9º, 10º, 10º-a, 12º, 12º-a, 13º a 18º, 20º a 27º, 29º, 31º e 32º da Base Instrutória não podem ser envolvidos no depoimento de parte e não são admitidos.”
    
     2. Não assiste razão ao recorrente. Bem andou o Mmo Juiz no seu prudente e legal critério, ao fazer a selecção da matéria de facto a que cada um dos médicos podia depor.
    Vejamos.
    O depoimento de parte é um meio processual (arts. 477º a 489º do CPC) destinado a provocar a confissão judicial, ou seja, o reconhecimento que a parte faz da realidade de um facto que lhe é desfavorável e favorece a parte contrária (art. 345º do CC).
A confissão, como meio de prova e de prova plena contra o confitente (art. 351º, n.º 1, do CC), pressupõe o reconhecimento da verdade de factos contrários ao interesse desse confitente.
    Destinando-se o depoimento de parte à obtenção de confissão, tem necessariamente que incidir sobre factos desfavoráveis ao depoente, sob pena de se transformar o depoimento de parte em testemunho de parte, à revelia das opções do legislador.
Facto pessoal é o facto conhecido pela parte, trate-se de facto por ela própria praticado, ou praticado com a sua intervenção, de acto de terceiro perante ela praticado (incluindo as declarações escritas de que seja destinatária) ou de mero facto ocorrido na sua presença.
Facto de que a parte deva ter conhecimento é aquele que é de presumir que ela tenha conhecido, pois o deve do artigo tem o sentido de juízo de probabilidade psicológica e não de conduta ética.6
    Por factos pessoais ou de que o depoente deva ter conhecimento, deve entender-se:
    «Facto pessoal é o facto conhecido pela parte, trate-se de facto por ela própria praticado, ou praticado com a sua intervenção, de acto de terceiro perante ela praticado (incluindo as declarações escritas de que seja destinatária) ou de mero facto ocorrido na sua presença. Facto de que a parte deva ter conhecimento é aquele que é de presumir que ela tenha conhecido, pois o deve do artigo tem o sentido de juízo de probabilidade psicológica e não de conduta ética (VARELA-BEZERRA-NORA, idem, p. 568); assim era claramente no Código de 1867 (“factos pessoais (…) ou de que o depoente possa ter conhecimento”). Trata-se, pois, de um único conceito e a aparente dualidade conceitual deve-se porventura a um erro de tradução do § 138 da ZPO alemã à data da elaboração do CPC de 1939.» 7

    3. É entendimento generalizado de que o depoimento de parte tem de incidir necessariamente sobre factos desfavoráveis do depoente, pois apenas estes são susceptíveis de serem confessados.
    Dissentindo deste entendimento Lebre de Freitas, Montalvão Machado e Rui Pinto8 afirmam:
«Em algumas decisões dos tribunais é entendido que, visando o depoimento de parte a obtenção da confissão, a parte só pode ser ouvida sobre os factos que lhe sejam desfavoráveis, estando excluído o seu depoimento sobre aqueles que lhe sejam favoráveis (assim, por exemplo, no ac. TRC de 27.4.95, PIRES DA ROSA, BMJ, 446, p. 365, e, aparentemente, no ac. do mesmo TRC de 4.3.97, SILVA GRAÇA, BMJ, 465, p. 653), dos quais em princípio tem o ónus da prova.
Estas decisões não são compreensíveis. Um facto positivo tem sempre, como inverso, um facto negativo e, se um é favorável à parte, o outro é-lhe desfavorável. O depoimento da parte sobre um facto que tenha o ónus de alegar e provar pode conduzir a conclusão de que esse facto não se verificou, o que constitui consequência desfavorável ao depoente.»
Abstraindo dos inconvenientes que podem advir para o autor de pedir o depoimento de parte relativamente a factos favoráveis ao réu, afigura-se que este entendimento comporta o risco de transformar depoimento de parte em testemunho de parte, solução que estes autores reconhecem não ter obtido consagração no nosso direito processual. Conforme referem9, o depoimento de parte “ não constitui, no nosso direito, um testemunho de parte, livremente valorável em todo o seu conteúdo, favorável ou desfavorável ao depoente.10 A proposta que chegou a existir no sentido de se consagrar, aquando da revisão de 1995-1996, a figura do testemunho de parte não veio a ser perfilhada. Os artigos do CPC ocupam-se, por isso, do depoimento de parte, nada mais havendo além dele, na secção da prova por confissão.
    Ora, tal como se assinala na citada Jurisprudência11, afigura-se que admitir o depoimento de parte a factos favoráveis ao depoente equivaleria a admitir, na prática, o testemunho de parte que o legislador não consagrou. E se estes autores defendem que os factos favoráveis decorrentes do depoimento de parte não são livremente apreciáveis pelo tribunal, fará sentido admitir o depoimento a factos favoráveis para, enviesadamente, se obter uma (altamente improvável) confissão? Entendemos, pois, que o depoimento de parte só pode ser requerido a factos desfavoráveis.

    4. O critério para se aferir quais os factos de que o depoente deve ter conhecimento é traçado por Alberto dos Reis12:
«Saber se o facto é de molde a dever ser conhecido do depoente, é apreciação confiada ao prudente arbítrio do juiz; este atenderá à natureza do facto e às circunstâncias em que este se produziu para depois concluir se deverá considerar-se do conhecimento do depoente».
Não é admissível o depoimento sobre factos criminosos ou torpes, de que a parte seja arguida (cfr. artigo 479° n.º 2 do CPC).
    
    5. Feito este enquadramento, importa descer ao caso concreto.
    Conforme se viu e se refere no douto despacho recorrido, o depoimento de parte só pode ter por objecto factos pessoais ou de que o depoente deva ter conhecimento.
    Assim, sempre que o depoimento de parte recaia sobre factos não pessoais ou de que o depoente não deva ter conhecimento, em que o objectivo não seja o de extrair uma confissão, o requerimento de depoimento de parte deve ser indeferido.
    No caso dos autos, porque nem todas as matérias sobre as quais foi requerido o depoimento de parte se continham nos limites definidos pelo artigo 479°, n.º 1, do CPC, o requerimento do A. apenas foi parcialmente admitido.
     6. Do depoimento do 1º Réu
     Relativamente ao 1º Réu, o A., ora Recorrente, pretende-se seja admitido o depoimento de parte sobre os quesitos 13) a 18) da Base Instrutória.
    Tais quesitos versam sobre matéria de natureza técnica e não sobre factos pessoais do 1º R. ou de que este deva ter conhecimento. Uma coisa são os factos ilícitos e culposos e outra é o apuramento do que deve integrar a legis artis, ou seja a determinação das boas práticas, não importando apurar a interpretação que o réu faz das mesmas, pois que essa interpretação subjectiva ou o seu desconhecimento pouco releva.
    Tanto assim que sobre essa matéria incidiu prova pericial (cfr. perguntas 9 a 16 do Anexo I ao requerimento probatório da R.), não tendo deixado o A. de se pronunciar sobre o alcance dessa mesma prova (cfr. ponto 2 do requerimento do A. apresentado em 17.09.2009).
    Neste contexto, não assiste razão ao recorrente.
    
    7. Do depoimento do 2º Réu
    Relativamente ao 2º Réu, o A. pretende que fosse admitido o requerimento de parte sobre os quesitos 1) a 5-a), 7) a 9), 12), 12-a), 13) a 18), 20) a 27), 29), 31) e 32) da Base Instrutória.
    Sobre os quesitos 1) a 5-a) reportam-se eles a um período temporal anterior a 19 de Novembro de 2005 e, por conseguinte, anterior ao primeiro contacto que o 2° Réu teve com o ora recorrente, donde não se poderem ter por pessoais.
    Neste contexto, os factos constantes dos quesitos 1) a 5-a), não sendo factos pessoais do 2º R., também não são factos de que este deva ter conhecimento.
    
     Sobre os quesitos 7) a 9) verifica-se que correspondem a matéria que respeita ao 3° Réu e não ao 2° Réu [quesito 7) e 8)]; sendo de natureza técnica a matéria do quesito 8), 2ª parte; e a matéria do quesito 9º não se traduz em qualquer facto desfavorável para o depoente, para além da sua não essencialidade.
    Sobre os quesitos 12) e 12-a) tal não se mostra decisivo para a descoberta da verdade, para além de não serem factos desfavoráveis ao depoente.
    Sobre os quesitos 13) e 18), 20) a 27), 29), 31) e 32) versam eles sobre matéria de natureza técnica e não sobre factos pessoais.
     Tanto assim que sobre eles incidiu prova pericial (cfr. perguntas 9 a 16, 17 a 21 e 23 e 24 do Anexo I ao requerimento probatório da R.), também a pedido do A.
    
    8. Do depoimento do 3° Réu
    Relativamente ao 3° Réu, o A., ora recorrente, pretende que seja admitido o requerimento de parte sobre os quesitos 1) a 5-a), 9), 10), 10-a), 12), 12-a), 13) a 18), 20) a 27), 29), 31) e 32) da Base Instrutória.
    Vale aqui o que acima ficou dito quanto à impertinência da pretensão do A.
    Nesta conformidade este recurso não deixará de improceder.
    
    C- Recurso da decisão final
    1. A extensão emprestada ao presente recurso não deve deixar de merecer um reparo.
    Estamos perante um recurso que se espraia por 812 artigos e 279 conclusões, num caso que nem sequer justifica tamanha prolixidade.
    “Aquele que sabe não fala; aquele que fala não sabe” - Lao-Tsé.
    Não é por escrever demais e martelar repetitivamente nas mesmas ideias que se ganha necessariamente razão. Malo tacere mihi quam mala verba loqui (quem muito fala muito enfada), para já não dizer, pelo respeito que temos pelo causídico, pela sua entrega à causa e às causas, denodo a que já nos habituou, multis lingua nocet (quem muito fala pouco acerta).
    Uma peça jurídica não é um romance e a alegação de direito deve obedecer à regra da brevidade e da diafaneidade,13 sendo um Grande Advogado, Angel Ossorio,14 que faz o elogio da brevidade “Sê breve - aconselhava um velho magistrado a um advogado principiante - porque a brevidade é o manjar predilecto dos juízes.” Mais dizendo, “Se falares pouco, dar-te-ão razão, ainda que a não tenhas … e às vezes ainda que a tenhas”. Como é óbvio não podemos acompanhar esta última asserção.
    Neste quadro não vamos deixar de ser rigorosos e por isso mesmo vamo-nos ater ao que dispõe o artigo 598ºdo CPC que estipula que o recorrente deve concluir a sua alegação de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão, sendo que são estas que delimitam necessariamente o objecto do recurso.15
    2. Num primeiro momento das suas alegações e conclusões do recurso procura o recorrente fazer a integração da ilicitude e determinar a natureza da culpa sobrevinda no acto médico, analisando os pressupostos da responsabilidade civil nesse particular domínio e pronunciando-se pela presunção de culpa, devendo, em todo o caso, os réus assumir a responsabilidade civil por violação do dever de prudência e cautela.
    Vamos, então analisar esta questão e servimo-nos aqui da explanação que já oportunamente fizemos nesta Instância.16
    
    3. Da responsabilidade civil médica
    
    3.1. Deixemos por ora a questão da responsabilidade médica analisada numa perspectiva de diferenciação entre o acto médico prestado no âmbito do serviço público e privado.

    Em tese, coloca-se a questão de saber se o doente - perante a conduta ilícita do médico, que procura para o tratar, conduta integrante simultaneamente de violação do contrato e ilícito extracontratual - pode recorrer a ambas as tutelas ou apenas a uma delas. E conclui alguma Doutrina no sentido de facultar ao lesado a escolha entre o regime que melhor o protege e que melhor se coaduna com o princípio do favorecimento da vítima. Admitir que ao abrigo de um contrato de prestação de serviços sui generis ficassem impunes condutas que - na ausência do contrato - integrariam responsabilidade aquiliana, constituiria o paradigma da não protecção do doente.
Aceita, assim, alguma Doutrina17 o concurso de responsabilidades. O que implica que haja uma única acção, a que corresponde no plano material um único direito, que tem como objecto unitário o ressarcimento do dano, mas que pode ser fundamentada em diversas normas.
    Mas mais importante do que saber se estamos perante um caso de responsabilidade contratual ou extracontratual, ou se é admissível o chamado “concurso de responsabilidades”, o que principalmente importa averiguar é se o/s réu/s agiu/agiram de forma negligente e, por isso, deve/m ser responsabilizado/s pelas consequências dos seus actos.

    3.2. A responsabilidade civil (conjunto de factos que dão origem à obrigação de indemnizar os danos sofridos por outrem) pode ser classificada em responsabilidade contratual e extracontratual ou aquiliana (ou obrigacional e extra-obrigacional ou delitual, conforme os autores).
Em qualquer dos casos, a responsabilidade civil consiste na obrigação de o lesante reparar os danos sofridos pelo lesado. E aqui cabe tanto a responsabilidade proveniente da falta de cumprimento duma obrigação como a resultante da violação de direitos absolutos.
O Código Civil trata separadamente as duas modalidades de responsabilidade (nos artigos 477º e segs a responsabilidade extracontratual e nos artºs. 787º e ss. a responsabilidade contratual). Mas, nos artigos 556º e segs sujeita-se ao mesmo regime a obrigação de indemnização.

    3.3. E embora sujeitas a um regime comum, podem assinalar-se algumas diferenças de largo alcance prático:
- Na responsabilidade extracontratual, geralmente, a culpa não se presume (artº 480º, nº 1), ao contrário do que acontece na obrigacional (artº 788º, nº 1);
- O regime da responsabilidade por acto de terceiros é diferente (artºs. 493º e 789º);
- Os prazos de prescrição são diferentes;
- Nos casos de pluralidade de responsáveis, na responsabilidade aquiliana o regime aplicável é o de solidariedade (artº 490º do CC), o que não sucede no domínio da responsabilidade contratual, pois só é admitida quando resulte da lei ou da vontade das partes (artº 506º).

    No que se refere às diferenças essenciais entre os dois regimes, a questão relativa ao ónus da prova, pode ser da maior importância, tudo dependendo da opção que venha a ser tomada em relação ao tipo de responsabilidade em presença.
    Em relação aos danos não patrimoniais, como é sabido, é discutida a questão da ressarcibilidade dos danos não patrimoniais na responsabilidade contratual - se bem que a posição maioritária a defenda,18 sendo certo que outros autores defendem o contrário.19
    A responsabilidade extra-obrigacional pode definir-se, em relação à obrigacional, por exclusão de partes (resulta da violação duma regra geral relativa à conduta, de deveres genéricos de respeito, de normas destinadas à protecção de outrem). A responsabilidade aquiliana nasce, pois, quando o dano resulta de infracção de um dever geral de conduta.

    Enquanto a responsabilidade extracontratual surge como consequência da violação de direitos absolutos, que se encontram desligados de qualquer relação pré-existente entre o lesante e o lesado (obrigação de indemnizar em consequência de um acidente de viação, por exemplo), a responsabilidade contratual pressupõe a existência duma relação inter-subjectiva, que atribuía ao lesado um direito à prestação, surgindo como consequência da violação de um dever emergente dessa mesma relação (caso típico da violação de um contrato).

    Não havendo, nos dois tipos de responsabilidade, danos distintos ou condutas diferentes, tratar-se-á apenas de dois regimes legais de protecção do lesado, que prevêem tal conduta ilícita e que visam reparar o dano, tendo cada regime a sua teleologia própria.

    Nesta conformidade, aceita-se que a responsabilidade civil médica admite ambas as formas de responsabilidade referidas. É que o mesmo facto poderá, ao mesmo tempo, representar a violação de um contrato e um facto ilícito extracontratual. Mas, no domínio da responsabilidade aquiliana, apenas a responsabilidade civil fundada em factos ilícitos é admissível (e não pelo risco ou por factos lícitos).

    3.5. Os casos de negligência médica estão a tornar-se mais frequentes nos tribunais nos últimos anos.

    Mas nem sempre é fácil discernir até que ponto existe efectivamente erro médico, uma actuação negligente, ou apenas falta de meios para um correcto diagnóstico. No entanto, casos têm surgido em que é nítida a falta de cuidados nos serviços de saúde e o desinteresse revelado pelos respectivos profissionais no atendimento e tratamento dos doentes, quer a nível hospitalar (público ou privado), quer a nível da própria clínica.

    E é em parte a tomada de consciência desse direito que leva os lesados a responsabilizar a classe médica, nomeadamente, a nível da responsabilidade civil, que é o que agora nos interessa considerar, importando não esquecer que a actividade médica e consequente responsabilização resulta de uma complexa actividade de toda uma equipa de profissionais de saúde.

    Entre estes comportamentos anti-éticos avultam o erro médico e em especial o erro por negligência.

    O erro médico pode ser definido como a conduta profissional inadequada resultante da utilização de uma técnica médica ou terapêutica incorrectas que se revelam lesivas para a saúde ou vida de um doente. E pode ser cometido por imperícia, inconsideração ou negligência

    É geralmente entendido que a responsabilidade do médico é, em princípio, de natureza contratual, na relação médico-paciente e enquanto este procura aquele para o tratar.
    Durante muito tempo foi rejeitada a ideia de que entre o médico e o doente se celebrava um contrato e de que o incumprimento das obrigações assumidas por aquele profissional podia originar responsabilidade contratual, fundando-se o ressarcimento dos danos causados, aquando da prestação da assistência médica, apenas no regime delitual. Encontrando tal forma de pensar as suas raízes profundas no direito romano e na concepção que nele imperava de que o labor médico, como manifestação da inteligência humana, não era passível de ser objecto de uma transacção, o que seria acentuado pelo valor superior dos bens (como a vida e a saúde humana) com que a actividade médica contende. O advento da Revolução Industrial realça a figura contratual da prestação de trabalho autónomo e subordinado, facilitando a aceitação da concepção contratual da actividade médica.20 Com efeito, é hoje aceite em todos os ordenamentos jurídicos que a maior parte das situações de responsabilidade médica, derivada de lesões corporais provocadas pelo médico, tem natureza contratual.
    Mas, tradicionalmente, a doutrina era relutante em admitir a natureza contratual da responsabilidade médica, por repugnar a aceitação da culpa presumida do médico sempre que o tratamento não tivesse alcançado os objectivos desejados. E, na verdade, não será fácil ao médico, em certos casos, ilidir a presunção de culpa, quando tal presunção se verifique.

    3.6. A dificuldade ultrapassa-se por via da construção da figura de “obrigações de meios” e “obrigações de resultado”.

    É obrigação de meios aquela em que o devedor se compromete a desenvolver prudente e diligentemente certa actividade para a obtenção de um determinado efeito, mas sem assegurar que o mesmo se produza (v.g. a obrigação do médico de empregar o seu saber tendente à cura do doente, mas não se comprometendo à cura efectiva).
    A obrigação de resultados verifica-se quando se conclua da lei ou do negócio jurídico que o devedor está vinculado a conseguir um certo efeito útil (v.g. a obrigação de entregar determinado objecto em determinado local)

    Assim, em regra, a relação entre o médico e o doente que o procura configura uma relação contratual, um contrato de prestação de serviços, ou um contrato médico, pelo que lhe serão aplicáveis as regras da responsabilidade contratual. Considera-se que as partes - autor e réus - celebraram um contrato de prestação de serviços médicos (art. 1080.º do CC).

    Trata-se de um contrato de prestação de serviços, mais propriamente um contrato médico ou um contrato socialmente típico que se insere basicamente na categoria dos chamados contratos de prestação de serviços, isto é, um contrato oneroso (em regra), sinalagmático, celebrado geralmente intuitu personae, com algumas características peculiares que necessariamente o distinguem da generalidade dos contratos deste género (dado o seu carácter sui generis. E tem como características específicas ser um contrato essencialmente pessoal e um contrato que, em princípio, não obriga a um resultado, isto é, o médico não se obriga a curar o doente, mas apenas prestar-lhe os cuidados considerados úteis e necessários à eventual cura.21

    A relação entre o doente e o médico nasce, assim, em regra, através de um contrato de prestação de serviços, visando o tratamento daquele, tendo por finalidade restituir-lhe a saúde, suavizar-lhe o sofrimento e salvar-lhe ou prolongar-lhe a vida.

    Tem-se o acto médico como o acto executado por um profissional de saúde que consiste numa avaliação diagnóstica, prognóstica ou de prescrição e execução de medidas terapêuticas quando realiza a prestação a que está vinculado (art. 752.º, nº 1), incumbindo-lhe provar, depois de apurada a falta de cumprimento ou o cumprimento defeituoso da obrigação, que estes não procedem de culpa sua (art. 788.º, nº 1). 22

3.7. O médico deve, por isso, agir segundo as exigências da legis artis e os conhecimentos científicos existentes na época, actuando de acordo com o dever objectivo de cuidado.

    Pode acontecer que o dano se mostre consequência de um facto que simultaneamente viole uma relação de crédito e um dos chamados direitos absolutos, como o direito à vida ou à integridade física. Nesses casos, verifica-se, simultaneamente, a violação dum contrato e de um dever geral de conduta. Então há que averiguar se o doente poderá invocar simultaneamente as normas correspondentes à responsabilidade contratual e à responsabilidade aquiliana, consoante lhe sejam mais favoráveis.

     É assim que se admite, na doutrina e na jurisprudência, um concurso de responsabilidades.

    Por isso tem-se discutido quais as consequências jurídicas do concurso de ambas as espécies de ilícito civil, sendo defendidas duas teorias: a do sistema do cúmulo e a do sistema do não cúmulo.

    O médico que realiza, por observação descuidada do paciente, um diagnóstico errado ou o cirurgião que descura negligentemente os cuidados técnicos adequados à operação respondem tanto obrigacionalmente por violação de um contrato de prestação de serviços como delitualmente por ofensa à integridade física do paciente.23

    Almeida Costa pronuncia-se pela não aplicação do sistema do cúmulo: “se de um vínculo negocial resultam danos para uma das partes, o pedido de indemnização deve alicerçar-se nas regras da responsabilidade contratual. A mesma directriz impõe-se quando o facto que produz a violação do negócio jurídico – ou melhor, da relação que dele deriva – simultaneamente preenche os requisitos da responsabilidade aquiliana. Esta solução mostra-se correcta no plano sistemático e no da justiça material”.24

    Mas a questão não é pacífica.
O sistema que exclui o cúmulo consiste precisamente na aplicação do regime da responsabilidade contratual, em virtude de um princípio de consumpção.

    Ora, existindo um único dano, resultante de um único facto, nada justifica a duplicação de acções ou concorrência de pretensões. Tal como não se justifica que o lesado beneficie, na mesma acção, das normas que considere mais favoráveis de cada um dos regimes. Mais discutível será se se deve admitir a chamada teoria da opção, ou seja, deixar-se ao lesado a escolha de uma acção baseada no ilícito contratual ou no ilícito extracontratual (numa acção invocaria a responsabilidade contratual e noutra a responsabilidade extracontratual).

    Ainda que a solução concreta possa ser a mesma, consoante se opte pelo sistema do cúmulo ou não cúmulo, admite-se que no campo dos princípios a opção pelo sistema do não cúmulo parece mais linear e de fácil aplicação. À unidade de conduta e do dano corresponderá necessariamente a unidade de pedido e de indemnização. Daí que numa perspectiva mais purista não tenha cabimento admitir-se que o lesado possa socorrer-se na mesma acção (ou seja, simultaneamente) das normas da responsabilidade contratual e extracontratual ou aquiliana. Se de um vínculo negocial resultam danos para uma das partes, o pedido de indemnização deve alicerçar-se nas regras da responsabilidade contratual se a relação em presença se coloca ao nível da relação directa doente-médico.25
    Mas será a especificidade de cada caso que ditará o regime aplicável em função das faltas cometidas e dos concretos interesses atingidos.

    3.8. A Doutrina e Jurisprudência consideram geralmente que a obrigação contratual do médico é uma obrigação de meios, porquanto, em princípio, o médico não pode nem deve prometer a cura do doente, limitando-se a dispensar-lhe os cuidados julgados necessários. É que a cura não depende apenas da actuação do médico, ainda que perfeita, em conformidade com os conhecimentos obtidos em cada época. E, tratando-se de uma obrigação de meios, cabe ao paciente demonstrar o dano e o nexo causal e compete ao médico, que, na sua actuação, atentas as exigências das leges artis e os conhecimentos científicos então existentes, não violou os deveres objectivos de cuidado, que agiu em conformidade com as regras de actuação susceptíveis de, em abstracto, poderem conduzir à produção do efeito pretendido, independentemente do resultado concreto.26
    O doente não terá assim de provar que não lhe foram prestados os cuidados possíveis em face das circunstâncias, mesmo que de obrigação de meios se trate, havendo uma relação contratual subjacente.
    Todavia, casos existem em que o médico se compromete a obter um certo resultado, como sucede, por exemplo, nas operações plásticas e nas análises clínicas. Nas obrigações de resultado impende igualmente sobre o médico o ónus da prova, nos termos do artigo 788º, ou seja, presume-se a sua culpa, admitindo, obviamente, tal presunção, prova em contrário.
Portanto, na maior parte dos casos, a responsabilidade do médico, exercendo clínica em regime de profissão liberal, é de natureza contratual, sendo tal obrigação de meios e não de resultados.
    No entanto, tal como noutras situações, como se disse já, há que atentar na situação específica de cada caso.
    
    3.9. É nesta linha que vai alguma Jurisprudência Comparada. Desde um importante Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 2001,27 que se vem entendendo que, se existir um contrato entre o médico e o paciente, a responsabilidade civil pelo acto médico assumiria, a um tempo, natureza contratual e natureza extra-contratual, uma vez que os danos resultantes do defeituoso cumprimento da ou das obrigações assumidas também seriam reparáveis em sede de responsabilidade extracontratual, porquanto tradutores da violação culposa de direitos absolutos, como são os direitos da personalidade.
    Não existindo uma relação contratual entre o médico e o paciente, a responsabilidade pelo acto médico assume exclusivamente natureza extracontratual.28
    No exercício da medicina está sempre presente a responsabilidade extracontratual e está também presente a responsabilidade contratual quando exista uma relação obrigacional entre o médico e o paciente ou entre o estabelecimento de saúde em que o serviço é prestado e o paciente.
    
     3.10. Vista a questão em termos abstractos vamos agora analisar a questão que ficou suspensa relativa á diferença entre o regime de um acto médico prestado no âmbito do serviço público e do privado
    Os requisitos para a responsabilidade de acto médico prestado em hospital público, em termos de responsabilidade extra-contratual são idênticos aos do regime da responsabilidade civil extracontratual prevista na lei civil: o facto, a ilicitude, a imputação do facto ao lesante, o prejuízo ou dano, e o nexo de causalidade entre este e o facto.
     Na actividade médica devem os órgãos e agentes das pessoas colectivas públicas observar as regras de ordem técnica, isto é, as regras próprias da ciência e técnica médicas e ainda as regras de prudência. Os médicos que procedem à cirurgia deviam ter um comportamento diligente, responsável, ponderado, de um bonus pater famílias - um comportamento padrão - , sobre o qual se há-de aferir a conduta do agente, traduzindo-se o juízo de culpa na desconformidade entre aquela conduta padrão que o agente podia e devia realizar e aquilo que efectivamente realizou. Os médicos cometem um acto ilícito culposo ao não actuarem com a diligência devida.
     O nexo de causalidade pressupõe que os danos se apresentem como consequência normal, provável e típica do facto ilícito.
     Os danos patrimoniais e não patrimoniais causais que o lesado sofreu merecem, pelas suas natureza e gravidade, a tutela do direito. Na determinação equitativa dos danos não patrimoniais, há que atender a todas as envolventes circunstâncias fácticas e a alguns critérios jurídicos, podendo destacar-se a gravidade efectiva dos danos, os fins gerais e especiais a que se inclinam as indemnizações do género e a prática jurisprudencial em casos similares.
    
    3.11. No caso sub judice temos de fazer intervir o regime da responsabilidade civil da Administração e demais entes públicos por danos causados pelos seus órgãos, agentes e representantes no exercício de uma actividade que deve ser considerada como de gestão pública.
    É assim porque o médico, quando exerce a sua profissão num hospital público é um funcionário público e exerce uma actividade de gestão pública.
    Por isso, a eventual responsabilidade civil proveniente dos actos e omissões que nesse hospital pratique e se considerem lesivos dos direitos dos utentes, desde que, naturalmente, praticados no exercício e por causa dessa função pública, é regulada pelo regime da responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais entidades públicas (Decreto-Lei n.º 28/91/M, de 22 de Abril, com as alterações do Decreto-Lei n.º 110/99/M).
    Vamos valorizar assim a prática do acto médico inserida numa actividade de serviço público e, como tal, como prática de actos de gestão pública.
    A responsabilidade do médico e, bem assim, a do próprio hospital, assume uma natureza extracontratual, por decorrer do exercício da função administrativa que aquele desempenha.
    E se dúvidas houvesse, neste mesmo sentido decidiu o V.º TUI em acórdão uniformizador de Jurisprudência, processo n.º 23/2005, de 18/1/2006.
    
    4. Dos pressupostos da responsabilidade, já atrás vistos, assumem especial relevância, nesta análise, a ilicitude e a culpa, uma vez que conhecem um tratamento específico na referida lei.
    Assim, as acções ou omissões de um médico, enquanto agente de actos de gestão pública, serão consideradas ilícitas se:
    i) violarem normas legais e regulamentares ou princípios gerais e basilares,
    ii) infringirem regras de ordem técnica ou
    iii) infringirem deveres de prudência comum e
    iv) que devam ser tidas em consideração, isto é, se de tais acções ou omissões resultar uma ofensa de direitos ou interesses legalmente protegidos, designadamente, da saúde ou da vida do doente.
    Terá também de haver culpa do médico para existir responsabilidade.
    
    5. Conforme o artigo 4º do DL28/91/M, a culpa deve ser apreciada nos termos do artigo 480º do CC, dizendo esta norma:”1. É ao lesado que incumpe provar a culpa do autor da lesão, salvo havendo presunção legal de culpa. 2. A culpa é apreciada, na falta de outro critério legal, pela diligência de um bom pai de família, em face das circusnstâncias de cada caso” .
    O grau de culpa implica diferentes soluções jurídicas no que respeita à responsabilidade pelo ressarcimento dos danos.
    Da conjugação dos artigos 2º e 6º do citado DL 28/91/M, pode retirar-se que se o acto ou a omissão tiver sido praticado com culpa leve, é o hospital exclusivamente responsável pelos danos causados.
    Porém, se o acto ou a omissão do médico tiver sido praticado com dolo ou com diligência e zelo manifestamente inferiores àqueles a que se achavam obrigados em razão do cargo, o hospital é responsável mas agora de forma solidária com o médico, gozando, posteriormente, do direito de regresso contra o mesmo, se for obrigado a indemnizar o paciente.
    
    6. Posto isto, projectemos estes princípios no caso concreto.
    Mas para tanto importa analisar a matéria de facto, matéria de facto que vem deficientemente impugnada, afirmando até o recorrente, sem o justificar, ter sido ela arbitrariamente alterada pelo Tribunal a quo.
    É uma afirmação grave e imponderada.
    
    7. Do julgamento da matéria de facto
    Nos pontos 42 e seguintes das suas alegações e atrabiliariamente o A., ora recorrente, apresenta um conjunto de considerações, as mais das vezes pouco claras, acerca do acerto do julgamento dos factos no caso sub judice.
    Limita-se o recorrente a simplesmente discordar, sem que essa discordância, porque fundada, se traduza em valor.
    Em qualquer caso, no que se refere à impugnação da matéria de facto, desde logo, importa referir que na grande maioria dos casos, o A. não indica quais os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo nele realizado, que impunham, sobre os diversos pontos da matéria de facto, decisão diversa da recorrida, conforme está obrigado nos termos do disposto na alínea b) do n.º 2 do artigo 599º do CPC.
    
    Mais, ao longo das suas extensas alegações de recurso, em diversos casos em que os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação da prova foram gravados (como é o caso do depoimento das testemunhas e dos esclarecimentos dos peritos ouvidos em audiência), o A. omite a indicação correcta das passagens da gravação em que se funda - o que leva, quanto a essas situações, desde logo, a que o recurso seja rejeitado (cfr. artigo 599º, n.º 2 do CPC).
    O que significa que este Tribunal não analisará essa prova, não concretamente especificada, sempre que se trate de apreciar da valorização de um dado depoimento.
    
    Não obstante a posição acima tomada e ainda o que adiante se venha a dizer sobre cada um destes factos em concreto, quanto à factualidade da Base Instrutória não se deixa de assinalar:
    
    Quanto ao quesito 3º, a resposta dada pelo douto Tribunal recorrido não é arbitrária, nem o A., ora recorrente, demonstra o contrário.
    
    Quanto ao quesito 4º, a impugnação do A. é obscura e infundada, pelo que improcede em conformidade.
    
    Quanto à resposta ao quesito 18º, não se verificam quaisquer dos vícios que lhe são assacados pelo A., ora recorrido, pelo que tal resposta não merece censura.
    
    Quanto às respostas aos quesitos 14º-a, 14º-b, 22º, 23º, 24º e 26º (entre outros) da Base Instrutória, que também não merecem qualquer censura.
    Invoca o A. o depoimento do Dr. G e refere ainda outra testemunha. Trata-se de uma opinião contra a de tantos outros, não custando perceber a síntese probatória acolhida em plúrima e diferenciada prova, vertida a fls 2058 e 2059 pelo Tribunal Colectivo. Tratar-se-á aí de um depoimento isolado, parcial e subjectivo. Aliás, observa-se que é esse mesmo médico que subscreve o “parecer” encomendado pelo A e que foi junto aos autos.
    Como está bem de ver não há razão para se valorizar um depoimento, para mais materializado em parecer, porventura pago, em detrimento de todos os outros técnicos e profissionais que depuseram em audiência e se pronunciaram em termos de prova pericial.
    
    As demais respostas à Base Instrutória também não merecem qualquer censura, uma vez que os vícios que lhes são apontados pelo A. ou são ininteligíveis ou não têm qualquer fundamento, não convencendo o recurso sistemático às regras da experiência comum e da lógica que, ao contrário do pretendido pelo recorrente, não suportam as conclusões aduzidas.
    
    8. Quanto ao exame médico de rotina antes da operação.
    O recorrente não observa - repete-se - quanto a esta questão, bem como à maior parte das questões que suscita, o disposto no artigo 599º do CPC na vertente da alínea b) do n.º 1.
    O A. veio alegar, entre outras coisas, que não lhe foram realizados todos os exames prévios à cirurgia que deviam ter sido feitos, que os médicos da R. não cumpriram o dever de informação que lhes cabia, que deviam ter optado por uma abordagem conservadora, que passaria por observar a evolução do tumor e só depois actuar, se fosse necessário, que os médicos da R. presumiram erradamente que o A. padecia de cancro quando tal não veio a confirmar-se e que, portanto, erraram ao remover-lhe o lóbulo pulmonar superior esquerdo, e que a rotura dos vasos quilíferos durante a intervenção cirúrgica se deveu a negligência.
    Sinceramente que ficamos sem saber o que pretende o recorrente quanto a esta questão. As alegações do recorrente sobre esta matéria mostram-se altamente confusas.
    Por exemplo, que importância tem o facto de o recorrente saber da marcação do exame se não resultou provado que eles foram marcados previamente e se o que releva é saber se esses exames prévios eram essenciais e se eles determinariam o despiste da doença?
    Que não foram feitos, sem dúvida que o não foram no Hospital Conde S. Januário, mas não se deixa de observar que o recorrente foi fazer alguns exames em Hong Kong, no espaço curto que mediou entre a primeira observação no Hospital em Macau e a intervenção cirúrgica e mesmo esses exames ali realizados não foram conclusivos.
    O que já poderia relevar, eventualmente, e isso não deixará de pesar contra o recorrente, é o facto de ele ficar ciente que tais exames de broncoscopia só seriam realizados no dia da operação e ele querer aguardar pelos resultados antes de se submeter à intervenção cirúrgica.
    Ora, não foi essa a sua posição, pois que anuiu à sua realização.
    Como veio a provar-se durante a instrução do processo judicial em primeira instância, no âmbito da qual foram ouvidas bastantes testemunhas, peritos, produzidos e examinados inúmeros documentos, não resulta da prova produzida a essencialidade desses exames. Ou sequer que esses exames, ainda que rotineiros, fossem determinantes de uma não operação.
    
    9. Insiste o recorrente com a importância dos exames de rotina.
    Alega que tal exame de broncoscopia e biópsia, bem como o exame de expectoração, não se substituem, mas antes se completam, sendo exames de rotina antes da intervenção, tal como resulta da resposta ao quesito 14-b).
    Mais assaca à decisão recorrida a substituição de um critério de viabilidade e de adequação por um critério de necessidade, ao ter-se entendido que só haveria culpa e ilicitude na actuação dos réus se o autor tivesse demonstrado a necessidade dos mesmos.
    Isto é, ao não terem sido realizados aqueles exames, a sentença situou a conduta dos réus dentro do razoável, entendimento este que viola as regras da experiência comum.
    A questão principal é a de saber se esses exames deviam ser realizados ou se a sua realização se mostrava determinante para a tomada de decisão em avançar para a operação.
    Anote-se que o recorrente, face às limitações do Hospital, foi, logo nos dias que se seguiram à sinalização do problema, a Hong Kong, onde realizou alguns exames que, mesmo aí, não se mostraram conclusivos.
    Como se sabe, muitas vezes em exames médicos ocorre o chamado falso positivo ou o falso negativo, isto é, um determinado exame aponta para a existência da doença e ela efectivamente não existe, ou aponta no sentido da inexistência de determinada doença e ela existe.
    Sobre esta questão importa atentar que, na realidade, se demonstrou que havia uma suspeita, razoável e sustentada, de que o A. poderia padecer de cancro. Pese embora o resultado do exame de biopsia transtorácica, realizado no Hospital St. Teresa’s de Hong Kong de 17 a 19 de Novembro de 2005 (a que se refere a alínea D da Matéria Assente) ser inconclusivo relativamente à existência ou não de cancro, já o exame de PET-CT, realizado na mesma instituição, apontava claramente para essa possibilidade, (cfr. Relatório de fls. 38 dos autos onde pode ler-se “A hipermetabolic soft tissue is present in the left lung apex (…) most consistent with a malignant tumor”) (detectou-se em tecido mole no ápice esquerdo do pulmão (…) que corresponde, provavelmente, a um tumor maligno)- (vide ainda relatório de fls. 39 dos autos, onde ler-se “A hipermetabolic lesion is present in the left lung apex (…) most consistent with a primary lung cancer”) (detectou-se uma lesão hipermetabólica no ápice esquerdo do pulmão (…) que corresponde, provavelmente, a um tumor maligno).
    Anota-se ainda o facto de que o concreto circunstancialismo de se observar, face ao resultado do referido exame, que o pretenso tumor crescera com grande rapidez no período de 2 anos, os 2º e 3º Réus aconselharam o A. a submeter-se a cirurgia, por revelar-se necessária, na medida em que a suspeita mais forte recaía sobre a hipótese de cancro do pulmão (cfr. respostas aos quesitos 8º e 9º da Base Instrutória).
    O autor aceitou submeter-se à referida intervenção cirúrgica, tendo assinado, juntamente com a sua esposa, o respectivo termo de consentimento de fls. 438 (cfr. resposta ao quesito 12º e alínea I da Matéria Assente), estando já advertidos da eventual necessidade de se remover o lóbulo superior do pulmão esquerdo do A.).
    Não sendo conclusivos os exames e face à urgência em operar se se tratasse de cancro, até por via das metástases que rapidamente se podem desenvolver, sendo que importava ainda confirmar uma hipótese muito séria de cancro (cfr. resposta ao quesito 12º-a) da Base Instrutória) e que, por vezes, a cirurgia, acaba por ser ela própria um meio de diagnóstico (resposta ao quesito 10º-a da Base Instrutória), sabendo-se ainda que uma biópsia pode extrair apenas uma parte sã do tecido e só uma análise laboratorial de todas as partes do tecido pode determinar a natureza de um dado tumor, compreende-se a decisão tomada, não podendo o recorrente alegar desconhecer os contornos da situação que levou a que se avançasse para a operação que autorizou.
    E quanto àquele ponto essencial, o da necessidade ou mesmo o da razoabilidade e determinabilidade de realização dos aludidos exames, há que ter presente que mesmo que tivesse sido feita biópsia com endoscopia que refere, em caso de resultado negativo, nem por isso seria possível afastar, com certeza alguma, a hipótese de cancro. Do ponto de vista médico, obter-se-ia um falso negativo (resposta ao quesito 14º da Base Instrutória).
    Vamos imaginar que se retirava por via da biópsia uma parte sã, se apresentava um resultado negativo quanto à existência de cancro, o doente era mandado para casa, não se fazia a operação, só assim se tendo a certeza do que se passava, e o cancro vinha efectivamente a desenvolver-se. Não estaríamos aí perante uma situação de manifesto erro e falta de prudência ao confiar-se precipitadamente numa aparência de um resultado?
    Na prática, a amostra de tumor retirada na biópsia, que seria sempre uma parte ínfima do tumor, poderia não apresentar sinais de malignidade, não obstante outras partes do tumor estarem, efectivamente, atacadas por células cancerígenas. Nesse caso, sim, poderia falar-se num diagnóstico errado de não malignidade, que resultaria certamente em o cancro não ser tratado convenientemente e numa eventual propagação das células cancerígenas a outros tecidos e órgãos, culminando na eventual morte do paciente, como causa necessária e directa do tumor.
    Mesmo na tese do recorrente que vai no sentido da omissão de um dever de realização de exames de rotina, mesmo que assim se entendesse, não se vê que, no quadro supra delineado, da realização desses exames resultasse necessariamente um resultado diferente e tal determinasse a não realização da operação, vistos os restantes elementos de facto observados, a existência de um tumor, infecção que terá motivado que o recorrente sangrasse e fosse ao Hospital, desenvolvimento rápido do mesmo, perigo de metástases, sinais de exames que deram sinal de cancro, a certeza de que só a observação de todos os tecidos a extrair podia dar uma certeza.
    Não se deixa assim de dar resposta a um argumento que chega a ser invocado pelo recorrente e fica subjacente à sua pergunta ao apontar para a valorização de um exame imagiológico ( PET-CT realizado em Hong Kong) em detrimento de um exame patológico (o exame de biópsia não realizado).
    
    Assim se conclui que não foi o Tribunal que excluiu arbitrariamente o “método de rotina médico”, utilizando as palavras do recorrente, antes situou o procedimento adoptado, compreendeu-o e entendeu que a conduta adoptada era perfeitamente compreensível em função dos princípios e das “leges artis” da medicina.
    
     10. Resulta assim claro que perde relevância a questão relativa ao ónus da prova quanto ao acordo sobre a não realização dos exames, não sem que se diga que a Jurisprudência invocada não se aplica ao caso. A problemática da presunção de culpa nos casos de responsabilidade contratual por via do incumprimento e nos casos de ónus da prova do lesado nos casos de responsabilidade extra-contratual respeita à prova dos actos devidos e negligenciados e nada tem que ver com uma concordância com a realização ou não realização dos exames por parte do lesado.
    
    11. Daquilo que o recorrente apelida de uma abordagem conservadora e do conhecimento da situação por banda do recorrente
    Desenvolvendo este ponto, diz o recorrente que os médicos não adoptaram uma abordagem conservadora e decidiram avançar para a operação sem fazerem esses exames (a esta questão já acima se respondeu) e sem darem conhecimento ao recorrente dessa não realização, invocando por essa via um deficit de conhecimento na sua tomada de posição.
    Esta questão está intimamente ligada à precedente. Se os médicos entenderam que os exames referidos não seriam concludentes, pelas razões já acima referidas, que interessaria dizerem ao paciente que haveria uma hipótese de fazerem ainda previamente outros exames mas que eles não seriam conclusivos? Essa possibilidade não deve deixar de ser equacionada pelo paciente quando enfrenta a opção de ser operado, não devendo ele descartar todas as possibilidades que uma pessoa medianamente inteligente e informada deve colocar quando decide avançar para uma intervenção, sendo muito normal que se informe sobre outras possibilidades de tratamento e de exames complementares.
    Mas mais uma vez o recorrente foge ao ponto essencial que é o seguinte: se os médicos lhe dissessem que podia ainda fazer exames prévios, mas que daí se ficava sem certeza alguma quanto à existência de cancro e que a forma mais adequada de o saber e de evitar o seu alastramento era operar, será que o recorrente deixava de anuir na intervenção cirúrgica? Este é que é o ponto e que ele não refere na sua douta alegação.
    E importa não esquecer que vem claramente comprovado que o recorrente, “antes de assinar a declaração sabia que podiam surgir diversos resultados de diagnóstico e, naquele momento, a suspeita mais forte era a de cancro do pulmão, e para se saber foi necessário retirar a massa para análise.”
    
    12. Ainda sobre o quesito 18º e da suficiência da comprovação de cancro a partir do exame do exame PET-CT e de biópsia percutânea transtorácica.
    
    Basicamente desses dois resultados resultou um non liquet sobre a situação diagnosticanda.
    O recorrente imputa ao Tribunal um erro de avaliação ao afastar a suficiência de uma abordagem conservadora no tratamento da doença que não passaria de uma mera inflamação.
    Erra o recorrente. Não foi o tribunal que fez a avaliação da situação clínica. O que o tribunal a quo fez foi considerar que não se provou que da avaliação médica produzida pelos réus que ela não fosse conforme a uma prática adequada e razoável ao tratamento daquele caso.
    Erra o recorrente enquanto diz que nessa avaliação se entendeu ser suficiente para realizar a intervenção cirúrgica o resultado desses dois exames. Não, houve outros factores e possibilidade de riscos de real existência de doença grave e necessidade de despistagem da mesma que aconselhavam a essa intervenção cirúrgica.
    Ainda aqui, dentro do enquadramento acima feito e sufragado pelo V.º TUI, na configuração de uma responsabilidade extra-contratual e no ónus da prova daí decorrente para o lesado, no limite, perante uma não presunção de culpa dos responsáveis pela prática de acto médico em hospital público, o certo é que não se comprova em lado algum de uma forma clara e sem quaisquer dúvidas que o quadro clínico do paciente impunha a realização de outros exames, vista a inconclusão a que sempre se chegaria.
    
    13. Diz ainda o recorrente que negligentemente em vez de detectarem cancro pulmonar, os 2º e 3º réus realizaram operação radical de cancro pulmonar, vindo-se a comprovar que este não existia. Perante isto o que importa saber é se esse procedimento foi incorrecto e que procedimento se impunha de forma a evitar a intervenção cirúrgica. Ora, compulsando a matéria de facto que não vem posta em crise nada se apurou em sentido contrário ou que desmentisse a correcção do procedimento adoptado.
     De todo o modo, o certo é que já durante a intervenção cirúrgica, realizou-se o exame de frozen section a que se refere a alínea M) da matéria especificada, tendo o respectivo resultado sido igualmente inconclusivo.
    E, mais uma vez se assinala que, mesmo que fossem retiradas mais amostras antes de se proceder à excisão do lóbulo pulmonar do A., enquanto os resultados se apresentassem negativos, haveria sempre o risco de estes serem falsos negativos.
    
     14. Insurge-se o recorrente quanto ao facto de se ter cortado mais do que o devido.
    Quanto à excisão do lóbulo superior esquerdo e não de apenas do tumor, ficou provado que, dada a dimensão do mesmo tumor, o local onde se encontrava, a excisão parcial poderia conduzir a metástase de cancro (crf. resposta aos quesitos 22º, 23º e 24º da Base Instrutória). Mais ficou provado que os 2º e 3º Réus excisaram 4 nódulos linfáticos ao A. a fim de evitar a possibilidade de metástase de cancro caso o tumor do A. fosse cancerígeno e que tal opção é razoável e compreensível (cfr. resposta aos quesitos 28º e 29º da Base Instrutória).
    Ficou igualmente provado através do depoimento das testemunhas inquiridas sobre a matéria, que a rotura dos vasos quilíferos do A. é uma complicação possível da cirurgia, é um risco médico, factor que foi devidamente escalpelizado na fundamentação da douta sentença.
    O que o recorrente faz, sem que impugne expressa e especificadamente a matéria de facto, é contrapor a sua visão e interpretação subjectiva à interpretação que resulta das pessoas e peritos ouvidos e situam o procedimento no campo da normalidade e da razoabilidade.
    O recorrente, invocando as regras do bom senso e da experiência comum, interroga-se até sobre a bondade da conduta cirúrgica invasiva, dizendo não compreender uma excisão integral, como potenciadora de um risco de propagação de cancro, se uma excisão parcial do lóbulo pulmonar já potenciava por si esse factor de risco.
    Não é preciso ser um especialista para compreender que quando uma maçã está podre se se cortar apenas uma parte do que está podre a maçã adultera-se mais rapidamente, qualquer pessoa sabe que tem de eliminar toda a parte que esteja afectada e ainda um pouco mais do que está à volta. Perdoe-se a singeleza desta linguagem, mas no fundo foi isso que os médicos fizeram e toda a gente, pelos vistos, ratificou. Só o recorrente, subjectivamente, assim não entendeu.
    Imaginemos que, por infelicidade, havia mesmo cancro e os médicos só excisavam uma parte; que o cancro se propagava e o paciente tinha de ser operado de novo ou a operação já seria ineficaz. Então, aí, o que diria, o recorrente?
    Mais uma vez o ponto é este: será que foi feita uma operação e com a extensão com que foi feita, indevidamente? Que outros procedimentos deviam e podiam ter sido feitos de forma a evitá-la?
    O seguinte facto dado como provado,
    Dada a grande dimensão do tumor e o local onde o mesmo se encontra, no caso de tratar-se de cancro, é possível que a excisão da parte parcial do lóbulo pulmonar superior esquerdo ou tecido conduza a metástase de cancro,
    não se mostra abalado.
    Não foi o Tribunal que concluiu no sentido da razoabilidade da intervenção cirúrgica. Isso resulta de uma avaliação médica que não deixou de ser corroborada nos autos, prova essa que a nosso ver não se mostra abalada.
    
    15. Desta forma se responde ainda a uma falta de registo cirúrgico lavrado pelo punho do próprio médico, enquanto o recorrente estranha que aí se refere não haver por via da biópsia confirmação de malignidade e, não obstante, procederam à excisão integral do lóbulo pulmonar superior esquerdo e de vários nódulos linfáticos.
    É que, em boa verdade, desse apontamento não resulta a certeza de que nesse momento, não obstante aquele resultado, que ele fosse conclusivo de forma a saber se havia tumor maligno. Sabe-se que tal detecção só é possível muitas vezes a partir da análise laboratorial da parte excisada, tanto assim que quando se extrai um simples nódulo ou caroço, ainda que superficial, o médico pergunta muitas vezes se o paciente pretende a realização do exame laboratorial.
    
    16. O mesmo se diga em relação à referência a células atípicas. Não foi o Tribunal que fez o diagnóstico; o Tribunal serviu-se tão somente de vários elementos para enquadrar e compreender o procedimento adoptado, de forma a poder emitir um juízo de censura, e é nesse contexto que aparecem as células atípicas, sendo que este não foi o factor determinante da opção tomada.
    
    17. Quanto ao quesito 28º da Base Instrutória, afirma o recorrente que o 3º réu confessou, em 1 de Março de 2011, no julgamento, que “a excisão dos nódulos linfáticos visa ao exame de biópsia, que detecta se as células cancerosas se propagaram, mas não visa prevenir a propagação”, donde entender que a afirmação proferida pelo Tribunal a quo, - “só se provou que dado que não se tinha afastado a possibilidade de cancro pulmonar no momento da cirurgia, os 2º e 3º réus procederam à excisão de 4 nódulos linfáticos junto do lado esquerdo brônquio do autor, para evitar a provável propagação do cancro do autor uma vez que, na eventualidade de se tratar de cancro…” , - configura um reconhecimento errado da finalidade da excisão.
    Não tem razão o recorrente. O 3º réu expressou pormenorizadamente que, durante a operação, os 4 nódulos linfáticos se encontravam maiores do que antes, pelo que procedeu à excisão destes a fim de realizar o exame de biópsia e para evitar afectação do tratamento se se tratasse de cancro maligno. Além disso, caso não se procedesse à excisão naquele tempo, não seria possível a realização de outra cirúrgica da excisão se a situação fosse maligna (vide a gravação respectiva).
    Donde resulta que a finalidade da excisão de nódulos linfáticos não só se limitou a um exame de biopsia, mas teve em linha de conta uma prevenção potencial e que de outra forma se frustraria, o que elimina a contradição pretendida, onde se pretende ver uma contradição decorrente do facto de se insinuar um corte numa parte que se sabia estar sã.
    Como já se assinalou, os critérios, teor e conhecimentos médicos não se mostram interpretados de forma arbitrária pelo tribunal. Essa pretensa confissão do 3º réu em nada abala a justificação da conduta médica por si desenvolvida, para além de que não é extensiva ao 3º réu.
    
    18. Ainda sobre o quesito 29º e a excisão dos nódulos linfáticos.
    Acompanhamos nesta parte a alegação dos réus:
    “O recorrente mais entende que a conduta dos réus de proceder à excisão de 4 nódulos linfáticos excedeu ao âmbito do consentimento do recorrente e violou a sua vontade, porque no termo de consentimento assinado por aquele só se descreve que “concordar com submeter-se à cirurgia de excisão do lóbulo pulmonar superior esquerdo.
    No entanto, como referiu a testemunha Dr. H, o juízo de dissecção linfática ou biopsia linfática depende do número dos nódulos linfáticos que o médico excisa. Aquele mais disse que no que toca à dissecção, o número é pelo menos 20. (audio-gravação (3) – SIDE B)
    Dr. H também indicou que no caso os réus só procederam à excisão de 4 nódulos linfáticos, conduta que se trata da excisão de amostragem que visa a determinação da fase do cancro. (audio-gravação (3) – SIDE B)
    Isso revela que a biopsia linfática de “amostragem” realizada da pelos réus foi um dos meios de diagnóstico, mas não tratamento de dissecção que proceda à excisão de grande quantidade de nódulos linfáticos.
    Isto quer dizer que a biopsia linfática de “amostragem” não é de natureza operativa, mas só um meio do exame de biopsia, pelo que aquele não precisa de ser expressamente indicada no termo de consentimento bem como o exame de frozen section realizado antes da operação.”
    Esta abordagem não deixa de estar patenteada na matéria de facto assente e não se mostra abalada, na exacta medida em que se fixou que
    “Se não se proceder à excisão do tumor para análise, impossibilita-se a eliminação do cancro, uma vez que todos os sintomas levam os 2º e 3º réus a pensar que o autor sofre de cancro pulmonar com elevada probabilidade.
     No caso do autor, apenas se procede à excisão integral do lóbulo pulmonar superior esquerdo para poder realizar a biopsia e a recolha de amostra.
     Por isso, os 2º e 3º réus continuaram a proceder à excisão de acordo com os procedimentos propostos.
     Como no momento da cirurgia não pôde excluir-se a possibilidade de cancro do autor, os 2º e 3º réus excisaram 4 nódulos linfáticos juntos à parte lateral esquerda dos brônquios do autor, para evitar a possibilidade de metástase de cancro caso se tratasse de cancro de pulmão.
     É razoável e compreensível a excisão de um total de 4 nódulos linfáticos do autor durante a cirurgia realizada pelos 2º e 3º réus.”
    
    19. O recorrente continua de forma anacrónica e repetitiva a repisar as mesmas matérias, o que dificulta uma análise, ponto a ponto dos seus desabafos, pois é disso que se trata, donde sermos, no mesmo timbre a responder, tal como já acima afirmado, que não se apontam razões processualmente válidas para considerar que houve erro de julgamento na resposta aos quesitos 21º, 24º, 25º, 26º, 28º, 29º.
    
    20. Voltando ao assunto do consentimento.
    Remetemo-nos aqui para o que acima ficou dito. O recorrente, mais uma vez repete-se e repete-se e não se alcança bem o que pretende com essa estratégia, sendo que, intencionalmente ou não, de cada vez, introduz um aspecto não referido anteriormente.
    Não sem que se enfatize, na linha do que dizem os réus, que deve ter-se em conta que o âmbito do consentimento da operação não deve ser interpretado de forma restrita como fez o recorrente. O consentimento cirúrgico do paciente trata-se, na verdade, dum consentimento geral para a intervenção cirúrgica a certo órgão, em que o paciente concorda e confia no médico. A meio de uma operação o cirurgião não pode perguntar ao paciente se deve cortar mais acima ou mais abaixo, mais um ou menos um milímetro. O ponto é que o médico actue dentro dos seus deveres de ética, saber e conhecimento, aferidos pelos padrões de um grau de zelo e prudência medianamente reconhecida e genericamente aceite pelos técnicos daquela área de saber. Será, mutatis mutandis, quase como o paciente autorizar um dada cirurgia e depois vir queixar-se que ficou com uma cicatriz normal decorrente dessa cirurgia.
    Isto para responder à questão da anuência do recorrente, na medida em que teria concordado com a excisão do lóbulo pulmonar e não já dos nódulos linfáticos. O ponto está em saber se essa ablação correspondeu a uma boa prática médica e quanto a esse ponto parece assunto incontroverso.
    Em termos de matéria de facto e quanto ao apuramento dessa boa e aconselhável prática, tal como fixado ficou na matéria de facto assente, o recorrente limita-se a discordar, como aliás, em relação a tantos outros pontos da matéria de facto.
    Um elemento probatório, uma boa razão, uma violação do prudente arbítrio, das regras do bom senso ou da experiência, que pudessem suportar a fixação da matéria fáctica noutro sentido, sobre isso, nada. Apenas a sua discordância.
    E quanto ora se disse e acima ficou dito supre a omissão que o recorrente assaca à sentença recorrida, quanto à falta de abordagem de um dever de comunicação por parte dos 2º e 3º réus.
    Resulta evidente que no momento da operação o recorrente e esposa estavam cientes, ou não deviam deixar de estar, das incertezas que pairavam, das suspeitas da doença, qual fosse a de cancro maligno, da inconclusão dos resultados dos exames e das vantagens da operação. E se falamos nas vantagens e não numa necessidade imperativa, é porque a questão da necessidade traduz um sentimento subjectivo, na medida em que mesmo que uma necessidade se imponha em termos de cura ou probabilidade de cura em termos médico-científicos essa cura pode ser enjeitada pelo paciente.
    E por que não configurar um cardápio de tudo aquilo que era possível fazer e dos centros cirúrgicos a que se podia recorrer; será que só assim se satisfaria o dever de informação ao doente? Há uma margem de avaliação técnica que só ao médico ou ao profissional especialmente habilitado compete, não se compaginando o direito à informação com o inteiramento de todos os detalhes e implicações que só ao médico deve caber.
     Por isso se conclui que os réus não violaram o dever da comunicação dos médicos, nem o direito à informação do doente, sendo que o âmbito do consentimento para a operação também não deve ser interpretado de forma restrita.
    
    21. Ainda sobre a excisão dos nódulos linfáticos.
    É verdade que a excisão de nódulos linfáticos causou ao recorrente a rotura de vasos quilíferos, o que provocou a complicação pós-operatória de quilotórax.
    Mas face ao quadro que vem provado e não se mostra abalado deve-se entender que tal complicação pós-operatória é um dos riscos da operação.
     Somos, pois a concordar com a Mma Juíza, enquanto consignou:
    “Em relação à rotura dos vasos quilíferos causada na operação e o conseguinte quilotórax, não se prova nos autos que a respectiva rotura foi causada pela violação das regras da técnica de medicina ou do dever de cuidado por parte dos 2º e 3º réus; de facto, na medicina clínica, a rotura dos vasos quilíferos é complicação pós-operatória e pertence a risco cirúrgico.”
    
    Considerando o exposto, forçoso é concluir que as opções médicas e os vários actos realizados foram os mais adequados face à situação clínica do A., não podendo o A. apontar a prática de qualquer acto ilícito à ora recorrida ou aos seus agentes.
    Assim, não se verificando o primeiro dos pressupostos de aplicação do regime da responsabilidade civil - a prática de actos ilícitos - sempre a pretensão do recorrente não deixará de soçobrar.
    
    22. Ainda da ilicitude e da culpa
    Quanto ao pressuposto da culpa, alega o recorrente que o CHCSJ e os médicos assistentes da recorrida actuaram com negligência, afirmando que era preferível optar-se por uma abordagem conservadora, evitando a cirurgia, e, caso fosse necessário realizá-la, era possível através do exame de frozen section concluir pela inexistência de cancro.
    Para que haja responsabilidade civil é necessário que se verifiquem os seguintes pressupostos em função de uma dada conduta: que o acto seja ilícito, que haja culpa do agente, se verifiquem danos, se observe um nexo causal entre estes e a conduta, autonomizando ainda alguns autores o vínculo da imputação do facto ao agente.29
    E não deixa de se observar que há quem reconduza esses pressupostos a dois mais um, este de carácter negativo, qual seja a ausência de causas de isenção de responsabilidade civil, deixando de os considerar atomisticamente, como é o caso do Prof. Pessoa Jorge que ensaia essa recondução apenas ao acto ilícito e prejuízos reparáveis, integrando a culpabilidade naquele primeiro requisito e o nexo causal no segundo.30
    É que a ilicitude do acto, mesmo nos actos neutros violadores de normas, não deixa de acarretar um juízo de censura ínsito à violação do ordenamento jurídico.
    A culpa é um juízo de censura que opera apenas pela acção do homem e se constrói em função dele. Mesmo quando se responsabiliza o homem por causa das coisas, dos veículos, das máquinas, dos animais, é em função de uma qualquer especial relação entre a coisa e o homem, que a detém, possui, titula, encabeça um qualquer direito sobre ela, que se atribui culpa, que se visa responsabilizar.31
    No caso, não se vê como assacar um juízo de censura por uma conduta imprudente, fora das regras da medicina comumente estabelecidas e que não fosse aceitável e compreensível por um juízo de um homem medianamente situado.
    Isto para realçar que a abordagem acima feita ao excluir-se a ilicitude, por inexistência de violação de regras, fosse por acção ou por omissão de deveres de conduta na prática do acto médico, responde à questão da pretensa culpabilidade.
    Desde já se reafirma - e vemo-nos já a incorrer nos mesmos vícios do recorrente em termos de repetição argumentativa - que não é isso que vem provado. O que se comprovou foi uma conformidade com as leges artis e tal prova não se mostra abalada.
    O A. não logrou provar, de modo nenhum, que por banda da R. ou dos seus agentes tenha existido qualquer comportamento que se subtraia à diligência que teria, em face da situação concreta, um bom pai de família.
    Antes, pelo contrário, não deixa até de se anotar, essa sim, uma excepcional rapidez entre a 1ª observação e a intervenção cirúrgica, que mediaram apenas duas semanas e se dispensou todo um acompanhamento e informação ao recorrente e esposa, o que não deixa de ser louvável e indicia bem a preocupação que a equipa médica teve perante um quadro que se configurava de especial urgência, face à alta probabilidade de se estar perante um cancro maligno
    
    23. Em todo o caso e resumindo:
    
    i) Ninguém obrigou o A. a realizar a intervenção cirúrgica dos autos em detrimento do chamado tratamento conservador;
    ii) o A. estava esclarecido de que só após a realização da cirurgia e da extracção da totalidade do tumor é que poderia formular-se uma conclusão definitiva quanto à existência ou não de cancro;
    iii) o direito à informação que o recorrente diz não ter sido assegurado não se mostra postergado porquanto ele não comporta o esclarecimento detalhado da abordagem médica e técnica que um leigo não compreende, não fazendo sentido informar da possibilidade de realização de exames que os técnicos consideravam inconclusivos e dispensáveis, juízo esse sufragado por um conjunto de peritos e especialistas;
    iv) caso se tratasse de cancro, a opção pela abordagem conservadora (que passaria por observar a evolução do tumor dentro do organismo do A.) poderia implicar que o tumor sofresse metástases e se alastrasse para outros tecidos e órgãos do A., situação em que, certamente, o A. ou os seus herdeiros estariam agora em juízo a demandar os ora RR. por não lhe terem retirado o tumor dos pulmões atempadamente.
    
    24. Da inversão do ónus da prova quanto à culpa.
    Quanto ao ónus da prova do pressuposto da culpa, o recorrente defende que deve ser perspectivada nos termos do nº 2 do artigo 486º do CC, segundo o qual “Quem causar danos a outrem no exercício de uma actividade, perigosa por sua própria natureza ou pela natureza dos meios utilizados, é obrigado a repará-los, excepto se mostrar que empregou todas as providência exigidas pelas circunstâncias com o fim de os prevenir.”
    Importa esclarecer que ainda que se considere a prática de actos médicos uma actividade perigosa por natureza, o que em princípio não se concede,32 tal prática não pode ser subsumida à situação regulada no nº 2 do artigo 486º do CC, conforme explicitado na douta sentença recorrida, devendo aplicar-se a regra geral prevista no n.º 1 do artigo 480º do mesmo Código, por força do disposto no artigo 335º, nº 1do CC.
    Na verdade, não estamos perante uma situação abrangida pela tatbestand da norma e, consequentemente, perante uma necessidade de recurso à presunção de culpa, o que decorre, como se viu, do regime da responsabilidade contratual. No caso sub judice não há necessidade de recurso a essa regra, porquanto simplesmente se provou à saciedade que as opções dos médicos respeitaram os parâmetros prescritos para o quadro em presença.
    Para além de que, igualmente como se viu, caberia ao caso o regime do ónus da prova do lesado válido para o regime da responsabilidade extra-contratual, aplicável às situações de acto médico prestado em hospital público, prova essa que não foi feita, também como acima visto.
    
    25. Da invocada responsabilidade baseada no risco
    A responsabilidade médica baseada no risco não tem cabimento nas situações de responsabilidade médica, não sendo esse o regime adoptado no nosso ordenamento em que a responsabilidade médica não deixa de assentar na responsabilidade baseada na culpa, presumida ou não.
    
     Nem sequer por via do disposto no artigo 9º do Decreto-Lei n.º 28/91/M, de 22 de Abril que dispõe:
    “A Administração do Território e demais pessoas colectivas públicas respondem pelos prejuízos especiais e anormais resultantes do funcionamento de serviços administrativos excepcionalmente perigosos ou de coisas e de actividades da mesma natureza, salvo se, nos termos gerais, se provar que houve força maior estranha ao funcionamento desses serviços ou ao exercício dessas actividades, ou culpa do lesado ou de terceiro.”
    A nossa lei, tal como aquele que inspira o nosso ordenamento, não prevê, no que toca à responsabilidade médica, casos de responsabilidade objectiva, nem casos de responsabilidade civil por factos lícitos danosos – tal responsabilidade assenta na culpa.33
     Neste sentido a Jurisprudência Comparada:
    “Uma actividade é excepcionalmente perigosa quando for razoável esperar que dela possam, objectivamente, resultar graves danos, isto é, danos que superem os que eventualmente possam decorrer da normalidade das outras actividades e que os prejuízos são anormais ou especiais quando oneram pesada e especialmente algum ou alguns cidadãos e, consequentemente, ultrapassam os pequenos transtornos e prejuízos que são inerentes à actividade administrativa e sobrecarregam de forma mais ou menos igualitária todos eles.”34

    “Nas acções de responsabilidade médica tem aplicação o regime geral do nosso ordenamento jurídico – art. 342º, n.º1, C. Civil - de acordo com o qual cabe à autora fazer a prova dos factos constitutivos do alegado direito à indemnização, salvo caso de presunção legal – art. 344º n.º 1, C. Civil – ou quando a parte contrária tiver culposamente tornado impossível a prova ao onerado – art. 344º, nº 2 C. Civil.”35
    “Para que seja imputável ao réu a lesão sofrida pelo autor (paraplégia) após um acto anestésico (epidural) o lesado (autor) deve provar os factos de onde resulte que aquele resultado foi causado pelo acto anestésico, que houve violação das leges artis e que o referido resultado se localiza no âmbito dos perigos que escrupuloso cumprimento das leges artis pretende evitar.”36
    
    Na verdade, a tese defendida pelo A., ao pretender, ainda que subsidiariamente, uma responsabilidade baseada no risco, não tem fundamento legal, não se entendendo que uma situação como a presente integre um prejuízo especial e anormal resultante de um serviço excepcionalmente perigoso ou de uma actividade da mesma natureza.
    É verdade que uma operação comporta um risco, mas se algo correr mal na decorrência dessa operação tal deve integrar-se no quadro da normalidade dos riscos que essa actividade comporta e não já na excepcionalidade prevista na norma.37
     26. Do nexo causal entre o facto e os danos
    O recorrente alega basicamente que depois das intervenções cirúrgicas a sua vitalidade, energia e confiança começaram a decrescer, sendo que até aí era uma pessoa saudável, forte, praticava desporto, nunca tinha alergias de pele e a medicamentos e depois começou a ter problemas nas funções de desintoxicação e no sistema imunitário, o que acabou por motivar até a sua saída da Banda como trompetista e a reforma antecipada.
    Até estamos em crer que tudo isso tenha acontecido, mas estão realmente provadas todas essas consequências nefastas? Está provado que tudo isso resultou daquela operação?
    Lendo e relendo a matéria de facto não descortinamos ali tais consequências, com a descrição que vem feita nas alegações, e quanto ao nexo causal não está ele precisamente determinado.
    Apesar do nexo de causalidade entre a excisão de nódulos linfáticos e as complicações inerentes, a rotura dos vasos quilíferos não é o dano inerente causado por uma biópsia linfática de “amostragem”, mas é antes uma consequência da operação que foi realizada de acordo com as condutas propostas pela ciência médica.
    Para além de que não há suficientes provas sequer de as funções corporais do recorrente terem sido danificadas ou o seu sistema da circulação linfática ter sido afectado por causa da excisão dos 4 nódulos linfáticos.
    
    27. Concluindo
    Posto isto, por inverificados os aludidos pressupostos da responsabilidade civil, concernentes à ilicitude, à culpa, até ao próprio nexo causal, por banda dos médicos e da Administração, nos termos vistos, despicienda se mostra a análise da restante matéria que vem colocada.
    
    Por todas as razões expostas, o recurso não deixará de improceder em toda a linha.

V - DECISÃO
    Pelas apontadas razões, acordam em negar provimento ao recurso interlocutório interposto pelos 1º, 2º e 3º RR., com custas pelos recorrentes;
    Em negar provimento ao recurso interlocutório interposto pelo A., com custas pelo recorrente;
    Em negar provimento ao recurso da decisão final interposto pelo A., com custas a seu cargo.
               Macau, 21 de Fevereiro de 2013
               João A. G. Gil de Oliveira
Presente José Cândido de Pinho
Vitor Coelho Lai Kin Hong
               
1 Neste sentido, o acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 12 de Setembro de 2003, proferido no âmbito do Processo n.º 0325161 : “Não sendo a confissão o objectivo deste requerimento do depoimento de parte, este requerimento deve ser indeferido.”
2 A alínea 14-b do acórdão (fls. 1438 a 1440 dos autos): O exame de broncoscopia e biopsia é um exame de rotina feito antes de qualquer operação aos pulmões, para recolher amostras para diagnóstico de casos de doenças brônquicas ou pulmonares impossíveis de diagnosticar ou casos de doenças pulmonares difusas difíceis de diagnosticar, para determinar o tipo de células cancerosas e o próprio tratamento.
       
3 - Segundo escrito no “manual patológico do cancro pulmonar” (fls. 1410 a 1425 dos autos) publicado pela 4ª ré, Serviços de Saúde e coordenado pelo 2º réu C, pág. 85, 6.3.2, “o exame de broncoscopia”: o exame de broncoscopia usa-se amplamente para o diagnóstico e a determinação de fase. O exame permite a observação pormenor de epiglote, glote, traqueias brônquios e brônquios intrasegmentais. Pode-se recolher as amostras por: biopsia directa, escove, lavagem e TBNA. O efeito mais importante do TBNA é determinar a fase dos linfonodos mediastinais. No caso de lesões periféricas pulmonares, a recolha de amostras é geralmente assistida por X-RAY e através de biopsia de clampe brônquico, escove, lavagem, ou lavagem broncoalveolar.
4 Fls. 592 a 784 dos autos
5 - Ac. RP, proc. n.º 212/10.9TTVNG.P1, de 18/6/2012
6 - Ac. da RL, de 3/11/2010, Proc. n.º 180/09.0TULSB-A.L1-6

7 - Lebre de Freitas, Montalvão Machado e Rui Pinto, Código de Processo Civil Anotado, Coimbra Editora, vol. II, 2ª edição., 505

8 - Código de Processo Civil Anotado, Coimbra Editora, vol. II, 2ª edição, 506
9 - op. cit., 497
10 - cfr. LEBRE DE FREITAS, A Confissão cit., ps. 240-246
11 - Ac. da RL, de 3/11/2010, Proc. n.º 180/09.0TULSB-A.L1-6

12 - Código de Processo Civil Anotado, Coimbra Editora, vol. IV, 93
13 - Alberto dos Reis, CPCA, vol. V, Reimp., 2005, 357
14 - El Alma Del Toga, 102
15 - Ac. STJ, de 25/2/93, Proc. n.º 08276 e TSO, ac. de 24/10/02, Proc. 198/02
16 - Ac. do TSI, de 20/11/2011, Proc. n.º 125/09
17 - Como veremos adiante
18 - Almeida Costa, Direito das Obrigações, p. 396, Menezes Leitão, Direito das Obrigações, vol. I., p. 318, Galvão Telles, Obrigações, p. 396 e Pinto Monteiro, Cláusula Penal e Indemnização, p. 31 e ss,
19 - A. Varela, CCAnotado, vol. I., p. 501 e Das Obrigações em Geral, vol. I., p. 605
20 - Rute Teixeira Pedro, Responsabilidade Civil do Médico, p. 56 e ss..

21 - Miguel Teixeira de Sousa, Sobre o ónus da prova nas acções de responsabilidade civil médica, p. 125, Direito da Saúde e Bioética, AAFDL e Carlos Ferreira de Almeida, Os contratos civis de prestação de serviço médico, mesma revista, p. 110.
22 - Ac. do STJ de 4/3/2008, proc. 08A183,
23 - Miguel Teixeira de Sousa, O Concurso de Títulos de Aquisição da Prestação, pag. 136
24-Almeida Costa, Direito das Obrigações, 9ª edição, 503
25 - Ameida Costa, ob. cit. 499
26 -Ac. do STJ, de 17/2/02, Revista n.º 4057/02
27 - cfr. CJ, Acórdãos do STJ, 2001, tomo II, págs. 166-170

28 - Ferreira de Almeida, Os contratos civis de prestação de serviço médico, in Direito da Saúde e Bioética, AAFDUL, Lisboa, 1996, 81 e 82.

29 - A. Varela, Dto das Obrigações em Lições ao 3º ano jurídico de 1967-68, polic., Coimbra, 1968, 347; Gomes da Silva, Coonceito e Estrutura da Obrigação, Lx, 1943, 110; Vaz Serra, Requisitos da Resp. Civil, BMJ, 92,39
30 - Pessoa Jorge, Ensaio Sobre os Pressupostos da Resp. Civil, Reimp., 1995, Almedina, 55

31 - Pessoa Jorge, ob. cit., 55
32 - cfr. neste sentido, A. STA, de 12/10/92, Proc. n.º 030514
33 - Ac. STJ, de 19/6/2001, Proc. n.º 1008/01
34 - Ac. STA, de 14712/2005, Proc. n.º 0351/05
35 - Ac. STA, de 14/4/2005, Proc. n.º 0677/03
36 - Ac. STA, de 26/5/05, Proc. n.º 0793/09
37 - cfr. Ac. STA acima referido, proc. n.º 03514
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778/2011 1/52