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Processo n.º 781/2012
(Recurso Cível )

Relator: João Gil de Oliveira
Data : 28/Fevereiro/2013


ASSUNTOS:

    - Alteração da regulação do poder paternal
    - Alimentos a menor
    - Critérios de atribuição dos montantes dos alimentos

SUMÁRIO:

1. Nas questões relativas ao poder paternal o critério de julgamento dos processos de jurisdição voluntária rege-se nos termos de que o tribunal não está sujeito a critérios de legalidade estrita, devendo antes adoptar em cada caso a solução mais conveniente e oportuna.

2. O interesse do menor é o valor predominante a prosseguir e a regulação a efectuar, no que aos alimentos concerne (cfr. art. 1844º, n.º 1 do CC), bem como ao demais no âmbito do exercício do poder paternal, deve padronizar-se por um critério de proporcionalidade entre as necessidades do menor e as reais possibilidades dos obrigados quanto ao dever de contribuir para o sustento, saúde, educação, conforto e bem estar do alimentando.
    
    3. Se uma pessoa obrigada a alimentos se refugia num empréstimo para fugir aos alimentos devidos, há que ter em atenção essa situação. Quem tem obrigações não tem devoções, isto é, não pode arrecadar fortuna e deixar de prover ao sustento dos filhos. Se não se entendesse desta forma estaria aberta a porta para que qualquer um pudesse fugir às suas obrigações básicas, bastando pedir emprestado para dizer que tinha que pagar ao banco para deixar de pagar aos filhos. Ora isto não se pode admitir.
O Relator,
João A. G. Gil de Oliveira






Processo n.º 781/2012
(Recurso Cível)
Data: 28/Fevereiro/2013

Recorrente: A

Recorrido: B

    ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
    I - RELATÓRIO
   A (XXX), recorrente do processo em epígrafe, mais bem identificada nos autos, inconformada com o decidido no processo de alteração de regulação de poder paternal relativo à sua filha C, decisão essa do seguinte teor:
   
    O pai da menor B deve pagar, a título dos alimentos para a filha menor, a quantia mensal de duas mil patacas (MOP2.000,00) [era anteriormente de MOP3.000,00] a partir de Abril de 2012 e, nos termos do artº 110º, nº 2 do Decreto-Lei nº 65/99/M, notifica-se a Direcção dos Serviços de Finanças para efectuar mensalmente o desconto da referida no vencimento do mesmo a partir de Abril de 2012, sendo tal quantia creditada na conta bancária indicada pela mãe da menor antes do dia de 30 de cada mês.
    Relativamente à parte de incumprimento, decide nos seguintes termos:
    O pai da menor deve pagar mensalmente uma quantia de MOP1.250,00 para restituir os alimentos devidos, no valor total de MOP45.000,00, indicados no apenso de incumprimento nº CV1-08-0053-MPS-C, até o integral pagamento, e, nos termos do artº 707º, nº 1, al. a), e nº 2. do CPC e do artº 110º, nº 2, do Decreto-Lei nº 65/99/M, notifica-se a Direcção dos Serviços de Finanças para efectuar mensalmente o desconto da quantia de MOP1.250,00 no vencimento do mesmo a partir de Abril de 2012 para ser depositada na conta bancária indicada pela mãe da menor antes do dia de 30 de cada mês, até o integral pagamento de todos os alimentos devidos.
    Ademais, considerando que já foram efectuados descontos no vencimento de Abril do pai da menor, os descontos acima mencionados relativos ao mês de Abril serão efectuados no vencimento do mês de Junho de 2012.”,
   veio apresentar as suas alegações de recurso, concluindo, em síntese:
   
   1. A sentença recorrida não chegou a provar o montante concreto das despesas necessárias à subsistência da menor por mês, o que violou as regras da experiência.
   2. Pelos documentos apresentados pela recorrente e anexados a este processo e pelas disposições dos artºs 599º e 629º, nº 1 do CPC, deve provar-se que o montante concreto das despesas necessárias à subsistência da menor por mês é de MOP17.000,00.
   3. A sentença recorrida determinou que o pai da menor B pague, a título dos alimentos para a filha menor, a quantia mensal de duas mil patacas (MOP2.000,00) a partir de Abril de 2012. Tal decisão violou os artºs 1733º, 1734º e 1844º do CC e as regras da experiência.
   4. Nos termos dos artºs 1733º, 1734º e 1844º do CC e do artº 110º, nº 2 do Decreto-Lei nº 65/99/M, deve decidir-se que o recorrido B pague mensalmente uma quantia de MOP4.000,00 a MOP5.000,00, a título dos alimentos para a filha menor, a partir do mês de Abril de 2012.
   5. A sentença recorrida violou também os artºs 704º, 707º, nº 1, al. a), e nº 2 do CPC e o artº 110º, nº 2 do Decreto Lei nº 65/99/M ao decidir que o pai da menor deve pagar mensalmente uma quantia de MOP1.250,00 para restituir os alimentos devidos, no valor total de MOP45.000,00, indicados no apenso de incumprimento nº CV1-08-0053-MPS-C, até o integral pagamento.
   6. Deve determinar-se, com base nas normas acima citadas, que os alimentos devidos, no valor total de MOP45.000,00, sejam descontados nos subsídios de férias do recorrido, atribuídos em Junho e Novembro (desconta-se a quantia de MOP22.500,00 cada) para depois sejam depositados directamente na conta bancário indicado pela mãe da menor,
   7. ou sejam descontados no vencimento de Junho e de Novembro (desconta-se a quantia de MOP22.500,00 cada) para depois sejam depositados directamente na conta bancário indicado pela mãe da menor.
   8. A incapacidade económica da recorrente foi comprovada no verso de fls. 6 do processo nº CV1-08-0053-MPS-B e foi-lhe designado patrono oficioso.
   9. A recorrente solicita que sejam fixados os honorários de patrono oficioso conforme dispõe o artº 29º do Decreto-Lei nº 41/99/M (incluindo os relativos ao processo nº CV1-08-0053-MPS-C e a este recurso).
   10. Mais solicita, ao abrigo dos artºs 1º, 4º e 5º, nº 1, al. b), do mesmo diploma legal, que lhe seja dispensado o pagamento total do reparo, custas processuais e honorários a patrono oficioso.
   Pede justiça!

Não foram oferecidas contra-alegações.
O Exmo Senhor Procurador–Adjunto, nesta Instância, na qualidade de curador de menores oferece o douto Parecer que adiante se transcreverá.
    Foram colhidos os vistos legais.

    II – FACTOS
    Vêm provados os factos seguintes:
    
    1. A menor C é filha do requerente B e da requerida A, nascida em XX de XXX de XXXX, em Macau.
    2. Os pais da menor casaram-se civilmente em 25 de Junho de 1999 em Macau. O seu casamento foi dissolvido em 18 de Junho de 2008 pelo processo nº CV1-06-0014-CDL do 1º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Base do RAEM.
    3. Por decisão proferida em 19 de Março de 2009 no processo CV1-08-0053-MPS do 1º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Base, à mãe foi atribuído o exercício do poder paternal, ficando a menor à guarda da mãe e a viver com esta, e o pai com o dever de prestar alimentos no montante de MOP3.000,00 por mês, podendo este visitar a menor sempre que o desejar, sem prejuízo das horas de descanso e das actividades escolares desta.
    4. Actualmente, a menor está a viver com a mãe em Zhuhai e está a frequentar o ensino primário em Macau, estando numa situação estável em termos da vida e estudo.
    5. O pai da menor não pagou à mãe a pensão alimentícia da menor desde Janeiro de 2011 a Março de 2012, o que perfaz um montante total de MOP45.000,00.
    6. O pai da menor é guarda do CPSP. Depois de proceder três descontos no vencimento mensal pelo adiantamento de vencimentos por ele requerido (perfazendo uma quantia total de MOP7.476,00) e a penhora de 1/6 do vencimento (actualmente é de MOP2.615,50 mensal), fica com um rendimento mensal líquido de MOP13.077. A mãe da menor exerce funções de croupier na Sociedade de Jogos de Macau, S.A., ganhando um salário mensal de MOP16.000,00.
    7. Em 11 de Julho de 2011, foi ordenada, no âmbito do processo nº CV1-06-0014-CPE do Tribunal Judicial de Base, a penhora de 1/6 do vencimento mensal do pai da menor, até o integral pagamento dos alimentos em dívida, no valor total de 247.040,00 (vd. fls. 295v a 297 do processo nº CV1-06-0014-CPE do TJB).
    8. O último desconto no vencimento pelo adiantamento de vencimentos requerido à Caixa Económica Postal será efectuado em Agosto de 2012.
    9. O pai da menor paga uma renda mensal de HKD3.800,00.
    
    
    Foram dados como não provados os factos seguintes:
    1. O montante concreto das despesas necessárias à subsistência da menor por mês.
    2. O pai da menor contribui, mensalmente, uma quantia que varia de MOP3.000,00 a MOP5.000,00, a título de alimentos para a sua mãe que vive em Portugal.
    3. O montante concreto das despesas à subsistência por mês do pai e da mãe por mês.
    Os factos acima referidos foram dados como provados com base nas provas documentais, bem como na confissão e no acordo feito entre as partes.
    
    III - FUNDAMENTOS
    1. O objecto do presente recurso passa fundamentalmente pela análise de duas questões, não sem que que se registe uma palavra de apreço pela alegação da recorrente que soube de uma forma escorreita e sintética identificar as razões de facto e de direito por que discorda da sentença proferida.
    E essas questões são as seguintes:
    - a sentença recorrida não terá levado em linha de conta as despesas que a mãe da menina tem de fazer face para prover às necessidades da criança;
    - discorda do pagamento do montante em dívida da forma como escalonada foi, pretendendo que esse montante seja pago aquando do recebimento dos subsídios de férias e Natal.

     2. Atentemos na fundamentação vertida na douta sentença:
    
    “De acordo com os factos referidos e nos termos dos respectivos diplomas legais, designadamente o artº 1760º, nºs 2, 3, o artº 1761º, nºs 1 e 4, do CC, e os artºs 121º e 122º do Decreto-Lei nº 65/99/M (Regime Educativo e de Protecção Social de Jurisdição de Menores), o Tribunal vai tomar decisão sobre a regulação de exercício do poder paternal relativa à menor, considerando em particular os elementos tais como o futuro da menor, a sua guarda e educação, o regime de alimentos e de visitas, até a necessidade para a alteração de regulação de exercício do poder paternal.
    Conforme os artºs 1733º e 1734º do CC, a regulação do exercício do poder paternal visa principalmente salvaguardar a protecção dos interesses do menor. O ideal para resolver o problema é o acordo entre os progenitores obtido nos interesses do menor.
    In casu, o pai pediu a redução dos alimentos, sobre qual não foi chegado a um acordo entre as partes. Entendemos, com base nos factos provados, que é mais adequado que a mãe continue a exercer o poder paternal quanto à menor, o que pode assegurar os interesses desta. Assim, não se verifica a necessidade de alteração da regulação de exercício do poder paternal, nela se incluindo o regime de visitas. Quanto aos alimentos, o pai admitiu que não pagou pensão alimentícia desde Janeiro de 2011 até Março de 2012. Referiu o mesmo na conferência que está actualmente em situação financeira desfavorável, pedindo, por isso, que seja a pensão reduzida para MOP1.500,00 mensal e os alimentos devidos sejam pagos em prestações (em 30 prestações, no valor de MOP1.500,00 cada uma). Por outro lado, a mãe da menor requereu o aumento do valor dos alimentos de MOP4.000,00 a MOP5.000,00 por mês. Mais pediu que os alimentos devidos sejam pagos em uma só vez.
    Segundo os artºs 1733º, 1734º e 1844º do CC, em princípio, ambos os progenitores têm as obrigações de prover o sustento dos filhos conforme as condições da família, e de assumir as despesas inerentes à segurança, saúde e educação destes. O artº 1845º do CC também dispõe que “1. Os alimentos devem ser proporcionados aos meios daquele que houver de prestá-los e à necessidade daquele que houver de recebê-los. 2. Na fixação dos alimentos deve atender-se, igualmente, à possibilidade de o alimentado prover à sua subsistência.” Nesta causa, os pais da menor têm empregos e vencimentos estáveis, mas não se conseguiu comprovar o valor dos encargos da vida diária da menor. Assim, de acordo com as regras da experiência e atendendo às necessidades diárias da menor, à situação económica actual do pai e da mãe e seus rendimentos disponíveis, bem como à proposta do douto Magistrado do Ministério Público, este Tribunal decide que o pai B deve pagar, a título dos alimentos para a filha menor, a quantia mensal de duas mil patacas (MOP2.000,00) à mãe A.
    Ao mesmo tempo, decide notificar, nos termos do artº 110º, nº 2 do Decreto-Lei nº 65/99/M, a Direcção dos Serviços de Finanças para efectuar mensalmente o desconto da quantia de MOP2.000,00 no vencimento do requerente a partir de Abril de 2012, sendo tal quantia creditada na conta bancária indicada pela mãe da menor antes do dia de 30 de cada mês, de modo a cumprir o dever de prestar alimentos à filha.
    Relativamente ao pedido relacionado com o incumprimento da prestação de alimentos, devido à confissão do pai da menor, este Tribunal deu como assento o facto de que o mesmo não pagou a pensão alimentícia da menor desde Janeiro de 2011 a Março de 2012, no total 15 meses, o que perfaz um montante total de MOP45.000,00 (MOP3.000,00 por mês). Tendo em conta a situação financeira actual do pai, este Tribunal decide, nos termos do artº 707º, nº 1, al. a) e nº 2, do CPC e do artº 110º, nº 2, do Decreto-Lei nº 65/99/M, notificar a Direcção dos Serviços de Finanças para efectuar mensalmente o desconto da quantia de MOP1.250,00 no vencimento do requerente a partir de Abril de 2012 (no total 36 prestações) para ser depositada na conta bancária indicada pela mãe da menor antes do dia de 30 de cada mês, de modo a restituir os alimentos devidos indicados no apenso de incumprimento nº CV1-08-0053-MPS-C, até o integral pagamento.
    Uma vez que já foram efectuados descontos no vencimento de Abril do pai da menor, os referidos descontos relativos ao mês de Abril serão efectuados no vencimento do mês de Junho de 2012.”

3. O Exmo Senhor Procurador Adjunto analisa de uma forma mui precisa e incisiva as razões que são colocadas no presente recurso e pela sua assertividade damos aqui por reproduzida a fundamentação do seu douto parecer, a que aderimos na íntegra.
     “O Magistrado do Ministério Público, como curador da menor C, foi chamado para pronunciar sobre o recurso interposto pela requerida, vem por este meio expressar a nossa posição sobre o merecimento do mesmo nos seguintes termos:
    Pelo visto, os fundamentos do recurso cingem-se tanto à matéria de facto como à matéria de direito, assim, sendo, vamos analisar cada uma das questões passo a passo.
    Em primeiro lugar, a recorrente argumenta que o tribunal "a quo" incorreu no erro da apreciação da prova, na medida em que não se ter dado como provado os factos por si alegados e que são demonstrativos do montante real necessário para o sustento da vida quotidiana da menor. No seu entender, os documentos por si juntos aos autos são capazes de demonstrar aquela realidade.
    Vamos ver se será assim?
    Ora, os documentos que a recorrente refere consta a fls. 18 a 63 dos autos.
    Se processar uma análise mais detalhada, verificamos que todos deles são mera fotocópia. Acresce que de fls. 18 a 21 se tratam de meras alegações dela, não são capazes de demonstrar nenhum facto concreto.
    Por outro lado, de fls. 22 a 34 são cópias de recibo de compra de mobílias ou de produtos electrónicos. Salvo o respeito, mesmo que se tivesse provado essas despesas, para nós era impossível estabelecer o nexo causal directo e necessário entre elas e o custo indispensável de vida da menor.
    E de fls. 35 a 37 são documentos que se referem aos contratos de seguro celebrado entre a requerida e três Seguradoras (XXX Limited, XXX Company Limited e XXX Company Limited, titulando nelas como pessoa segurada a sua filha menor). Ora, não nós repugna que um contrato de seguro possa oferecer mais garantia à vida da menor, porém, a respectiva despesa nunca possui um carácter indispensável e imediata relativamente à vida quotidiana da menor.
    Diferentemente, as fls. 38 a 42 já mencionam algumas despesas directas e necessárias da menor, incluindo despesas de transportes da escola, despesas de condomínio e despesas de aulas de música.
    E a partir de fls. 43, entendemos que já não são documentos relevantes para determinação do custo da vida da menor, excepto a fls. 57 onde se refere o salário base da própria requerida.
    De facto, com tudo acima ficou relatado, não nós parece possível ter uma panorama global sobre o custo da vida da menor por falta da prova.
    E acresce que tal dificuldade não é ultrapassável por actos oficiosos do tribunal "a quo" (pois estamos no domínio de jurisdição voluntária onde a intervenção do tribunal possa ser mais activa), dado que o centro da vida da menor é na China Continental e não Macau.
    Por outro lado, não se esquece que não há mais ninguém conhece bem esta questão senão os pais que exercem o poder paternal, e quando estes não conseguem demonstrar objectivamente o valor do custo da vida, quase não há mais ninguém é capaz.
    Perante este quadro das coisas, pensamos que a conclusão que o tribunal "a quo" chegou, quanto ao não dar como provado as despesas do custo da vida da menor é a única solução correcta e adequada que pode chegar.
    Duvidosamente, a recorrente entende que deveria o tribunal recorrido ter dado como provado que o custo mensal rondava em MOP$17,000.00, mas sem especificar como lá chegar a este valor. Pois, os documentos acima analisados não parecem estar em consonância com o alegado da recorrente.
    Pelo que não entendemos que ocorreu qualquer erro na apreciação da prova por parte do tribunal recorrido.
*
    Em segundo lugar, a recorrente alegou também que houve erro na aplicação do direito por parte do tribunal "a quo", dado que não foi observado pelo tribunal as disposições constantes nos art. 1733º, 1734º e 1844º, todos do Código Civil.
    Salvo o respeito, para nós se trata de mera afirmação sem qualquer fundamento.
    Em primeiro lugar, é incorrecto a ideia de que qualquer alteração (quando é baixar) do montante de alimentos viola logo os princípios gerais do dever dos pais para com os filhos.
    Pois, parece que a recorrente não deu conta a existência de outra norma mais específica nessa matéria de alimentos, precisamente, nos termos do art. 1845 do Código Civil, onde a lei lançou a ideia de proporcionalidade entre o montante a pagar pelo obrigado e a necessidade do alimentado.
    No caso em apreço, na falta de dados concretos, o tribunal apelou às regras de experiência comum da vida, o montante de salários disponíveis pelas partes, determinou a alteração do montante de alimentos, de MOP$3,000.00 mensal passou a ser MOP$2,000.00 mensal.
    Na nossa óptica, trata-se de uma decisão sensata, por ter tido em consideração os encargos que o requerente pai tem assumido, pois, para além deste montante novo de alimentos, o requerente também precisa de suportar outro montante de MOP$1,250.00 mensal, como pagamento em prestações do alimentos já em atraso.
    Assim sendo, o requerente tem de pagar mensalmente no total MOP$3,250.00, o que representa já um valor, embora não alto, mas razoável como contributo para a vida da sua filha menor por ter chegado ao equilíbrio entre o dever de prestar alimentos e a sua própria capacidade.
    Com efeito, sendo facto de que a recorrente exerce o poder paternal, mas tal situação não a exime logo do dever de alimentos, o dever de alimentos continua a vincular também a recorrente.”

4. Pouco mais haverá a dizer, reafirmando-se o que já foi decido nesta Instância e que vai no sentido de que nas questões relativas ao poder paternal o interesse do menor é o valor predominante a prosseguir e a regulação a efectuar, no que aos alimentos concerne (compreende tudo o que é necessário à vida, sustento, habitação, vestuário, lazer e tratamento de moléstias - cfr. art. 1844º, n.º 1 do CC), bem como ao demais no âmbito do exercício do poder paternal, deve padronizar-se por um critério de proporcionalidade entre as necessidades do menor e as reais possibilidades dos obrigados quanto ao dever de contribuir para o sustento, saúde, educação, conforto e bem estar do alimentando.
     5. É o que resulta do já plasmado em diversas decisões e mais não é do que o que decorre da lei:
    “Nos termos do art.º 1845.º, n.º 1, do Código Civil de Macau, os alimentos devem ser nomeadamente proporcionados aos meios daquele que houver de prestá-los.”1
    “A lei impõe uma obrigação de regular o exercício do poder paternal, de harmonia com a regra da protecção dos interesses do menor, sempre que se encontra a situação em que os pais do menor não podem exercer esse poder nos termos do artigo 1739º nº 1 do Código Civil, basta uma situação em que os pais do menor se encontram separados de facto.
(…)
    O critério de julgamento dos processos de jurisdição voluntária rege-se nos termos de que o tribunal não está sujeito a critérios de legalidade estrita, devendo antes adoptar em cada caso a solução mais conveniente e oportuna.
Para a decisão da regulação do poder paternal, a sentença é sempre proferida de harmonia com o interesse do menor.
Em termos da regra aplicável ao processo de jurisdição voluntária, o que temos de dizer é que o tribunal pode sempre decidir por ser conveniente e oportuno os alimentos a pagar por um dos pais no qual não fica confiado o menor, mesmo que as partes não tenha pedido, se assim conformar com o interesse do menor.”2
    
    6. É certo que se a recorrente pretende dar à filha níveis de conforto e se os pode dar, incomportáveis face à situação concreta do outro progenitor obrigado a alimentos, terá de arcar com esses custos por si só, não podendo exigir que os níveis mínimos de subsistência deste último e de outros dependentes deste (referimo-nos ao outro filho) deixem de ser garantidos.
     De todo o modo, como se frisou, e tal como acima esmiuçado, não resulta provado o montante de despesas alegado em termos da satisfação das necessidades directas da criança.
    
    7. Uma nota ainda quanto à pretensão não satisfeita de pagamento de MOP 45.000,00 em dívida.
    Se se reconhece, e o próprio recorrido não deixa de o fazer, que tal montante está em dívida, essa situação não deixa de ser grave e de se repercutir nas dificuldades em prover aos alimentos da criança. Pretende a mãe que o recorrido pague em duas prestações por alturas do recebimento dos subsídios de férias e Natal. Mas a solução adoptada, de fraccionamento e faseamento, ao longo do tempo, não deixa de se mostrar acertada e mais adequada. Não obstante a situação censurável de incumprimento que, a repetir-se, poderá demandar medidas mais drásticas de retenção na fonte e porventura por valores superiores para evitar o acumular da dívida, o certo é que a modalidade pretendida, por um lado sempre corresponderia a um espraiamento, embora menor, mas por outro lado, não deixa de ter em conta as maiores dificuldades do recorrido em acudir às diferentes situações das necessidades da sua vida familiar.
    É aliás essa ideia de adequação e proporcionalidade entre as necessidades e os recursos disponíveis que leva à mutabilidade dos regimes dos menores e adaptação à evolução das situações concretas.
    No caso, importa não esquecer que o vencimento do recorrido, abstractamente considerado, suportaria normalmente o encargo que vinha fazendo de MOP 3.000,00, não fora o empréstimo feito à Caixa Económica. Sobre isto importa registar que se uma pessoa obrigada a alimentos se refugia num empréstimo para fugir aos alimentos devidos, há que ter em atenção essa situação. Quem tem obrigações não tem devoções, isto é, não pode arrecadar fortuna e deixar de prover ao sustento dos filhos. Só que no caso não está bem esclarecido o fim desse endividamento, nem o Relatório do IAS o esclarece devidamente.
    O certo é que, como se disse já, alterando-se a situação dos réditos dos obrigados a alimentos, não fica excluída a possibilidade de alteração do regime.
    Se não se entendesse desta forma estaria aberta a porta para que qualquer um pudesse fugir às suas obrigações básicas, bastando pedir emprestado para dizer que tinha que pagar ao banco para deixar de pagar aos filhos. Ora isto não se pode admitir.
    Importa, pois, estar atento, mas por ora, no quadro que vem desenhado, não há razão para se alterar o que foi decidido em prudente critério pela Mma Juíza, como muito bem observa o Digno Curador de Menores.
    
    Em face do exposto o recurso não deixará de improceder.
    
    IV – DECISÃO
Pelas apontadas razões, acordam em negar provimento ao recurso, confirmando a decisão recorrida.
Custas pela recorrente.
  
   Fixa-se a título de honorários à Exma Patrona Oficiosa, nesta instância de recurso, a quantia de MOP 2.000,00.

Macau, 28 de Fevereiro de 2013,
João A. G. Gil de Oliveira
Ho Wai Neng
José Cândido de Pinho
1 - Ac. do TSI, de 27/5/04, Proc. n.º 88/2004
2 - Ac do TSI, de 10/11/11, Proc. n.º 283/2011; 25/11/04, Proc, n.º 239/2004
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