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Processo n.º 82/2013. Recurso jurisdicional em matéria administrativa.
Recorrente: A.
Recorrido: Secretário para a Segurança.
Assunto: Suspensão da eficácia do acto administrativo. Prejuízo de difícil reparação. Prazo para junção de documentos. Efeito útil da decisão.
Data da Sessão: 8 de Janeiro de 2014.
Juízes: Viriato Manuel Pinheiro de Lima (Relator), Song Man Lei e Sam Hou Fai.

SUMÁRIO:
  I – Se, na petição do procedimento de suspensão da eficácia do acto administrativo, o requerente se limita a protestar juntar documentos, sem pedir ao Tribunal qualquer prazo para o efeito, este Tribunal profere decisão final quando a tramitação processual chegue a tal termo, não tendo de notificar o requerente para juntar os documentos nem conferir-lhe prazo adicional, se não for pedido.
  II – O facto de o indeferimento da suspensão da eficácia colocar em causa o efeito útil da decisão que vier a ser proferida no recurso contencioso não é, por si, suficiente para o deferimento da providência.
  O Relator,
Viriato Manuel Pinheiro de Lima


ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU:

I – Relatório
A requereu a suspensão da eficácia do despacho do Secretário para a Segurança, de 26 de Setembro de 2013, que negou provimento a recurso hierárquico interposto de despacho do Comandante do Corpo de Segurança Pública, que, por sua vez, revogara a autorização de permanência em Macau do ora recorrente, na qualidade de trabalhador não residente.
O Tribunal de Segunda Instância, (TSI) indeferiu o requerido, por Acórdão de 14 de Novembro de 2013.
Inconformado, interpõe A recurso jurisdicional para o Tribunal de Última Instância (TUI).
Termina a respectiva alegação com a formulação das seguintes conclusões úteis:
- O douto acórdão recorrido decidiu sem aguardar que o recorrente procedesse à apresentação de prova adicional que protestou juntar, ou, pelo menos, sem previamente fixar um prazo razoável para a sua apresentação.
- Tal prova estava direccionada ao preenchimento do requisito previsto na al. a) do artigo 121º do Código do Procedimento Administrativo Contencioso (CPAC).
- O douto acórdão recorrido indeferiu a pretensão do recorrente exclusivamente com base no não preenchimento do requisito previsto na al. a) do artigo 121°, mas sem haver atentado no protesto de apresentação de prova por parte do recorrente, cerceando-lhe dessa forma a possibilidade de carrear legitimamente e em tempo, em prol da verdade dos factos, prova susceptível de suportar o deferimento da sua pretensão.
- Pelo que, ressalvada diversa opinião, o douto acórdão recorrido viola o princípio da tutela jurisdicional efectiva e, concomitantemente, o artigo 2° do CPAC, o artigo 14° do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos de que Macau é signatário e a própria al. a) do artigo 121° do mesmo CPAC.
- Salvo o devido respeito, só aguardando pela junção da prova protestada apresentar ou fixando um prazo razoável para a sua apresentação antes de decidir quanto ao mérito da pretensão de suspensão de eficácia formulada pelo recorrente, teria o Distinto Tribunal a quo todas as condições para, no cumprimento do princípio da tutela jurisdicional efectiva e de um correcto juízo equitativo, deferir ou indeferir tal pretensão.
- Por outro lado, afigura-se que o Distinto Tribunal a quo não decidiu em conformidade com o balanceamento entre os interesses em conflito resultante do próprio acórdão recorrido, incorrendo, por esta via, na violação do princípio da imparcialidade.
- O tribunal está por regra vinculado a desenvolver as actividades probatórias requeridas pelos cidadãos enquanto condições de demonstração das suas pretensões, só podendo afastar aquelas que sejam desnecessárias, sob pena de se verificar uma não ponderação de interesses relevantes dos mesmos.
- Acresce que, ressalvada melhor opinião, afigura-se que a decisão vertida no douto acórdão recorrido, coloca em causa o efeito útil da decisão que vier a ser proferida sobre o recurso contencioso que se encontra pendente tendo por objecto o acto administrativo que revogou a autorização de permanência do recorrente na RAEM, caso o mesmo obtenha, como nos parece ir suceder, provimento.
A Exm.ª Procuradora-Adjunta emitiu parecer em que se pronuncia pela improcedência do recurso.

II – Os factos
Estão provados os seguintes factos:
O requerente, nascido em 04JUN1979, é natural de Malásia, titular do passaporte da Malásia nº XXXXXXXXX e do TITNR nº XXXXXXX;
Em 30 JAN2012, foi contratado, como trabalhador não residente, pela B, para desempenhar nessa empresa as funções de Executive Host – Casino Customer Services, International Premium Market Development;
Por sentença do TJB datada de 27MAIO2013, já transitada em julgado, o requerente foi condenado pela prática de um crime de condução em estado de embriaguez, p. e p. pelo artº 90º/1 da Lei nº 3/2007, na pena de prisão de 3 meses, substituída por igual tempo de multa, à razão de MOP$70,00 por dia e na pena acessória de inibição de condução por um período de um ano;
Por despacho do Senhor Comandante da PSP de 11JUL2013, foi revogada ao requerente a autorização de permanência na qualidade de trabalhador não residente (TNR), nos termos do disposto no artº 11º/1-3) da Lei nº 6/2004, conjugado com o artº 15º/1 do Regulamento Administrativo nº 8/2010;
Inconformado com o decidido naquele despacho do Senhor Comandante da PSP de 11JUL2013, interpôs recurso hierárquico necessário para o Senhor Secretário para a Segurança;
Por despacho do Senhor Secretário para a Segurança de 26SET2013, foi-lhe negado provimento ao recurso hierárquico;
Em 22OUT2013 o requerente foi notificado desse despacho, cuja execução ora pretende ver suspendida; e
Em 22OUT2013, a entidade patronal C, rescindiu contrato de trabalhado celebrado com o requerente, com fundamento no cancelamento do seu TITNR pelo Departamento de Migração da PSP.

III – O Direito
1. As questões a apreciar
O Acórdão recorrido entendeu que, para que a providência cautelar de suspensão de eficácia de actos administrativos pudesse ser decretada, seria necessária a verificação cumulativa dos três requisitos previstos no art. 121.º, n.º 1 do Código de Processo Administrativo Contencioso (CPAC). E que, não tendo o requerente provado os factos que alegou, integradores do requisito de que a execução do acto lhe causaria previsivelmente prejuízo de difícil reparação, a providência estava condenada ao insucesso e assim decidiu, indeferindo a mesma.
O requerente recorre, alegando que o Acórdão recorrido foi proferido sem que tivesse aguardado que o requerente juntasse os documentos cuja apresentação protestara fazer na petição. Entende que o Acórdão recorrido violou o princípio da tutela jurisdicional efectiva, nas vertentes de violação do princípio do contraditório e da plena possibilidade de defesa das partes e, concomitantemente, o artigo 2.º do Código de Processo Administrativo Contencioso e o artigo 14.º do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos.
Alega, ainda, o recorrente que o Acórdão recorrido violou o princípio da imparcialidade, por não ter decidido em conformidade com o balanceamento entre os interesses em conflito e por não ter ponderado os interesses relevantes do recorrente, pois não desenvolveu as actividades probatórias requeridas e por não ter atentado que a decisão coloca em causa o efeito útil da decisão que vier a ser proferida no recurso contencioso.
São as questões a apreciar.

2. Verificação cumulativa dos requisitos
No sistema administrativo de Macau e nos semelhantes, designados de administração executiva, “Os actos administrativos são executórios logo que eficazes” (n.º 1 do artigo 136.º do Código de Procedimento Administrativo) (CPA).
  Por isso, a Administração não precisa de recorrer aos tribunais para executar os actos administrativos. Dispõe o n.º 2 do artigo 136.º do CPA que “O cumprimento das obrigações e o respeito pelas limitações que derivam de um acto administrativo podem ser impostos coercivamente pela Administração sem recurso prévio aos tribunais, desde que a imposição seja feita pelas formas e nos termos admitidos por lei”.
  Por outro lado, a interposição de recurso contencioso de anulação do acto administrativo não tem, em regra, efeito suspensivo do acto (embora haja casos expressamente previstos na lei, em que o tem).
  No caso dos autos, a interposição do recurso contencioso de anulação não suspende a execução do acto.
Não obstante, a lei prevê, como providência cautelar, a suspensão da eficácia dos actos administrativos, estatuindo o artigo 121.º do CPAC:
“Artigo 121.º
(Legitimidade e requisitos)
1. A suspensão de eficácia dos actos administrativos, que pode ser pedida por quem tenha legitimidade para deles interpor recurso contencioso, é concedida pelo tribunal quando se verifiquem os seguintes requisitos:
a) A execução do acto cause previsivelmente prejuízo de difícil reparação para o requerente ou para os interesses que este defenda ou venha a defender no recurso;
b) A suspensão não determine grave lesão do interesse público concretamente prosseguido pelo acto; e
c) Do processo não resultem fortes indícios de ilegalidade do recurso.
2. Quando o acto tenha sido declarado nulo ou juridicamente inexistente, por sentença ou acórdão pendentes de recurso jurisdicional, a suspensão de eficácia depende apenas da verificação do requisito previsto na alínea a) do número anterior.
3. Não é exigível a verificação do requisito previsto na alínea a) do n.º 1 para que seja concedida a suspensão de eficácia de acto com a natureza de sanção disciplinar.
4. Ainda que o tribunal não dê como verificado o requisito previsto na alínea b) do n.º 1, a suspensão de eficácia pode ser concedida quando, preenchidos os restantes requisitos, sejam desproporcionadamente superiores os prejuízos que a imediata execução do acto cause ao requerente.
5. Verificados os requisitos previstos no n.º 1 ou na hipótese prevista no número anterior, a suspensão não é, contudo, concedida quando os contra-interessados façam prova de que dela lhes resulta prejuízo de mais difícil reparação do que o que resulta para o requerente da execução do acto”.

É manifesto que os três requisitos previstos nas alíneas do n.º 1 são de verificação cumulativa, pelo que basta a não verificação de um deles para que a providência não seja decretada, salvo nas hipóteses previstas nos n.os 2, 3 e 4.1
Mais rigorosamente, o requisito da alínea a), que é o que está em causa (a execução do acto cause previsivelmente prejuízo de difícil reparação para o requerente ou para os interesses que este defenda ou venha a defender no recurso de anulação) tem sempre de se verificar para que a suspensão da eficácia do acto possa ser concedida, excepto quando o acto tenha a natureza de sanção disciplinar, o que não é o caso.

3. Prova dos prejuízos de difícil reparação
O Acórdão recorrido considerou que não se verificava o requisito do prejuízo de difícil reparação para o requerente, com os seguintes fundamentos:

“In casu, o alegado prejuízo de difícil reparação consiste, em síntese, na perda do emprego, no seu regresso imediato à Malásia, na privação do seu rendimento, alegadamente único para o sustento da vida da sua família na Malásia e o dele próprio em Macau.
Ora, se é certo que foi demonstrada nos autos a rescisão do seu contrato de trabalho com a B, e a consequente saída de Macau, não é menos verdade que se tendo limitado a alegar factos integradores do prejuízo de difícil reparação, o requerente não cumpriu o ónus de provar esses factos, pois a simples junção do documento alegadamente comprovativo da remessa do dinheiro para o seu cônjuge na Malásia não quer dizer de per si o rendimento que o requerente auferia em Macau é o único para o sustento da sua família na Malásia.
Ora, mesmo que esse facto pudesse ser dado por demonstrado, a privação do seu rendimento proveniente da entidade patronal B de per si nunca pode ser geradora de uma situação de carência quase absoluta e de impossibilidade de satisfação das necessidades básicas e elementares, dele próprio e da sua família na Malásia.
Pois tal como bem observou o Dignº Procurador Adjunto, tendo em conta a sua actual idade, não parece crível que o requerente e o seu cônjuge não possam arranjar emprego, na Malásia, para sustentar a família.
O que significa que a privação do seu rendimento a que conduz a perda do seu emprego em Macau é apenas causa necessária, mas nunca também causa suficiente de uma tal situação de carência absoluta, pois carece sempre do "contributo" por parte do próprio requerente e do seu cônjuge que consiste em não procurar outro emprego e actividade profissional para ganhar a sua vida.
Uma vez que os prejuízos de difícil reparação deverão ser consequência provável da execução do acto, probabilidade essa que é aferida segundo os critérios da teoria da causalidade adequada”.
O recorrente não discute a conclusão de que não se fez prova do requisito em questão. Só que entende que o Tribunal recorrido não lhe deu oportunidade para provar os factos que integravam o requisito, pois protestara na petição juntar documentos para tal prova e o Acórdão recorrido foi proferido antes que o pudesse fazer.
O recorrente está a deturpar a realidade.
Vejamos.
O meio processual em questão, como procedimento preventivo e conservatório, tem natureza urgente, significando isto que correm em férias judiciais estes procedimentos, sendo os actos da secretaria nestes processos praticados com a maior brevidade possível, com precedência sobre quaisquer outros [artigo 6.º, n.os 1, alínea d), 2 e 3 do Código de Processo Administrativo Contencioso].
Neste processo não há despacho de citação, procedendo a secretaria de imediato à citação simultânea do órgão administrativo e dos contra-interessados, quando os haja, para contestarem no prazo de 10 dias, remetendo-lhes os duplicados juntos pelo requerente (artigo 125.º, n.o 3 do Código de Processo Administrativo Contencioso).
Juntas as contestações ou findo o respectivo prazo, o processo vai com vista ao Ministério Público, por 2 dias e, seguidamente, é concluso ao relator para o submeter à conferência na sessão imediata, independentemente de vistos, que só correm quando qualquer dos juízes-adjuntos os solicite, hipótese em que a decisão é proferida na sessão seguinte àquela (artigo 129.º, n.o 2, do Código de Processo Administrativo Contencioso).
A petição de suspensão de eficácia do acto administrativo recorrido deu entrada no TSI em 29 de Outubro de 2013. Nela, nos artigos 19.º e 22.º, o requerente protestou juntar documentos comprovativos :
- De que a ex-entidade patronal admitirá novamente o requerente se o pedido de suspensão de eficácia fosse deferido;
- Do seu casamento e da paternidade de um filho.
O requerente não pediu qualquer prazo para junção dos documentos, nem fez qualquer referência à mesma junção, para além do que ficou dito.
Aquilo em que o requerente parecia estar sobretudo interessado era não ter de abandonar Macau, já que no fim da petição apenas pede que a entidade recorrida fosse logo notificada por fax para efeitos da suspensão provisória do acto administrativo. Quanto à junção de documentos, nada.
O órgão administrativo foi citado por carta de 30 de Outubro de 2013 e veio a contestar a 6 de Novembro de 2013.
O requerente foi notificado da cópia da contestação por carta de 7 de Novembro de 2013.
O Ministério Público teve vista do processo em 8 de Novembro de 2013 e deu parecer no próprio dia.
O Acórdão recorrido foi proferido a 14 de Novembro de 2013.
No dia seguinte, isto é, a 15 de Novembro de 2013, veio o requerente a juntar ao processo:
- Documento de funcionário da C, datado de 13 de Novembro de 2013, atestando que a empresa está interessada no trabalho do requerente;
- cópias de certidões de casamento do requerente e de paternidade de um filho, emitidas, respectivamente, a 28 de Outubro e 15 de Novembro de 2013.
Ou seja, entre a entrada da petição e a decisão decorreram 16 dias.
O requerente teve tempo para juntar os documentos que fossem pertinentes.
Mas, se não fosse possível, devia ter pedido ao Tribunal um prazo para os juntar. Não o fez. Não se pode queixar da celeridade da tramitação processual, já que, em todos os processos e, particularmente nos urgentes, este é um valor a preservar por todos os intervenientes processuais.
Ao contrário do que defende o recorrente o Tribunal não tinha de aguardar eternamente pela junção da prova protestada apresentar. Nem tinha de fixar qualquer prazo razoável para a sua apresentação. Era o requerente que tinha de vir pedir ao Tribunal que aguardasse que ele obtivesse os documentos, o que o Tribunal certamente faria, se o prazo pedido fosse razoável.
Mas o que fica dito não é, ainda, toda a verdade.
E esta é a seguinte:
- Em 11 de Junho de 2013, foi o ora recorrente notificado para se pronunciar sobre a intenção das autoridades de emigração de Macau de cancelar a sua autorização de residência.
- Em 31 de Julho de 2013, foi o ora recorrente notificado do despacho do Comandante do Corpo de Segurança Pública, que revogou a sua autorização de permanência em Macau, na qualidade de trabalhador não residente.
O recorrente passou procuração aos seus advogados em 5 de Agosto de 2013.
Interpôs o recorrente recurso hierárquico para o Secretário para a Segurança, em 26 de Agosto de 2013, que veio a negar provimento a este recurso hierárquico, em 26 de Setembro de 2013.
Ou seja, pelo menos a partir de 31 de Julho de 2013, o ora recorrente conhecia a decisão que revogara a sua autorização de permanência em Macau.
Podia presumir que havia possibilidades de o seu recurso hierárquico não ser procedente, pelo que, a partir dessa data, se tivesse usado da diligência média devia ter começado por reunir os documentos necessário à prova dos factos em que basearia o pedido de suspensão de eficácia do acto final, sobretudo daqueles que demorassem mais tempo a obter, como era o caso daqueles que fossem emitidos na Malásia, local da sua proveniência.
Até à data da interposição do pedido de suspensão (29 de Outubro de 2013) teve, assim, o recorrente cerca de 3 meses para obter os documentos, pelo que não se pode queixar senão de si.
Em conclusão, teve o recorrente largos meses para obter os documentos em causa.
Se mesmo esse lapso de tempo não fosse suficiente, deveria ter pedido ao Tribunal prazo adicional para a sua junção, o que não fez.
Não pode, pois, imputar ao TSI violação do princípio da tutela jurisdicional efectiva, com o que improcede a questão suscitada.

4. Irrelevância dos documentos para prova do requisito dos prejuízos de difícil reparação.

Mas ainda que a tese do recorrente fosse procedente – e não é – tal circunstância não levaria à procedência do recurso.
É que os 3 documentos em causa não provam os factos considerados necessários pelo TSI, tendentes a comprovar o requisito dos prejuízos de difícil reparação.
As certidões de casamento do recorrente e de nascimento do filho apenas provam estes factos. Tratando-se de documentos autênticos, a sua força probatória formal e material está, evidentemente, no poder de cognição do TUI.
Quanto ao documento da B, dizendo que voltaria a empregar o recorrente, este não pretende que ele prove mais do que esse facto.
Ora estes factos não relevam para integrar o requisito dos prejuízos de difícil reparação, na tese do TSI, transcrita atrás, designadamente, que “o rendimento que o requerente auferia em Macau é o único para o sustento da sua família na Malásia”.
Da mesma forma, referiu o TSI – conclusão de facto que este TUI não censura – “ … mesmo que esse facto pudesse ser dado por demonstrado, a privação do seu rendimento proveniente da entidade patronal B de per si nunca pode ser geradora de uma situação de carência quase absoluta e de impossibilidade de satisfação das necessidades básicas e elementares, dele próprio e da sua família na Malásia.
Pois tal como bem observou o Dignº Procurador Adjunto, tendo em conta a sua actual idade, não parece crível que o requerente e o seu cônjuge não possam arranjar emprego, na Malásia, para sustentar a família.
O que significa que a privação do seu rendimento a que conduz a perda do seu emprego em Macau é apenas causa necessária, mas nunca também causa suficiente de uma tal situação de carência absoluta, pois carece sempre do "contributo" por parte do próprio requerente e do seu cônjuge que consiste em não procurar outro emprego e actividade profissional para ganhar a sua vida”.
Em suma, ainda que o recorrente pudesse ter junto, em tempo, os aludidos documentos ao processo, sempre isso seria irrelevante para o fim em causa.

5. Balanceamento entre os interesses em conflito.
Alega, ainda, o recorrente que o Acórdão recorrido violou o princípio da imparcialidade, por não ter decidido em conformidade com o balanceamento entre os interesses em conflito.
Há, nesta alegação, algum défice de compreensão da essência da decisão recorrida.
O Acórdão recorrido negou o pedido de suspensão porque o requerente não fez prova dos factos que integrassem quaisquer prejuízos de difícil reparação.
Isto é, julgou não haver prova de que houvesse interesses alguns por parte do requerente. Logo, não há que falar de qualquer balanceamento de interesses em conflito, se o requerente não provou tais interesses (isto, independentemente de saber se o tribunal tem de efectuar tal balanceamento de interesses, questão que não cumpre aqui examinar, por falta de interesse útil).

6. Efeito útil da decisão a ser proferida no recurso contencioso
Alega, ainda, o recorrente que o Acórdão recorrido violou o princípio da imparcialidade, por não ter ponderado os interesses relevantes do recorrente, pois não desenvolveu as actividades probatórias requeridas e por não ter atentado que a decisão coloca em causa o efeito útil da decisão que vier a ser proferida no recurso contencioso.
Quanto ao não desenvolvimento das actividades probatórias requeridas, nada há que acrescentar ao que se disse acima, em 3.
Quanto ao facto de o indeferimento da suspensão colocar em causa o efeito útil da decisão que vier a ser proferida no recurso contencioso, tem o recorrente toda a razão. Só que não se percebe em que é que isso contribui para a censura do Acórdão recorrido, sabido como é, que as providências cautelares (todas as providências cautelares) têm precisamente o escopo de conservar a utilidade da decisão a tomar no processo principal.
Como escreve ABRANTES GERALDES “A principal função da tutela cautelar2 consiste, pois, em neutralizar os prejuízos a suportar pelo interessado que tem razão, derivados da duração do processo declarativo ou executivo e que não sejam absorvidos por outros institutos de direito substantivo ou processual com semelhante finalidade”.
Se o argumento do recorrente fosse pertinente, então todos os pedidos de providências cautelares deveriam ser deferidos, sem mais, mesmo que sem requisitos legais, desde que visassem, como é suposto, conservar a utilidade da decisão a tomar no processo principal.
Improcede a questão suscitada.
O recurso não merece provimento.

III – Decisão
Face ao expendido, negam provimento ao recurso.
Custas pelo recorrente, com taxa de justiça fixada em 6 UC.
Macau, 8 de Janeiro de 2014.
Juízes: Viriato Manuel Pinheiro de Lima (Relator) – Song Man Lei – Sam Hou Fai


O Magistrado do Ministério Público
presente na conferência: Mai Man Ieng

1 Neste sentido, para legislação semelhante, ao tempo, à de Macau, cfr. J. C. VIEIRA DE ANDRADE, A Justiça Administrativa (Lições), Coimbra, Almedina, 3.ª ed., 2000, p. 176.
     2 A. ABRANTES GERALDES, Temas da Reforma do Processo Civil, Coimbra, Almedina, III vol.,1998 p. 41.
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