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Processo nº 868/2012 Data: 07.03.2013
(Autos de recurso penal)

Assuntos : Contravenção laboral.
Erro notório na apreciação da prova.
Dolo.
Absolvição.



SUMÁRIO

1. O erro notório na apreciação da prova existe quando se dão como provados factos incompatíveis entre si, isto é, que o que se teve como provado ou não provado está em desconformidade com o que realmente se provou, ou que se retirou de um facto tido como provado uma conclusão logicamente inaceitável. O erro existe também quando se violam as regras sobre o valor da prova vinculada, as regras de experiência ou as legis artis. Tem de ser um erro ostensivo, de tal modo evidente que não passa despercebido ao comum dos observadores”, e que “é na audiência de julgamento que se produzem e avaliam todas as provas (cfr. artº 336º do C.P.P.M.), e é do seu conjunto, no uso dos seus poderes de livre apreciação da prova conjugados com as regras da experiência (cfr. artº 114º do mesmo código), que os julgadores adquirem a convicção sobre os factos objecto do processo.
Assim, sendo que o erro notório na apreciação da prova nada tem a ver com a eventual desconformidade entre a decisão de facto do Tribunal e aquela que entende adequada o Recorrente, irrelevante é, em sede de recurso, alegar-se como fundamento do dito vício, que devia o Tribunal ter dado relevância a determinado meio probatório para formar a sua convicção e assim dar como assente determinados factos, visto que, desta forma, mais não se faz do que pôr em causa a regra da livre convicção do Tribunal

2. Em sede de processo de transgressão laboral, que não deixa de ter a natureza de “processo penal”, inviável é a condenação sem efectiva (e clara) prova não só do elemento objectivo da infracção, mas também do elemento subjectivo.

O relator,

______________________
José Maria Dias Azedo

Processo nº 868/2012
(Autos de recurso penal)






ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:





Relatório

1. Por sentença proferida pelo Mmo Juiz do T.J.B. decidiu-se absolver a “VENETIAN MACAU S.A.” das imputadas 15 contravenções laborais p. e p. pelo art. 9°, n.° 1, al. d) do D.L. n.° 24/89/M e art°s. 10°, al. 5) e art. 85°, n.°1, al. 2 da Lei n.° 7/2008; (cfr., fls. 4579 a 4583-v e 4635 a 4649 que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).

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Inconformado, o Exmo. Magistrado do Ministério Público recorreu.
Motivou para concluir afirmando o que segue:

  “1. Antes do dia 3 de Agosto de 2007, os 15 funcionários em causa eram todos contratados pela entidade patronal Companhia Venetian Macau S.A.. Todos eram empregados da categoria F.
  2. A alínea 21.ª (fls. 6 da sentença) dos factos provados “as instruções de trabalho constante da fls. 308 dos autos não eram aplicáveis aos funcionários da Venetian Macao-Resort.”, sendo juízo concludente, nos termos do n.º 4 do art.º 549.º do Código de Processo Civil aplicado subsidiariamente por analogia nos termos do art.º 4.º do Código de Processo Penal, deve ser dada como inexistente.
  3. As provas nos autos não são suficientes para justificar a conclusão de que “as instruções de trabalho constante da fls. 308 dos autos não eram aplicáveis aos funcionários da Venetian Macao-Resort.”
  4. Sendo ambos chefes da entidade patronal, os depoimentos quanto à disposição de período de trabalho das duas testemunhas divergem-se notoriamente.
  5. Nas provas documentais, mais precisamente as duas versões de orientações de regalias de funcionários actualizadas em datas diferentes, estão impressos conjuntamente os sinais do Venetian e do Sands. E nas duas “orientações de regalias de funcionários” estão assinaladas com clareza “orientações de regalias de funcionários categoria F – grupo de funcionamento funcionários ”.
  6. Portanto, pode-se concluir que os dois documentos são aplicáveis a todos os funcionários da categoria F tanto do Venetian como do Sands. A única diferença entre os dois reside em datas diferentes de entrada em vigor..
  7. Perante o exposto, quer os depoimentos das testemunhas quer as provas documentais, consoante experiências do dia-a-dia e compreensão geral, são suficientes para provar que a versão do ano 2006 das “orientações de regalia de funcionários” é aplicável aos 15 funcionários em causa.
  8. O tribunal recorrido optou por dar fé unilateralmente aos depoimentos de algumas testemunhas da entidade patronal e convenceu-se de que as instruções de trabalho constante da fls. 308 dos autos não eram aplicáveis aos funcionários da Venetian Macao-Resort.”, e considerou o acto de actualização das orientações de regalia de funcionários feitas pela entidade patronal como elaborar novas orientações de regalias de funcionários especialmente para os empregados do Venetian Macao-Resort. O tribunal a quo não fez caso dos depoimentos das outras testemunhas e negligenciou totalmente o facto de que à assinatura dos contratos, as chamadas orientações de regalia de funcionários “especialmente elaboradas para os empregados do Venetian Macao-Resort” não existiam.
  9. Na realidade, antes do dia 3 de Agosto, o único documento que regulava especificamente o número de horas de trabalho era as “orientações de regalias de funcionários” actualizadas em 2006. Nelas constava que o período de trabalho dos empregados da categoria F era de 8 horas por dia e 48 horas por semana (incluindo horas de almoço).
  10. As orientações de regalias de funcionários definem elementos integrantes dos contratos como por exemplo o período normal de trabalho, o tempo para refeição, férias anuais, feriados públicos e ausências dos funcionários. Esses elementos são as prescrições fundamentais das condições de trabalho e à falta deles, os contratos tornam-se difíceis de cumprir.
  11. A cláusula n.º 12 do contrato de trabalho indica com clareza a aplicação do programa de regalias como parte integrante do contrato. De facto não existe qualquer motivo que impeça a aplicação dessas orientações.
  12. No entanto, os funcionários em causa prestavam, em média, 8 horas de serviço real diariamente e tinham mais uma hora fora dessas para tomar refeição.
  13. A entidade patronal aumentou o período de trabalho dos empregados, contudo não pagou correspondentemente renumerações mais altas. Portanto, o acto da entidade patronal equivale-se a uma diminuição de retribuição básica e por isso, incorreu na contravenção prescrita na alínea 5) do art.º 10.º da Lei n.º 7/2008. A punição deve fundamentar-se na alínea 2) do n.º 1 do art.º 85.º do mesmo diploma legal.
  14. O tribunal recorrido cometeu erros crassos na apreciação de provas e o seu veredicto padece do vício mencionado na alínea c) do n.º 2 do art.º 400.º”; (cfr., fls. 4579 a 4603 e 4652 a 4667).

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Respondendo, alega a arguida que se deve negar provimento ao recurso; (cfr., fls. 4612 a 4615).

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Admitido o recurso, vieram os autos a este T.S.I..

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Em sede de vista, juntou o Ilustre Procurador Adjunto o seguinte douto Parecer:

“Apreciando sobremaneira o esforço da Exma Colega recorrente na senda do assacado erro notório na apreciação da prova por parte da douta sentença sob escrutínio, quer-nos parecer, porém, não lhe poder assistir razão.
Compreende-se, perfeitamente, que, face às contradições apontadas dos depoimentos referidos, ao facto de em nenhuma da "Orientações sobre Regalias dos Trabalhadores" (26/12/06 e 3/8/07) se explicitar a qual das entidades ("Sands" ou "Venetian ") as mesmas se aplicariam, constando, porém, dos dois documentos os logotipos de ambas e a referência generalista de aplicação aos funcionários, categoria "F" e à circunstância de apenas nesses documentos se definirem detalhadamente os direitos e obrigações da entidade patronal e assalariados, se possa instalar a dúvida sobre a correcção da convicção alcançada pelo julgador ao concluir que aquelas "Orientações" de 22/12/06 não eram aplicáveis aos funcionários da "Venetian Macao- Resort" e, consequentemente, aos 15 trabalhadores aqui em causa.
Convirá, porém, não esquecer que "Salvo disposição em contrário, a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente", art° 114°, CPP.
Ora, o certo é que não se vê que, do teor do texto da decisão em crise, por si só, ou conjugada com as regras da experiência comum, resulte patente, evidente, ostensivo que o julgador errou ao apreciar Como apreciou, não se tendo o mesmo esquivado a expressar, concreta e especificamente a sua valoração da prova produzida e dos motivos que o levaram às conclusões que formulou.
É claro que, em concreto, alguns desses motivos se poderão revelar discutíveis, pois que, além do mais, em termos normais, não terá sido só após a sua inauguração que a "Venetian" contratou os trabalhadores, como não se revela líquido que as "Orientações" reportadas a 3/8/07 se reportem à definição de regalias de trabalhadores dessa entidade após aquela inauguração e não constituam, antes, uma mera actualização da versão de 2006, aplicável, simultaneamente a estes e aos empregados da "Sands".
A questão é que, pese embora tais dúvidas, não se detecta que, para a convicção alcançada pelo julgador "a quo", o mesmo tenha, porventura, dado como provados factos incompatíveis entre si ou retirado desses factos conclusões logicamente inaceitáveis, não competindo a este tribunal censurá-lo por ter formado a sua convicção no sentido em que a formou, quando, além do mais, é certo não remeterem os contratos de trabalho livremente assinados pelos trabalhadores para qualquer "Guia de Benefícios" (que não se vê que tivesse, forçosamente, que existir), mas para o "Team Member Handbook'', documento distinto daquele.
Ou seja, compreendendo-se e acompanhando-se grande parte das dúvidas suscitadas pela recorrente relativamente à pertinência da convicção firmada pelo julgador "a quo", não alcançamos, porém, a assacada ocorrência do vício de notório erro na apreciação da prova.
E, a partir da asserção fundamental alcançada pelo douto aresto, de que se não prova que as "Orientações de Regalias" de 26/12/06 se aplicassem aos trabalhadores em questão, não se descortina que mereça reparo o decidido relativamente ao facto de a hora de refeição não poder ser contabilizada no período de trabalho, o que não sucederia em caso inverso, como já pugnámos, no âmbito do proc. 684/2012.
Este, o nosso entendimento”; (cfr., fls. 4669 a 4671).

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Passa-se a decidir.

Fundamentação

Dos factos.

2. Estão provados s factos seguintes:

“1) A, funcionário, portador do BIR de Macau n.º XXX, residente na Rua do Canal das Hortas, XXX, Macau, tel.: XXX, é empregado da entidade patronal desde 16 de Julho de 2007, cargo ocupado: empregado de limpeza, auferiu os seguintes salários mensais: de 16 de Julho de 2007 a 30 de Setembro de 2007, MOP$5.300,00; de 1 de Outubro de 2007 a 31 de Maio de 2008, MOP$5.500,00; de 1 de Junho de 2009 a 31 de Julho de 2010, MOP$5.830,00; de 1 de Agosto de 2010 a 30 de Setembro de 2010, MOP$6.035,00; de 1 de Outubro de 2010 a 31 de Janeiro de 2011, MOP$6.150,00; de 1 de Fevereiro de 2011 a 28 de Fevereiro de 2011, MOP$6.583,00; de 1 de Março de 2011 a 31 de Março de 2011, MOP$6.879,00.
2) B, funcionário, portador do BIR de Macau n.º XXX, residente na Rua do Almirante Sérgio, XXX, Macau, tel.: XXX, é empregado da entidade patronal desde 16 de Julho de 2007, cargo ocupado: empregado de limpeza, auferiu os seguintes salários mensais: de 16 de Julho de 2007 a 30 de Setembro de 2007, MOP$5.300,00; de 1 de Outubro de 2007 a 31 de Maio de 2008, MOP$5.500,00; de 1 de Junho de 2008 a 31 de Julho de 2010, MOP$5.830,00; de 1 de Agosto de 2010 a 30 de Setembro de 2010, MOP$6.035,00; de 1 de Outubro de 2010 a 31 de Janeiro de 2011, MOP$6.150,00; de 1 de Fevereiro de 2011 a 28 de Fevereiro de 2011, MOP$6.583,00; de 1 de Março de 2011 a 31 de Março de 2011, MOP$6.879,00.
3) C, funcionário, portador do BIR de Macau n.º XXX, residente na Rua Um do Bairro Iao Hon 32.º, XXX, Macau, tel.: XXX, é empregado da entidade patronal desde 16 de Julho de 2007, cargo ocupado: empregado de limpeza, auferiu os seguintes salários mensais: de 16 de Julho de 2007 a 30 de Setembro de 2007, MOP$5.300,00; de 1 de Outubro de 2007 a 31 de Maio de 2008, MOP$5.500,00; de 1 de Junho de 2008 a 31 de Julho de 2010, MOP$5.830,00; de 1 de Agosto de 2010 a 30 de Setembro de 2010, MOP$6.035,00; de 1 de Outubro de 2012 a 31 de Janeiro de 2011, MOP$6.150,00; de 1 de Fevereiro de 2011 a 28 de Fevereiro de 2011, MOP$6.583,00; de 1 de Março de 2011 a 31 de Março de 2011, MOP$6.879,00.
4) D, funcionário, portador do BIR de Macau n.º XXX, residente na Avenida do Hipódromo, XXX, Macau, tel.: XXX, é empregado da entidade patronal desde 23 de Julho de 2007, cargo ocupado: lavador de louças, auferiu os seguintes salários mensais: de 23 de Julho de 2007 a 31 de Maio de 2008, MOP$6.000,00; de 1 de Junho de 2008 a 31 de Julho de 2010, MOP$6.360,00; de 1 de Agosto de 2010 a 28 de Fevereiro de 2011, MOP$6.583,00; de 1 de Março de 2011 a 31 de Março de 2011, MOP$6.879,00.
5) E, funcionário, portador do BIR de Macau n.º XXX, residente na Avenida de Venceslau de Morais, XXX, Macau, tel.: XXX ou XXX, é empregado da entidade patronal desde 30 de Julho de 2007, cargo ocupado: empregado de mesa na secção de restauração, auferiu os seguintes salários mensais: de 30 de Julho de 2007 a 31 de Maio de 2008, MOP$6.250,00; de 1 de Junho de 2008 a 31 de Julho de 2010, MOP$6.625,00; de 1 de Agosto de 2010 a 28 de Fevereiro de 2011, MOP$6.857,00; de 1 de Março de 2011 a 31 de Março de 2011, MOP$7.436,00.
6) F, funcionário, portador do BIR de Macau n.º XXX, residente na Rua dos Pescadores, XXX, Macau, tel.: XXX, é empregado da entidade patronal desde 1 de Agosto de 2007, cargo ocupado: lavrador de louças, auferiu os seguintes salários mensais: de 1 de Agosto de 2007 a 31 de Maio de 2008, MOP$6.000,00; de 1 de Junho de 2008 a 31 de Julho de 2010, MOP$6.360,00; de 1 de Agosto de 2010 a 28 de Fevereiro de 2011, MOP$6.583,00; de 1 de Março de 2011 a 31 de Março de 2011, MOP$6.879,00.
7) G, funcionário, portador do BIR de Macau n.º XXX, residente na Rua da Tribuna, XXX, Macau, tel.: XXX, é empregado da entidade patronal desde 1 de Agosto de 2007, cargo ocupado: empregado de mesa, auferiu os seguintes salários mensais: de 1 de Agosto de 2007 a 31 de Maio de 2008, MOP$6.000,00; de 1 de Junho de 2008 a 31 de Julho de 2010, MOP$6.360,00; de 1 de Agosto de 2010 a 28 de Fevereiro de 2011, MOP$6.583,00; de 1 de Março de 2011 a 31 de Março de 2011, MOP$6.879,00.
8) H, funcionário, portador do BIR de Macau n.º XXX, residente na Rua Nova da Areia Preta, XXX, Macau, tel.: XXX, é empregado da entidade patronal desde 1 de Agosto de 2007, cargo ocupado: lavrador de louças, auferiu os seguintes salários mensais: de 1 de Agosto de 2007 a 31 de Maio de 2008, MOP$6.000,00; de 1 de Junho de 2008 a 31 de Julho de 2010, MOP$6.360,00; de 1 de Agosto de 2010 a 28 de Fevereiro de 2011, MOP$6.583,00; de 1 de Março de 2011 a 31 de Março de 2011, MOP$6.879,00.
9) I, funcionário, portador do BIR de Macau n.º XXX, residente na Rua da Tranquilidade, XXX, Macau, tel.: XXX, é empregado da entidade patronal desde 1 de Agosto de 2007, cargo ocupado: lavrador de louças, auferiu os seguintes salários mensais: de 1 de Agosto de 2007 a 31 de Maio de 2008, MOP$6.000,00; de 1 de Junho de 2008 a 31 de Julho de 2010, MOP$6.360,00; de 1 de Agosto de 2010 a 28 de Fevereiro de 2011, MOP$6.583,00; de 1 de Março de 2011 a 31 de Março de 2011, MOP$6.879,00.
10) J, funcionário, portador do BIR de Macau n.º XXX, residente na Alameda da Tranquilidade, XXX, Macau, tel.: XXX, é empregado da entidade patronal desde 1 de Agosto de 2007, cargo ocupado: lavrador de louças, auferiu os seguintes salários mensais: de 1 de Agosto de 2007 a 31 de Maio de 2008, MOP$6.000,00; de 1 de Junho de 2008 a 31 de Julho de 2010, MOP$6.360,00; de 1 de Agosto de 2010 a 28 de Fevereiro de 2011, MOP$6.583,00; de 1 de Março de 2011 a 31 de Março de 2011, MOP$6.879,00.
11) K, funcionário, portador do BIR de Macau n.º XXX, residente na Travessa dos Vendilhões, XXX, Macau, tel.: XXX, é empregado da entidade patronal desde 1 de Agosto de 2007, cargo ocupado: lavrador de louças, auferiu os seguintes salários mensais: de 1 de Agosto de 2007 a 31 de Maio de 2008, MOP$6.000,00; de 1 de Junho de 2008 a 31 de Julho de 2010, MOP$6.360,00; de 1 de Agosto de 2010 a 28 de Fevereiro de 2011, MOP$6.583,00; de 1 de Março de 2011 a 31 de Março de 2011, MOP$6.879,00.
12) L, funcionário, portador do BIR de Macau n.º XXX, residente na Alameda da Tranquilidade, XXX, Macau, tel.: XXX, é empregado da entidade patronal desde 1 de Agosto de 2007, cargo ocupado: lavrador de louças, auferiu os seguintes salários mensais: de 1 de Agosto de 2007 a 31 de Maio de 2008, MOP$6.000,00; de 1 de Junho de 2008 a 31 de Julho de 2010, MOP$6.360,00; de 1 de Agosto de 2010 a 28 de Fevereiro de 2011, MOP$6.583,00; de 1 de Março de 2011 a 31 de Março de 2011, MOP$6.879,00.
13) M, funcionário, portador do BIR de Macau n.º XXX, residente na Rua Norte do Canal das Hortas, XXX, tel.: XXX, é empregado da entidade patronal desde 1 de Agosto de 2007, cargo ocupado: lavrador de louças, auferiu os seguintes salários mensais: de 1 de Agosto de 2007 a 31 de Maio de 2008, MOP$6.000,00; de 1 de Junho de 2008 a 31 de Julho de 2010, MOP$6.360,00; de 1 de Agosto de 2010 a 28 de Fevereiro de 2011, MOP$6.583,00; de 1 de Março de 2011 a 31 de Março de 2011, MOP$6.879,00.
14) N, funcionário, portador do BIR de Macau n.º XXX, residente na Avenida do Almirante Lacerda, XXX, Macau, tel.: XXX, é empregado da entidade patronal desde 1 de Agosto de 2007, cargo ocupado: lavrador de louças, auferiu os seguintes salários mensais: de 1 de Agosto de 2007 a 31 de Maio de 2008, MOP$6.000,00; de 1 de Junho de 2008 a 31 de Julho de 2010, MOP$6.360,00; de 1 de Agosto de 2010 a 28 de Fevereiro de 2011, MOP$6.583,00; de 1 de Março de 2011 a 31 de Março de 2011, MOP$6.879,00.
15) O, funcionário, portador do BIR de Macau n.º XXX, residente na XXX, Macau, tel.: XXX, é empregado da entidade patronal desde 21 de Maio de 2007, cargo ocupado: empregado de limpeza, auferiu os seguintes salários mensais: de 21 de Maio de 2007 a 30 de Setembro de 2007, MOP$5.300,00; de 1 de Outubro de 2007 a 31 de Maio de 2008, MOP$5.500,00; de 1 de Junho de 2008 a 31 de Julho de 2010, MOP$5.830,00; de 1 de Agosto de 2010 a 30 de Setembro de 2010, MOP$6.035,00; de 1 de Outubro de 2010 a 31 de Janeiro de 2011, MOP$6.150,00; de 1 de Fevereiro de 2011 a 28 de Fevereiro de 2011, MOP$6.583,00; de 1 de Março de 2011 a 31 de Março de 2011, MOP$6.879,00.
16) Os 15 empregados eram de categoria F e trabalhavam na The Venetian Macao-Resort situada no Cotai.
17) Segundo estabelecido nos contratos fixados entre a entidade patronal e os funcionários, os 15 funcionários acima referidos trabalhavam 48 horas por semana.
18) Desde o ingresso às funções até ao dia 31 de Março de 2011, todos os trabalhadores ficavam na empresa por menos de 9 horas por dia, sendo que uma das quais era dedicada a refeição.
19) As instruções de regalias dos funcionários constantes da fls. 308 foram actualizadas em 26 de Dezembro de 2006, aplicáveis aos funcionários do Sands Macau. Segundo esse documento, os trabalhadores de categoria F trabalhavam 8 horas por dia e 48 horas por semana (incluindo a hora de refeição).
20) The Venetian Macao-Resort do Cotai foi aberta em 28 de Agosto de 2007 e em 3 de Agosto de 2007, a entidade patronal elaborou instruções de trabalho aplicáveis aos empregados da Resort.
21) As instruções de trabalho constante da fls. 308 dos autos não eram aplicáveis aos funcionários da Venetian Macao-Resort.
22) Quando deixavam os seus lugares para tomar alimentos, os 15 trabalhadores pediam autorização aos colegas ou superiores; quando voltavam, também reportavam para tomar notas.
23) A entidade patronal não traçou qualquer limite para que os funcionários tomassem alimentos na cantina dos funcionários.
***
Factos não provados:
As instruções de regalias dos trabalhadores constantes da fls. 308 dos autos eram aplicáveis aos empregados que trabalhavam na Venetian Macao-Resort do Cotai.
Outros factos opostos aos factos provados.
***
A convicção do tribunal baseou-se em:
Durante o julgamento, a inspectora assessora P do Departamento de Inspecção do Trabalho da Direcção dos Serviços para os Assuntos Laborais relatou o processo de investigação da causa. A opinião dela resumiu-se aos seguintes termos: de acordo com as instruções de regalias dos empregados constantes da fls. 308 dos autos, a hora de refeição devia ser contada como tempo de trabalho. Como a entidade patronal não pagou aos funcionários por aquelas horas de refeição, era de instituir um processo para acusar a contravenção laboral nesta presente causa.
Os funcionários A, B, C, D, E, F, G, H, I, J, K, L, M, N, O também falaram do processo de disposição respeitante a horário de expediente e disseram que aquando da contratação, o empregador disse que estava incluída a hora de refeição nas 8 horas de trabalho. Porém, na realidade eles trabalhavam por 8 horas na Venetian e tinham uma outra hora para tomar comidas, portanto na totalidade eram 9 horas. Os que entraram nas funções mais cedo disseram que antes de a Venetian ter aberto, a duração de horário de trabalho era mais curta. Ao princípio eram só 7 horas incluindo a hora para refeição. No entanto, depois da abertura, fizeram uma alteração o que fez com que os trabalhadores trabalhassem 8 horas e tivessem uma hora extra para tomar comidas.
Também no julgamento, a testemunha Q prestou o seu depoimento, de que ele próprio tinha começado a trabalhar na Venetian Macao-Resort em 2005 como director do Departamento de Recursos Humanos da empresa. Uma empresa de intermediação chamada “Talent 2” estava encarregada de contratação de funcionários da Venetian Macao-Resort do Cotai. Ele disse também que as instruções de regalias dos funcionários constantes da fls. 308 dos autos não eram aplicáveis aos funcionários da Venetian Macao-Resort do Cotai. Ao celebrar contratos com os funcionários, a empresa explicou todas as instruções de trabalho aos empregados e no acto de entrevista, explicitou aos 15 funcionários, A, B, C, D, E, F, G, H, I, J, K, L, M, N, O, que os funcionários trabalhavam 8 horas e que eram 9 horas na totalidade incluindo o tempo de refeição.
No julgamento, a testemunha R afirmou que enquanto fiscalizador de gestão da secção de mordomo da empresa, tinha referido claramente que os empregados de limpeza estavam sob a sua chefia. Mencionou igualmente que no acto de contratação, já tinha explicado detalhadamente aos relativos empregados o horário de trabalho e os seus direitos. Mais disse que não tinha obrigado os empregados a tomar refeição na cantina da empresa, mas que depois de comer, os empregados tinham que voltar aos postos dentro de horário indicado. Que ele já tinha explicitado a todos os funcionários que dentro das 8,5 horas de prestação de serviço na empresa, estava incluída uma hora para tomar refeição e que tinha deixado claro que ia disponibilizar uma hora para refeição (ao invés dos funcionários do Sands que só tinham meia hora para tomar alimento). Isso tinha como base a consideração de que o Venetian ocupava um espaço grande, o que implicava que os funcionários demoravam a chegar à cantina. Portanto, o tempo para tomar alimento foi ajustado e ficou a ser uma hora.
O tribunal fez o seu julgamento em relação aos factos, após uma análise rigorosa dos testemunhos dos funcionários A, B, C, D, E, F, G, H, I, J, K, L, M, N, O, de P, inspectora assessora do Departamento de Inspecção do Trabalho da Direcção dos Serviços para os Assuntos Laborais, de Q e de R, bem como uma consulta das provas documentais no presente processo durante o julgamento”; (cfr., fls. 4636-v e segs.).

Do direito

3. Vem o Exmo. Magistrado do Ministério Público recorrer da sentença que absolveu a arguida dos autos das imputadas 15 contravenções laborais p. e p. pelo art. 9°, n.° 1, al. d) do D.L. n.° 24/89/M e art°s. 10°, al. 5) e art. 85°, n.°1, al. 2 da Lei n.° 7/2008.

Entende que a decisão em questão está inquinada com o vício de “erro notório na apreciação da prova”.

Cremos porém que carece de razão, sendo antes de sufragar o entendimento pelo Ilustre Procurador Adjunto exposto no douto Parecer (que atrás se deixou transcrito), que dá clara e cabal resposta à questão colocada no recurso, e que, por uma questão de economia processual, aqui se dá como integralmente reproduzido, pouco havendo a acrescentar.

Vejamos.

Tem este T.S.I. entendido que:

“O erro notório na apreciação da prova existe quando se dão como provados factos incompatíveis entre si, isto é, que o que se teve como provado ou não provado está em desconformidade com o que realmente se provou, ou que se retirou de um facto tido como provado uma conclusão logicamente inaceitável. O erro existe também quando se violam as regras sobre o valor da prova vinculada, as regras de experiência ou as legis artis. Tem de ser um erro ostensivo, de tal modo evidente que não passa despercebido ao comum dos observadores”, e que “é na audiência de julgamento que se produzem e avaliam todas as provas (cfr. artº 336º do C.P.P.M.), e é do seu conjunto, no uso dos seus poderes de livre apreciação da prova conjugados com as regras da experiência (cfr. artº 114º do mesmo código), que os julgadores adquirem a convicção sobre os factos objecto do processo.
Assim, sendo que o erro notório na apreciação da prova nada tem a ver com a eventual desconformidade entre a decisão de facto do Tribunal e aquela que entende adequada o Recorrente, irrelevante é, em sede de recurso, alegar-se como fundamento do dito vício, que devia o Tribunal ter dado relevância a determinado meio probatório para formar a sua convicção e assim dar como assente determinados factos, visto que, desta forma, mais não se faz do que pôr em causa a regra da livre convicção do Tribunal.”; (cfr., v.g., Ac. de 12.05.2011, Proc. n° 165/2011, e mais recentemente de 13.12.2012, Proc. n.° 926/2012 do ora relator).

No caso, e sem embargo do muito respeito por opinião diversa, não se divisa onde, como ou em que medida e termos incorreu o Tribunal a quo em violação das regras sobre prova de valor tarifado, as regras de experiência ou legis artis.

Não se deixa de consignar também que tem este T.S.I. conhecimento oficioso de que em sede de outros processos que aqui correram termos se decidiu de forma diversa (quanto à aplicabilidade das “instruções de trabalho” de fls. 308 aos trabalhadores do Venetian).

Todavia, “cada caso é um caso”, e o que decidido foi em sede de outros processos não faz caso julgado nos presentes autos.

Admite-se que fica a “dúvida”, porém, tal dúvida, em nossa opinião, não constitui um “erro notório na apreciação da prova”, (pelo menos nos termos em que o mesmo tem sido entendido), sob pena de flagrante violação do “princípio da livre apreciação da prova”, (e ser também de afirmar que, então, na parte em questão, de prever seria o sentido da(s) decisões a proferir), o que, no mínimo, não nos parece adequado.

Nesta conformidade, e certo sendo que também não se provou o “elemento subjectivo” das infracções imputadas, à vista está a solução.

Com efeito, e como já decidiu este T.S.I.:

“Em sede de um processo de “transgressão laboral”, que não deixa de ser um processo de “natureza penal”, legal não é presumir o dolo ou negligência do arguido, não havendo também lugar a “responsabilidade objectiva”…; (cfr., v.g., Ac. de 13.12.2012, Proc. n.° 796/2012).

Nesta conformidade, e tudo visto, resta decidir.

Decisão

4. Nos termos que se deixam expostos, acordam negar provimento ao recurso.

Sem tributação, (dada a isenção do Ministério Público).

Macau, aos 07 de Março de 2013

José Maria Dias Azedo
Tam Hio Wa
Chan Kuong Seng (vencido, por entender que deveria proceder o recurso do M.P., com consequente reenvio do processo para novo julgamento no T.J.B., por erro notório na apreciação da prova).


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