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Processo nº 913/2012 Data: 28.02.2013
(Autos de recurso penal)

Assuntos : Crime de auxílio (qualificado).
Vantagem patrimonial.



SUMÁRIO

Comete o crime de “auxílio” (qualificado) p. e p. pelo n.° 2 do art. 14°, da Lei n.° 6/2004, o arguido que transporta pessoas indocumentadas para Macau a troco de pagamento de quantias monetárias acordadas, ainda que este pagamento seja, num primeiro momento, efectuado a terceiros e não directamente ao arguido.

O relator,

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Processo nº 913/2012
(Autos de recurso penal)






ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:





Relatório

1. O Digno Magistrado do Ministério Público requereu o julgamento de A, com os sinais dos autos, imputando-lhe a prática de 1 crime de “auxílio”, p. e p. pelo art. 14°, n.° 2 da Lei n.° 6/2004; (cfr., fls. 88-v a 89-v que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).

Realizado o julgamento, e não obstante provada ter ficado toda a factualidade imputada ao arguido, decidiu o Tribunal que aquela integrava tão só o crime de “auxílio (simples)” do n.° 1 do mencionado art. 14° da Lei n.° 6/2004; (cfr., fls. 130 a 133-v).

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Inconformado, o Exmo. Magistrado do Ministério Público recorreu, imputando à decisão recorrida o vício de “erro de direito” e pedindo a condenação do arguido nos termos constantes da acusação deduzida; (cfr., fls. 136 a 139).

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Sem resposta do arguido, vieram os autos a este T.S.I., onde, em sede de vista, juntou o Ilustre Procurador Adjunto o seguinte Parecer:

“O teor da Motivação de fls. l36 a 139 demonstra que o recurso em apreço se cinge à qualificação jurídica operada pelo Tribunal a quo no Acórdão posto em crise, que condenou o recorrido/arguido A na prática dum crime p.p. pelo n.°1 do art. 14° da Lei n.°6/2004.
Sem prejuízo do elevado respeito pela douta posição do Tribunal a quo e também pela outra opinião diferente, subscrevemos inteiramente a criteriosa argumentação da Exma. Colega na Motivação, e propendemos pelo provimento do presente recurso.
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Dispõe o art. 14 ° da Lei n.° 6/2004:
1. Quem dolosamente transportar ou promover o transporte, fornecer auxílio material ou por outra forma concorrer para a entrada na RAEM de outrem nas situações previstas no artigo 2.°, é punido com pena de prisão de 2 a 8 anos.
2. Se o agente obtiver, directamente ou por interposta pessoa, vantagem patrimonial ou benefício material, para si ou para terceiro, como recompensa ou pagamento pela prática do crime referido no número anterior, é punido com pena de prisão de 5 a 8 anos.
Vê-se que o n.°2 consagra o auxílio qualificado, tipificando como elemento constitutivo o vantagem patrimonial ou beneficio material. Na nossa óptica, a razão de ser deste segmento legal consiste em qualquer vantagem patrimonial ou beneficio material como recompensa representar a malevolência mais intensiva e, deste molde, implica em si a perigosidade e censurabilidade mais elevadas.
Assim, o crime de auxílio qualificado contemplado neste n.°2 não pressupõe o logro ou efectivo pagamento duma vantagem patrimonial ou beneficio material, bastando um prévio acordo ou compromisso da recompensa, mesmo sendo meramente oral.
Deste modo, nem a falha do acordo ou compromisso prévio nem o malogro de vantagem patrimonial ou benefício material impede a consumação do apontado crime de auxílio qualificado, ou degrada este crime ao previsto no o n.°l o art.14° da Lei n.°6/2004.
No caso sub judice, o Tribunal a quo explicou: 此外,本案僅控告和證明嫌犯與他人協議取得報酬,並未控告且亦未證實嫌犯嫌犯已經收取到任何財產或物質利益報酬或者嫌犯早已知悉是次偷渡的組織者或其他協助者已經收取到偷渡者支付的費用。8月2日第6/2004號法律第14條第2款之規定加重處罰利用犯罪實際取得財產或物質利益者,而非僅僅擁有此意圖。
Essa paisagem torna evidente a posição do Tribunal a quo de que o n.° 2 tem como requisito imprescindível o logro ou pagamento efectivo da vantagem patrimonial ou benefício material, não bastando a intenção de dar recompensa.
Disto emerge o erro de direito.
Por todo o expendido acima, entendemos que merece provimento o presente recurso”; (cfr., fls. 149 a 150).

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Nada obstando, cumpre decidir.

Fundamentação

Dos factos

2. Estão provados os factos como tal elencados no Acórdão recorrido, a fls. 131 a 131-v, que não vem impugnados nem se mostram de alterar, e que aqui dão-se com integralmente reproduzidos.

Do direito

3. O presente recurso vem interposto pelo Exmo. Magistrado do Ministério Público, e tem como objecto o Acórdão do T.J.B. que condenou o arguido dos autos como autor de 1 crime de “auxílio (simples)”, p. e p. pelo art. 14°, n.° 1 da Lei n.° 6/2004.

Bate-se o Recorrente pela alteração da qualificação jurídico-penal operada, pedindo a condenação do mesmo arguido como autor de uma crime de “auxílio” mas do n.° 2 do citado art. 14°, (e não do n.° 1, como decidido foi).

Vejamos.

Estatui o dito art. 14° que:

“1. Quem dolosamente transportar ou promover o transporte, fornecer auxílio material ou por outra forma concorrer para a entrada na RAEM de outrem nas situações previstas no artigo 2.º, é punido com pena de prisão de 2 a 8 anos.

2. Se o agente obtiver, directamente ou por interposta pessoa, vantagem patrimonial ou benefício material, para si ou para terceiro, como recompensa ou pagamento pela prática do crime referido no número anterior, é punido com pena de prisão de 5 a 8 anos”.

E, nesta conformidade, impõe-se concluir que a razão está do lado do Exmo. Recorrente.

De facto, no caso dos autos, provado está que acordado estava a “compensação” do arguido (recorrido) pela sua tarefa em “transportar” pessoas indocumentadas para Macau, como sucedeu.

Aliás, está também provado que os indivíduos clandestinos pagaram a um conhecido do arguido quantias monetárias para que fossem transportados para Macau.

E, como também já decidiu este T.S.I., “não obstante não receber dinheiro dos ilegais, não deixa de se mostrar integrada a previsão típica do crime do n.º 2 do art. 14º da Lei 6/2004, de 2 de Agosto de 2004, se o arguido conluiado com outrem foi enviado para Macau para tratar de encaminhar imigrantes ilegais que pagaram por essa vinda aos co-agentes do arguido no Interior da China”; (cfr., Ac. de 22.07.2010, Proc. n.° 528/2010).


Assim, inquestionável parece ser que a sua conduta integra a prática de 1 crime p. e p. pelo n.° 2 do art. 14° da Lei n.° 6/2004.

Nesta conformidade, e sendo o crime cometido punido com a pena de prisão de 5 a 8 anos de prisão, e visto que foi o arguido condenado numa pena de 2 anos e 9 meses de prisão, evidente é que não se pode manter a dita pena, sendo, assim, e atentos os critérios dos art°s 40° e 65° do C.P.M., de fixar uma pena de 5 anos e 9 meses de prisão.

Decisão

4. Nos termos e fundamentos expostos, acordam julgar procedente o recurso, ficando o arguido condenado pela prática de 1 crime p. e p. pelo n.° 2 do art. 14° da Lei n.° 6/2004 na pena de 5 anos e 9 meses de prisão.

Custas pelo arguido recorrido com taxa de justiça de 5 UCs.

Honorários ao Exmo. Defensor no montante de MOP$1.000,00.

Macau, aos 28 de Fevereiro de 2013

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José Maria Dias Azedo
(Relator)

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Chan Kuong Seng
(Primeiro Juiz-Adjunto)

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Tam Hio Wa
(Segundo Juiz-Adjunto)

Proc. 913/2012 Pág. 10

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