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Proc. nº 981/2012
Relator: Cândido de Pinho
Data do acórdão: 17 de Janeiro de 2013
Descritores:
-STDM
-Declaração de remissão/quitação


SUMÁRIO:

I- A remissão consiste no que é vulgarmente designado por perdão de dívida.

II- A quitação (ou recibo, no caso de obrigação pecuniária) é a declaração do credor, corporizada num documento, de que recebeu a prestação.

III- O reconhecimento negativo de dívida é o negócio pelo qual o possível credor declara vinculativamente, perante a contraparte, que a obrigação não existe.

IV- O reconhecimento negativo da dívida pode ser elemento de uma transacção, se o credor obtém, em troca do reconhecimento, uma concessão; mas não o é, se não se obtém nada em troca, havendo então um contrato de reconhecimento ou fixação unilateral, que se distingue da transacção por não haver concessões recíprocas.

V- A remissão ou quitação de créditos do contrato de trabalho é possível após extinção das relações laborais.





Proc. nº 981/2012

Acordam no Tribunal de Segunda Instância da R.A.E.M.

I - Relatório
A, com os demais sinais dos autos, intentou acção de processo comum de trabalho contra a “STDM - Sociedade de Turismo e Diversões de Macau, SARL”, pedindo a condenação desta no pagamento do valor de Mop$ 1.966.891,81 referente a dias de descanso semanal, anual e feriados que não gozou e que não foram pagos durante o tempo de duração da relação laboral estabelecida entre ambos.
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Julgada improcedente a acção, da respectiva sentença foi interposto recurso jurisdicional, o qual acabaria por ser decidido pelo TSI através do acórdão de 24/11/2011, que anularia o julgamento efectuado na 1ª instância e determinaria a repetição do mesmo por verificação da nulidade do art. 571º, nº1, als. b) e c), do CPC.
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Realizado novo julgamento, viria o TJB a produzir nova sentença, uma vez mais de improcedência da acção.
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Dessa decisão recorreu o autor da acção, em cujas alegações formulou as seguintes conclusões:
«A. Quanto ao quesito 1.º da Base Instrutória, a resposta deveria ter sido “Provado”, dado que esta resposta do Tribunal a quo contradiz o especificado na alínea B) dos Factos Assentes e a resposta ao quesito 21.º da Base Instrutória.
B. É também esta a resposta que resulta do teor da prova testemunhal, tendo em conta as passagens do depoimento do XXX a partir dos minutos 00:02 e 00:12 da gravação in Translator 2 - Recorded on 02-Mar-2010 at 10.07.44 (-R$S359103311270) e 00:04 e 00:11 da gravação in Translator 2Recorded on 02-Mar-2010 at 10.08.21 (-R$S4)AW03311270), transcritas no parágrafo 7.º do corpo destas Alegações.
C. Acresce que o facto de o Autor ter sempre recebido uma importância diária como retribuição fixa, uma outra quantia variável, designada por “gorjetas resulta reconhecido pela Ré nos artigos 85.º e 136.º da Contestação.
D. Quanto ao quesito 2.º da Base Instrutória, a resposta deveria ter sido “Provado”, tendo em conta as passagens do depoimento do XXX a partir dos minutos 01:33 e 01:57 da da gravação in Translator 2 - Recorded on 02-Mar-2010 at 10.08.21 (-R$S4)AW03311270), transcritas no parágrafo 12.º do corpo destas Alegações.
E. Quanto ao quesito 3.º da Base Instrutória, a resposta deveria ter sido “Provado”, tendo em conta o especificado na alínea D) dos Factos Assentes e a posição da Ré assumida nos artigos 136.º e 137.º da Contestação.
F. É também esta a resposta que resulta do teor da prova testemunhal, tendo em conta as passagens do depoimento do XXX a partir dos minutos 02:15 e 02:42 da gravação in Translator 2 - Recorded on 02-Mar-2010 at 10.07.44 (-R$S359103311270) e 09:32 e 09:48 da gravação in Translator 2 _ Recorded on 02-Mar-2010 at 10.19.53 (-R$SIDMW03311270), transcritas no parágrafo 18.º do corpo destas Alegações.
G. Quanto aos quesitos 4.º a 20.º da Base Instrutória, a resposta deveria ter sido “Provado”, dado que a retribuição média diária do Autor resulta de uma mera operação aritmética com base nos valores anuais especificados na alínea B) dos Factos Assentes, divididos pelo número de dias de cada ano.
H. As respostas negativas aos quesitos 4.º a 20.º da Base Instrutória violaram o disposto no art.º 558.º, n.º 1 do CPCM, devendo, por isso, ser alteradas ao abrigo do disposto no artigo 629.º, n.º 1, a), primeira parte, do CPCM.
I. Ao responder não provado à matéria dos quesitos 1.º a 20.º da Base Instrutória o Tribunal a quo violou o disposto no art.º 335.º, n.º 2 do CCM e incorreu em erro na apreciação da matéria de facto, designadamente das passagens dos depoimentos do testemunha XXX (XXX) gravadas ao minuto 00:02 a 00:12, 02:15 a 02:42 e 09:32 a 09:48 do Translator 2 - Recorded on 02-Mar-2010 at 10.07.44 (-R$S359103311270), 00:04 a 00:11, 01:33 a 01:57 e 03:03 a 03:47 do Translator 2 - Recorded on 02-Mar-2010 at 10.08.21 (-R$S4)AW03311270).
J. As respostas aos quesitos 1.º a 20.º da Base Instrutória resultaram assim de um erro de percepção na produção de prova, dado que, dos depoimentos transcritos da testemunha XXX (XXX) resulta claramente que o Autor provou o que lhe competia.
K. Acresce que a Ré não produziu qualquer contraprova destinada a tomar duvidosos os factos constitutivos do direito do Autor.
L. Esta conclusão é, de Testo, a única consistente coma posição da Ré assumida na Contestação.
M. A sentença ora recorrida violou, por isso, o disposto no art.º 558.º, n.º 1 do CPCM, devendo, por conseguinte, serem as respostas aos quesitos 1.º a 20.º da Base Instrutória alteradas para “Provado” nos termos do disposto no art.º 629.º, n.º 1, a) do CPCM.
N. Os pontos concretos da matéria de facto a que respeitam os quesitos 1.º a 20.º da Base Instrutória foram pois incorrectamente julgados, devendo, por conseguinte, ser a resposta aos referidos quesitos alterada para “Provado” nos termos do disposto no art.º 629.º, n.º 1, a) do CPCM.
O. Sendo certo que, sem conceder, mesmo em caso de dúvida, sempre os factos alegados pelo Autor a que se reportam os quesitos 1.º a 20.º da Base Instrutória, deviam ter sido considerados como constitutivos do direito por força do disposto no art. º 335.º, n.º 3, do CCM.
P. Assim, a sentença recorrida ao não dar como provados todos os factos constitutivos do direito do A., designadamente os factos dos quesitos 1.º a 20.º da Base Instrutória violou o disposto no art.º 558.º, n.º 1 do CPCM e nos art.º 335.º, n.º 2 e 3 do CCM.
Q. Doutra banda, com interesse para a caracterização da parte variável da remuneração como salário do A. ficaram provados os factos indicados nas alíneas B) a H) dos Factos Assentes.
R. A quase totalidade da remuneração do A. era paga pela Ré a título de rendimento variável (cfr. alíneas B) a H) dos Factos Assentes), o qual integra o salário.
S. Ao contrário do que sucede noutros ordenamentos jurídicos, o legislador de Macau recortou o conceito técnico jurídico de salário nos artigos 7.º, b), 25.º, n.º 1 e 2 e 27.º, n.º 2 do RJRL.
T. É o salário tal como se encontra definido nos artigos 7.º, b), 25.º, n.º 1 e 2 e 27.º, n.º 2 do RJRL que serve de base ao cálculo de inúmeros direitos dos trabalhadores, designadamente do acréscimo salarial devido pelo trabalho prestado nos períodos de descanso obrigatório.
U. A interpretação destas normas não deverá conduzir a um resultado que derrogue, por completo, a sua finalidade, a qual consiste em fixar, de forma imperativa, a base de cálculo dos direitos dos trabalhadores.
V. A doutrina invocada na douta sentença recorrida não serve de referência no caso “sub judice” por ter subjacente diplomas (inexistentes em Macau) que estabelecem o salário mínimo, e definem as regras de distribuição pelos empregados das salas de jogos tradicionais dos casinos das gorjetas recebidas dos clientes.
W. Em Portugal quem paga as gorjetas aos trabalhadores dos casinos que a elas têm direito não é a própria Concessionária, que nunca tem a disponibilidade do valor percebido a título de gorjetas, mas as Comissões de distribuição das gratificações (CDG), as quais, sendo distintas e autónomas da empresa concessionária são moldadas como entidades equiparáveis a pessoas colectivas, sujeitas a registo, com sede em cada um dos casinos.1
X. Ao contrário, em Macau, quem paga aos trabalhadores a quota-parte a que eles têm direito sobre o valor das gorjetas é a própria concessionária que o faz seu, e não a comissão responsável pela sua recolha e contabilização.
Y. O primitivo carácter de liberalidade das gorjetas diluiu-se no momento e na medida em que as gorjetas dadas pelos clientes não revertiam directamente para os trabalhadores mas, ao invés, eram reunidas, contabilizadas e distribuídas pela Ré, segundo um critério por ela fixado (distribuição essa, sublinhe-se, que, como ficou provado, era feita por todos os trabalhadores da Ré e não apenas por aqueles que contactavam com os clientes).
Z. No caso dos autos, as gorjetas que se discutem não pertencem aos trabalhadores a quem são entregues pelos clientes dos casinos (alínea D) dos Factos Assentes).
AA. Estas gorjetas pertencem à Ré que com elas faz o que entende, nomeadamente o especificado nas alíneas D), E) e H) dos Factos Assentes.
BB. A Ré tinha o dever jurídico de pagar ao A. quer a parte fixa, quer a parte variável da remuneração do trabalho (alíneas B), C) e F) dos Factos Assentes).
CC. O pagamento da parte variável da retribuição do A. - que corresponde à quase totalidade da contrapartida do seu trabalho - traduziu-se numa prestação regular, periódica, não arbitrária e que sempre concorreu durante todo o período da relação laboral para o orçamento pessoal e familiar do trabalhador (Alíneas D) e E) dos Factos Assentes).
DD. Assim, nos termos do disposto nos artigos 7.º, b) e 25.º, n.º 1 e 2 do RJRL, a parte variável da retribuição do A deverá considerar-se como salário para efeitos do cômputo da indemnização pelo trabalho prestado nos períodos de dispensa e descanso obrigatório.
EE. As gorjetas dos trabalhadores dos Casinos e, em especial as auferidas pelo A. durante todo o período da sua relação laboral com a Ré, em ultima ratio devem ser vistas como «rendimentos do trabalho», porquanto devidos em função, por causa e por ocasião da prestação de trabalho, ainda que não necessariamente como correspectivo dessa mesma prestação de trabalho, mas que o passam a ser a partir do momento em que pela prática habitual, montantes e forma de distribuição, com eles o trabalhador passa a contar, sendo que sem essa componente o trabalhador não se sujeitaria a trabalhar com um salário que, na sua base, é um salário insuficiente para prover às necessidades básicas resultantes do próprio trabalho.
FF. Acaso se entenda que o salário do A. não era composto por duas partes: uma fixa e uma variável, então o mesmo será manifestamente injusto - porque intoleravelmente reduzido ou diminuto - e, em caso algum, preenche ou respeita os condicionalismos mínimos fixados no Regime Jurídico das Relações Laborais da RAEM, designadamente nos artigos 7.º, b), 25.º, n.º 1 e 2 e 27.º, n.º 2 desse diploma.
GG. De tudo quanto se expôs resulta que, a douta Sentença do Tribunal de Primeira Instância, na parte em que não aceita que a quantia variável auferida pelo A. durante toda a relação de trabalho com a Ré seja considerada como sendo parte variável do salário do A., terá feito uma interpretação incorrecta do disposto nos artigos 5.º; 27.º; 28.º; 29 n.º 2, 36.º todos do Decreto-lei n.º 101/84/M, de 25 de Agosto e, bem assim, uma interpretação incorrecta do consagrado nos artigos 5.º; 7.º, n.º 1, al. b); 25.º; 26.º e n.º do art. 27.º todos do Decreto-lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril.
HH. Nesta parte, a douta sentença deve ser alterada com as legais consequências, designadamente no que respeita ao cômputo da indemnização pelo trabalho prestado nos períodos de descanso e feriados obrigatórios.
II. Os croupiers dos casinos não são remunerados em função do volume de apostas realizadas na mesa de jogo, nem são eles que fixam o seu período e horário de trabalho, sendo-lhes vedado trabalhar quando e quanto lhes convém, conforme resulta das respostas aos quesitos 22.º e 23.º da Base Instrutória.
JJ. O salário diário destina-se a remunerar os trabalhadores nas situações em que não é fácil, nem viável, prever, com rigor, o termo do trabalho a realizar, como sucede, e.g., nas actividades sazonais, irregulares., ocasionais e/ou excepcionais, bem como na execução de trabalho determinado, precisamente definido e não duradouro, ou na execução de uma obra, projecto ou outra actividade definida e temporária.
KK. O salário diário é, pois, próprio dos contratos de trabalho onde a prestação do trabalho não assume carácter duradouro, o que não sucede com o desempenho da actividade de croupier, que consiste num trabalho continuado e duradouro, a que, automaticamente, corresponde o estatuto de trabalhador permanente no termo do primeiro ano de trabalho consecutivo.
LL. O entendimento de que a remuneração dos croupiers da Ré, e o do A. em particular, consiste num salário diário, não ficou provado por se tratar de matéria de direito, nem se coaduna com este tipo de funções, nem com as condições de trabalho, nem com estatuto de trabalhador permanente definido no artigo 2.º, f) do RJRL), o qual pressupõe o exercício de uma determinada função dentro da empresa, de forma continuada e duradoura no tempo.
MM.Assim, a decisão relativa ao montante da compensação por descanso semanal deverá ser revogada por interpretação incorrecta do disposto nos art.os 7.º, n.º 1, al. b); 17.º, n.º 6, a), 25.º, n.º 2; e 27.º, n.º 2, todos do Decreto-lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril, fixando-se esse valor em MOP$588,873.48, por aplicação da fórmula (salário médio diário X 2).
NN. A decisão relativa ao montante da compensação por descanso anual, deverá ser revogada por violação do disposto quanto ao salário nos art.os 7.º, n.º 1, al. b); 25.º, n.º 2; e 27.º, n.º 2 do RJRL, e do disposto quanto à fórmula de cálculo nos art.os 21.º, n.º 1, 22.º, n.º 2, e 26.º, n.º 1 do mesmo diploma, devendo fixar-se em MOP$102,083.27, por aplicação da fórmula (salário médio diário X 3), por conseguinte, Ré condenada no pagamento do valor total de MOP$690.956.75.
OO. A interpretação destas normas não deverá conduzir a um resultado que derrogue, por completo, a sua finalidade, a qual consiste em fixar, de forma imperativa, a base de cálculo dos direitos dos trabalhadores.
  NESTES TERMOS, e nos demais de direito que V. Exas. se encarregarão de suprir, deverá ser revogada a douta Sentença do Tribunal de Primeira Instância, pois só assim se fará a já costumada JUSTIÇA».
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A STDM respondeu ao recurso formulando as seguintes conclusões alegatórias:
«1. Pretende a Recorrente a alteração da matéria de facto dada como assente que se relacione com os quesitos nºs 1, 2.º, 3.º e 4.ª a 20.º da base instrutória.
2. Entende a Recorrida que sejam quais forem as declarações que a testemunha tenha prestado no tocante à matéria em causa, para além do declarado pelas restantes testemunhas, mormente as arroladas pela aqui Recorrida, o Tribunal a quo terá sempre de as valorar em conjunto com todos os restantes meios de prova constantes dos autos;
3. Neste contexto, para além da observância e cumprimento do princípio da aquisição processual, no âmbito do qual O tribunal deve tomar em consideração todas as provas realizadas no processo, mesmo que não tenham sido apresentadas, requeridas ou produzidas pela parte onerada com a prova (cfr. o artigo 436.º do CPC), de entre o conjunto de todas as provas carreadas para o processo, o Julgador goza da livre apreciação da prova (cfr. o n.º 1 do artigo 558.º do CPC);
4. No entendimento da aqui Recorrida, não se está perante uma questão de hipotético erro na apreciação da prova, conforme a pretende enquadrar a Recorrente, mas somente de uma divergência de entendimento no que toca ao atendimento e valoração de toda a prova carreada para os autos, a qual, evidentemente, não serviu os intentos da aqui Recorrente;
5. Especificamente sobre a matéria constante dos quesitos 4.º a 20.º da base instrutória, se a intenção do Recorrente é o cálculo do salário diário e sua posterior multiplicação pelo devido factor, pelo trabalho prestado em dias de descanso semanal, anual e feriados obrigatórios; sempre se dirá que a certidão de rendimentos do imposto profissional não pode ser utilizada com o critério;
6. Deu-se como assente (cfr. o ponto 8. da douta matéria assente, a fls. 694 dos autos) que “Entre os anos de 1984 e 2000 o Autor auferiu os seguintes rendimentos: (...) ”. seguindo-se a transcrição dos rendimentos anuais do Recorrente e constantes da certidão do imposto profissional supra mencionada;
7. No entanto, não ficou provado, assim como não consta de qualquer outro facto assente, que tais rendimentos anuais tenham todos sido pagos pela Recorrida ao Recorrente, seja a título de salário, seja a título de entrega das gorjetas, ou a qualquer outro título;
8. Dentro do rendimento anual constante da certidão podem existir parcelas do mesmo que não tenham sido pagas pela Recorrida. Sabemos, por confissão da Recorrida, que os montantes relativos ao salário diário fixo (MOP $ 4,10, HKD 10,00 e HKD 15,00, todos por dia de trabalho) foram pagos pela Recorrida;
9. No entanto, não sabemos se no conjunto dos rendimentos do Recorrente em cada ano existem rendimentos que tenham sido pagos, ou colocados à sua disposição, que sejam provenientes doutras actividades que não a prestação de trabalho à Recorrida e, por conseguinte, pagos ou disponibilizados por qualquer ou quaisquer outras pessoas ou entidades;
10. Perante a matéria de facto dada como provada, não pode o Tribunal a quo concluir que todos os rendimentos de cada um dos anos foram todos pagos ou colocados à disposição do Recorrente pela Recorrida;
11. Existe todo um conjunto de rendimentos que estão sujeitos a imposto profissional e que poderão ter tido como fonte pagadora qualquer outra pessoa ou entidade que não a Recorrida;
12. Assim, nunca poderia o Tribunal a quo simplesmente dividir os rendimentos anuais do Recorrente pelos dias do ano e imputa-los na totalidade a montantes pagos ou disponibilizados pela Recorrida, porquanto não resulta provado que o tenham sido, correndo-se o risco de as compensações eventualmente devidas por trabalho prestado em dias de descanso serem calculadas com base em montantes que não foram pagos ou disponibilizados pela Recorrida, configurando esta situação uma injustiça evidente;
13. Assim, entende a Recorrida que andou bem o Tribunal a quo, no que toca a subsunção da matéria de facto dada como provada, ou não provada, à solução de direito encontrada, devendo manter-se a Decisão, ou seja, calculando-se os montantes diários apenas na base do salário diário fixo do Recorrente, por ser o único rendimento que resulta provado como tendo sido pago pela Recorrida ao Recorrente e de possível liquidação, devendo e Recurso improceder porque infundado;
Ainda concluindo,
14. As gratificações ou gorjetas recebidas pelos empregados de casino dos clientes não fazem parte do salário;
15. A retribuição ou salário, em sentido jurídico (laboral), encerra quatro elementos essenciais e cumulativos: é uma prestação regular e periódica; em dinheiro ou em espécie; a que o trabalhador tem direito por título contratual e normativo e que corresponde a um dever jurídico da entidade patronal; como contrapartida pelo seu trabalho;
16. No caso dos autos, estando em causa gorjetas comprovadamente oferecidas por clientes de casino, dependendo o seu recebimento do espírito de animus donandi de terceiros, estranhos à relação jurídico-laboral, nunca poderia o trabalhador ter exigido à sua entidade empregadora o seu pagamento, inexistindo aquela oferta por parte dos clientes;
17. O Recorrente sabia que a parte do rendimento respeitante às gorjetas dependia exclusivamente das liberalidades dos clientes de casino, nada podendo exigir à ora Recorrida a esse título caso essa parte do seu rendimento fosse zero;
18. Na Jurisprudência e Doutrina de Portugal, é entendimento maioritário que as gorjetas oferecidas pelos clientes não constituem parte do salário. E, na verdade, a única diferença relevante entre os dois sistemas é a circunstância de as regras/critérios de distribuição das gratificações/gorjetas serem definidas, em Macau, pela entidade empregadora, enquanto em Portugal, esses critérios/regras encontram-se definidas pelo membro do Governo responsável pelo sector do turismo, ouvidos os representantes dos trabalhadores:
19. Também em Portugal os trabalhadores dos casinos estão proibidos de fazerem suas, a título individual, as gorjetas recebidas, devendo depositá-las, após o recebimento, em caixa própria, sendo as ditas gorjetas distribuídas, posteriormente, pelos trabalhadores de acordo com os ditos critérios definidos por via legislativa;
20. Cremos que o facto de a definição dos critérios de distribuição das gorjetas caber, em Macau, à entidade empregadora não altera a natureza não salarial daquelas prestações, até porque, nem quando começou a trabalhar para a ora Recorrida, nem durante toda a relação contratual, o Recorrente alguma vez se interessou por esta questão, aceitando tais critérios sem questionar; ,
21. Dispõe o artigo 25.º, n.º 1 do RJRT que “Pela prestação dos seus serviços ou actividade laboral, os trabalhadores têm direito a um salário justo.”;
22. Salvo o devido respeito por opinião contrária, analisando a certidão de rendimentos do Recorrente, não se pode dizer que ao Autor não foi proporcionado um rendimento justo, maxime porque os rendimentos globais auferidos eram claramente superiores à média do rendimento/ remuneração auferida por cidadãos de Macau com formação académica e profissional equivalente às suas que não trabalhassem em casino, os quais eram mais que bastantes para prover a uma vida digna e decente do Recorrente e sua família;
23. Deste modo, na esteira do entendimento do mais Alto Tribunal da RAEM, do Douto Tribunal Recorrido e, bem assim, da Doutrina e Jurisprudência maioritárias de Portugal, é também entendimento da Recorrida que: “As gratificações ou gorjetas recebidas pelos empregados de casino dos clientes não fazem parte do salário.”;
24. É, pois, forçoso concluir - como fez e bem o Tribunal a quo - que o rendimento dos trabalhadores dos casinos da STDM, proveniente das gorjetas concedidas pelos clientes, não pode ser qualificado como prestação retributiva e, desta forma, ser levado em linha de conta no cálculo de uma eventual indemnização que o ex-trabalhador, pudesse reivindicar da aqui Recorrida pelos dias de descanso semanal, anual e de feriados obrigatórios;
Ainda concluindo,
25. Andou bem a Douta Sentença do Tribunal a quo relativamente ao tipo de salário auferido pelo Autor, considerando-o salário diário;
26. Foi dado como provado - cfr. o Ponto 8 da douta matéria assente - que: “8. A componente fixa diária da remuneração do Autor foi de HK$ 4,10, desde 1 de Janeiro de 1984 até 30 de Junho de 1989. HK$10 desde 1 de Julho de 1989 até 30 de Abril de 1995 e HK$15 desde 1 de Maio de 1995 até ao termo do contrato com a Ré em Dezembro de 2000.” - (realce nosso);
27. Não se percebe, assim, como e sem qualquer fundamento, a pretensão do Recorrente, porquanto depois de ter sido acordado entre o trabalhador e a entidade patronal que a contrapartida pelo seu trabalho era de uma importância diária, tal como provado, não se vislumbra nem se aceita qualquer fundamentação sobre a consideração de que o A. auferia um salário mensal;
28. O Recorrente não apresenta suporte factual para sustentar a solução de direito que alega dever ser aplicada, pelo que deve a decisão recorrida ser mantida quanto a esta parte;
Ainda concluindo,
29. Admitindo a Recorrida, apenas por cautela e por hipótese, que de forma alguma se concede, a obrigação de indemnizar o ora Recorrente tendo em conta o valor das gorjetas oferecidas pelos clientes de casino, devem ser as seguintes as fórmulas aplicáveis para aferir das compensações adicionais eventualmente devidas:
i. Trabalho prestado em dias de descanso semanal:
1. DL 101/84/M: salário diário x 0 (e não x1, porque uma parcela já foi paga);
2. DL 24/89/M: salário diário x 1 (e não x2, porque uma parcela já foi t paga);
3. DL 32/90/M: salário diário x 0 (e não x1, porque uma parcela já foi paga);
ii. Trabalho prestado em dias de descanso anual:
1. DL 101/84/M: salário diário x 0 (e não x1, porque uma parcela já foi paga);
2. DL 24 DL 24/89/M e DL 32/90/M: salário diário x 0 (e não x1 ou x3, porque uma parcela já foi paga e porque a Ré não impediu a Autora de gozar quaisquer dias de descanso);
iii. Trabalho prestado em dia feriado obrigatório:
1. DL 101/84/M: salário diário x 0 (e não x1, porque uma parcela já foi paga);
2. DL 24/89/M e DL 32/90/M: DL 24/89/M: salário diário x 1 (e não x2, porque uma parcela já foi paga);
30. Subsidiariamente, caso se entenda que as fórmulas supra expostas não devem ser as adoptadas para o cálculo de uma eventual indemnização devida ao Recorrente, remete-se para as fórmulas adoptadas nos acórdãos do Tribunal de Última Instância, proferidos no âmbito dos Processos n.º 28/2007, 29/2007 e 58/2007, datados de 21 de Setembro de 2007, 22 de Novembro de 2007 e 27 de Fevereiro de 2008, respectivamente.
Em face de todo o exposto, deverá o presente Recurso improceder porque infundado e, em consequência, ser mantida -em conformidade a douta Sentença recorrida, na parte em que absolveu a aqui Recorrida, fazendo-se desta forma e mais uma vez a devida Justiça».
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Também a STDM apresentou recurso subordinado, em cujas alegações foram formuladas as seguintes conclusões:
«1. No dizer da lei processual civil, as excepções peremptórias “importam a absolvição total ou parcial do pedido e consistem na invocação de factos que impedem, modificam ou extinguem o efeito jurídico dos factos articulados pelo autor.” - cfr. o n.º 3 do artigo 412.º do CPC.;
2. No artigo 306.º da Contestação, a ora Recorrente subordinada alegou que “Tendo este ficado assim integralmente compensado, ressarcido e satisfeito por todas as quantias a título de descanso semanal, descanso anual e feriados obrigatórios, que tivesse porventura a receber.”, uma vez que o Autor assim o declarou, quando assinou o documento n.º 1 junto aos autos (a Declaração);
3. Pese embora o douto Tribunal a quo a ter tido em conta, não se pronunciou sobre o seu caracter remissivo, levando a que a aqui Recorrente Subordinada tenha de lançar mão deste expediente processual, sob cautela e no cumprimento do bom patrocínio, prevendo a hipótese de alguma das pretensões do Autor poderem proceder no âmbito do recurso principal por ele interposto;
4. Se o douto Tribunal a quo tivesse conhecido do efeito remissivo da declaração junta à contestação como documento n.º 1, o pedido do Autor nem sequer chegaria a ser conhecido, tendo-se, o Mmo. Juiz o quo, limitado a considerar o pagamento tout court da quantia indemnizatória acima referida, descontextualizado do acordo remissivo celebrado entre as partes;
5. Note-se que o Autor não se limitou a declarar ter recebido o montante indemnizatório dos autos. O Autor declarou que o referido montante se referia ao pagamento de todos os dias de descanso nos termos da lei, pelo que abdicou, ou remitiu, quaisquer outros créditos de que pudesse eventualmente pretender reclamar;
6. Assim, no tocante à questão fundamental da validade da declaração remissiva e a sua consequência jurídica, sabe-se que também é entendimento deste douto Tribunal de Recurso que a mesma é válida e extintiva de toda e qualquer compensação emergente da relação laboral2:
7. Seja qual for a qualificação jurídica que se lhe atribua, visa a mesma Declaração a produção dos efeitos de fazer extinguir a dívida do devedor e o reconhecimento definitivo da inexistência da prestação devida ao credor;
8. Ainda sobre a mesma questão, é esse o entendimento do Tribunal de Última Instância, no sentido de que a remissão de créditos emergentes do contrato de trabalho é possível após extinção das relações laborais3, pese embora considere a mais Alta Instância de Recurso em Macau que se afigura mais preciso qualificar a Declaração como uma quitação acompanhada de reconhecimento negativo da dívida;
9. Seja como for, entende ainda o Tribunal de Última Instância, trate-se de quitação, de remissão, ou de transacção, os efeitos são semelhantes, já que se está perante direitos disponíveis, uma vez que a relação laboral já havia cessado, pelo que a consequência é a inexistência do direito de crédito contra a Ré;
10. É também este o entendimento desta Alta Instância de Recurso, claramente patente, a título exemplificativo, no Acórdão proferido no processo n.º 216/2011, estando em causa uma declaração em tudo igual à que se discute nos presentes autos, assim como uma igual falta de pronúncia sobre o seu caracter remissivo;
11. Ora, sendo a douta Sentença recorrida absolutamente omissa quanto à eficácia remissiva da declaração assinada pelo Autor, requer-se a V. Exas. o seu conhecimento, em conformidade.
Assim não se entendendo, conclua-se, ainda,
12. A Sentença aqui em crise não aplicou a devida fórmula ao cálculo da eventual compensação por trabalho prestado em dias de descanso anual;
13. O trabalho prestado nos dias de descanso anual era remunerado à razão do triplo do salário de um dia de trabalho efectivo, apenas nos casos de impedimento, pelo empregador, do gozo de dias de descanso do trabalhador, o que não é o caso por não resultar de qualquer facto constante da matéria dada como provada;
14. E na falta de norma expressa para compensar o trabalhador pelo não gozo de dias de descanso anual sem impedimento por parte da entidade patronal, entende a Recorrente subordinada que nada mais tem a pagar que não a remuneração em singelo já recebida pela Autora.
15. No entanto, entende a Recorrente subordinada que não se deve recorrer à aplicação analógica do regime previsto para o trabalho prestado em dias de descanso semanal, porquanto, tendo o legislador expressamente tomado essa opção, quando o podia, como o fez para o descanso semanal, não existe lacuna, mas sim uma clara e expressa opção legislativa em remunerar o trabalhador apenas nos termos normais, sem haver lugar a qualquer compensação, afastada que está a situação de o não gozo ter sido provocado pela entidade patronal;
16. Por outro lado, tendo os dias de trabalho prestado em dias de descanso anual sido já remunerados, em singelo, é forçoso concluir que nada mais deve a Recorrente subordinada à Autora, pelo que deve, o que se requer, ser a douta Sentença revogada no que a esta parte diz respeito;
Termos em que se requer a manutenção do ora decidido na Primeira Instância, quanto à questão do salário e gratificações, e, quanto ao presente Recurso subordinado ora interposto, a sua procedência, fazendo V. Exas., deste modo, a habitual e costumada Justiça».
*
A este recurso respondeu o autor, tendo concluído as suas alegações da seguinte maneira:
«A. O direito conferido às partes para recorrer nos termos do n.º 1 do artigo 584.º do Código de Processo Civil é restrito às decisões que directamente as afectem, já que a palavra «vencido» referida naquele preceito legal equivale a «prejudicado», isto é, refere-se àquele a quem a decisão recorrida tenha sido objectivamente desfavorável.
B. A legitimidade para recorrer, pressupondo um interesse directo e um prejuízo real, conduz à exclusão da parte a quem a decisão não cause um prejuízo directo e efectivo, ou seja, que apenas seja passível de sofrer prejuízo indirecto ou reflexo, eventual nu incerto.
C. No caso “sub judice”, a recorrente subordinada não ficou vencida, dado ter sido absolvida do pedido, pelo que não se verifica a hipótese prevista no art.º 587.º, nº 1 do Código de Processo Civil ex vi do art.º 1º do Código de Processo do Trabalho.
D. O recurso subordinado para o Tribunal de Segunda Instância da sentença que absolveu a Ré do pedido não é, portanto, admissível, por não se verificar o pressuposto da legitimidade para recorrer previsto no artigo 584.º, n.º 1 do Código de Processo Civil.
E. Caso assim não se entenda, sempre seria de improceder a arguida excepção de omissão de pronúncia.
F. Isto porque a Ré apenas suscitou a questão da remissão de créditos prevista no artigo 854.º e ss. do Código Civil nas suas alegações do recurso subordinado, pelo que a possibilidade de discutir em sede de recurso uma questão que não foi atempadamente suscitada na Contestação precludiu nos termos do disposto no arte º 409.º do Código de Processo Civil.
G. Acresce que o Tribunal a quo se pronunciou sobre o carácter remissivo da declaração de fls. 298 ao concluir que a importância paga pela Ré através da Direcção dos Serviços de Trabalho e Emprego era superior à indemnização devida pela Ré, pelo que nada mais o Autor tinha a receber.
H. Por outras palavras, para o Tribunal a quo a declaração de fls. 298 remitiu os créditos do Autor pelo valor que lhe foi efectivamente pago através da Direcção dos Serviços de Trabalho e Emprego, o que demonstra que o juiz se pronunciou sobre o carácter remissivo dessa declaração, no qual, aliás, se fundou a absolvição da Ré do pedido.
I. Pelo que também por aqui teria de improceder a arguida nulidade de omissão de pronúncia quanto ao carácter remissivo da declaração de fls. 298.
J. Caso assim não se entenda, nunca a declaração de fls. 298 se poderia configurar como (i) uma remissão de todos os créditos para além dos que foram efectivamente pagos ao Autor ou como (ii) uma quitação acompanhada de reconhecimento negativo de dívida como defende a Ré.
K. É que a solução da remissão de créditos/quitação acompanhada de reconhecimento negativo de dívida apenas pode ser eventualmente aplicável às declarações em que o trabalhador declare expressamente nada mais ter a receber da antiga entidade patronal.
L. E comparando a declaração de fls. 298 dos autos com as declarações a que se referem os acórdãos indicados a nota de rodapé I das alegações do recurso subordinado, três diferenças fundamentais saltam à vista.
M. A primeira diferença é a expressão “Mais declaro” com que o declarante inicia o segundo paragrafo da declaração-tipo retirada do acórdão proferido no processo n.º 490/2010 (artigo 24 do corpo desta resposta) e com a qual pretende expressar uma intenção que falta no parágrafo anterior dessa declaração e que se encontra de todo ausente na declaração de fls. 298.
N. A segunda diferença é que o Autor declarou a fls. 298 ter conhecimento que a importância que recebeu da Ré se refere ao serviço prestado em “todos os dias” de descanso “nos termos da lei” “de acordo com a conclusão da análise determinada na proposta elaborada pela Direcção dos Serviços de Trabalho e Emprego”.
O. Significa isto que o Autor só deu quitação dos valores calculados pela Direcção dos Serviços de Trabalho e Emprego que lhe foram efectivamente pagos, e não de todos os valores a que porventura pudesse ter direito pelo trabalho prestado à Ré nos períodos de descanso obrigatório e nos feriados obrigatórios.
P. É, de resto, esse o sentido que decorre da lei, dado que havendo dúvida sobre o sentido da declaração e sendo caso de negócio oneroso, temos de recorrer à solução dimanada do art.º 229.º do Código Civil, prevalecendo o sentido da declaração que conduzir ao maior equilíbrio das prestações.
Q. A terceira diferença é que se na declaração de quitação de fls. 298 o declarante não declarou nada mais ter a receber da antiga entidade patronal, então, não se lhe pode aplicar o mesmo tratamento reservado à declaração reproduzida no artigo 24.º desta resposta, onde o trabalhador declarou nada mais ter a receber da antiga entidade patronal, dado não se poder tratar da mesma maneira o que é desigual por força do princípio da igualdade, o qual determina que se trate de forma igual o que é igual e de forma diferente o que é diferente na medida da diferença.
R. Falta, pois à declaração de fls. 298 o segundo parágrafo da declaração tipo reproduzida no artigo 24 desta resposta às alegações para que aquela se possa equiparar a esta e se possa falar em reconhecimento negativo de dívida ou em remissão de todos os créditos que não apenas dos que foram efectivamente pagos ao Autor através da Direcção dos Serviços de Trabalho e Emprego.
NESTES TERMOS e com o mais que V. Exas., muito doutamente, não deixarão de suprir, não deverá ser admitido o recurso subordinado interposto pela Ré, ou, sendo-o, deverá ser-lhe negado provimento, com as legais consequências,
Assim, mais uma vez, farão V. Exas. JUSTIÇA!».
*
Cumpre decidir.
***
II - Os Factos
A sentença recorrida deu por assente a seguinte factualidade:
1. Entre 1 de Janeiro de 1984 e 31 de Dezembro de 2000, o Autor trabalhou para a Ré, sendo o seu horário por turnos.
2. O rendimento do Autor desdobrava-se numa parte fixa e outra variável.
3. A parte variável dependia do valor global do dinheiro recebido pelos clientes do casino, ou seja, as gorjetas.
4. As gorjetas recebidas pelos empregados eram colocadas, por ordem da Ré, numa caixa destinada exclusivamente a esse efeito e eram contadas e contabilizadas diariamente também por uma comissão paritária constituída por um membro de tesouraria da Ré, um gerente de andar e um ou mais trabalhadores da Ré por ela incumbidos, a fim de serem distribuídas de 10 em 10 dias aos diversos empregados, incluíndo os da área administrativa e informática e de acordo com a categoria profissional a que pertenciam.
5. A Ré incluiu sempre a quantia paga a título de “gorjetas” nos montantes que participou à DSF para efeitos de liquidação e cobrança de imposto profissional dos seus empregados.
6. Durante a relação contratual entre Autor e Ré nunca as partes puseram em causa o acordo sobre as condições do pagamento do salário e do respectivo cálculo.
7. A componente fixa diária da remuneração do Autor foi de HK$ 4,10 desde 1 de Janeiro de 1984 até 30 de Junho de 1989, HK$10 desde 1 de Julho de 1989 até 30 de Abril de 1995 e HK$15 desde 1 de Maio de 1995 até ao termo do contrato com a Ré em Dezembro de 2000.
8. Entre os anos de 1984 e 2000 o Autor auferiu os seguintes rendimentos:
a)1984: MOP$ 122.875,00;
b)1985: MOP$ 132.872,00;
c)1986: MOP$ 115.534,00;
d)1987: MOP$ 134.873,00;
e)1988: MOP$ 131.617,00;
f)1989: MOP$ 171.720,00;
g)1990: MOP$ 188.863,00;
h)1991: MOP$ 185.541,00;
i)1992: MOP$ 193.826,00;
j)1993: MOP$ 202.132,00;
l)1994: MOP$ 204.348,00;
m)1995: MOP$ 212.725,00;
n)1996: MOP$ 199.788,00;
o)1997: MOP$ 138.634,00;
p)1998: MOP$ 121.769,00;
q)1999: MOP$ 147.602,00;
r) 2000: MOP$ 147.481,00.
9. Em meados de Julho de 2003, o Autor recebeu os documentos juntos aos autos a fls. 133, 134 e 135, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
10. O Autor recebeu depois a quantia ali referida de MOP$ 12.783,05 e assinou a declaração, cuja tradução consta dos autos de fls. 402, designadamente que tal quantia era paga pela ré a título de compensação de todos os dias de descanso legais.
11. O autor não teria celebrado contrato de trabalho com a ré se apenas recebesse prestação pecuniária fixa referida em G) dos factos assentes.
12. A parte variável do rendimento auferido pelo autor ultrapassava o valor da parte fixa.
13. Durante o período compreendido entre 1 de Janeiro de 1984 e 31 de Dezembro de 20000 o autor nunca gozou quaisquer dias de descanso anual nem de descanso semanal.
14. A ré não pagou ao autor qualquer acréscimo na compensação pelo trabalho prestado durante os períodos de descanso semanal e anual.
***
III- O Direito
1 - A sentença, concatenando a fundamentação do acórdão anulatório de fls…. com a prova obtida no novo julgamento, concluiu pela improcedência da acção com base nos seguintes argumentos:
- “As gorjetas não integram o conceito de salário para efeito de indemnização por descanso não gozado”;
- Não pode proceder o pedido da acção referente aos alegados dias de feriados obrigatórios não gozados, “por falta de prova de não os ter gozado e de neles ter trabalhado”;
- Teria a autora direito a receber a quantia de HK$ 10.087,65 a título de indemnização pelos dias de descanso semanal e anual não gozados e não pagos;
- Tendo, porém, a autora recebido da STDM quantia superior a título de indemnização por não ter gozado os dias de descanso reclamados nos autos, extinguiu-se pelo cumprimento a obrigação da ré.
No primeiro recurso (da autora), esta pretende arguir erro no julgamento da matéria de facto, essencialmente a respeito da inclusão, ou não, das gorjetas no conceito de salário. Insurge-se também contra os factores incluídos na fórmula de cálculo da indemnização. Por tudo isso, e em síntese, acha-se no direito a reclamar o pagamento do valor de Mop$ 1.279,830,23.
No segundo recurso (subordinado) pretende a STDM erige como questões a debater o carácter remissivo da declaração que sustenta a extinção da obrigação pelo pagamento e o factor de multiplicação a aplicar para cálculo da eventual compensação pelo trabalho em dias de descanso anual.
Ora, equacionado deste jeito o âmbito dos recurso interpostos, somos a crer que se deve começar pela matéria do recurso subordinado, na medida em que a sua eventual procedência prejudica o conhecimento do recurso da autora. Na verdade, independentemente do valor da indemnização a que a autora se arrogue ter direito - e até mesmo independentemente do valor a que em tese ou a priori tivesse direito - o que é certo é que a sentença da 1ª instância não enfrentou o valor do documento que contém uma declaração assinada pela autora. Isto é, ao tribunal bastou saber que o valor da indemnização que liquidou na sentença era inferior ao do valor recebido conforma a dita declaração. E uma simples análise aritmética foi suficiente para levar a concluir que o valor “recebido” cobria o “devido”, circunstância que por si mesma levava a julgar pelo cumprimento da obrigação.
Este juízo, porém, só se aceita na perspectiva da 1ª instância, na medida em que ela entendeu que no conceito de salário não entram as importâncias recebidas a título de gorjetas. Mas, dando-se o caso de este TSI entender diferentemente a respeito deste específico aspecto, já a fundamentação da sentença recorrida se não reputaria suficiente, na medida em que, agora, o valor apurado certamente ultrapassaria largamente o de HK$10.087,65 efectivamente recebido pela autora.
Mas, por outro lado, também não nos parece necessário discutir aqui previamente o conceito de salário (este TSI, de resto, tem vindo a decidir uniformemente que dele fazem parte as gorjetas), uma vez que se apure a natureza remissiva ou quitativa extraída da declaração assinada pela autora. Se essa for a conclusão que este TSI vier a alcançar, então qualquer que fosse o valor indemnizatório “devido”, nenhuma outra indemnização seria de atribuir à impetrante, caso em que a sentença se teria que manter, embora por motivo nela não aflorado expressamente.
Vejamos, pois, da bondade do recurso subordinado.
*
2 - Do recurso subordinado
Está em causa, portanto, apurar da natureza da declaração traduzida a fls. 402, a que se refere o ponto 10 da matéria de facto.
Tal documento tem o seguinte teor:
“Eu, A (titular do BIRM nº X/XXXXXX/X), em relação ao processo por não pagamento de compensação de férias pela STDM declaro:
“Recebi neste Departamento a Inspecção do Trabalho da DSTE um cheque do BNU, nº MA 807XXX, no montante de doze mil, setecentos e oitenta e três patacas e cinco avos (MOP$ 12.783,05), tenho conhecimento que a mesma quantia é paga pela referida sociedade a título de compensação de todos os dias de descanso legais durante o período em que eu prestava função nesta sociedade, nos termos do resultado da análise do parecer da DSTE elaborado neste processo, e confirmo o recebimento na referida quantia”.
Efectivamente, esta declaração difere de algumas outras que têm sido objecto de análise em situação similar em processos desencadeados por colegas deste recorrente. Enquanto algumas dessas declarações são muito mais claras no seu propósito, em virtude de literalmente expressarem a vontade do declarante de nada mais terem a receber da STDM, ou que, com o recebimento da importância concreta, nenhum outro direito decorrente da relação de trabalho com a STDM subsiste e que, por isso, nenhuma outra quantia é pelo declarante exigível, a de fls. 402 é mais limitada no seu conteúdo.
Ainda assim, embora menos completa, a verdade é que não deixa de frisar expressamente que o valor recebido corresponde a “…compensação de todos os dias de descanso legais…” (bold nosso). Isto é, não se mostra que tal documento fique confinado a uma simples quitação de determinado valor pago, mas vai mais além a ponto de o declarante ter implicitamente reconhecido nada mais ter a receber, porque o valor recebido correspondia à totalidade do montante compensatório devido pelos dias de descanso legais não gozados.
Ora, assim sendo, cumpre-nos apelar a um douto aresto do TUI lavrado no Processo nº 27/2008, em 30/07/2008, com o qual concordamos e que, por essa razão e mais uma vez, aqui fazemos nosso.
Eis o seu teor:
“A remissão é o contrato pelo qual o credor, “com a aquiescência do devedor”, renuncia ao poder de exigir a prestação devida, afastando definitivamente da sua esfera jurídica os instrumentos de tutela do seu interesse”.
E acrescenta ANTUNES VARELA, “o interesse do credor a que a obrigação se encontra adstrita não chega a ser satisfeito, nem sequer indirecta ou potencialmente.
A obrigação extingue-se sem haver lugar a prestação”.
A remissão consiste no que é vulgarmente designado por perdão de dívida.
Aliás, remitir significa perdoar.
Ora, não parece ter sido isto que sucedeu, em face da declaração da autora.
A autora declarou que recebeu a prestação, que quantificou. E reconheceu mais nada ser devido em relação à relação laboral que já se tinha extinguido.
Mas não quis perdoar a totalidade ou mesmo parte da dívida, ou pelo menos não é isso que resulta da declaração, nem foi alegado ter sido essa a sua intenção.
Parece, portanto, tratar-se de quitação ou recibo, que é a declaração do credor, corporizada num documento, de que recebeu a prestação, prevista no art. 776.º do Código Civil.
Explicam PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA que a “quitação é muitas vezes, como Carbonnier (Droit civil, 4, 1982, n.º 129, pág. 538) justamente observa, não uma simples declaração de recebimento da prestação, mas a ampla declaração de que o solvens já nada deve ao accipiens, seja a título do crédito extinto, seja a qualquer outro título (quittance pour solde de tout compte)”.
Poderá, desta maneira, a quitação, ser acompanhada de reconhecimento negativo de dívida, que é, na lição de ANTUNES VARELA, o negócio “pelo qual o possível credor declara vinculativamente, perante a contraparte, que a obrigação não existe.
...
O reconhecimento negativo de dívida, assente sobre a convicção (declarada) da inexistência da obrigação, não se confunde com a remissão, que é a perda voluntária dum direito de crédito existente”.
Claro que o reconhecimento negativo da dívida pode dissimular uma remissão, mas para isso há que alegar e provar o facto, o que não aconteceu.
Explica VAZ SERRA nos trabalhos preparatórios do Código Civil de 1966, que “o reconhecimento negativo propriamente dito distingue-se da remissão, pois, ao passo que, nesta, existe apenas a vontade de remitir (isto é, de abandonar o crédito), naquele, a vontade é a de pôr termo a um estado de incerteza acerca da existência do crédito”.
E, como ensina o mesmo autor, noutra obra dos mesmos trabalhos preparatórios, a remissão não é de presumir, “dado que, em regra, a quitação não é passada com essa finalidade”.
O reconhecimento negativo da dívida pode, de outra banda, “ser elemento de uma transacção, se o credor obtém, em troca do reconhecimento, uma concessão; mas não o é, se não se obtém nada em troca, havendo então um contrato de reconhecimento ou fixação unilateral, que se distingue da transacção por não haver concessões recíprocas”.
Mas a transacção preventiva ou extrajudicial não dispensa “uma controvérsia entre as partes, como base ou fundamento de um litígio eventual ou futuro: uma há-de afirmar a juridicidade de certa pretensão, e a outra negá-la”.
Mas nem da declaração escrita, nem das alegações das partes no processo, resulta tal controvérsia.
Em conclusão, afigura-se-nos mais preciso qualificar a declaração da autora como uma quitação acompanhada de reconhecimento negativo de dívida.
Seja como for, trate-se de quitação, de remissão ou de transacção, os efeitos são semelhantes, já que, como se verá, se está perante direitos disponíveis, uma vez que a relação laboral já havia cessado, pelo que a consequência é a inexistência do direito de crédito contra a ré.
4. Insusceptibilidade de cessão de crédito de salário. Impossibilidade de renúncia a salário. Vícios da vontade
Nas alegações de recurso para o TSI, a autora veio defender que o art. 33.º do RJRL não permite a cedência de créditos, por força do princípio do tratamento mais favorável para o trabalhador. E os trabalhadores estiveram sempre sob alçada económica e disciplinar da ré, já que a B controla a C, pelo que a autora não teve uma vontade livre e esclarecida quando assinaram as declarações.
Mas a declaração de quitação não constitui qualquer cedência de créditos (a quem?).
Acresce que a cedência de créditos só está vedada enquanto durar a relação de trabalho e esta já se tinha extinguido quando foi emitida a quitação.
Por outro lado, ainda que tivesse havido renúncia a créditos, ou seja remissão, ela seria possível porque efectuada após extinção da relação de trabalho.
É o que defende a generalidade da doutrina. Escreve PEDRO ROMANO MARTINEZ:
“Relacionada com a irredutibilidade encontra-se a impossibilidade de renúncia, de cessão, de compensação e de penhora da retribuição. Estas limitações, excepção feita à penhora, só têm sentido na pendência da relação laboral; cessando a subordinação jurídica, o trabalhador deixa de estar numa situação de dependência, que justifica a tutela por via destas limitações”.
Quanto à alegação de que a autora não teve uma vontade livre e esclarecida quando assinou a declaração, a mesma é irrelevante nesta fase, já que a autora não alegou no momento próprio factos integradores de vícios da vontade.
5. Normas convencionais e declarações negociais. O princípio do tratamento mais favorável para o trabalhador
O Acórdão recorrido considerou que o art. 6.º do RJRL não permitia o acordo das partes pelo qual a autora, trabalhadora, declarasse remitir a dívida para com a ré, tendo esta declaração violado o princípio de tratamento mais favorável dos trabalhadores.
E acrescentou o mesmo Acórdão, referindo-se ao princípio de tratamento mais favorável, ele “deve ser tido pelo menos também como farol de interpretação da lei laboral, sob o qual o intérprete-aplicador do direito deve escolher, na dúvida, o sentido ou solução que mais favorável se mostre aos trabalhadores no caso considerado, em virtude do objectivo de protecção do trabalhador que o Direito do Trabalho visa prosseguir”.
Na feliz síntese de BERNARDO LOBO XAVIER “o princípio do tratamento mais favorável, no plano da hierarquia das normas, significa que as normas de mais alto grau valem como estabelecendo mínimos, podendo ser derrogadas por outras subalternas, desde que mais favoráveis para o trabalhador. No plano da interpretação, na dúvida sobre o sentido da lei, deverá eleger-se aquele que seja mais benéfico para o trabalhador. Na aplicação no tempo, aplicar-se-ão imediatamente todas as regras do trabalho, no pressuposto de que, havendo um constante progresso social, as novas normas são mais favoráveis para o trabalhador, conservando este, ainda, as regalias adquiridas à sombra de anterior legislação”.
O art. 6.º do RJRL dispõe o seguinte:
“Artigo 6.º
Prevalência de regimes convencionais São, em princípio, admitidos todos os acordos ou convenções estabelecidos entre os empregadores e trabalhadores ou entre os respectivos representantes associativos ainda que disponham de modo diferente do estabelecido na presente lei, desde que da sua aplicação não resultem condições de trabalho menos favoráveis para os trabalhadores do que as que resultariam da aplicação da lei”.
Esta norma prevê que as normas convencionais, estipuladas entre empregadores e trabalhadores ou entre os respectivos representantes associativos, podem afastar o regime das normas legais desde que o regime convencional não seja menos favorável para os trabalhadores do que o regime legal.
Assim, e em primeiro lugar, as normas convencionais de que fala o preceito são normas relativas ao regime do trabalho, para vigorarem enquanto durar a relação laboral.
O acordo dos autos entre a autora e a antiga entidade patronal não é integrado por normas, isto é, não constituem nenhuma regulamentação normativa atinente às condições de trabalho. São antes declarações negociais, pelas quais a autora declara ter recebido as quantias devidas pela relação laboral já extinta e nada mais ter a receber da antiga entidade patronal.
Parece, portanto, que o art. 6.º do RJRL nada tem que ver com a matéria em apreço.
Por outro lado, o art. 6.º do RJRL prescreve, na verdade, o princípio do tratamento mais favorável para o trabalhador, no que respeita à prevalência dos acordos sobre a lei, ao plano da hierarquia das normas.
Mas, no caso dos autos, embora exista um acordo entre partes (entre um ex-trabalhador e uma ex-entidade patronal) não existe nenhuma lei mais favorável ou menos favorável aos trabalhadores ou a ex-trabalhadores, pelo que não se vislumbra, qualquer aplicação do princípio do tratamento mais favorável para o trabalhador, na vertente que o art. 6.º do RJRL consagra, que é o da prevalência dos acordos sobre a lei.
Há, é certo, outras vertentes do mesmo princípio do tratamento mais favorável para o trabalhador, por exemplo, no art. 5.º, n.º 1 do RJRL, que é o da manutenção das regalias adquiridas sobre o regime constante do RJRL.
Mas, no caso em apreço não está em causa nenhuma alteração de regime convencional para um regime legal, pelo que a vertente do princípio do tratamento mais favorável para o trabalhador, constante do art. 5.º, n.º 1 do RJRL, não aproveitaria à autora.
O Acórdão recorrido invoca, ainda, em abono da sua tese o art. 60.º do Decreto-Lei n.º 40/95/M, de 14 de Agosto, que institui o regime aplicável à reparação dos danos emergentes dos acidentes de trabalho e doenças profissionais.
Tal preceito, no seu n.º 2 fere com a nulidade os actos e os contratos que visem a renúncia aos direitos estabelecidos naquele diploma. Ora, nem nos autos está em causa qualquer acidente de trabalho ou doença profissional, nem a quitação operou qualquer renúncia a direitos da autora.
O art. 60.º do Decreto-Lei n.º 40/95/M é, pois, inaplicável.
Em suma, a autora não tem o direito que invocou, pelo que a acção estava condenada ao insucesso”.
Por esta autorizada posição se vê que a referida declaração, mais consentânea com uma quitação, tal como se pode ler no aresto, implica que o autor/credor nada mais tenha a exigir do devedor, seja qual for a composição do salário (questão que haveria de discutir-se no recurso do então autor).
Trata-se, de resto, de uma posição que noutras ocasiões temos já subscrito. Veja-se, por exemplo, e por mais recentes, os Acs. do TSI lavrados nos Processos nºs. 265/2012 e 317/2011, ambos de 6/10/2011; 316/2010 e 318/2010, ambos de 28/07/2011, 233/2011, de 20/10/2011, entre outros. No mesmo sentido, ver ainda o Ac. de 29/09/2011, Proc. nº 490/2010.
Neste sentido, a compensação recebida não pode deixar de ter efeitos extintivos da dívida, independentemente da noção que se tenha do salário, das partes que o compõem (se as gorjetas dele devem fazer ou não parte), da questão da sua natureza diária ou mensal e dos critérios ou factores de multiplicação no cálculo da compensação. Qualquer que fosse o resultado a que este tribunal chegasse sobre estas questões, o resultado decisório sempre seria o mesmo: o de confirmar o julgado pela 1ª instância nesta matéria.
E como esta conclusão torna inútil, por prejudicado, o recurso principal, não o iremos apreciar, independentemente do êxito que ele merecesse sobre a composição do salário e qualquer que fosse o valor a apurar na compensação a atribuir ao autor.
***
IV - Decidindo
Nos termos expostos, acordam em:
1 - Conceder provimento ao recurso subordinado, em consequência do que, embora por diferentes razões, se confirma a sentença e se julga improcedente a acção e se absolve a ré da acção, STDM, do pedido.
2 - Julgar prejudicado o conhecimento do recurso principal.
Custas pelo recorrente A em ambas as instâncias.
TSI, 17 / 01 / 2013
José Cândido de Pinho
Lai Kin Hong (Vencido nos termos da declaração de voto)
Choi Mou Pan



Processo nº 981/2012
Declaração de voto de vencido

Vencido pois não vejo razão para alterar a minha posição já assumida na declaração de voto que juntei aos vários Acórdão do TSI, nomeadamente os Acórdãos tirados nos processos nºs 210/2010, 216/2011, 223/2010 e 252/2008, isto é, dada a natureza imperativa da norma do artº 6º do Decreto-Lei nº 24/89/M, um contrato mediante o qual se convencionaram as condições de trabalho aquém do mínimo da protecção dos trabalhadores não pode deixar de ser julgado nulo, por força do disposto no artº 287º do Código Civil, nos termos do qual, salvo excepção expressa em contrário resultante da lei, são nulos os negócios jurídicos celebrados contra disposição legal de carácter imperativo.

RAEM, 17JAN2013

Lai Kin Hong





1 Despacho Normativo n.º 24/89 que revogou o Despacho Normativo n.º 82/85, de 28 de Agosto junto à Contestação.
2 Vide os Acórdãos do Tribunal de Segunda Instância proferidos nos Processos nºs 207/2008, 249/2008, 335/2008, 380/2008, 407/2008 e 428/2008, todos de 18 de Setembro de 2008.
3 Vide, entre outros, o Acórdão do Tribunal de Última Instância proferido no processo n.º 46/2007, de 27 de Fevereiro de 2008.
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