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Processo n.º 52/2013 Data do acórdão: 2013-5-23 (Autos em recurso penal)
Assuntos:
– art.o 54.o, n.o 1, do Código Penal
– revogação da pena suspensa

S U M Á R I O
Nos termos do art.o 54.o, n.o 1, do vigente Código Penal, a suspensão da execução da pena de prisão é revogada sempre que, no decurso dela, o condenado cometer crime pelo qual venha a ser condenado, e revelar que as finalidades que estavam na base da suspensão não puderam, por meio dela, ser alcançadas.
O relator,

Chan Kuong Seng

Processo n.º 52/2013
(Autos de recurso penal)
Recorrente: A (XXX)




ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU
I – RELATÓRIO
Inconformado com o despacho proferido pela M.ma Juíza presentemente titular do Processo Sumário então n.° CR2-09-0351-PSM do 2.o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base (TJB), agora com o n.o CR4-09-0241-PSM do 4.o Juízo Criminal desse Tribunal, que lhe revogou a suspensão da execução da pena de três meses de prisão inicialmente imposta nesses mesmos autos por sentença de 23 de Outubro de 2009, devido à prática, nesse mesmo dia, em autoria material, de um crime de condução em estado de embriaguez, p. e p. pelo art.o 90.o, n.o 1, da Lei n.o 3/2007, de 7 de Maio (vigente Lei do Trânsito Rodoviário, doravante abreviada por LTR), veio o arguido assim condenado A recorrer para este Tribunal de Segunda Instância (TSI), para pedir a revogação daquele despacho revogatório da pena suspensa, tendo imputado à decisão recorrida o vício de erro notório na apreciação da prova e a violação do disposto no art.o 54.o do vigente Código Penal (CP) (cfr. a motivação do recurso apresentada a fls. 86 a 94 dos presentes autos correspondentes).
Ao recurso respondeu o Ministério Público (a fls. 97 a 100v) no sentido de improcedência da argumentação do recorrente.
Subidos os autos, emitiu a Digna Procuradora-Adjunta parecer (a fls. 111 a 112), preconizando também a improcedência do recurso.
Feito o exame preliminar e corridos os vistos, cumpre decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA
Do exame dos autos, decorrem os seguintes dados com pertinência à solução do recurso:
– ao ora recorrente foi aplicada inicialmente, por sentença condenatória de 23 de Outubro de 2009, no âmbito do Processo Sumário então n.° CR2-09-0351-PSM do 2.o Juízo Criminal do TJB, agora n.o CR4-09-0241-PSM do 4.o Juízo Criminal desse Tribunal, subjacente à presente lide recursória, a pena de três meses de prisão, suspensa na sua execução por um ano, pela autoria material, no mesmo dia 23 de Outubro de 2009, de um crime de condução em estado de embriaguez, p. e p. pelo art.o 90.o, n.o 1, da LTR, com inibição de condução pelo período de um ano (cfr. sobretudo a sentença condenatória constante de fls. 14 a 16 dos presentes autos correspondentes);
– o recorrente veio condenado, por sentença de 25 de Fevereiro de 2010 do Processo Sumário n.o CR2-10-0036-PSM do 2.o Juízo Criminal do TJB, como autor material de um crime de desobediência qualificada referido no art.o 92.o, n.o 1, da LTR, praticado nesse mesmo dia 25 de Fevereiro de 2010, cerca da zero hora e 25 minutos (por ter conduzido nessa altura o seu motociclo de matrícula n.o ME-XX-XX para ir comprar comida à sua mãe), na pena de cento e vinte dias de multa, à quantia diária de cento e vinte patacas, perfazendo isto o total de catorze mil e quatrocentas patacas, com cassação da carta de condução, cassação essa suspensa pelo período de dezoito meses (cfr. o teor dessa sentença a que aludem as fls. 33 a 35 dos presentes autos recursórios);
– em face dessa nova condenação penal, e após ouvido o próprio ora recorrente, a M.ma Juíza actualmente titular do subjacente Processo ora n.o CR4-09-0241-PSM decidiu, no seu despacho proferido em 13 de Julho de 2010, transitado em julgado em 23 de Julho de 2010, prorrogar por um ano, o prazo inicial de suspensão de execução da pena, sob condição de prestação de uma contribuição pecuniária no valor de cinco mil patacas a favor da Região Administrativa Especial de Macau no prazo de um mês (cfr. sobretudo o teor desse despacho a fl. 42v);
– ulteriormente, veio o ora recorrente condenado, por acórdão proferido em 5 de Outubro de 2012, transitado em julgado em 15 de Outubro de 2012, no seio do Processo Comum Colectivo n.o CR2-11-0174-PCC do 2.o Juízo Criminal do TJB, como autor material de um crime de ofensa simples à integridade física, p. e p. pelo art.o 137.o, n.o 1, do CP, na pena de cem dias de multa, por seguinte factualidade provada, na sua essência: em 30 de Dezembro de 2010, cerca das 04:20 horas da madrugada, um guarda da Polícia de Segurança Pública mandou parar, numa operação policial de STOP realizada em frente da paragem de autocarro do Casino Sands, o motociclo de matrícula n.o ME-XX-XX conduzido na altura pelo arguido ora recorrente, o qual, como não trouxe consigo a carta de condução e para prevenir que tal guarda policial conseguisse detectar esse acto ilegal, não ligou para a ordem do guarda, e continuou a conduzir o dito motociclo para frente para sair do local em fuga; o mesmo guarda estendeu a mão para tentar impedir a fuga, mas foi batido pelo mesmo motociclo e pelo capacete usado pelo arguido, o que lhe causou ferida contusa no tecido mole da parte do ombro e braço direitos que lhe demandou um dia para convalescença (cfr. a certidão dessa sentença a que se referem as fls. 69 e seguintes dos presentes autos recursórios);
– na sequência dessa nova condenação penal, a mesma M.ma Juíza presentemente titular do subjacente Processo Sumário n.o CR4-11-0085-PSM, decidiu, no seu despacho ora recorrido e exarado a fl. 83 dos presentes autos recursórios, precedido da audição do própro recorrente, revogar, nos termos do art.o 54.o, n.o 1, do CP, o benefício de suspensão da execução da pena inicialmente concedido ao condenado ora recorrente.
III – FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
De antemão, é de notar que mesmo em processo penal, e com excepção da matéria de conhecimento oficioso, ao tribunal de recurso cumpre resolver só as questões material e concretamente alegadas na motivação do recurso e ao mesmo tempo devidamente delimitadas nas conclusões da mesma, e já não responder a toda e qualquer razão aduzida pela parte recorrente para sustentar a procedência das suas questões colocadas (nesse sentido, cfr., de entre muitos outros, os acórdãos do TSI, de 7 de Dezembro de 2000 no Processo n.o 130/2000, de 3 de Maio de 2001 no Processo n.o 18/2001, e de 17 de Maio de 2001 no Processo n.o 63/2001).
Na sua motivação escrita, o recorrente considera, em jeito de conclusão, que o despacho revogatório da pena suspensa ora recorrido “enferma do vício de erro notório na apreciação da prova e do vício de violação do disposto no arto 54o do Código Penal”, pois “dos factos dados como provados, não se colhe que as finalidades que estavam na base da suspensão não puderam ou possam, por meio dela, ser alcançadas”, e “o crime cometido pelo recorrente que levou à revogação da suspensão da pena de prisão foi o crime de ofensa simples à integridade física..., crime este cuja ilicitude não compromete os fins que estavam na base da suspensão da pena de prisão de 3 meses que lhe tinha sido anteriormente aplicada”.
Dessa alegação do recorrente, resulta claro que foi impropriamente arguido o vício de erro notório na apreciação da prova, posto que a questão concretamente colocada como objecto do recurso diz respeito materialmente à rectidão, ou não, da verificação do critério material para efeitos de revogação da pena suspensa, exigido na parte final da letra do n.o 1 do art.o 54.o do CP.
Pois bem, quanto a esta questão cerne do recurso, é manifesto ao presente Tribunal de recurso que perante as circunstâncias fácticas que imediatamente antecederam a ocorrência de factos respeitantes ao tipo legal de ofensa simples à integridade física, as quais espelham que o recorrente, para evitar que o guarda policial finalmente ofendido deste crime pudesse detectar o seu acto ilegal relativo à condução do seu motociclo na madrugada de 30 de Dezembro de 2010, não ligou à ordem de paragem do motociclo dada por esse guarda, e continuou a conduzir para frente para sair, em fuga, do local.
Assim sendo, a despeito de ser leve a ferida sofrida pelo referido guarda policial no seu corpo, é altamente censurável a conduta do recorrente nessa madrugada, sob plena vigência ainda do período de suspensão da pena de prisão inicialmente imposta nos subjacentes autos penais, no âmbito dos quais ele já obteve, no anterior despacho judicial, de 13 de Julho de 2010, transitado em 23 de Julho de 2010, de prorrogação do prazo da suspensão, uma oportunidade de não revogação imediata da suspensão.
O art.o 54.o, n.o 1, do CP determina que a suspensão da execução da pena de prisão é revogada sempre que, no decurso dela, o condenado a) infringir grosseira ou repetidamente os deveres ou regras de conduta impostos ou o plano individual de readaptação social, ou b) cometer crime pelo qual venha a ser condenado, e revelar que as finalidades que estavam na base da suspensão não puderem, por meio dela, ser alcançadas.
No caso, e sob a égide do art.o 54.o, n.o 1, alínea b), do CP, tem claramente razão a M.ma Juíza ao decidir pela revogação da pena suspensa, sem mais nova prorrogação do seu prazo, porquanto as circunstâncias fácticas acima referidas em relação ao crime de ofensa simples à integridade física por que veio a ser condenado o recorrente já demonstram, à evidência, que as finalidades que estavam na base da suspensão concedida em Outubro de 2009 não puderam, por meio da suspensão, ser alcançadas, pelo que sem mais indagação por ociosa, há que naufragar o pedido de nova prorrogação do período da suspensão, sendo, pois, de manter, tal e qual, o despacho recorrido.
Mostrando-se, assim, claramente infundado o recurso, é de rejeitá-lo em conferência (cfr. os art.os 409.o, n.o 2, alínea a), e 410.o, n.o 1, do CPP).
IV – DECISÃO
Dest’arte, acordam em rejeitar o recurso do arguido, por ser manifestamente improcedente.
Custas do recurso pelo arguido, com três UC de taxa de justiça, e quatro UC de sanção pecuniária referida no art.o 410.o, n.o 4, do Código de Processo Penal.
Macau, 23 de Maio de 2013.
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Chan Kuong Seng
(Relator)
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Tam Hio Wa
(Primeira Juíza-Adjunta)
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José Maria Dias Azedo
(Segundo Juiz-Adjunto)



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