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Processo nº 121/2013 Data: 13.06.2013
(Autos de recurso penal)

Assuntos : Inibição de condução.
Suspensão da execução.
Revogação da suspensão.



SUMÁRIO

Atento o disposto no art. 109°, n.° 2 da Lei n.° 3/2007, é de revogar a suspensão da execução da inibição de condução se, no seu decurso, vier o arguido a cometer (nova) infracção que implique a condenação nesta pena acessória.

O relator,

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José Maria Dias Azedo

Processo nº 121/2013
(Autos de recurso penal)






ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:





Relatório

1. A (XXX), com os sinais dos autos, veio recorrer do despacho datado de 17.01.2013, pelo Mmo Juiz do T.J.B. proferido, que lhe revogou a suspensão da execução da pena acessória de inibição de condução por 1 ano e 3 meses, decretada por sentença de 12.11.2010.

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Em sede de conclusões afirma o que segue:

“1.° Pela sentença de 12 de Novembro de 2010, já transitada em julgado, proferida junto do Processo Comum Singular n° CR3-10-0220-PSM do Tribunal Judicial de Base, o Recorrente foi condenado pela prática do crime de condução em estado de embriaguez, p. e p. pelo art.° 90.°, n.° 1 da Lei de Trânsito Rodoviário, na pena de três meses de prisão, substituída por multa à taxa diária de cem patacas (MOP$100,00), o que perfaz a multa total de nove mil patacas (MOP$9.000,00), se a multa não for paga, cumpre a pena de prisão aplicada. E inibição de condução no período de um ano e três meses, mas suspendendo na sua execução no período de um ano e seis meses.
2.° O Recorrente foi condenado, em 17 de Fevereiro de 2012, junto do processo n.° CR4-11-0160-PCC do mesmo Tribunal, na pena de dois (2) anos de prisão com a suspensão de dois (2) anos, e inibição de condução no período de um ano, suspendendo na sua execução no período de dois (2) anos, pela prática do crime de Homicídio por negligência, p.e p. nos termos do art.° 134.°, n.° 1 do Código Penal, conjugado com o n.° 1 do art.° 93.° da Lei do Trânsito Rodoviário.
3.° Desde da condenação no processo colectivo n.° CR4-11-0160-PCC, na nova pena de suspensão, até hoje na audiência, mostra-se ter interiorizado a gravidade do crime e a importância de cumprir a lei.
4. ° Constata-se nos autos que, na segunda condenação do arguido, o Tribunal decretou também a suspensão da execução da sanção acessória de inibição de condução aplicada, mesmo tendo conhecimento da primeira condenação daquele na pena suspensa.
5.° Após dos factos objectos do presente autos, e do processo n.° CR4-11-0160-PCC, o recorrente manteve um bom comportamento de sem cometer novas infracções ou crimes por um período mais de dois (2) anos.
6. ° Antes de tomar decisão da revogação da suspensão da execução da sanção acessória de inibição de condução aplicada, a Mm.° não formou a imagem geral sobre o Recorrente através do cumprimento do princípio de imedição.
7.° O recorrente é condutor profissional por mais de vinte anos.
8.° O Recorrente tem a seu cargo a esposa.
9.° Não foi avaliado, nomeadamente, a situação profissional e económica da família do recorrente, seria duramente atingida em caso de se vir privada daquele de quem depende inteiramente o seu sustento.
10.° Conforme exposto no n.° 1 do art.° 109.° da Lei do Trânsito Rodoviário, "O tribunal pode suspender a execução das sanções de inibição de condução ou de cassação da carta de condução por um período de 6 meses a 2 anos, quando existirem motivos atendíveis."
11.° A revogação da suspensão da execução da pena só deverá ter lugar quando estiverem esgotados ou se mostrarem de todo ineficazes as restantes providências contidas na lei Penal.
12.° A revogação só deverá ter lugar como última ratio, isto é, quando estiverem esgotadas ou se revelarem de todo ineficazes as restantes providências, certo é que, no caso em apreço e tomando em conta a atitude do Recorrente.
13.° A eficácia de lançar mão aos outros meios ou providências contidas na lei, como por exemplo, prorrogar o período da suspensão da execução da sanção acessória de inibição de condução, já que com o seu comportamento o recorrente demonstrou que se cumpriram as expectativas que motivaram a concessão da suspensão da execução da pena.
14.° Dos factos provados não se colhem que as finalidades que estavam na base da suspensão não puderam; por meio dela, ser alcançadas, não estando, pois, esgotadas as possibilidades de uma socialização do ora recorrente em liberdade.
15.° A sensibilidade da Mm.° Juiz "ad quo" foi no sentido de negar em dar uma chance ao recorrente, ponderadas todas as razões atinentes à prevenção geral e especial.
16.° Dessa posição discorda o recorrente, considerando que o circunstancialismo do caso concreto aponta para uma manutenção da suspensão da execução da sanção acessória de inibição de condução, ou mesmo assim não entendendo, a Mm.° até pode prorrogar o tal período da suspensão, dando assim uma oportunidade ao Recorrente.
17.° Razões pelas quais, ao decidir-se diversamente, o despacho recorrido, por um lado, a não manutenção a suspensão da execução da sanção acessória de inibição de condução aplicada ou a respectiva prorrogação, ao ora Recorrente, representa um vício de erro notório na apreciação da prova, e do vício de violação de lei ao disposto do n.° 1 do art.° 54.° do CP e n.° 1 do art.° 109.° da Lei do Trânsito Rodoviário”.
A final, pede a “revogação da decisão recorrida substituindo-a por uma outra medida, que não a revogação da suspensão da execução da sanção acessória de inibição de condução aplicada”; (cfr., fls. 107 a 115 que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).

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Respondendo, pugna o Exmo. Magistrado do Ministério Público pela integral confirmação da decisão recorrida; (cfr., fls. 117 a 120).

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Admitido o recurso, e remetidos os autos a este T.S.I., em sede de vista, emitiu a Ilustre Procuradora Adjunta douto Parecer, pugnando também pela confirmação da decisão recorrida.

Eis o teor do dito Parecer:

“Inconformando com o douto despacho judicial que decidiu revogar a suspensão da execução da pena acessória de inibição de condução que lhe tinha sido concedida, vem A interpor recurso, invocando vício de erro notório na apreciação da prova e imputando a violação da norma contida no n° 1 do art° 54° do CPM e no n° 1 do art° 109° da Lei do Trânsito Rodoviário.
A Magistrada do Ministério Público evidencia já a sem razão do recorrente.
Constata-se nos presentes autos que:
- Por sentença proferida em 12-11-2010 nos presentes autos, o recorrente foi condenado, pela prática de um crime de condução em estado de embriaguez, p.p. pelo art° 90° n° 1 da Lei n° 3/2007 (Lei do Trânsito Rodoviário), na pena de 3 meses de prisão, substituída por igual tempo de multa, à razão de 100 patacas por dia, o que perfaz um montante de 9,000 patacas, e na pena acessória de inibição de condução por período de 1 ano e 3 meses, e suspensa na sua execução por 1 ano e 6 meses nos termos do art.° 109° n° 1 da mesma Lei.
Tendo sido notificado desta sentença no mesmo dia, que transitou em julgado em 22-11-2010.
No processo n° CR4-11-0160-PCC, o recorrente foi condenado pela prática em 23-11-2010 de um crime de homicídio por negligência p.p. art.° 134° n° 1 do CPM, com conjugação do art.° 93° n° 1 da Lei n° 3/2007, na pena de 2 anos de prisão, suspensa na sua execução por 2 anos, e na pena acessória de inibição de condução por período de 1 ano, e suspensa na sua execução por 2 anos nos termos do art° 109° n°l da mesma Lei.
Daí resulta que, no decurso da suspensão da execução das penas decretadas nos presentes autos, o recorrente voltou a praticar novo crime previsto na Lei do Trânsito Rodoviário e foi condenado, o que levou o Tribunal a concluir que a mera ameaça da execução da pena, nomeadamente a pena acessória de inibição de condução, não obteve o seu desiderato base, ou seja, evitar que o recorrente cometesse qualquer outro ilícito, pelo que revogou a suspensão da execução por período de 1 ano e 3 meses, pela prática de um crime de condução em estado de embriaguez, p.p. pelo art.° 90° n° 1 da Lei n° 3/2007 (Lei do Trânsito Rodoviário).
1- Não se vê aqui a verificação do vício de erro notório na apreciação da prova previsto no art.° 400 n° 2 al. c) do CPPM.
No caso vertente, e sendo de ter em conta o disposto no art.° 54° do CPM, por força do preceituado no art.° 124° do mesmo diploma legal, evidente se nos mostra que censura não merece a decisão recorrida (cfr. o Ac. do TSI, de 01-12-2011, Proc. n° 647/2011 ).
Como se sabe, para fazer funcionar o instituto de revogação da suspensão previsto no art.° 54° do CPM, é necessário verificar que, durante o período da suspensão da execução da pena, o condenado viole grave e reiteradamente os deveres ou regras de conduta impostos ou cometa outro crime pelo qual venha a ser condenado, e se revele que as finalidades que motivaram a suspensão já não puderam ser alcançadas por este meio.
Igualmente, é de afirmar que a revogação da suspensão da execução da pena acessória tem como pressuposto a prática de nova infracção que implique a inibição de condução.
Tudo depende da prognose formulada sobre a realização ou não das finalidades que estavam na base da suspensão decretada.
Neste aspecto, parece-nos que, no caso vertente, a resposta deve ser negativa.
De facto, o recorrente cometeu, no período da suspensão da sua inibição de condução e somente 11 dias depois desta condenação, novo crime e infracção, e ainda, o crime de "homicídio por negligência", ligado ao acto de condução, a defraudar, manifestamente, a realização das finalidades da suspensão da inibição de conduzir anteriormente concedida.
2- O recorrente pugna a existência o vício de erro de interpretação e de aplicação de direito previsto no art.° 400° n° 1 do CPPM, por carecer de consideração a natureza da profissão do recorrente como motivo atendível para o efeito da suspensão da execução da pena acessória de inibição de condução, nos termos do art.° 109° n° 1 da Lei n° 3/2007.
Aqui, chegados, tal como alega o recorrente, será aplicar automaticamente a dita norma, isto é, o tribunal tem de suspender a execução da tal sanção de inibição de condução em razão de o recorrente ser condutor profissional por mais de 20 anos e depender economicamente da profissão de condutor?
Analisados os autos, entendemos que não se pode reconhecer razão ao recorrente, pois não se vislumbra que o douto despacho judicial ora recorrido tenha violado a regra e a norma legal acima mencionada.
Estipula-se no n° 1 do art° 109°, da citada Lei a possibilidade de suspensão da execução da sanção de inibição de condução, quando existirem motivos atendíveis.
Não queremos opinar a contrário quanto ao entendimento do ilustre Tribunal da 2°. Instância, "Só se coloca a hipótese de suspensão da interdição da condução, caso o agente seja um motorista ou condutor profissional com rendimento dependente da condução de veículos" (v. doutos acórdãos do T.S.I. com n°s 717/2008, de 19/03/2009, 248/2010, de 27/05/2010 e 66/2010, de 25/03/2010).
No entanto, não podemos deixar de considerar, nos casos da aplicação da pena de inibição de condução, como noutros da aplicação de outras penas, as finalidades e as limitações estipuladas nos art°s 40° e 65° do CPM. Sendo a culpa do agente e as exigências de prevenção criminal como os princípios e critérios da determinação da medida da pena.
In casu, em comparação com casos semelhantes anteriormente julgados, relativamente ao recorrente, da matéria de facto apurada, não resulta nenhuma condição atenuante ou favorável ao agente (v. os doutos acórdãos proferidos nos processos do Tribunal de Segunda Instância com nas 130/2010, de 22/07/2010), nomeadamente, pelo facto de não ser primeiro, duas condenações respectivamente por crime de condução em estado de embriaguez e de homicídio por negligência, causando a morte a terceiro, e ambas já operam quando à forma de suspensão da pena de inibição de condução, por ser condutor profissional nos termos do art.° 109° n° 1 da Lei n.° 3/2007.
Pelo exposto, entendemos que se deve negar provimento ao recurso e manter-se o douto despacho judicial ora recorrido”; (cfr., fls. 132 a 134-v).

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Nada obstando, passa-se a decidir.

Fundamentação

Dos factos

2. Estão provados os seguintes factos com interesse para a decisão a proferir:

- por sentença de 12.11.2010, proferida nos Autos de Processo Sumário n.° CR3-10-0220-PSM, foi o ora recorrente condenado como autor da prática de 1 crime de “condução em estado de embriaguez”, p. e p. pelo art. 90°, n.° 1 da Lei n.° 3/2007, na pena de 3 meses de prisão, substituindo-se tal pena por igual período de multa à taxa diária de MOP$100.00, perfazendo a multa de MOP$9.000,00, e na pena acessória de inibição de condução por 1 período de 1 ano e 3 meses, suspensa na sua execução por 1 ano e 6 meses;
- por Acórdão de 17.02.2012, proferido nos Autos de Processo Comum Colectivo n.° CR4-11-0160-PCC, foi o mesmo recorrente condenado pela prática de 1 crime de “homicídio por negligência”, p. e p. pelo art. 134°, n.° 1 do C.P.M. e art. 93°, n.° 1, da Lei n.° 3/2007, na pena de 2 anos de prisão suspensa na sua execução por 2 anos, e na pena acessória de inibição de condução por 1 ano, também suspensa na sua execução por 2 anos.
- perante esta segunda condenação, o Mmo Juiz titular do processo da “primeira condenação” decidiu revogar a suspensão da execução da pena acessória aí decretada, sendo esta a decisão objecto do presente recurso.

Do direito

3. Como se deixou relatado, vem o arguido recorrer do despacho datado de 17.01.2013, pelo Mmo Juiz do T.J.B. proferido, que lhe revogou a suspensão da execução da pena acessória de inibição de condução por 1 ano e 3 meses decretada por sentença de12.11.2010.

Entende que a decisão recorrida padece de “erro notório na apreciação da prova” e de “violação ao disposto no n.° 1 do art. 54° do CP e n.° 1 do art.° 109.° da Lei do Trânsito Rodoviário”.

Cremos porém que não tem o recorrente razão, não se podendo acolher a pretensão pelo mesmo apresentada (de revogação da decisão recorrida), já que a dita decisão recorrida fez correcta aplicação dos preceitos legais que incidem sobre a questão.

De facto, importa atentar não no estatuído no n.° 1, invocado pelo recorrente, onde se prevê a possibilidade da suspensão desta pena acessória, mas sim no n.° 2 do art. 109° da mencionada Lei n.° 3/2007, onde se prescreve que:

“Se durante o período de suspensão se vier a verificar nova infracção que implique a inibição de condução, a sanção de inibição de condução a aplicar é executada sucessivamente com a suspensa”.

E, constatando-se que os factos que deram lugar à “segunda condenação” do ora recorrente implicam a sanção da inibição de condução, (cfr., art. 94°, n.° 1 da dita Lei 3/2007), certo sendo também que tiveram lugar no dia 23.11.2010, (um dia após o trânsito em julgado da sentença da “primeira condenação”), portanto, “durante o período da suspensão”, pouco há a dizer.

Na verdade, atento o estatuído no art. 109°, n.° 2 da Lei n.° 3/2007, em sede da mencionada “2ª condenação”, nem se devia (podia) decidir por uma pena acessória de inibição de condução “suspensa na sua execução”, pois que, como aí se preceitua “a sanção de inibição de condução a aplicar é executada sucessivamente com a suspensa”.

Todavia, não é esta a decisão objecto do presente recurso, e, assim, em causa estando (agora) a execução da pena acessória de inibição de condução decretada na “1ª condenação”, nenhuma censura merece a decisão da revogação da suspensão da sua execução, evidente sendo a improcedência do recurso, impondo-se a sua rejeição nos termos do art. 410°, n.° 1 do C.P.P.M..

Decisão

4. Nos termos e fundamentos expostos, em conferência, acordam rejeitar o recurso; (cfr., art. 409°, n.° 2, al. a) e 410, n.° 1 do C.P.P.M.).

Pagará o recorrente 4 UCs de taxa de justiça, e como sanção pela rejeição do seu recurso, o equivalente a 4 UCs; (cfr., art. 410°, n.° 4 do C.P.P.M.).

Macau, aos 13 de Junho de 2013

José Maria Dias Azedo
Chan Kuong Seng
Tam Hio Wa
Proc. 121/2013 Pág. 16

Proc. 121/2013 Pág. 17