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Processo nº 251/2013
(Autos de Recurso Civil e Laboral)

Data: 30 de Maio de 2013

ASSUNTO:
- Marca
- Capacidade distintiva

SUMÁRIO:
   - A marca é um sinal distintivo de produtos e serviços de uma empresa dos de outras empresas, daí que o seu registo exige a capacidade distintiva.
- Tanto “COTAI” como “COTAI STRIP” indicam uma determinada zona específica da RAEM onde se desenvolvem as actividades de jogo, hotelaria, lazer e entretenimento.
- Assim, um consumidor médio, ao ver a expressão “COTAI STRIP COTAITravel”, não obstante a existência da palavra “Travel” em itálico e que tem o sentido de uma actividade ligada a transporte, deslocação e movimentos físicos, pode não saber se se tratar duma marca do produto ou duma publicidade à zona geográfica da RAEM onde se desenvolvem as actividades de jogo, hotelaria, lazer e entretenimento, bem como pode não saber, em concreto, qual a entidade exploradora desse produto ou dessas actividades, uma vez que existem diferentes entidades titulares de licença para a exploração de jogos de fortuna e azar que praticam as mesmas actividades na referida zona.
- Não possuindo capacidade distintiva, não pode ser objecto do registo.
O Relator,
Ho Wai Neng


Processo nº 251/2013
(Autos de Recurso Civil e Laboral)

Data: 30 de Maio de 2013
Recorrentes: Direcção dos Serviços de Economia
A
Recorrida: B

ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:

I – Relatório
Por sentença de 21/09/2012, foi decidido julgar procedente o recurso judicial interposto pela B e, em consequência, anulou-se a decisão da Direcção dos Serviços de Economia (DSE), recusando assim a concessão do registo da marca nº N/37773 a favor da A, para a classe de produtos nº 18.
Dessa decisão vêm recorrer tanto a Direcção dos Serviços de Economia, como A, alegando, em sede de conclusão, respectivamente, o seguinte:
Conclusões da DSE:
“Como se verifica existem duas interpretações judiciais em relação a estas marcas: a primeira, elabora uma análise dissecando a marca palavra por palavra e assim conclui que não existe capacidade distintiva e, por outro lado, o carácter enganoso da marca; a segunda, no sentido da marca ser analisada no seu todo e assim adquirir capacidade distintiva e de não se tratar de marca enganosa porque, a localização geográfica é usada sem conduzir os consumidores a pensar que esses produtos / serviços, que lhe andam associados, têm essa proveniência, no sentido de ali serem fabricados / prestados, sendo, por sua vez, a localização geográfica verdadeira.
A marca registanda é uma designação de fantasia, tem capacidade distintiva, não contem nenhuma falsa indicação de proveniência e o seu registo não ocasiona actos de concorrência desleal, pelo que, é de manter o despacho de concessão e revogar-se a sentença recorrida.”
Concluões da A:
a) A marca N/37773 COTAI STRIP COTAITravel é uma marca nominativa complexa, em cuja composição surge apenas uma palavra que pode ser considerada descritiva, já é constitui um topónimo, COTAI.
b) Tanto STRIP como TRAVEL constituem, na marca em causa, expressões de fantasia, o que confere à marca um carácter geral de fantasia.
c) A STRIP correspondem as palavras portuguesas tira, faixa, pista.
d) TRAVEL é também uma expressão de fantasia, já que, mesmo que se aceite que se trata de vocábulo que se reporta a uma actividade normalmente ligada à actividade de viagens, conforme consta da fundamentação da decisão recorrida, a marca N/37773, destinada a assinalar produtos diversos da classe 18.ª, não está ligada a esse sector de viagens.
e) Ao considerar que a marca COTAI STRIP COTAITravel é toda ela composta por sinais que designam apenas características de bens, isto é, a sua natureza e a sua proveniência geográfica, a decisão recorrida incorre num manifesto erro de julgamento e faz uma errada aplicação das normas contidas no artigo 197.° e na alínea b) do n.º 1 do artigo 199.° do RJPI.
f) Esto erro de julgamento resulta, aparentemente, de uma errada leitura do que sejam os produtos que com a marca N/37773 a Recorrente pretende assinalar.
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Foram colhidos os vistos legais.
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II – Factos
Foi considerada como provada a seguinte factualidade pelo Tribunal a quo:
a) Em 30.07.2008 A requereu o registo da marca N/37773 para a classe de produtos n° 18 a qual consiste no seguinte:
COTAI STRIP COTAITravel
b) Por despacho de 13.12.2011 proferido a fls. 16 dos autos do Processo Administrativo apensos, foi concedido o registo da marca referida.
c) Tal Despacho foi publicado no Boletim Oficial da RAEM, n° 1, II Série, de 04.01.2012.
d) Em 03.02.2012 foi apresentado no Tribunal a quo o recurso.
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Foram colhidos os vistos legais.
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III – Fundamentação
   O presente recurso consiste em saber se a marca N/37773 possui capacidade distintiva, susceptível de ser objecto de protecção pelo registo.
   Como se sabe, a marca é um sinal distintivo de produtos e serviços de uma empresa dos de outras empresas.
   A constituição da marca, em princípio, é livre. Pode ser constituída por um sinal ou conjunto de sinais nominativos, fonéticos, figurativos ou emblemáticos, ou por uma e outra coisa conjuntamente. Pode ser ainda composta pelo formato de um produto ou da respectiva embalagem (artº 197º do RJPI)
   Todavia, esta liberdade de composição da marca não é ilimitada.
   A lei estabelece, a este respeito, várias restrições, uma das quais é justamente a constituição da marca tem de ser dotada de eficácia ou capacidade distintiva.
   Assim, a marca não pode ser exclusivamente composta por sinais ou indicações que possam servir no comércio para designar a espécie, a qualidade, a quantidade, o destino, o valor, o lugar de origem, a época de produção dos produtos ou que se tenham tornado usuais na linguagem corrente ou nos hábitos leais e constantes do comércio (artº 199º do RJPI).
   Referem-se aqui, nas palavras do Prof. Ferrer Correia, os chamados sinais descritivos dos produtos.
   Para o mesmo autor, os sinais descritivos dos produtos só não poderão preencher, de per si, o conteúdo da marca se forem usados sem modificação. A proibição já não valerá quando, através de alterações gráficas e fonéticas, se lhes atribua um conteúdo original e distintivo.
   No caso em apreço, a marca em causa é composta simplesmente por caracteres “COTAI STRIP COTAITravel”.
A palavra “COTAI” ou a expressão “COTAI STRIP”, na RAEM, tem um significado especial, que se refere a uma localização geográfica específica desta Região Administrativa Especial, isto é, o local situado entre as Ilhas da Taipa e de Coloane.
Aliás, a palavra “COTAI” resulta da síncope das palavras Coloane e Taipa.
Com a instalação de hotéis luxos e casinos na zona em referência, “COTAI” ou “COTAI STRIP” é actualmente uma zona específica da RAEM onde se desenvolvem as actividades de jogo, hotelaria, lazer e entretenimento pelos diferentes titulares de licença para a exploração de jogos de fortuna e azar.
Quanto à palavra “COTAITravel”, a mesma resulta da composição das palavras “COTAI” e “Travel”
Já vimos que a palavra “COTAI” é uma designação geográfica.
A palavra “Travel” tem o sentido de uma actividade ligada a transporte, deslocação e movimentos físicos.
É certo que esta palavra não tem nada a ver com os produtos a que a marca registanda visa assinalar.
Mas isto será suficiente para afirmar que a marca registanda dispõe da capacidade distintiva para efeitos do seu registo?
Um consumidor médio, ao ver a expressão “COTAI STRIP COTAITravel” num saco de tiracolo, por exemplo, conseguiria identificar o produto, estabelecendo uma relação entre este produto com o agente económico que o produziu (A)?
Salvo o devido respeito, entendemos que a resposta não deixa de ser negativa.
Vejamos a sua razão de ser.
O que sobressai da referida expressão são as palavras “COTAI” e “STRIP”.
Como já referimos que tanto “COTAI” como “COTAI STRIP”, que constituem como elemento essencial da marca registanda, indicam uma determinada zona específica da RAEM onde se desenvolvem as actividades de jogo, hotelaria, lazer e entretenimento.
Nesta conformidade, um consumidor médio, ao ver a referida expressão “COTAI STRIP COTAITravel”, não obstante a existência da palavra “Travel” em itálico e que tem o sentido de uma actividade ligada a transporte, deslocação e movimentos físicos, pode não saber se se tratar duma marca do produto ou duma publicidade à zona geográfica da RAEM onde se desenvolvem as actividades de jogo, hotelaria, lazer e entretenimento, bem como pode não saber, em concreto, qual a entidade exploradora desse produto ou dessas actividades, uma vez que existem diferentes entidades titulares de licença para a exploração de jogos de fortuna e azar que praticam as mesmas actividades na referida zona.
Aliás, como a própria DSE, também ora recorrente, reconhece na sua contestação que “O Consumidor, vulgo uma publicidade bem conseguida, associa os serviços “Cotai Strip”(…) à Recorrida Particular (A) como também coliga a marca “City of Dreams” (…) à Recorrente (B) – cfr. fls. 50 dos autos, último parágrafo.
Por outro lado, foi requerido o registo da mesma marca para várias classes de produtos, o que, a nosso ver, dificulta ainda mais a identificação do produto visado, pois, o consumidor pode acabar por não saber, afinal de contas, qual é o produto que a marca visa assinalar em concreto (Será a marca do próprio produto ou publicidade de um outro produto?).
Não é de acolher a posição de que as palavras “COTAI” e “COTAI STRIP” estão associadas com as actividades desenvolvidas pela ora recorrente A naquela zona específica da RAEM.
É certo que a ora recorrente A foi a primeira entidade que desenvolveu as actividades de jogo, hotelaria, lazer e entretenimento no COTAI STRIP.
Mas isto não significa que um consumidor médio iria associar desde logo estas palavras com as actividades desenvolvidas por ela, pois, como já referimos anteriormente, coexistem outras entidades da mesma natureza no COTAI STRIP e o sucesso daquela zona como centro de entretenimento relacionado com as actividades de jogo, hotelaria e lazer nunca pode resultar do esforço de uma só entidade, mas sim do contributo global de várias entidades, quer privadas, quer públicas.
Face ao expendido, se conclui que a marca registanda N/37773 não tem capacidade distintiva, pelo que não pode ser objecto do registo.
Assim, os recursos sub justice não deixarão de se julgar improcedentes.
Tudo visto, resta decidir.
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IV – Decisão
Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam em negar provimento aos recursos interpostos, confirmando a sentença recorrida
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Custas pelas recorrentes, sendo a DSE gozar da isenção subjectiva.
Notifique e registe.
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RAEM, aos 30 de Maio de 2013.

Ho Wai Neng
José Cândido de Pinho
Lai Kin Hong




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251/2013