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Recurso nº 346/2009
Recorrente: A
Recorridos : B,
  C,
  D,
  E,
  F,
  G,
  H,
  I,
  J,
  K,
  L,
  M e
N (未成年人- 由N代表)(menor – representado por M)



A cordam no Tribunal de Segunda Instância da R.A.E.M.:
Os seguintes autores:
1. B: casado, natural de Macau, de nacionalidade chinesa, portador do Bilhete de identidade de residente de Macau.
2. C: viúva, de nacionalidade chinesa, portador do Bilhete de identidade de residente de Macau.
3. D: maior solteiro, de nacionalidade chinesa, ora residente em Macau, portador do Bilhete de Identidade de Residente permanente de Macau.
4. E: de nacionalidade chinesa, casado com O em regime da comunhão de adquiridos, ora residente em Macau, portador do Bilhete de Identidade de Residente Permanente de Macau.
5. F: de nacionalidade chinesa, casado com P em regime da comunhão de adquiridos, ora residente em Macau, portador do Bilhete de Identidade de Residente Permanente de Macau.
6. G: maior, solteira, de nacionalidade chinesa, ora residente em Macau, portador do Bilhete de Identidade de Residente Permanente de Macau.
7. H: de nacionalidade chinesa, casado com Q em regime da comunhão de adquiridos, portador do Bilhete de Identidade de Residente Permanente de Macau.
8. I: de nacionalidade chinesa, casado com R em regime da comunhão de adquiridos, ora residente em Macau, portador do Bilhete de Identidade de Residente Permanente de Macau.
9. J: viúva, de nacionalidade chinesa, ora residente em Macau, portador do Bilhete de Identidade de Residente Permanente de Macau.
10. K: maior, solteira, de nacionalidade chinesa, ora residente em Macau, portador do Bilhete de Identidade de Residente Permanente de Macau.
11. L: solteira, maior, de nacionalidade chinesa, ora residente em Macau, portador do Bilhete de Identidade de Residente Permanente de Macau.
12. M: viúva, de nacionalidade chinesa, ora residente em Macau, portadora do Bilhete de Identidade de Residente Permanente de Macau.
e
13. N: do sexo feminino, menor, solteira, residente na mesma morada, portadora do Bilhete de Identidade de Residente Permanente de Macau, representada por M,
propôs acção de despejo contra A, com residência em Macau, pedindo:
I. ver resolvido o contrato de arrendamento;
II. condenar os réus a despejar imediatamente o imóvel arrenda de proceder à sua entrega livre de ónus e devoluto;
III. pagar as rendas em dívida desde o mês de Abril de 2003 no montante de MOP$11,160.00 (onze mil cento e sessenta patacas);
IV. pagar a título de indemnização por falta do pagamento pontual das rendas mensais devidas e já vencidas desde o mês de Abril de 2003 de acordo com o art. 996º do Código Civil no valor MOP$22,322.00 (vinte e duas mil trezentas e vinte patacas) e
V. do pagamento das rendas vencidas na pendência da presente acção, caso não tenha feito o depósito das mesmas, acrescido dos respectivos juros de mora calculados à taxa legal.
Correndo os normais termos processuais, o Mmº Juiz Titular do processo decidiu que:
I. declara resolvido o contrato verbal de arrendamento celebrado em 1968, entre a autora C, por si e em representação dos restantes autores e o réu A;
II. condena o réu a desocupar imediatamente o local arrendado, deixando –o devoluto de pessoas e bens;
III. condena ainda o réu a pagar as rendas vencidas e não pagas, no montante de MOP$10,800.00, referente ao período compreendido entre Junho de 2003 e Maio de 2008 e as que vencerem, caso não venham a ser pagas até à efectiva desocupação, todos acrescidas de juros contados a partir das datas de vencimento de cada uma das rendas até ao integral pagamento contabilizados à taxa legal;
IV. absolve o réu do pedido dos autores constantes na al. IV) da p.i.
Com esta sentença não conformou, recorreu para este Tribunal A, alegando nos seus precisos termos da peça das alegações constantes das fls. 126 a 136)1.
A este recurso respondeu apenas o autor B que se alegou que:
1. A douta sentença proferida não incorre em qualquer vício processual ou material que permita anular a decisão proferida.
2. O recorrente não observou o disposto no artigo 598º n.º 2 al. a), b) e c) do Código de Processo Civil relativamente ao alegado erro de julgamento do Tribunal, devendo assim, a parte do recurso relativo ao mesmo ser rejeitado.
3. A douta sentença não condenou em quantidade superior ao pedido ao estabelecer a obrigação do pagamento das rendas que se vencerem até efectiva desocupação da fracção, não sendo, como tal nula.
4. Efectivamente a sentença proferida não só observou o pedido formulados pelos Autores, como também observou o disposto no artigo 996º do Código de Processo Civil ao rejeitar o pagamento da indemnização em virtude de ter declarado resolvido o contrato verbal de arrendamento celebrado em 1968, entre a Autora C, por si e em representação dos restantes Autores e o Réu A.
5. O pagamento da renda, compreende uma obrigação pecuniária de prazo certo, que deve seguir o regime geral das obrigações no que respeita à mora devendo por isso vencer juros legais a cotar da data da constituição em mora de acordo com o artigo 795º do Código Civil.
6. Com efeito, a obrigação de pagamento da renda corresponde a uma obrigação de prazo certo, ademais caso assim não fosse, sempre poderíamos dizer que a vontade das partes tem o limite imposto pelo Princípio da Pontualidade das obrigações e da boa-fé negocial.
7. Os Autores, pelo menos a partir de uma certa altura, efectivamente, interpelaram, e por diversas vezes, o Réu no sentido do pagamento das rendas em atraso e este sempre se recusou a fazer, ou seja, na eventualidade de ter havido mora dos Autores, esta deixou de existir a partir do momento em que os Autores voltaram a interpelar o Réu para o pagamento das referidas rendas.
8. O recorrente não pagou as rendas reclamadas e vencidas, antes de proposta a acção, nem a correspondente indemnização, assim, sendo, de acordo com o artigo 1019º do Código Civil, o direito do Autor requerer a resolução do contrato por falta de pagamento da renda, é legitimo, próprio e adequado ao fim pretendido, devendo adoptar-se a forma de Processo Especial prevista no artigo 929º do Código de Processo Civil, para efectivação do mesmo.
9. Esteve bem a decisão proferida na sentença ao considerar que procedente a acção especial de despejo.
   Nestes termos deve o presente recurso ser julgado improcedente e, em consequência ser mantida a sentença recorrida.
   Mais, se requer a V. Exa. se dignem fixar o efeito suspensivo ao recurso apresentado pelo Réu, depois de cumprida a formalidade prevista no n.º 2 do artigo 934º do Código de Processo Civil.

Cumpre-se decidir.
Foram colhidos os vistos legais.

À matéria de facto foi dada por assente a seguinte factualidade:
- Os Autores são proprietários no regime da propriedade privada do prédio urbano composto de r/c, 1º e 2º andar, sito em Macau, freguesia da Sé, na Rua Leste do Mercado de S. Domingos, n.º 21, inscrito na matriz predial sob o n.º 010862, descrito na Conservatória do Registo Predial de Macau sob o n.º 7645 do livro B-25, a fls. 71v.
- A propriedade do imóvel encontra-se inscrita a favor dos Autores sob o nº 150786 do Livro G.
- Com o valor matricial de MOP$75,400.00 (setenta e cinco mil e quatrocentas patacas).
- Os Autores adquiriam a propriedade do mencionado imóvel através de sucessão “mortis causa”, na qualidade de herdeiros legítimos de S.
- E por virtude da partilha do acervo hereditário deixado pelo inventariado S cujos Autos de Inventário Facultativo correram termos junto de douto Tribunal Judicial de Base, sob o Proc. n.º CV3-05-0042-CIV deste 3º Juízo Cível.
- Os Autores procederam a todas as formalidades legais, nomeadamente, à liquidação do Imposto Sucessório em relação à sucessão hereditária do prédio n.º 21 da Rua Leste do Mercado de S. Domingos.
- Não existe, relativamente ao supra identificado imóvel, quaisquer dívidas à Fazenda da Região Administrativa Especial de Macau.
- Por volta do ano de 1968, a Autora C, e já no estado de viúva de S e a pedido do Réu, concordou em dar ao mesmo de arrendamento, o 2º andar do prédio sito em Macau na Rua Leste do Mercado de S. Domingos no nº 21.
- O Réu arrendou o mencionado imóvel com o propósito de lá habitar com a sua família.
- E, sob a condição de o restituir à Autora C quando por ela tal fosse solicitado, pela mesma via verbal.
- Foi ainda acordado, entre a mesma Autora e o Réu, o pagamento da quantia de MOP$80,00 (oitenta patacas) por mês.
- Quantia essa que foi elevada para MOP$180,00 (cento e oitenta patacas) por mês, a partir do ano 2000.
- As quantias supra referidas foram sendo pagas com certa regularidade, no dia 20 de cada mês.
- Em numerário, e o local onde a Autora C exercia a sua actividade comercial, isto é, na Rua Leste do Mercado de S. Domingos n.º 19, no Bairro de S. Domingos.
- As rendas eram pagas na pessoa do Réu ou da esposa deste, directamente à Autora C.
- Nos últimos anos, eram pagas directamente à nora da mesma, O, em virtude de a Autora C já não trabalhar e o negócio ter passado a ser explorado pelos seus filhos e respectivos cônjuges.
- O Réu sempre cumpriu a sua obrigação de pagar a renda até ao mês de Abril do ano de 2003.
- A partir do mês de Abril do ano de 2003, o Réu não mais cumpriu a sua obrigação de pagamento da renda acordada com a Autora C.
- Desde o final do ano de 2003, reiteradamente, os Autores têm advertido e interpelado pessoalmente o Réu para que este procedesse à regularização das rendas em atraso.
- Em meados do mês de Outubro do ano de 2007, o Autor E, abordou o Réu informando-o que quer a sua mãe quer os seus irmãos, e na altura na qualidade de legítimos proprietários do imóvel em causa, não estavam mais interessados em manter o acordo de arrendamento, com fundamento do de o Réu incorrer continuamente no inadimplemento do mesmo, tanto por falta de pagamento das rendas, como por ter dado um fim diverso ao imóvel daquele que fora estipulado com a Autora C.
- O Réu, até à presente data, ainda não liquidou as rendas em atraso nem procedeu à devolução do imóvel.
    
    Conhecendo.
    No seu recurso, o recorrente invocou em cada conclusão uma questão jurídica, a saber:
    1ª Conclusão: dos meios de prova de que a decisão utilizou não resultou provado o incumprimento por parte do réu e a não procedida interpelação por parte dos autores, deve tomar uma decisão favorável ao réu nos termos do artigo 437º do Código de Processo Civil;
    2ª e 3ª Conclusões: Erro na consideração de irrelevância do facto de não reconhecimento por parte dos autores da qualidade de arrendatário do réu, factor esse que relaciona efectivamente com o abuso de direito e a culpa na falta de pagamento das rendas por parte dos autores. Para tal, citou a declaração publicada nos jornais dos autores, do não reconhecimento da qualidade do arrendatário do réu, facto este que deve ser considerado como facto notório;
    4ª Conclusão: o direito da acção da resolução dos autores caducou-se por a acção não ter sido proposta dentro de um ano;
    5ª Nulidade da sentença por ter decidido fora do pedido, referente à condenação de “… as que vencerem, caso não venham a ser pagas, até à efectiva desocupação”, nos termos do artigo 571º nº 1 al. e) do CPC;
    6ª Sob princípio da derrogabilidade da lei especial sobre a lei geral, não deve o Tribunal considerar o efeito jurídico geral da mora do devedor, mas sim a mora especial do arrendatário, sem ter assim decidido o Tribunal incorreu no erro na aplicação da regra geral no caso concreto;
    7ª Conclusão: O artigo 996º do Código Civil não estabeleceu a indemnização pelos juros de mora no caso de resolução do contrato de arrendamento, esta parte da decisão deve ser revogada.
    Nesta conformidade, o recorrente pediu:
    - a absolvição do réu, com o fundamento contido na 4ª conclusão, por caducidade do direito da acção;
    - Subsidiariamente, julgar improcedente a acção, com as 1ª, 2ª e 3ª conclusões;
    - declarar nula a sentença respeitante a parte “as que vencerem, caso não venham a ser pagas, até à efectiva desocupação”;
    - revogar a decisão na parte referente a “todos acrescidas de juros contados a partir das datas de vencimento de cada uma das rendas até ao integral pagamento contabilizados à taxa legal”.
    Vejamos.
    
    Questão prévia – Lei aplicável
    Como está provado que o contrato, sendo embora de forma verbal, foi celebrado em 1968, a lei aplicável será o Código Civil, com a necessária adaptação, nos termos do disposto no artigo 17º do D.L. nº 39/99/M, de 3 de Agosto, que aprovou o Código Civil, independentemente do disposto no artigo 3º do Decreto-Lei nº 12/95/M de 14 de Agosto, que aprovou o Regime do Arrendamento Urbano.
    
1. Caducidade de pedir da resolução do contrato
    Prevê o artigo 1018º do Código Civil que: “[a] acção de resolução deve ser proposta dentro de 1 ano a contar do conhecimento do facto que lhe serve de fundamento, sob pena de caducidade.”
    Trata-se esta uma disposição geral da caducidade do direito de pedir a resolução do arrendamento, por qualquer dos fundamentos legais, nomeadamente previstos no artigo 1034º e 1017º do mesmo Código Civil.
    Em caso especial do fundamento por não pagamento da renda, o locatário ainda pode fazer o caduco do direito de pedir a resolução do arrendamento nos termos do artigo 1019º, que prevê que: “[o] direito à resolução do contrato por falta de pagamento da renda ou aluguer caduca logo que o locatário, até à contestação da acção destinada a fazer valer esse direito, pague ou deposite as somas devidas e a indemnização referida no artigo 996º”.
    Está provado que “Por volta do ano de 1968, a Autora C, e já no estado de viúva de S e a pedido do Réu, concordou em dar ao mesmo de arrendamento, …”, “O Réu sempre cumpriu a sua obrigação de pagar a renda até ao mês de Abril do ano de 2003”.
    Está ainda provado o contrato foi celebrado verbalmente, sem estabeleceu o prazo da sua duração.
    Sendo embora, o Código Civil prevê a duração máxima do contrato de arrendamento de 30 anos, ao contrato de arrendamento a lei estabeleceu um prazo supletivo de um ano, nos termos do artigo 974º. Sendo assim, aplicando o regime de renovação autónoma nos termos do artigo 1038º nº 1, o contrato sempre é sendo considerado renovado por um ano. Quer isto implica, face ao regime de caducidade do direito de pedir da resolução, cada ano em que o locatário não paga a renda constitui um novo fundamento para a resolução, por falta de pagamento de renda, ou seja, em cada ano renovado do contrato, na manutenção da falta do pagamento da renda, não fica caduco o seu direito de pedir da resolução.
    
2. Julgamento de matéria de facto
    Sendo fundamento subsidiário, o recorrente impugnou o julgamento de matéria de facto, entendendo que o Tribunal violou a regra de confissão das partes, por um lado, por ter dado comprovado o facto constante dos articulados nº 26º da p.i., enquanto os nºs 29 e 30 ficaram fora dos factos provados, por outro, na sua contestação articulado 27º negou expressamente os factos constantes do articulado nº 26; entendeu também que o Tribunal deveria dar como provado o facto de não reconhecimento da qualidade do arrendatário do réu, face o facto notório resultado do anúncio publicado no jornal (fl. 90, sendo documento nº 1 junto da contestação).
    Disseram os articulados nºs 29 e 30 da p. i. que:
    - O réu tem-se escusado ao cumprimento da sua obrigação de pagar a renda.
    - Argumentando que também tem “direitos” sobre o imóvel em causa!
    Enquanto o articulado nº 26º disse que:
    - Data a partir da qual, o réu não mais cumpriu a sua obrigação de pagamento da renda acordada com a autora C.
    Depois, o Tribunal deu-se como provado o nº 26, conjuntamente com o articulado nº 27 “razão pela qual, desde o final do ano 2003”, que “A partir do mês de Abril de 2003, o réu não mais cumpriu a sua obrigação de pagamento da renda acordada com a autora C”.
    Como é óbvio, a matéria constante do articulado nº 29 é da mesma do articulado nº 26º, enquanto a do nº 30 não se afigura necessário e útil para a alegação dos autores. Não vimos qual utilidade a repetição da mesma matéria de facto.
    Quanto ao anúncio publicado no jornal, foi o anúncio publicado pelo réu em que se diz, ele, sendo arrendatário, tem vindo pago as rendas, uma vez o senhorio C não reconhece a qualidade do arrendatário, devia ser ele responsável pela sua palavra.
    Sendo uma mera declaração unilateral do próprio arrendatário, por um lado, os factos declarados nunca podiam ser, pelo facto de ser a declaração publicada no jornal, considerados como factos notórios; por outro, com a tal declaração, apesar de ser publicado no jornal, nunca se pode comprovar o facto de não reconhecimento por parte do senhorio da qualidade de arrendatário do declarante. E ainda podemos dizer, mesmo que se tratasse de um documento autêntico, só poderia comprovar o facto de ter prestou a mesma declaração e já não os factos declarados que poderia considerados como verdadeiros.
    Ou seja, o anúncio nunca pode comprovar o facto de não reconhecimento da qualidade do arrendatário por parte dos autores.
    Assim sendo, não estando dado como provado o dito reconhecimento, não haverá lugar a falar da relevância dessa negação.
    
3. Nulidade da sentença
    Arguiu o recorrente a nulidade da sentença do vício previsto no artigo 571º nº 1 al. e) do Código de Processo Civil, por ter decidido em objecto diverso do pedido, porquanto o Tribunal decidiu condenar o réu, entre outros montantes, “a pagar as rendas vencidas e não pagas, no montante de MOP$10,800.00, referente ao período compreendido entre Junho de 2003 e Maio de 2008 e as que vencerem, caso não venham a ser pagas até à efectiva desocupação, todos acrescidas de juros contados a partir das datas de vencimento de cada uma das rendas até ao integral pagamento contabilizados à taxa legal” (sub. nosso), enquanto os autores se limitaram a pedir a condenação do réu a “pagar as rendas em dívida desde o mês de Abril de 2003 no montante de MOP$11,160.00 (onze mil cento e sessenta patacas)”.
    Do texto dos pedidos, podemos ver claramente que os autores pediram as rendas em dívida e as rendas vencerem na pendência da acção e a indemnização pela falta do pagamento das rendas, caso não proceda o depósito das rendas em dívida, todos estes acrescentam os juros de mora.
    O Tribunal a quo decidiu, absolvendo a 4º pedido que é “pagar a título de indemnização por falta do pagamento pontual das rendas mensais devidas e já vencidas desde o mês de Abril de 2003 de acordo com o art. 996º do Código Civil no valor MOP$22,322.00 (vinte e duas mil trezentas e vinte patacas)”, resolver o contrato e ordenar o despejo do imóvel e o pagamento das rendas vencidas e não pagas e as que vencerem caso não venham a ser pagas até à efectiva desocupação.
    Sendo embora o momento da efectiva desocupação não diz exactamente ao momento do efectivo pagamento das rendas em dívida, ambos não se cingidos nos pedidos dos autores, pelo que se verificou a efectiva condenação em objecto diverso do pedido, apesar do abrangimento parcial do pedido. Nesta parte deve ser nula, ou seja a parte referente na condenação a “as que vencerem, caso não venham a ser pagas até à efectiva desocupação” deve ser retirada.
    Dá-se assim procedente o recurso nesta parte.
    Não obstante a declaração da nulidade desta parte, este Tribunal de recurso, sob regime de substituição, decidir em conformidade nos termos do disposto no artigo 630º nº 1 do Código de Processo Civil.
    De facto, enquanto a sentença não absolveu o réu do V pedido, a parte em causa deveria ser entendida como abrangente ao pedido dessa parte, ou seja, a condenação deveria ser seguinte:
    Condenar o réu a pagar as rendas vencidas e não pagas, no montante de MOP$10,800.00, referente ao período compreendido entre Junho de 2003 e Maio de 2008 e as que vencerem na pendência da presente acção.
    
4. Juros de mora em caso de resolução do contrato de arrendamento
    O recorrente entendeu que tendo sido servido do fundamento da resolução do contrato de arrendamento a falta de pagamento de renda, não pode ser levado à consideração também da indemnização pelos juros de mora, se não consubstancia uma violação do princípio de derrogabilidade da regra especial (na acção de despejo) à regra geral (na acção de indemnização).
    O tribunal a quo decidiu que ”a pagar as rendas vencidas e não pagas, no montante de MOP$10,800.00, referente ao período compreendido entre Junho de 2003 e Maio de 2008, acrescidas de juros contados a partir das datas de vencimento de cada uma das rendas até ao integral pagamento contabilizados à taxa legal” (já foi subtraída a parte da decisão em objecto diverso do pedido, em consequência da decisão supra).
    Prevê o artigo 996º do Código Civil (na sentença onde se referiu este artigo, por lapso, referiu o Código de Processo Civil), sob epígrafe de “mora do locatário”, que:
    “1. Constituindo-se o locatário em mora, o locador tem o direito de exigir, além das rendas ou alugueres em atraso, uma indemnização igual a metade do montante que for devido, salvo se o contrato for resolvido com base na falta de pagamento; se o atraso exceder 30 dias, a indemnização referida é aumentada para o dobro.
    2. Cessa o direito à indemnização ou à resolução do contrato, se o locatário fizer cessar a mora no prazo de 8 dias a contar do seu começo.
    3. Enquanto não forem cumpridas as obrigações a que o n.º 1 se refere, o locador tem direito a recusar o recebimento das rendas ou alugueres seguintes, os quais são considerados em dívida para todos os efeitos.
    4. A recepção de novas rendas ou alugueres não priva o locador do direito à resolução do contrato ou à indemnização referida, com base nas prestações em mora.
    5. À mora do locatário no pagamento das rendas ou alugueres não pode ser aplicada a sanção prevista no artigo 333º.”2
    Efectivamente o decidido mostra-se também diverso ao pedido, pois, os autores pediram apenas “do pagamento das rendas vencidas na pendência da presente acção, caso não tenha feito o depósito das mesmas, acrescido dos respectivos juros de mora calculados à taxa legal”, e neste pedido foi aposto a condição da condenação: caso não tenha feito o depósito das mesmas, porque só o pedido assim deduzido corresponderia ao espírito da lei, nos termos do disposto no nº 1 do artigo 997º do Código Civil, pelo qual faz cessar a mora com o depósito das rendas de dívida.
    O que nos parece é que esta parte da decisão não está correcta.
    Por outro lado, quanto aos fundamentos do recurso nesta parte, não podemos deixar de dizer, o recorrente impugnou uma incorrecta decisão com uma questão falsa. Se não vejamos.
    O pedido de pagamento de juros de mora pressupõe a existência da mora.
    Concordamos com o entendimento jurídico do recorrente, quanto ao efeito jurídico da falta de pagamento das rendas que se serve de um fundamento da acção de despejo, mas digamos que, esse só se refere às rendas em dívidas, e, nesta parte, de facto, os autores não deduziram o pedido da indemnização dos juros de mora (al. III dos pedidos). Este efeito jurídico não podia estender além do acto da citação, momento donde inicia a mora do devedor – artigo 401º do Código de Processo Civil e artigo 794º nº 1 do Código Civil, e neste caso, a situação jurídica não se mantinha na aplicação da dita regra especial, mas sim entrou na aplicação da regra geral de mora.
    Como resulta dos autos, o réu, ora recorrente, fez depósito das rendas em causa, o que produzia efeitos jurídicos de cessar a mora dele no pagamento das rendas, pelo qual não está satisfeita a condição da condenação do pagamento dos juros de mora, nos termos do V pedido.
    Assim sendo e de qualquer maneira, por fundamento diverso, a parte da decisão ora recorrida, quanto aos juros de mora, deve ser revogada.
    Ponderado, resta decidir.
    
    Pelo exposto, acordam neste Tribunal de Segunda Instância em conceder provimento parcial ao recurso interposto pelo réu e em consequência:
    - alterar a III parte da decisão e o réu passa a ser condenado a pagar as rendas vencidas e não pagas, no montante de MOP$10,800.00, referente ao período compreendido entre Junho de 2003 e Maio de 2008 e as que vencerem, na pendência da presente acção, caso não venham a ser pagas.
    - manter-se a restante decisão, por não foi objecto do recurso.
    Custas pelo recorrente e recorridos, na proporção do seu decaimento.
RAEM, aos 6 de Junho de 2013

_________________________
Choi Mou Pan
(Relator)

_________________________
João Augusto Gonçalves Gil de Oliveira
(Primeiro Juiz-Adjunto)

_________________________
Ho Wai Neng
(Segundo Juiz-Adjunto)

1 Tem a versão chinesa o seguinte:
1. 被上訴判決所採納之證據方法,並未能證實上訴人不履行與原告曾作出催告,根據《民事訴訟法典》第437條,應作出不利於原告的判決,即視該等事實未能證實;
2. 被上訴法院錯誤認為原告不承認被告為租客一事與本案無關,事實上該事實牽涉到原告的權利濫用欠繳租金的過錯;
3. 報章聲明所載之事實屬眾所周知之事實,證實了原告不承認上訴人為承租人事,應將之列入既證事實中,並宣告原告濫用權利及其在欠繳租金一事中之過錯;
4. 不論是持續性債務還是一時性債務,解除之訴均由解除依據之事實時起一年內提起,否則該訴權失效,被上訴判決認為該期間尚未開始是錯誤的,所以上訴法院應宣告原告之訴權失效;
5. 被上訴判決作出“as que vencerem, caso não venham a ser pagar, até à efectiva desocupação”的判決,明顯不屬於起訴狀內之請求,依《民事訴訟法典》第571條第一款e)項,上訴法院應宣告該判決無效;
6. 鑒於特別法優於一般法的法律適用原則,本案不應考慮債務人遲延的一般後果,只應考慮承租人遲延這一特別後果,然而被上訴判決錯誤將一般規定適用於特別法所規範之具體個案當中;
7. 依《民事訴訟法典》第996條內對租賃合同因欠繳租金而解除所規定之法定後果的立法精神,解除租賃合同已經構成充分的制裁,因此立法者並沒有為租金的遲延訂立利息。所以上訴法院應廢止被上訴裁判當中“todas acrescidas de juros contados a partir das datas de vencimento de cada uma das rendas até ao integral pagamento, contabilizados à taxa legal”之部份。
由上述之分析可見,尊敬的 中級法院法官閣下應判決:
a. 根據結論iv)及相關之理由陳述,宣告原告之訴權失效,從而駁回原告提出的勒遷之訴;倘不這樣認為,則根據結論i)、ii)和iii),以及相關之理由陳述,判決原告提出勒遷之訴不成立,並宣告原告濫用權利及其在欠繳租金一事中為過錯方;
b. 根據結論v)與及相關之理由陳述,上訴法院應宣告被上訴判決“as que vencerem, caso não venham a ser pagar, até à efectiva desocupação”屬無效;
c. 根據結論vi)和vii)與及相關之理由陳述,上訴法院應廢止被上訴裁判當中“todas acrescidas de juros contados a partir das datas de vencimento de cada uma das rendas até ao integral pagamento, contabilizados à taxa legal”之部份。
2 Prevê o artigo 333º que:
Artigo 333.º (Sanção pecuniária compulsória)
1. O tribunal, em acréscimo à condenação do devedor no cumprimento da prestação a que o credor tenha contratualmente direito, à cominação de pôr termo à violação de direitos absolutos ou à condenação na obrigação de indemnizar, pode, a requerimento do titular do direito violado, condenar o devedor a pagar ao ofendido uma quantia pecuniária por cada dia, semana ou mês de atraso culposo no cumprimento da decisão ou por cada infracção culposa, conforme se mostre mais conveniente às circunstâncias do caso; a culpa no atraso do cumprimento presume-se.
2. A sanção pecuniária compulsória não pode ser estabelecida para o período anterior ao trânsito em julgado da sentença que a ordene, nem para o período anterior à liquidação da indemnização, salvo se o devedor for condenado por ter interposto recurso com fins meramente dilatórios, caso em que a aplicação da sanção é reportada à data da notificação da decisão que a tenha cominado.
3. A sanção pecuniária compulsória só será cominada quando o tribunal a considere justificada e será fixada segundo a equidade, atendendo à condição económica do devedor, à gravidade da infracção e à sua adequação às finalidades de compulsão ao cumprimento.
4. Não é aplicável a sanção pecuniária compulsória nos casos em que tenha sido estabelecida uma cláusula penal compulsória com os mesmos fins, ou nas decisões em que se condene o devedor no cumprimento de uma prestação de facto infungível, positivo ou negativo, que exija especiais qualidades científicas ou artísticas do obrigado, a que o credor tenha contratualmente direito.
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TSI-.346-2009 Página 1