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Processo n.º 666/2012 Data do acórdão: 2013-7-11 (Autos em recurso penal)
Assuntos:
– art.o 321.o, n.o 4, alínea a), do Código de Processo Penal
– requerimento de prova
– tema probando
– insuficiência para a decisão da matéria de facto provada
– art.o 400.o, n.o 2, alínea a), do Código de Processo Penal
– erro notório na apreciação da prova
– art.o 400.o, n.o 2, alínea c), do Código de Processo Penal
S U M Á R I O
1. Segundo o art.o 321.o, n.o 4, alínea a), do Código de Processo Penal, os requerimentos de prova são indeferidos se for notório que as provas requeridas são irrelevantes ou supérfluas.
2. Se do teor da fundamentação fáctica do acórdão recorrido, se retira que o tribunal seu autor já investigou todo o tema probando (constituído in casu apenas pela matéria fáctica descrita na acusação, por não ter sido apresentada contestação pelo arguido) com pertinência à decisão do mérito da acusação, não é possível ocorrer o vício aludido no art.o 400.o, n.o 2, alínea a), do Código de Processo Penal.
3. Como depois de vistos todos os elementos probatórios dos autos, não se vislumbra como evidente ao tribunal ad quem que o tribunal recorrido, ao ter julgado a matéria de facto como o fez concretamente no seu acórdão, tenha violado alguma regra da experiência da vida humana em normalidade de situações, ou violado alguma norma jurídica cogente sobre o valor da prova, ou violado quaisquer legis artis a observar na tarefa jurisdicional de julgamento de factos, não pode o arguido recorrente vir sindicar gratuitamente a livre convicção a que chegou esse tribunal sob aval do art.o 114.o do Código de Processo Penal, improcedendo, pois, o esgrimido vício de erro notório na apreciação da prova referido no art.o 400.o, n.o 2, alínea c), do mesmo Código.
O relator,
Chan Kuong Seng

Processo n.º 666/2012
(Autos de recurso penal)
Recorrente (arguido): A








ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU
I – RELATÓRIO
Inconformado com o acórdão proferido a fls. 408 a 415v dos autos de Processo Comum Colectivo n.° CR1-10-0058-PCC do 1.o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base, que o condenou, como autor material, na forma consumada, de um crime de burla em valor elevado, p. e p. pelo art.o 211.º, n.º 3, com referência ao art.o 196.o, alínea a), ambos do vigente Código Penal (CP), na pena de um ano e nove meses de prisão, e de um crime de falsificação de documento, p. e p. pelo art.o 244.o, n.o 1, alínea a), do mesmo Código, na pena de sete meses de prisão, e, em cúmulo dessas duas penas, na pena única de dois anos de prisão efectiva, e na obrigação de pagar MOP86.100,00 (oitenta e seis mil e cem patacas) de indemnização pecuniária, arbitrada oficiosamente, à ofendida Associação de Pais e Professores do Colégio B de Macau (澳門B中學家長教師會), com juros legais contados desde a data desse acórdão até integral e efectivo pagamento, veio o arguido A, aí já melhor identificado, recorrer para este Tribunal de Segunda Instância (TSI), para alegar e peticionar, em essência, o seguinte na sua motivação de recurso (apresentada a fls. 427 a 444 dos presentes autos correspondentes):
– a título principal arguindo, houve violação, por parte do Tribunal recorrido, do princípio da investigação, aquando da tomada de decisão de não audição de todas as testemunhas arroladas pelo recorrente para descoberta da verdade (mormente acerca da questão de existência da deliberação da Associação sobre a aquisição de casacos e “pins”, e da questão de existência do indivíduo chamado “C.”), para além de ter havido também erro notório na apreciação da prova e insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, daí que deveria ser ele absolvido, ou ser declarado nulo o acórdão condenatório;
– e subsidiariamente fCdo, houve violação do art.o 48.o, n.o 1, do CP, devido à decidida não suspensão da pena de prisão, pelo que deveria merecer ele a suspensão da pena de prisão, por ser um delinquente primário, casado e com os filhos a cargo;
– e ainda subsidiariamente fCdo, houve excesso na medida das penas, por incorrecta aplicação sobretudo do art.o 65.o do CP, pelo que deveriam ser atenuadas as penas por que vinha condenado em primeira instância.
Ao recurso respondeu (a fls. 455 a 457 dos autos) a Digna Delegada do Procurador junto do Tribunal recorrido, no sentido de procedência parcial do recurso, com consequente determinação da suspensão de execução da pena de prisão, sob condição de pagamento da indemnização à ofendida e de prestação de uma contribuição pecuniária a favor da Região Administrativa Especial de Macau em valor não inferior a MOP50.000,00.
Subidos os autos, emitiu a Digna Procuradora-Adjunta parecer (a fls. 471 a 473), pugnando pelo provimento parcial do recurso, nos termos opinados na resposta ao recurso.
Feito o exame preliminar, corridos os vistos e realizada a audiência neste TSI, cumpre decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA
Do exame dos autos, sabe-se o seguinte, com pertinência à solução do recurso:
A. O arguido ora recorrente, depois de notificado pessoalmente, em 22 de Fevereiro de 2012, do despacho de designação da data para audiência de julgamento (com cópia da acusação deduzida pelo Ministério Público) e do despacho judicial de nomeação de sua Defensora Oficiosa (cfr. as certidões de notificação exaradas respectivametne a fls. 245 e 247 dos autos), apresentou no dia seguinte, à Secção Central do Tribunal Judicial de Base com indicação do número dos subjacentes processos penais, uma exposição somente subscrita por ele a contestar a acusação, com três anexos, sendo o primeiro dos quais um rol de 21 testemunhas (ora concretamente constante de fls. 259 a 260). E nessa exposição (a fls. 248 a 257), o arguido afirmou materialmente (nas linhas 20 a 24 da fl. 256) que ouviu dizer que C era um dos trabalhadores voluntários da “ISIA Macau” e responsável pela coordenação do assunto de adjudicação, a terceiro no Interior da China, do trabalho de concepção de casacos e “pins”, além disso, o arguido defendeu na mesma exposição (na última linha da mesma fl. 256 e nas linhas 7 a 8 da fl. 257) que todos os dados e documentos tinham sido por ele obtidos na sede da “ISIA Macau”, e que não tinha chegado ele a produzir qualquer documento, pelo que não poderiam proceder os dois acusados crimes de falsificação de documentos.
B. Em face do que, a M.ma Juíza titular do mesmo processo, com fundamento em que tal exposição (com anexos) tinha sido apresentado pela própria pessoa do arguido, ordenou, por despacho de 8 de Março de 2012 (a fl. 299), que se desse conhecimento de todo o expediente em causa à Ex.ma Defensora do arguido para tratamento tido por adequado por esta, tendo esse despacho sido objecto de carta registada de 16 de Março de 2012, dirigida à mesma Ex.ma Defensora (cfr. o processado a fls. 300 a 300v).
C. Na relação de receitas e despesas finaneiras da “ISIA Macau” referida na factualidade descrita na acusação pública, consta que no período de 1 de Janeiro de 2007 a 31 de Dezembro de 2007, a “ISIA Macau” teve uma receita no valor de MOP96.600,00.
D. O Tribunal Colectivo ora recorrido, depois de feita a audiência de julgamento em 14 de Maio de 2012 com audição do próprio arguido, e, inclusivamente, dos dois sobrinhos deste como duas das testemunhas de acusação (cfr. o teor da acta da audiência lavrada a fls. 406 a 407v), acabou por dar materialmente provada toda a factualidade descrita na acusação, excepto na parte em que se imputou ao arguido a apresentação de um recibo falsificado à ofendida Associação, com intuito de alcançar vantagem ilegítima (cfr. o teor do acórdão recorrido, constante de fls. 408 a 415v).
E. Segundo a matéria de facto dada por assente no acórdão recorrido (e aí descrita originalmente em chinês, com tradução para português aqui feita pelo ora relator), e na sua essência:
– no dia 1 de Fevereiro de 2001, o arguido A, o seu sobrinho C (conhecido também por “C”) e a sua sobrinha D foram ao 2.o Cartório Notarial de Macau para criar uma associação com a denominação literal de “Information and Software Industry Association (澳門資訊及軟件業商會)” (“ISIA Macau”), e conforme uma acta de reunião sem assinatura de participantes na reunião, o arguido foi eleito como presidente da Direcção, e os seus sobrinho e sobrinha ficaram a desempenhar as funções de tesoureiro e de secretária, respectivamente;
– em 12 de Abril de 2001, o arguido e o seu sobrinho foram abrir no Banco Luso Internacional de Macau uma conta em nome da “ISIA Macau”, a qual só precisava de uma assinatura para ser válida;
– após criada, a “ISIA Macau” nunca realizou qualquer assembleia geral de associados, não tinha acta de reuniões, nem relatório de contas;
– em 2006, o arguido desempenhava as funções de presidente da Comissão Executiva da Associação de Pais e Professores do Colégio B de Macau (Associação ora ofendida), cujo tesoureira, chamada E, era responsável pela gestão das verbas da Associação e tinha à sua guarda a conta bancária da Associação, cujos cheques careciam de assinaturas conjuntas do presidente e do vice-presidente ou da tesoureira;
– em 15 de Julho de 2007, a Associação ofendida reuniu-se, com agenda, para deliberação, sobre, inclusivamente, a compra de casacos contra vento e de “pins” para serem oferecidos ao director e ao pessoal docente do Colégio, mas não se deliberou sobre quem é que iria ser nomeado para acompanhar este assunto, e em várias reuniões posteriores, também não se falou do assunto;
– em 15 de Outubro de 2007, o arguido disse à referida senhora E que ele já tinha incumbido alguém para fabricar os “pins”, e por isso precisava de pagar as despesas de fabrico. E alegando a urgência do tempo como motivo, o arguido exigiu à senhora E que emitisse um cheque da conta da Associação ofendida, sem preenchimento do montante, para que ele o arguido pudesse pagar as despesas de fabrico de “pins”. Por confiar no arguido, essa senhora, a pedido do arguido, assinou num cheque e o entregou ao arguido, para este preencher o montante do cheque;
– depois de obter o cheque, o arguido preencheu aí como tomador “ISIA Macau” e como montante MOP96.600,00, e assinou, e veio depositar o cheque, em 29 de Outubro de 2007, na conta bancária da “ISIA Macau” junto do Banco Luso Internacional;
– em 19 de Junho de 2008, um indivíduo desconhecido, por via de telecópia, mandou à senhora E um recibo da “ISIA Macau”, com sinete de “C”, do qual constavam o montante total de MOP96.600,00, e preço unitário de fabrico de “pin” em MOP920,00; o arguido levou também 105 “pins” ao Colégio;
– com base na avaliação feita pela Agência Comercial de Troféus “F” (F獎品公司), a Associação ofendida considerou que o preço justo (incluindo o preço de concepção) para cada “pin” era de MOP100,00, o que dava o total de MOP10.500,00 para a encomenda de fabrico de 105 “pins”, tendo, por isso, ficado a própria Associação com o prejuízo pecuniário de MOP86.100,00, dinheiro esse que o arguido não chegou a repor, e foi por isso que a Associação ofendida deliberou, em 17 de Outubro de 2008, em denunciar o arguido;
– em 21 de Novembro de 2008, o arguido apresentou aos subjacentes autos penais seis páginas de documento, uma das quais respeitante a uma relação de receitas e despesas financeiras da “ISIA Macau”, com assinaturas de tesoureiro e de verificador (mas com desconhecimento da identidade e dos nomes dos assinantes), e com a indicação do nome “C.” como pessoa de lançamento das contas;
– segundo os dados da Direcção dos Serviços de Identificação, a “ISIA Macau” não chegou a apresentar a lista nominativa do seu órgão gerente;
– o arguido, de modo livre, voluntário e consciente, e mediante plano, usou a “ISIA Macau” por si controlada, e aproveitou-se da intenção da Associação ofendida de encomendar o fabrico de “pins”, para dizer falsamente ao pessoal gestor da Associação ofendida que ele já tinha encarregado a “ISIA Macau” de conceber e fabricar os “pins”, fazendo com que o órgão gestor da Associação ofendida tenha acreditado erroneamente na necessidade de o arguido pagar o preço em causa e, por isso, tenha emitido um cheque com montante não preenchido; o arguido, depois, veio declarar preço falso de fabrico, e preencheu o montante de MOP96.600 no cheque, e após levantado o montante no banco, fez seu o montante; conduta essa do arguido que causou à Associacão ofendida prejuízo pecuniário elevado; o arguido também apresentou, intencionalmente, um relatório financeiro com conteúdo e assinaturas não correspondentes à verdade, com o intuito de ocultar a verdade dos factos; o arguido sabia claramente que a sua conduta era violadora da lei e era punível por lei;
– o arguido é sócio de empresa, com salário mensal de MOP50.000,00;
– o arguido é casado, e precisa de sustentar dois filhos;
– o arguido é delinquente primário.
F. Segundo a fundamentação do acórdão recorrido, o arguido negou a prática dos factos acusados.
III – FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
De antemão, é de notar que mesmo em processo penal, e com excepção da matéria de conhecimento oficioso, ao tribunal de recurso cumpre resolver só as questões material e concretamente alegadas na motivação do recurso e ao mesmo tempo devidamente delimitadas nas conclusões da mesma, e já não responder a toda e qualquer razão aduzida pela parte recorrente para sustentar a procedência das suas questões colocadas (nesse sentido, cfr., de entre muitos outros, os acórdãos do TSI, de 7 de Dezembro de 2000 no Processo n.o 130/2000, de 3 de Maio de 2001 no Processo n.o 18/2001, e de 17 de Maio de 2001 no Processo n.o 63/2001).
O arguido começou a apontar ao Tribunal recorrido a violação do princípio da investigação, aquando da materialmente decidida não audição de todas as testemunhas então por si arroladas para efeitos de descoberta da verdade sobretudo no tocante à existência da deliberação da Associação ofendida sobre a aquisição de casacos e “pins”, e à existência do indivíduo chamado “C.”.
Pois bem, o art.o 297.o, n.o 1, do actual Código de Processo Penal (CPP), conjugado com o art.o 6.o, n.o 2, do Decreto-Lei n.o 55/99/M, de 8 de Outubro, aprovador do vigente Código de Processo Civil, determina que o arguido, em dez dias a contar da notificação do despacho que designa dia para a audiência, apresenta, querendo, a contestação, acompanhada do rol de testemunhas.
Dos elementos processuais coligidos dos autos e referenciados na parte II do presente acórdão de recurso, flui que no prazo de dez dias contados da notificação pessoal do arguido do despacho de designação da data para audiência de julgamento, a sua Ex.ma Defensora Oficiosa não apresentou a contestação escrita nem qualquer rol de testemunhas em nome do arguido.
Assim sendo, afigura-se que não pode vir o arguido suscitar, na sua motivação de recurso, a alegada questão de ter o Tribunal a quo decidido materialmente em não ouvir todas as testemunhas por si arroladas no dia 23 de Fevereiro de 2012, com assacada violação do princípio da investigação.
Na verdade, se nunca foi apresentada contestação escrita nem qualquer rol de testemunhas pela Ex.ma Defensora Oficiosa em nome do arguido no prazo legal para o efeito, é processualmente injusto acusar agora que o Tribunal a quo violou o princípio da investigação, por alegada “decisão de não audição de todas as testemunhas do arguido”.
E mesmo que se entendesse que a própria pessoa do arguido poderia subscrever e apresentar por si só a contestação escrita e o respectivo rol de testemunhas, sempre seria de dizer o seguinte:
O art.o 321.o do CPP reza, no seu n.o 1, que o tribunal ordena, oficiosamente ou a requerimento, a produção de todos os meios de prova cujo conhecimento se lhe afigure necessário à descoberta da verdade e à boa decisão da causa, e no subsequente n.o 4, alínea a), que os requerimentos de prova são ainda indeferidos se for notório que as provas requeridas são irrelevantes ou supérfluas.
No caso dos autos, quanto à existência, defendida pelo próprio arguido, da deliberação da Associação ofendida sobre a aquisição de casacos e “pins”, isto já saiu materialmente provado no acórdão ora recorrido, pelo que há que cair por terra a tese de falta de investigação disto pelo Tribunal a quo.
E no tangente à prova da existência do indivíduo chamado “C.”, é mister chamar a atenção do recorrente para o facto de que ele, na exposição apresentada pela sua própria pessoa em 23 de Fevereiro de 2012, nunca pôs em causa a existência desse “C.”, mas se limitou a afirmar que foi esse C responsável pela adjudicação, a terceiro no Interior da China, do trabalho de concepção dos casacos e “pins”.
Por isso, não se vislumbra nenhuma razão plausível para o arguido vir suscitar só agora na sua motivação de recurso, a necessidade de feitura da prova da existência desse C.
De resto, essa alegadamente necessária prova não passa de ser uma questão irrelevante para sustentar a improcedência da acusação no concernente ao crime de falsificação de documento (i.e., da relação de receitas e despesas ou do relatório financeiro da “ISIA Macau”), porquanto independentemente da existência ou não, no mundo real em Macau, de algum indivíduo com esse nome “C.” ou “C”, a falsidade do teor desse relatório, segundo a lógica da acusação, interpretada no seu conjunto, reside propriamente na questão de não veracidade do preço de MOP96.600,00 de fabrico (incluindo a concepção) de “pins” e das assinaturas de “tesoureiro” e “verificador” apostas no relatório finaneiro, pelo que era realmente supérflua toda a produção da prova tendente a indagar da existência, ou não, de “C.” como pessoa lançadora da receita de MOP96.600,00 no referido relatório finaneiro da “ISIA Macau”.
Do exposto decorre, sob a égide do art.o 321.o, n.o 4, alínea a), do CPP, a não violação, pelo Tribunal recorrido, do princípio da investigação.
E agora no respeitante ao assacado vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, a razão também não está no lado do arguido, visto que do teor da fundamentação fáctica do acórdão recorrido, se retira que o Tribunal recorrido já investigou todo o tema probando (in casu, constituído apenas pela matéria fáctica descrita na acusação, já que não foi apresentada qualquer contestação escrita pela Ex.ma Defensora Oficiosa de então, em nome do arguido) com pertinência à decisão do mérito da acusação então deduzida pelo Ministério Público, daí que não é possível ocorrer o vício aludido no art.o 400.o, n.o 2, alínea a), do CPP.
E como depois de vistos todos os elementos probatórios dos autos, não se vislumbra ao presente Tribunal ad quem como evidente que o Tribunal recorrido, ao ter julgado a matéria de facto como o fez concretamente no seu acórdão, tenha violado alguma regra da experiência da vida humana em normalidade de situações, ou violado alguma norma jurídica cogente sobre o valor da prova, ou violado quaisquer legis artis a observar na tarefa jurisdicional de julgamento de factos, não pode o arguido vir sindicar gratuitamente a livre convicção a que chegou o Tribunal recorrido sob aval do art.o 114.o do CPP.
Improcede assim o recurso nesta parte relativa ao esgrimido vício referido no art.o 400.o, n.o 2, alínea c), do CPP.
Outrossim, tidos em conta todos os factos e circunstâncias já apurados pelo Tribunal recorrido com relevância aos padrões da medida concreta da pena vertidos nos art.os 40.o, n.os 1 e 2, 65.o, n.os 1 e 2, e 71.o, n.os 1 e 2, do CP, não se mostram excessivas as penas parcelares e única da prisão já achadas no aresto recorrido, dentro das respectivas molduras penais aplicáveis de prisão.
E sobre a subsidiária pretensão de pena suspensa, já assiste alguma razão ao recorrente.
Sendo ele um delinquente primário, e atento o montante concreto de prejuízo por ele causado à Associação ofendida (o qual embora seja legalmente considerado elevado por ser superior a 30 mil patacas, não é dinheiro avultado), é de suspender-lhe, nos termos do art.o 48.o, n.o 1, do CP, a execução, pelo período de quatro anos, da pena única de prisão imposta no acórdão recorrido.
Contudo, atendendo a que é dever do arguido reparar o mal dos dois crimes praticados, a suspensão da prisão tem que ser condicionada (nos termos do art.o 49.o, n.o 1, alínea a) e c), do CP):
– à apresentação, por ele, dentro de seis meses contados do trânsito em julgado do presente acórdão de recurso, da prova do efectivo pagamento total da quantia indemnizatória arbitrada em MOP86.100,00 (oitenta e seis mil e cem patacas) pelo Tribunal a quo (com juros já vencidos desde a data do acórdão recorrido) a favor da Associação ofendida;
– e à prestação, no prazo de dez meses contado do trânsito em julgado do presente aresto, de MOP50.000,00 (cinquenta mil patacas) de contribuição a favor da Região Administrativa Especial de Macau.
IV – DECISÃO
Dest’arte, acordam em julgar parcialmente provido o recurso, passando a determinar a suspensão, por quatro anos, e sob as duas condições acima referidas, de execução da pena única de dois anos de prisão imposta no acórdão recorrido ao arguido.
Por ter decaído na esmagadora maioria da fundamentação do seu recurso, pagará o arguido 90% das custas do presente processado recursório, com dezoito UC de taxa de justiça correspondente a essa proporção.
Comunique à Associação ofendida.
Macau, 11 de Julho de 2013.
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Chan Kuong Seng
(Relator)
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Tam Hio Wa
(Primeira Juíza-Adjunta)
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José Maria Dias Azedo
(Segundo Juiz-Adjunto)



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