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Processo nº 498/2009
(Autos de Recurso Civil e Laboral)

Data: 23 de Janeiro de 2014

ASSUNTO
- Selecção da matéria de facto

SUMÁRIO
- Não é de selecionar os factos que, ainda que fossem provados, nada poderiam afectar ou modificar a decisão recorrida, quer por si, quer em conjugação com os outros já provados.
Relator,
Ho Wai Neng

Processo nº 498/2009
(Autos de Recurso Civil e Laboral)

Data: 23 de Janeiro de 2014
Recorrentes: A, B e C (1º, 2ª e 5º Réus)
D e E (Autores)
Recorridos: Os Mesmos
F e G (3ª e 4º Réus)

ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:

I – Relatório
Por despacho saneador de 24/07/2007, julgou-se improcedente a invocada excepção de ilegitimidade activa dos Autores bem como a alegada ilegitimidade passiva do 5º Réu.
Dessa decisão vêm recorrer os 1º, 2ª e 5º Réus, alegando, em sede de conclusões, o seguinte:
Do 1º Réu:
A. A identificação da lei competente que regula a sucessão não é uma questão irrelevante.
B. Isto porque a lei aplicável à sucessão do H é a lei da RAEHK, na qual não existe a figura do herdeiro legitimário, o que obstava a que os AA. pudessem ter configurado a sua legitimidade com base no disposto no n.° 2 do artigo 234.° do CCM, conforme expressamente fizeram nos artigos 74. ° e 75. ° da sua petição inicial.
C. Faltando aos AA. a qualidade de herdeiros legitimários, falta-lhes, também legitimidade para, nessa qualidade, impugnar quaisquer negócios susceptiveis de prejudicar as suas quotas legitimárias.
D. A decisão contida no douto despacho recorrido no sentido de julgar irrelevante a determinação da lei aplicável à sucessão do H e improcedente a excepção da ilegitimidade activa dos AA. violou os artigos 30.°, n.º 1 e 2, 59.°, n.º 2 e 234.°, n.º 2, todos do CCM.
Dos 2ª e 5º Réus:
1. Os AA. não têm legitimidade activa para propuseram a presente acção, uma vez que não têm qualquer direito em relação às fracções autónomas cuja transmissão pretendem arguir, porquanto, como herdeiros legitimários, a parte da herança em que sucedem, a legítima, não seria potencialmente diminuída com essa transmissão;
2. O 5.° R. não tem legitimidade passiva, uma vez que não ocupa qualquer posição ou interesse em tal relação.
3. E enferma de vários vício de violação de lei, em particular das seguintes normas jurídicas:
a) n.ºs 1 e 2, do art. 30º, art. 59.º, n.º 2 do art. 234.º, os arts. 1997º e 2000.º, todos do CC;
b) Os arts. 58.°, n.º 2 do art. 412.°, e al. e) do art. 413, todos do CPC;
*
Os Autores responderam à motivação dos recursos dos 1º, 2ª e 5º Réus nos termos constantes a fls. 567 a 576 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, pugnando pela improcedência dos mesmos.
*
Por sentença de 15/01/2009, julgou-se improcedente a acção e, em consequência, absolveu-se os Réus do pedido.
Dessa decisão vêm recorrer os Autores, alegando, em sede de conclusão, o seguinte:
1. Os Recorrentes imputam à douta sentença recorrida a violação do disposto no art.º 430.°, n.º 1 do Código de Processo Civil.
2. Assim como, e em consequência da violação desse preceito legal, imputam à douta sentença recorrida a nulidade do art.º 571.°, n.º 1, alínea d), do mesmo diploma.
3. Na sua petição inicial, alegaram os AA factos integradores de simulação e a falsidade da procuração que serviu da base à venda das fracções.
4. Na sua Réplica, vieram os AA alegar erro do falecido devido a dolo dos RR na outorga da procuração.
5. Em consequência do que pediram a admissão da modificação operada da causa de pedir, por ser legalmente permitida e a declaração de nulidade do contrato formalizado pela escritura de 20 de Fevereiro de 2003, em virtude de a procuração que instruíu tal escritura ter sido obtida com base em erro essencial do falecido H, consequente do dolo dos 2.ª, 3.ª e 4.° RR, e declaradas, igualmente, nulas e de nenhum efeito as referidas escrituras.
6. Proferido o douto despacho saneador, a matéria de facto assente e a base instrutória, constataram os AA que na última se não continha a matéria de facto necessária à apreciação de direito das várias questões colocadas, nomeadamente decorrentes da ampliação da causa de pedir e do pedido formulada na sua Réplica.
7. Apresentando subsequente reclamação e propondo a adição de novos quesitos julgados essenciais à boa decisão da causa.
8. Tal reclamação foi desatendida com fundamento em que os factos constantes da Base Instrutória eram já os suficientes e necessários ao conhecimento do mérito da causa, segundo as várias soluções plausíveis de direito, considerando meramente circunstanciais e sem relevo os novos quesitos propostos.
9. Do despacho proferido sobre as reclamações não cabe recurso, apenas podendo ser impugnado no recurso interposto da decisão final, podendo, a final, a parte vencida suscitar a reapreciação do despacho que decidiu as reclamações, enxertando este no recurso da decisão final.
10. Pretendem os AA ora recorrentes, pois, trazer à douta apreciação desse Venerando Tribunal a limitação para si decorrente da deficiência da matéria de facto levada à Base Instrutória.
11. Na base instrutória devem constar os factos essenciais para a decisão da causa, isto é, os factos constitutivos, impeditivos, modificativos ou extintivos do direito ou da pretensão invocadas.
12. Nenhum facto foi articulado relativamente ao invocado erro em que incorreu o autor da sucessão por motivo do dolo dos RR e que foram oportunamente alegados pelos AA na sua réplica.
13. Afigurava-se igualmente relevante a quesitação de factos instrumentais, para demonstrar a existência dos factos relevantes, os essenciais.
14. O interesse para a decisão da causa verifica-se sempre que os factos articulados possam contribuir para a formação do juízo que há-de determinar a decisão e sempre que possam ter influência mais ou menos directa no esclarecimento da verdade.
15. Os ora recorrentes podem ter perdido a acção por virtude daquela alegada deficiência.
16. O Meritíssimo Juiz a quo violou, nomeadamente, a disposição do art.º 430.°, n.º 1 do Código de Processo Civil.
*
Os Réus responderam à motivação do recurso dos Autores, nos termos constantes a fls. 812 a 813 e fls. 806 a 809 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, pugnando pela improcedência do recurso.
*
Foram colhidos os vistos legais.
*
II – Factos
Foi considerada como assente e provada a seguinte factualidade pelo Tribunal a quo:
1. H, aliás H, de nacionalidade portuguesa, faleceu, em 12 de Junho de 2004, em Hong Kong, sem deixar testamento (alínea A da Especificação).
2. H, aliás H faleceu no estado de casado com B aliás B, casamento que foi contraído, em primeiras núpcias de ambos, no regime da comunhão de adquiridos (alínea B da Especificação).
3. Deste casamento resultaram quatro filhos: os Autores e os seus irmãos F e G, ora Réus (alínea C da Especificação).
4. Existe um documento escrito intitulado "Procuração" do qual consta que foi outorgado no Consulado Geral de Portugal em Hong Kong em 24 de Outubro de 2002, na presença do Cônsul Geral e que foi assinado por H e B, constituindo procurador C, cuja cópia consta dos autos a fls. 113 e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido (alínea D da Especificação).
5. Por escritura pública de compra e venda efectuada no dia 20 de Fevereiro de 2003, lavrada a fls. 114 do livro 18-A do Cartório do Notário Privado Dr. António J. Dias Azedo, o 5° Réu, C, outorgou na qualidade de procurador de H e sua mulher B, como vendedores, tendo outorgado como comprador o 1° Réu, A, o qual comprou as seguintes fracções autónomas:
1) Fracção autónoma designada por "A-1" do 1° andar "A", para habitação, do prédio sito em Macau na Rua de Santo António, nº 11 a 11C, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº5720 a fls. 136 do Livro B23, com o regime de propriedade horizontal inscrito sob o nºXXX a fls. 122 do Livro XX, ora registada em nome do 1° Réu conforme inscrição nº616XX a, inscrito na matriz predial da freguesia de Santo António sob o artigo 0372XX, pelo preço de MOP$50,000.00.
2) Fracção autónoma designada por "B-1" do 1° andar "B", para habitação, do prédio sito em Macau na Rua de Santo António, nº11 a 11C, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nºXX a fls. 136 do Livro XX, com o regime de propriedade horizontal inscrito sob o nºXX a fls. 122 do Livro F10, ora registada em nome do 1° Réu conforme inscrição nºXXX a, inscrito na matriz predial da freguesia de Santo António sob o artigo 037296, pelo preço de MOP$50,000.00.
3) Fracção autónoma designada por "C-I" do 1° andar "C", para habitação, do prédio sito em Macau na Rua de Santo António, nº11 a 11C, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nºXXX a fls. 136 do Livro XX, com o regime de propriedade horizontal inscrito sob o nºXXX a fls. 122 do Livro XX, ora registada em nome do 1º Réu conforme inscrição nºXXX a, inscrito na matriz predial da freguesia de Santo António sob o artigo 037296 (alínea E da Especificação).
6. O Réu, A é irmão de I aliás I, casada catolicamente com G no regime da comunhão de adquiridos, natural de Macau, filha de J e de K (alínea F da Especificação).
7. H sofria de uma doença crónica - diabetes mellitus (Resposta ao quesito 1º).
8. À partir da data não apurada, mas pelo menos, a partir de 1999, o estado de saúde de H agravou-se progressivamente (Resposta ao quesito 2º).
9. Por isso fixou residência em Hong Kong, em fins de 1999, não tendo regressado a Macau (Resposta ao quesito 3º).
10. E tinha problemas renais que o obrigaram a fazer hemodiálise, no HK Sanatorium & Hospital, desde Novembro de 2002 até ao dia 10 de Junho de 2004 (cfr. fls. 121 a 134) (Resposta ao quesito 5º).
11. Provado o que consta da resposta do quesito 2° (Resposta ao quesito 7º).
*
III – Fundamentação:
A) Do recurso dos Autores:
Os Autores imputam à sentença recorrida a violação do disposto do nº 1 do artº 430º do CPC, por não ter sido feita uma selecção da matéria de facto necessária e suficiente para permitir uma decisão de direito adequada e justa. Assim, entendem que a mesma é nula por omissão de pronúncia nos termos da al. d) do nº 1 do artº 571º do CPCM.
Para os mesmos, devem incluir os seguintes factos na Base Instrutória, a saber:
20.º A
   H, em vida, fazia distinção entre os seus filhos?
20.º B
   No domínio dos seus negócios, H socorria-se sempre dos seus filhos, a todos distribuindo tarefas?
20.º C
   O 5.º R, para além da venda em apreço no presente processo, apareceu como representante de H numa venda de, pelo menos, 8 fracções autónomas à sociedade Landsea Estate Inc. e numa outra venda de, pelo menos, 3 fracções autónomas à sociedade Harriet International Inc.?
20.º D
   Desde 2002, mais de 40 fracções autónomas pertencentes a H foram vendidas, no seu conjunto à sociedade XX International Inc. e à sociedade XX Estate Inc.?
20.º E
   As referidas sociedades comerciais têm a sua sede nas Ilhas Virgens Britânicas?
Contudo, a sua reclamação da selecção da matéria de facto não foi atendida pelo Tribunal a quo, por se entender que os factos em causa eram meros factos circunstanciais e sem relevo directo para a decisão do mérito da causa.
Quid iuris?
Na presente acção, os Autores alegaram, como fundamento principal da acção e causa de pedir, a falsidade da procuração e a simulação do negócio.
E como fundamento subsidiário, invocaram o erro de H induzido pelos Réus na celebração da procuração em referência.
Para a melhor compreensão, transcreve-se seguidamente o pedido da ampliação da causa de pedir dos Autores constante da réplica e, bem assim, os quesitos da Base Instrutória:
Ampliação da causa de pedir e do pedido:
“133º
   “Dispõe o artigo 217.° do Código de Processo Civil, no seu n.º 1, que «na falta de acordo, a causa de pedir só pode ser alterada ou ampliada na réplica (...)», no seu n.º 2 que «o pedido pode também ser ampliado na réplica (...)» e no seu n.º 6 que «é permitida a modificação simultânea do pedido e da causa de pedir, desde que tal não implique a convolação para relação jurídica diversa da relação jurídica controvertida».
134º
   Procede-se a essa modificação simultânea do pedido e da causa de pedir, na medida em que se verifica, no caso, ressalvado o devido respeito, a circunstância indicada na última das normas indicadas, pois a alteração que se requer não implica a convolação de que fala aquele normativo.
135º
   Os AA, ora Replicantes, estão convencidos, tal como alegaram na p.i. que o negócio dos presentes autos está ferido por duas causas de invalidade: uma, porque tem por base uma procuração falsa; outra, porque se trata de um negócio simulado (artigos 38° e passim).
64º
   Mas, para a hipótese de assim se não entender, o que se diz sem conceder e por mera cautela de patrocínio, entendem os AA que o referido negócio padece de invalidade decorrente do facto de a procuração, que instruiu o contrato celebrado e que constitui objecto dos presentes autos, ter sido obtida através de uma declaração viciada por erro por parte do H.
136º
   Com efeito, o H só conferiu os referidos poderes ao 5° R apenas porque foi enganado pelos 2ª, 3ª e 4° RR.
137º
   Na verdade, em plena vida activa, nunca o H conferiu a um estranho à família tantos poderes sobre tão vastos domínios do seu património.
138º
   Na realidade, socorria-se sempre dos seus filhos.
139º
   Eram eles o seu braço direito.
140º
   E se assim foi no auge da vida do H, que razão pode explicar que, na fase terminal da sua vida, e quando já estava agarrado a uma cama do Hospital ou a uma cadeira de rodas, tenha passado várias procurações ao 5° R e para vender várias fracções autónomas do seu património?
141º
   E que necessidade pode justificar que tudo isso fosse feito no completo desconhecimento dos AA?
142º
   Principalmente do 2° A., em cuja casa (de que era proprietário conjuntamente com a sua mãe. 2ª R) residia o H (Doc. nº 12)
143º
   E onde aquele ficava, quando, frequentemente, ia a Hong Kong visitar o pai.
144º
   E porque não apareceu a 2ª, 3ª ou 4° RR a representar o H?
145º
   Na verdade, eram estes quem o acompanhavam, permanentemente, em Hong Kong.
146º
   A razão era apenas uma e passava pelo estratagema de fazer o H conferir poderes a alguém em quem confiavam, para, depois, o fazerem este participar na escritura que entendessem celebrar.
147º
   Sendo que em todas as escrituras celebradas, os 2ª, 3ª e 4° RR fizeram sempre intervir alguém, como vendedor (representante) e comprador, que podiam controlar perfeitamente.
148º
   Seja a sociedade "XX" ou a sociedade "XX" (de que os RR são sócios ou administradores), seja o ora 1° R, A, que é irmão de I, que por sua vez é a mulher do G, o aqui 4° R.
149º
   Como claramente se vê, os 2ª, 3ª e 4° RR nunca aparecem às claras, seja a beneficiar de procurações seja a adquirir directamente bens do H.
150º
   E não aparecem porque, de acordo com o seu estratagema, não podem aparecer.
151º
   Na verdade, pretendendo afastar os AA, seus co-herdeiros, desses bens, eles têm de esconder a sua ligação ao itinerário desses bens, desde a sua saída do património do H até à entrada num outro património.
152º
   O que fazem, arranjando um terceiro da sua confiança, seja como procurador do H seja como interpostas pessoas para a aquisição desses bens.
153º
   Foram esses os papéis desempenhados pelo 5° R, pelas sociedades "XX" e "XX", nas outras acções, e pelo 1° R, na presente acção.
154º
   E daí que continuem os RR, nessas outras acções, a afirmar que não são sócios ou administradores dessas sociedades e que não sabem quem são.
155º
   De tudo decorre que os 2ª, 3ª e 4° RR, através de artifícios fraudulentos e com intenção de induzir ou manter em erro o H, lograram obter dele a declaração de vontadade, através da qual, alegadamente, conferiu poderes ao 5° R para, entre outros, alienar as fracções em causa nos presentes autos.
156º
   Não tendo qualquer percepção dos propósitos fraudulentos que animavam os RR, permanecendo em total desconhecimento acerca dos poderes conferidos.
157º
   Caso contrário, nunca teria outorgado tais poderes.
158º
   Dado que sempre foi lema de toda a sua vida tratar sempre por igualas seus filhos, nunca beneficiando ou prejudicando uns em detrimento de outros.
159º
   Sirva de exemplo o facto de integrar todos os seus filhos nos seus negócios.
160º
   Ainda o facto de ter oferecido fracções autónomas, por igual número, aos seus filhos.
161º
   E ainda o facto de ter doado o equivalente a MOP$5,450,574.00 (cinco milhões, quatrocentas e cinquenta mil, quinhentas e setenta e quatro patacas) a cada um dos filhos, para obterem a sua residência em Singapura.
162º
   E também o facto de ter transferido para o 1° A a propriedade da fracção autónoma designada por IR/C do rés-da-chão "I", supra referida, como forma de o compensar pelo facto de este não ter beneficiado daquela liberalidade em dinheiro, dado não ter pretendido sair de Macau, contrariamente aos restantes irmãos, inclusive o 2° A.
163º
   Na verdade, não tendo beneficiado ou prejudicado uns em relação aos outros, durante toda a sua vida activa, nenhum sentido faria que deixasse de ser assim às portas da sua morte.
164º
   Os 2ª, 3ª e 4° RR agiram com dolo, dado que utilizaram meios enganosos para obter do H uma declaração que não teria emitido sem aquele engano.
165º
   Verificada a invalidade da procuração, por dolo, inválido não pode deixar de ser o contrato de compra e venda celebrado através da escritura através da qual se transferiram as referidas fracções para o 1º R.
166º
   Na verdade, sendo a procuração inválida, ela não tem potencialidade para conferir ao 5º R os referidos poderes.
167º
   Tendo, no entanto, outorgado, ilegitimamente, a escritura em questão, em representação do H, a venda é nula, por se tratar de venda de bens por quem, para o efeito, não tinha poderes, nos termos do disposto no art.° 882.° do Civil.
168º
   Declaração de nulidade esta que ora se requer, por virtude de ser consequência da ampliação da causa de pedir aqui efectuada.”
*
Base Instrutória:
1)
   H sofria de uma doença crónica - diabetes mellitus?
2)
A partir de 1998 o seu estado de saúde agravou-se progressivamente?
3)
   Por isso fixou residência em Hong Kong, em fins de 1999, não tendo regressado a Macau?
4)
   Teve problemas coronários graves que determinaram duas intervenções cirúrgicas (angioplastia com aplicação de stent), entre Maio e Dezembro de 2002?
5)
   E tinha problemas renais que o obrigaram a fazer hemodiálise, no HK Sanatorium & Hospital, desde Novembro de 2002 até ao dia 10 Junho de 2004?
6)
O H tinha ainda problemas de visão e de movimentação?
7)
   Entre Dezembro de 2002 e Junho de 2004 o seu estado de saúde agravou-se acentuadamente?
8)
   Aproveitando o estado de saúde de H, a mãe dos autores e os seus dois irmãos mais velhos passaram a controlar todos os negócios, tendo projectado desviar do património de H bens móveis e imóveis, colocando-os no património de terceiros?
9)
   Para esse efeito falsificaram, entre outras, a procuração a que se alude em D) através da qual foram ficticiamente conferidos poderes especiais a um colaborador de longa data, o Réu, C, para administrar livremente certos bens imóveis, podendo deles dispor conforme a sua conveniência?
10)
   H não se deslocou no dia 24 de Outubro de 2002 ao Consulado Geral de Portugal?
11 )
   E não rubricou e assinou o documento a que se alude em D)?
12)
   O então Cônsul-Geral de Portugal em Hong Kong, não tem conhecimentos suficientes da língua chinesa que lhe permitissem dispensar a intervenção de um intérprete para explicar o conteúdo da procuração a que se alude em D)?
13)
   O 1º Réu não pretendia adquirir para si a propriedade das fracções autónomas referidas em E)?
14)
   E não pagou qualquer preço por elas?
15)
   E em conluio com os 2ª, 3ª e 4º Réus apenas procedeu a tal compra com o intuito de os beneficiar e prejudicar os Autores?
16)
   O valor da venda foi muito inferior ao do mercado imobiliário na RAEM?
17)
   O negócio visou apenas possibilitar proceder a negócios sucessivos com o intuito de desviar do património de H os referidos imóveis?
18)
   O 1º R e o 5° Réu sabiam perfeitamente que H não pretendia transmitir a terceiros esses mesmos imóveis mas que ajudavam, assim, os 2ª e 3ª e 4ª RR, ardilosamente, a manterem sob o seu controlo tais imóveis?
19)
   Desde a data em que H adoeceu gravemente (Maio de 2002) a progenitora dos Autores afastou-se e deixou de com eles conviver?
20)
   E passou a estar unicamente com a Ré F e com o outro filho, G, sempre preferindo tratar de todos os assuntos familiares com os filhos mais velhos?
21 )
   Os Autores sabem que os factos que alegaram não são verdadeiros?
*
Realizada a audiência de julgamento, o Tribunal a quo considerou como não provados os quesitos 4º, 6º, 8º, 9º, 10º, 11º, 12º, 13º, 14º, 15º, 16º, 17º, 18º, 19º, 20º e 21º, com a qual os Autores se conformaram, ou seja, a dita decisão da matéria de facto não foi objecto de impugnação.
Nesta conformidade e salvo o devido respeito, não se nos afigura que tenha alguma relevância e utilidade prática em se incluir os quesitos em referência na Base Instrutória, tal como é pretendido pelos Autores.
Repare-se, ainda que os factos neles vertidos vierem provados, nada poderia afectar ou modificar a decisão recorrida, uma vez que tais factos, a saber:
- H, em vida, fazia distinção entre os seus filhos.
- No domínio dos seus negócios, H socorria-se sempre dos seus filhos, a todos distribuindo tarefas.
- O 5.º R, para além da venda em apreço no presente processo, apareceu como representante de H numa venda de, pelo menos, 8 fracções autónomas à sociedade XX Estate Inc. e numa outra venda de, pelo menos, 3 fracções autónomas à sociedade XX International Inc.
- Desde 2002, mais de 40 fracções autónomas pertencentes a H foram vendidas, no seu conjunto à sociedade XX International Inc. e à sociedade XX Estate Inc.
- As referidas sociedades comerciais têm a sua sede nas Ilhas Virgens Britânicas.
Quer per si, que em conjugação com os outros já provados, não permitem o Tribunal chegar à conclusão da existência da falsificação da procuração, da simulação ou do dolo por parte dos Réus.
Isto é, mantendo-se inalterada a matéria fáctica considerada como assente e provada, ainda que associando tais novos factos, nunca se poderia julgar a acção como procedente.
Pelo exposto, não deixará de se negar provimento ao recurso interposto.
B) Dos recursos do 1º Réu e dos 2ª e 5º Réus:
Com a confirmação da sentença recorrida que se julgou a acção improcedente e consequentemente se absolveu os Réus do pedido, fica prejudicado o conhecimento dos recursos interpostos pelos 1º, 2ª e 5º Réus.
Aliás, nos termos do nº 2 do artº 628º do CPCM, os recursos que não incidam sobre o mérito da causa e que tenham sido interpostos pelos recorridos em recurso de decisão sobre o mérito só são apreciados se a sentença não for confirmada.
*
Tudo visto, resta decidir.
*
IV – Decisão
Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam em:
1. Negar provimento ao recurso interposto pelos Autores, confirmando a sentença recorrida; e
2. Não conhecer os recursos interlocutórios interpostos pelos 1º, 2ª e 5º Réus.
*
Custas do recurso final pelos Autores e sem custas para os recursos interlocutórios.
Notifique e registe.
*
RAEM, aos 23 de Janeiro de 2014.
Ho Wai Neng
José Cândido de Pinho
Tong Hio Fong



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