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Processo n.º 462/2013 Data do acórdão: 2013-9-19 (Autos em recurso penal)
Assuntos:
– manifesta improcedência do recurso
– rejeição do recurso
S U M Á R I O

Mostrando-se evidentemente infundado o recurso, é de rejeitá-lo em conferência, nos termos dos art.os 409.o, n.o 2, alínea a), e 410.o, n.o 1, do Código de Processo Penal.
O relator,
Chan Kuong Seng

Processo n.º 462/2013
(Autos de recurso penal)
Recorrente (assistente): A (XXX)





ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU
I – RELATÓRIO
Inconformado com o acórdão proferido em 12 de Abril de 2013 nos autos de Processo Comum Colectivo n.º CR4-12-0001-PCC do 4.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base (TJB), que tinha condenado a arguida B (XXX), pela prática, em autoria material, de um crime consumado de emissão de cheque sem provisão, p. e p. pelo art.º 214.º, n.º 1, do Código Penal (CP), na pena de sete meses de prisão, suspensa na sua execução por dois anos, e tinha decidido remeter, ao abrigo do art.º 71.º, n.º 4, do Código de Processo Penal (CPP), as partes da causa cível aí enxertada para acção cível separada, veio o assistente e demandante civil A (XXX) recorrer para este Tribunal de Segunda Instância (TSI), para rogar, a título principal, a invalidação dessa decisão judicial na parte respeitante ao não conhecimento do seu pedido cível então deduzido contra a arguida (decisão essa que, no entender dele, tinha violado os art.os 477.º, 557.º e 489.º do Código Civil (CC) e o art.º 57.º, n.º 1, alínea a), do CPP e o espírito dos art.os 214.º e 220.º do CP), com consequente pretendida condenação directa da arguida no pedido cível, ou devolução do processo ao Tribunal recorrido para efeitos de apreciação do mérito do pedido cível, bem como, a título subsidiário falando, a invalidação, com base na alegada existência do vício de erro notório na apreciação da prova, da decisão emitida pelo Tribunal recorrido a nível da matéria de facto respeitante à causa cível, para além de pedir, fosse como fosse, que a suspensão de execução da pena de prisão da arguida passasse a ser subordinada, sob a égide do art.º 49.º, n.º 1, do CP, à condição de ela pagar, dentro de um mês, ao próprio recorrente, a indemnização reclamada no pedido cível com juros legais (cfr. o teor da motivação de recurso, apresentada a fls. 274 a 289 dos presentes autos correspondentes).
Ao recurso, apenas respondeu a arguida, a qual defendeu a improcedência do recurso (cfr. a resposta de fls. 320 a 331).
Subidos os autos, emitiu o Digno Procurador-Adjunto parecer (a fls. 342 a 343), pugnando pelo não provimento do recurso na parte penal.
Feito o exame preliminar (em sede do qual se entendeu dever o recurso ser rejeitado por manifestamente infundado) e corridos os vistos legais, é de decidir do recurso.
II – FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA
Fluem do exame dos autos os seguintes elementos processuais pertinentes:
1. O ora recorrente A chegou a deduzir nos subjacentes autos penais n.º CR4-12-0001-PCC, o pedido cível de indemnização contra a arguida B, alegando, na sua essência, que esta era gerente da “XX Property Limited”, que ele chegou a entregar a essa Companhia HKD70.000,00 a título de sinal para compra de um bem imóvel, que em face da impossibilidade de conclusão desse negócio de compra e venda, a arguida lhe prometeu a restituição do referido sinal, que a arguida, em 12 de Fevereiro de 2011, lhe emitiu um cheque com o n.º 97XXXX, no valor de HKD70.000,00, e datado de 15 de Fevereiro de 2011, para efeitos de pagamento do dito sinal, que ele, em 15 de Fevereiro de 2011, apresentou o cheque ao pagamento no Banco da China de Macau, o qual lhe comunicou que não havia fundo suficiente na conta do cheque, que a arguida, embora tenha sabido que a sua conta não tinha fundo suficiente, passou intencionalmente na mesma tal cheque, com o fim de fazer retardar o pagamento da dívida ou de fugir ao pagamento da dívida, que a arguida agiu livre, voluntária e conscientemente, sabendo que a sua conduta não era permitida por lei, que essa conduta da arguida fez necessariamente com que ele tenha sofrido prejuízo patrimonial no valor de HKD70.000,00, tenha gasto MOP590,00 na constituição dele como assistente, e tenha sofrido danos morais indemnizáveis por MOP50.001,00 (cfr. a petição cível de fls. 35 a 41 dos autos).
2. A sr.ª XXX (XXX) foi condenada por acórdão proferido em 27 de Julho de 2012 no Processo Comum Colectivo n.º CR4-11-0136-PCC do 4.º Juízo Criminal do TJB, inclusivamente como autora material de um crime de burla em valor elevado (concretamente, no valor de HKD70.000,00) praticado contra o ora recorrente A, com o dever de pagar a este HKD60.000,00 a título de indemnização, porquanto já foi cativada nesses autos a quantia de HKD10.000,00 inicialmente destinada por essa arguida ao pagamento parcial do dinheiro devido ao mesmo ofendido. E segundo a fundamentação fáctica desse acórdão, essa arguida trabalhou na “XX Property Limited” e foi ela que se apropriou do sinal entregue em Fevereiro de 2011 pelo ofendido A, no valor de HKD70.000,00, fazendo seu o mesmo sinal (cfr. mormente o teor desse acórdão, certificado a fls. 298 a 309 dos presentes autos).
3. No acórdão ora recorrido (i.e., acórdão proferido em 12 de Abril de 2013 nos subjacentes autos n.º CR4-12-0001-PCC), já ficaram materialmente provados o acto de emissão do cheque sem provisão suficiente em causa e o dolo da arguida ora recorrida B na emissão desse cheque, com base nos quais esta ficou condenada como autora material de um crime de emissão de cheque sem provisão. O Tribunal Colectivo ora recorrido mais considerou provado que: o ora assistente mandatou uma trabalhadora da “XX Property Limited” para proceder a um negócio de compra e venda de um bem imóvel e para este efeito entregou a esta HKD70.000,00 como sinal de compra do imóvel; essa trabalhadora ficou condenada no Processo n.º CR4-11-0136-PCC por crime de burla, com dever de pagar a correspondente indemnização; a ora arguida B, em face da conduta de continuadas queixas feitas pelo ofendido na Companhia, o qual não quis sair da Companhia, passou a este o cheque em causa a fim de servir de caução da indemnização, para evitar a perturbação deste ofendido ao normal funcionamento da Companhia. E segundo a fundamentação do mesmo acórdão ora recorrido, o Tribunal Colectivo seu autor, depois de atender inclusivamente à decisão condenatória proferida no referido Processo n.º CR4-11-0136-PCC contra a trabalhadora da ora arguida, trabalhadora essa que nem sequer foi interveniente nos subjacentes autos penais, acabou por decidir remeter as partes do pedido cível para acção civil separada, a fim de possibilitar uma decisão rigorosa sobre a causa civil (cfr. o teor do acórdão ora recorrido, a fls. 264 a 267 dos presentes autos).
III – FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
De antemão, cabe afirmar que mesmo em processo penal, e com excepção da matéria de conhecimento oficioso, ao tribunal ad quem cumpre só resolver as questões material e concretamente alegadas na motivação do recurso e ao mesmo tempo devidamente delimitadas nas conclusões da mesma, e já não responder a toda e qualquer razão aduzida pela parte recorrente para sustentar a procedência das suas questões colocadas (nesse sentido, cfr., de entre muitos outros, os acórdãos do TSI, de 7 de Dezembro de 2000 no Processo n.o 130/2000, de 3 de Maio de 2001 no Processo n.o 18/2001, e de 17 de Maio de 2001 no Processo n.o 63/2001).
Pois bem, perante os elementos processuais pertinentes já acima referidos na parte II do presente acórdão de recurso, é evidentemente de concluir que tem razão o Tribunal Colectivo a quo ao decidir remeter as partes do pedido cível para acção civil separada a fim de possibilitar uma decisão rigorosa. De facto, a relação material controvertida como tal alegada na petição civil enxertada pelo ora recorrente tem a ver precisamente com a matéria de facto já julgada num outro processo penal em que a acima referida trabalhadora XXX da Companhia gerida pela ora arguida B já ficou condenada inclusivamente por conduta de burla praticada contra o ora recorrente, e, como tal, também condenada a pagar a este a indemnização correspondente ao montante do sinal de compra de imóvel, e se essa trabalhadora não foi interveniente nos presentes autos penais para poder contradizer os factos alegados pelo recorrente pelo menos a nível de danos morais, não é curial ao Tribunal ora recorrido decidir directamente do objecto do pedido cível enxertado.
Por outra banda, como não se vislumbra que o Tribunal ora recorrido, ao ter fixado a matéria de facto como o fez no acórdão recorrido, tenha violado qualquer regra da experiência da vida humana em normalidade de situações, ou qualquer norma jurídica sobre o valor legal da prova, ou quaisquer legis artis vigentes na tarefa jurisdicional de julgamento da matéria de facto, é de improceder patentemente o esgrimido vício de erro notório na apreciação da prova de que se fala na alínea c) do n.º 2 do art.º 400.º do CPP.
E do acima analisado e decidido, resulta também claramente a inviabilidade de rogada submissão da suspensão de execução da pena de prisão da arguida B a qualquer condição de “pagamento da indemnização com juros legais”. Na verdade, se a eventual responsabilidade civil desta arguida perante o ora recorrente tem que ser apurada em acção civil separada, como é possível fixar agora alguma condição de pagamento da indemnização resultante dessa eventual responsabilidade civil?
Em suma, naufraga o recurso, sem mais necessidade – atento o espírito do art.º 410.º, n.º 3, do CPP – de apreciação de outros argumentos tecidos pelo recorrente para sustentar a procedência das suas pretensões principal e subsidiárias.
O recurso, como tal, deve ser rejeitado efectivamente em conferência (art.os 409.o, n.o 2, alínea a), e 410.o, n.o 1, do CPP).
IV – DECISÃO
Em sintonia com o exposto, acordam em rejeitar o recurso, por ser manifestamente improcedente.
Custas pelo recorrente, com seis UC de taxa de justiça e quatro UC de sanção pecuniária (referida no art.o 410.o, n.o 4, do Código de Processo Penal).
Macau, 19 de Setembro de 2013.
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Chan Kuong Seng
(Relator)
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Lai Kin Hong
(Primeiro Juiz-Adjunto)
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Choi Mou Pan
(Segundo Juiz-Adjunto)


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