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Processo nº 475/2013 Data: 19.09.2013
(Autos de recurso penal)

Assuntos : Crime de “condução em estado de embriaguez”.
Inibição de condução.
Suspensão.



SUMÁRIO

1. A pena acessória tem um sentido e um conteúdo que visa não só garantir a tutela do ordenamento jurídico e a confiança na validade da norma violada mas, também, prevenir “a perigosidade individual”, tendo uma função preventiva adjuvante da pena principal”, devendo ser aplicada a quem for condenado pela prática do crime de “condução em estado de embriaguez”, ainda que o arguido não se encontre habilitado a conduzir.

2. Só se coloca a hipótese de suspensão da interdição da condução, caso o arguido seja um motorista ou condutor profissional com rendimento dependente da condução de veículos ... até porque os inconvenientes a resultar ... da execução dessa pena acessória não podem constituir causa atendível para a almejada suspensão ... posto que toda a interdição da condução irá implicar naturalmente incómodos não desejados pelo condutor assim punido na sua vida quotidiana.

O relator,

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José Maria Dias Azedo


Processo nº 475/2013
(Autos de recurso penal)






ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:





Relatório

1. Por sentença do Mmo Juiz do T.J.B. decidiu-se condenar A, arguida com os sinais dos presentes autos, pela prática em autoria material e na forma consumada de um crime de “condução em estado de embriaguez”, p. e p. pelo art. 90°, n.° 1 da Lei n.° 3/2007, na pena de 3 meses de prisão, substituída pela multa de MOP$10.800,00, e na pena acessória de inibição de condução pelo período de 1 ano; (cfr., fls. 13 a 16 que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).

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Inconformada, a arguida recorreu.
Em sede de conclusões, e em síntese, pede (apenas) a suspensão da execução da pena acessória de inibição de condução; (cfr., fls. 22 a 29-v).

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Respondendo, pugna o Exmo. Magistrado do Ministério Público pela total improcedência do recurso; (cfr., fls. 137 a 139).

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Neste T.S.I., igual posição toma a Ilustre Procuradora Adjunta, afirmando o que segue:

“A, ora arguida dos presentes autos, foi condenada pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de condução em estado de embriaguez ou sob influência de estupefacientes ou substâncias psicotrópicas p.° p.° pelo art.° 90 n.° 1 da Lei do Trânsito Rodoviário, na pena de três meses de prisão em alternativa de multa de MOP 10,800.00, bem como na pena acessória de inibição de condução pelo período de um ano.
Inconformado meramente com a decisão de não suspensão da execução da pena acessória de inibição de condução, vem recorrer para o Tribunal de Segunda Instância, invocando a desproporcionalidade entre a pena principal e a acessória e a desconsideração de factos laterais muito importantes para a determinação da medida da pena aplicada.
Na sua motivação de recurso, alega que o tribunal devia decidir pela suspensão da execução da pena acessória de inibição de condução, nos termos do art.° 109 n.° 1 da Lei do Trânsito Rodoviário.
Analisados os autos, em conformidade com a Digna Magistrada do M.P. na sua resposta à motivação do recurso, entendemos que seja correcta a decisão de não suspensão da execução da pena acessória de inibição de condução, do Tribunal a quo, por força da consequência jurídica exigida pelo art.° art.° 90 n.° 1 da Lei do Trânsito Rodoviário, bem como dos art.°s 40 e 65 do C.P.M., não existindo motivos atendíveis que o Tribunal a quo devesse ponderar para a hipótese de suspensão da dita pena acessória.
O rumo jurisprudencial até agora seguido pelos Tribunais tem sido de que " ... só se coloca a hipótese de suspensão caso o arguido seja um motorista ou condutor profissional com rendimento dependente da condução de veículos", sendo respectivamente afirmado pelo Ilustre Tribunal da Segunda Instância nos processos n.°s 134/2013 de 23/05/2013, 252/2012 de 26/07/2012,390/2011 de 26/07/2012 e 707/2011 de 26/07/2012.
No entanto, podem afastar-se da hipótese de suspensão os casos de, reincidência ou existência de antecedentes criminais relacionados à condução ou atitude de confissão de arguido, como nos Processos do Tribunal de Segunda Instância n.°s 235/2011 de 26/04/2012, 533/2011 de 26/07/2012, 48/2008 de 11/09/2008, embora esteja provado que o arguido é motorista de profissão.
Nesta conformidade, parece-nos que, in casu, não há lugar à aplicação do disposto no art.° 109 n.° 1 da Lei do Trânsito Rodoviário, por estar apenas provado de que a recorrente é uma comerciante que explora estabelecimentos de comidas.
Face à condição económica da recorrente, aos serviços de "delivery" normalmente prestados pelos fornecedores de mercadoria e à conveniência de transportes públicos, não se nos configura dificuldade rigorosa de resolução de problemas derivadas da execução da pena acessória de inibição de condução, não se vislumbrando assim nenhum motivo atendível previsto no art.° 109 n.° 1 da Lei do Trânsito Rodoviário.
Vale pena destacar-se aqui o correcto entendimento do Ilustre Tribunal da Segunda Instância:
"Aliás, é nos inconvenientes a resultar naturalmente da execução da inibição de condução para a vida quotidiana da pessoa condutora assim punida que consistem os efeitos próprios dessa sanção, pelo que não se pode invocar tais inconvenientes para sustentar a pretensão de suspensão da execução da sanção, sob pena de petição de princípio." (cfr. Proc. n.° 252/2012 de 26/07/2012)
Deve ser assim afastada a hipótese de suspensão da pena acessória de inibição de condução fixada à recorrente, tendo em conta as necessidades de prevenção, quer geral quer especial.
Pelo exposto, deve ser julgado improcedente o recurso da arguida A”; (cfr., fls. 158 a 159).

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Cumpre decidir.

Fundamentação

Dos factos

2. Estão provados os factos como tal elencados na sentença recorrida, a fls. 14-v, que não vem impugnados nem se mostram de alterar, e que aqui se dão como reproduzidos para todos os efeitos.

Do direito

3. Com o presente recurso insurge-se a arguida contra a sentença que a condenou como autora de um crime de “condução em estado de embriaguez”, p. e p. pelo art. 90°, n.° 1 da Lei n.° 3/2007, na pena de 3 meses de prisão, substituída pela multa de MOP$10.800,00, e na pena acessória de inibição de condução pelo período de 1 ano.
Alega, em síntese, que dada a sua vida pessoal, familiar e profissional, (nomeadamente, por ter de levar os filhos à escola, e por ter que acompanhar as compras para os seus estabelecimentos de restauração), imprescindível é a (sua necessidade) de condução, pedindo assim, a suspensão da referida pena acessória.

Cremos porém que não se pode reconhecer razão à ora recorrente.

De facto, no que toca à pena acessória de inibição de condução tem este T.S.I. vindo a entender que: “só se coloca a hipótese de suspensão da interdição da condução, caso o arguido seja um motorista ou condutor profissional com rendimento dependente da condução de veículos ... até porque os inconvenientes a resultar ... da execução dessa pena acessória não podem constituir causa atendível para a almejada suspensão ... posto que toda a interdição da condução irá implicar naturalmente incómodos não desejados pelo condutor assim punido na sua vida quotidiana”; (cfr., v.g., o Ac. de 19.03.2009, Proc. n°. 717/2008, e, mais recentemente, de 21.03.2013, Proc. n° 1011/2012).

E, ainda que se nos mostre de compreender a “situação” da ora recorrente, evidente é que esta não se equipara à que, nos termos expostos, tem justificado a suspensão da execução da pena acessória de inibição de condução.

Na verdade, teve já este T.S.I. oportunidade de consignar que:

“A pena acessória tem um sentido e um conteúdo que visa não só garantir a tutela do ordenamento jurídico e a confiança na validade da norma violada mas, também, prevenir “a perigosidade individual”, tendo uma função preventiva adjuvante da pena principal”, e que,
“A pena acessória de inibição de condução deve ser aplicada a quem for condenado pela prática do crime de “condução em estado de embriaguez”, ainda que o arguido não se encontre habilitado a conduzir”; (cfr., v.g. Ac. de 24.01.2013, Proc. n.° 894/2012).

Nesta conformidade, e motivos não havendo para se alterar o entendimento que se tem vindo a adoptar, evidente é a improcedência do presente recurso que, por isso, se rejeita.


Decisão

4. Nos termos que se deixam expostos, acordam rejeitar o recurso; (cfr., art. 409°, n.° 2, al. a) e 410, n.° 1 do C.P.P.M.).

Pagará a arguida, a taxa de 5 UCs, e como sanção pela rejeição o equivalente a 3 UCs; (cfr., art. 410°, n.° 4 do C.P.P.M.).

Macau, aos 19 de Setembro de 2013
José Maria Dias Azedo
Chan Kuong Seng
Tam Hio Wa

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