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Processo nº 316/2013
(Autos de Recurso Civil e Laboral)

Data: 18 de Setembro de 2013


ASSUNTO:
- Junção dos documentos às alegações
- Possibilidade da renúncia do exercício do direito à meação dos bens comuns do casal no âmbito da execução
- Justo receio


SUMÁRIO:
- A junção de documentos em sede do recurso apenas pode ter lugar, nos termos do artº. 616º, nº 1, do CPCM, quando se destina a provar factos supervenientes, ou cuja apresentação se tenha tornado necessária e virtude do julgamento proferido na primeira instância.
- E o documento só se torna necessário em virtude do julgamento a quo quando a decisão a quo se tenha baseado em meio probatório inesperadamente junto por iniciativa do tribunal ou em preceito jurídico com cuja aplicação as partes justificadamente não tivessem contado.
- O legislador prevê a possibilidade da separação dos bens comuns na execução movida contra um só dos cônjuges. Porém, esta separação é facultativa e não obrigatória, pois o cônjuge não executado pode optar pela não separação dos bens comuns, solidarizando-se desta forma na liquidação da quantia exequenda do cônjuge executado.
- Não há justo receio da perda da garantia patrimonial se já foram arrestados/penhorados bens suficientes para garantir o pagamento da dívida.
O Relator,


















Processo nº 316/2013
(Autos de Recurso Civil e Laboral)

Data: 18 de Setembro de 2013
Recorrentes: - A Development Limited (Requerente)
- B, C, D e E (1º, 2ª, 3º e 4ª Requeridos)
Recorridos: Os mesmos

ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:

I – Relatório
Por despacho de 20/07/2012, foi julgada improcedente a excepção de caducidade do arresto suscitada pelos Requeridos.
Dessa decisão vem recorreram os Requeridos, alegando, em sede de conclusão, o seguinte:
1. O despacho constante de fls. 541 e 542 veio "julg[ou] improcedente o pedido de caducidade do presente arresto", na medida em em que "analisadas as causas legais de caducidade do presente arresto, previstas nas diversas alíneas do n.° 1 do artigo 334°, do Código de Processo Civil, constatamos que nenhuma delas se mostra preenchida, pelo que se terá de concluir, salvo melhor entendimento, pela improcedência do pedido deduzido pelos requeridos".
2. Salvo o devido respeito, que é muito, errou o Tribunal a quo ao não declarar a caducidade do arresto nos termos do art. 334° n.º 2 do mesmo Código.
3. O procedimento cautelar é sempre dependência da causa que tenha por fundamento o direito acautelado (art. 328° n.º 1 do CPC) que no presente caso a lei impõe que seja instaurada num prazo de 10 dias após a notificação à Recorrida de que foi efectuada notificação dos Recorrentes não ouvidos em audiência, sob pena de caducidade da providência.
4. Ora, o arresto requerido pela Recorrida visa evitar a perda na esfera jurídica do Recorrente de património suficiente para liquidar o crédito ilíquido melhor descrito nos autos n.° CV2-02-0023-CAO. No entanto, a acção de invalidade/impugnação pauliana interposta pela Recorrida, e da qual esta fez depender o arresto visa, ao arrepio da lei, a conservação da garantia patrimonial de um crédito líquido.
5. Não obstante, desde Março de 2012 os Recorrentes viram participações sociais, melhor descritas a fls. 23 e 24 dos autos, na disposição exclusiva do Tribunal e, com a decisão recorrida, manter-se-á tal situação, por tempo indeterminado.
6. No momento em que a Recorrida requereu o presente arresto era inegável que o crédito cuja tutela provisória se queria acautelar era ilíquido e, consequentemente, que este arresto não tem por objecto acautelar o crédito que com a acção declarativa a recorrida visa conservar a garantia patrimonial.
7. Escreve RODRIGUES BASTOS, nas suas "Notas ao Código de Processo Civil", 3ª Edição, fls. 171 e 172, "destinando-se os procedimentos cautelares a combater o periculum in mora, e não tendo, por isso, autonomia, compreende-se que caduque a medida tomada com essa finalidade quando o autor se releva negligente em obter a decisão definitiva. Se assim não fosse, converter-se-ia uma justa norma de protecção do requerente em injustificado gravame do requerido, que ficaria indefinidamente amarrado a uma decisão, proferida sumária e rapidamente e, portanto com bastantes probabilidades de não ser a mais justa".
8. Ora, a acção efectivamente instaurada pela Requerente é muito diferente daquela que a providência exigia que fosse instaurada.
9. Assim, se a providência cautelar se encontra indevidamente apensada à acção, erroneamente suposta como acção principal, isso não poderá impedir que esta venha a caducar, em particular quando a mesma não tem por objecto acautelar o interesse jurídico que com a referida acção a autora pretendia ver reconhecido.
10. Deste modo, se a Recorrida falhou em intentar a acção da qual o arresto efectivamente depende o prazo previsto no n.º 2 do referido art. 334º não foi interrompido com a apensação incorrecta do presente providência cautelar à acção declarativa autuada com o n.º CV1-12-0010-CAO.
11. E, ao falhar essa promoção, apenas é possível concluir no sentido da caducidade do presente arresto, pois a acção declarativa que visa a conservação da garantia patrimonial do crédito cuja garantia patrimonial foi acautelada pelo presente arresto não foi intentada dentro do prazo de caducidade prescrito pelo artigo 334º n.º 2 do CPC.
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A Requerente respondeu à motivação do recurso dos Requeridos, nos termos constantes a fls. 562 a 568 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, pugnando pela improcedência do recurso ora interposto.
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Por sentença de 18/01/2013, foi julgada procedente a oposição deduzida pelos Requeridos e consequentemente foi revogado o arresto anteriormente decretado sobre as quotas detidas pelos 3º e 4ª Requeridos nas sociedades “F Gestão de Participação Limitada”/ “F控股有限公司” e “Companhia de Desenvolvimento Agrícola G, Limitada”/ “G農業發展有限公司”.
Dessa decisão vem recorrer a Requerente, alegando, em sede de conclusão, o seguinte:
A. O presente recurso vem interposto da Decisão proferida no dia 18 de Janeiro de 2013, em que o Tribunal a quo decidiu revogar o arresto anteriormente decretado sobre as quotas detidas pelos 3.° e 4.° Recorridos nas sociedades “F Gestão de Participação Limitada”/ “F控股有限公司” e “Companhia de Desenvolvimento Agrícola G, Limitada”/ “G農業發展有限公司”;
B. Tal providência cautelar de arresto surgiu como extensão de um outro arresto (CV2-02-0023-CAO/D), instaurada pela Recorrente, com fundamento no incumprimento do pagamento do crédito que lhe é devido pelo 1.° Recorrido, B;
C. Em 3 de Maio de 2010 a Recorrente intentou contra o 1.º Recorrido a acção executiva sob a forma sumária (CV2-02-0023-CAO-B), tendo, como base um Acórdão do TSI, sendo fixado o montante de MOP$146,559,753.77, como quantia exequenda o qual, posteriormente, cm resultado da decisão do TUI, ficou o mesmo reduzido ao montante de MOP$90,678,791.85;
D. No decurso da supra mencionada acção executiva sumária, a Recorrente logrou penhorar 24 participações sociais, 5 imóveis e 42 contas bancárias, pertencentes ao 1.° Recorrido e da 2.ª Recorrida;
E. Na sequência da decisão de procedência do procedimento cautelar de arresto (CV2-02-0023-CAO-D), requerido pela Recorrente em 6 de Dezembro de 2011, os bens do 1.° Recorrido referidos foram arrestados;
F. Constituem requisitos do arresto, para além da existência (ou probabilidade de existência ou aparência) do direito de crédito da titularidade do Recorrente - fummus boni juris -, o fundado receio de perda de garantia patrimonial do mesmo;
G. Uma vez que o 1.º Recorrido é casado em comunhão de adquiridos com C, ora 2.ª Recorrida, a garantia patrimonial da Recorrente dever ser considerada em apenas metade daquele valor, por força da meação à qual a 2.ª Recorrida tem direito; porquanto o exercício do direito da 2.ª Recorrida em requerer a separação de bens é indisponível, nos termos do art.º 69.º, n.º 1 do CC;
H. Donde ser nula a declaração de renúncia apresentada como documento n.º 25 da Oposição, a fls. 327 a 329 dos autos, por ser uma limitação ilícita do exercício de um direito da personalidade da 2.ª Recorrida, contrária aos princípios da ordem pública, tal como está prevista no n.º 2 do art.º 273.º do CC);
I. Porém, o tribunal a quo não ponderou na sua decisão ora recorrida o facto de o 1.º Recorrido só ter direito à meação sobre os bens arrestados juntos aos autos n.º CV2-02-0023-CAO-D são bens comuns do casal e não próprios do 1.º Recorrido;
J. Ora, na circunstância da 2.ª Recorrida vir a exercer o seu irrenunciável direito à separação de bens, a garantia patrimonial da Recorrente ficará reduzida a um montante total que rondará os MOP$38.180.500,00, valor esse muito inferior ao crédito que a Recorrente dispõe sobre o 1.° Recorrido,
K. Mesmo, segundo os valores fornecidos pelos recorridos nos autos, o património executável do 1.º Recorrido, após a meação, será eventualmente apenas de MOP$73.145.500,00, valor esse, bastante inferior ao valor do crédito de MOP$75.711.548,72, estipulado pelo tribunal a quo;
L. Embora esse valor estipulado na douta decisão recorrida, como crédito da Recorrente, já anteriormente, no âmbito dos autos de CV2-02-0023-CAO-D, a Meritíssima Juiz titular do processo estimou o valor de tal crédito em MOP$80.000.000,00, isto em Março de 2012;
M. As avaliações feitas pela companhia "savills", contratadas e pagas por uma sociedade dos Recorridos, sobre os cinco imóveis arrestados, são inexactas e desprovidas de fundamento; pois os valores atribuídos pela mesma, não refletem os reais valores de mercado.
N. Conforme mencionado nos relatórios de tais avaliações "a fracção está sujeita a penhora e arresto, por instrução específica do cliente, o imóvel deveria e foi avaliado como estivesse livre de quaisquer encargos e pudesse ser livremente alienado no mercado (fls. 281, 290, 299, 310, 321 dos autos)"
O. Face ao valor de crédito da Recorrente, a título de capital, acrescido os respectivos juros, os bens arrestados do 1.º Recorrido não são suficientes para garantir o crédito da Recorrente;
P. Ficou indiciariamentc provado que o Banco Luso Internacional e o China Construction Bank efectuaram débitos nos montantes de HKD$7.421.870,03 e de HKD$7.148.126,18, respectivamente, no in ício de Agosto de 2012, nas duas contas bancárias pertencentes ao 1.° Recorrido, para liquidação de duas dívidas de "Overdraft";
Q. Factos esses, praticados pelos citados bancos, que podem ser interpretados no sentido de que o 1.º Recorrido é eventualmente devedor de outras dívidas que não são do conhecimento da Recorrente, o que vem contrariar a linha de pensamento do tribunal a quo - ser o 1.º Recorrido líder de um grupo empresarial de grande envergadura - porém, o mesmo é, conforme ficou provado, devedor a vários bancos;
R. Tendo-se verificado ainda que existiam outros actos de levantamentos de depósitos de montante elevado, de HKD$1.000.000,00, duma conta do "Guangdong Development Bank", e, de igual montante duma conta do "Hong Kong and Shanghai Bank Corpo Ltd.", mediante a emissão de dois cheques cruzados a favor da filha do 1.° Recorrido, ora, 4.ª Recorrida;
S. Foi indiciariamente provado pelo Tribunal a quo ser usual os Recorridos recorrerem a fundos pessoais para financiar as operações correntes das empresas da família Ngan, e por vezes trocados entre si para facilitar os financiamentos das diversas sociedades geridas pela família;
T. Perante essa actuação do 1.° Recorrido, qualquer pessoa de são critério, colocada na posição do credor. temerá pela perda da garantia patrimonial do seu crédito, pois a transmissão de fundos pessoais do 1.º Recorrido para os seus familiares, é em si uma circunstância que torna objectivamente dificil a realização coactiva do crédito da Recorrente;
U. As 4 (quatro) quotas acima mencionadas da "Companhia de Desenvolvimentos Agrícola G Limitada", e da "F Gestão de Participação Limitada", que pertenciam ao 1.° Recorrido e à 2.ª Recorrida, e que posteriormente, foram transferidas, no dia 26 de Julho de 2010, para os seus filhos, ora 3.° e 4.° Recorridos, logo após o despacho judicial de 22 de Junho de 2010, que ordenou a penhora de 24 quotas sociais pertencentes ao 1.° Recorrido, e da respectiva notificação das penhoras referentes às respectivas quotas ocorridas entre 7 e 21 de Julho de 2010, junto aos autos de Execução Sumária n.º CV2-02-0023-CAO-B;
V. Ao procederem às identificadas cessões de quotas, o 1.º e a 2.ª Recorridos agiram com a consciência e o único propósito de prejudicar a Recorrente, subtraindo do seu património bens que impossibilitam a integral satisfação do crédito judicialmente reconhecido, que a Recorrente tem sobre o 1.° Recorrido;
W. Tais cessões de quotas celebradas pelos Recorridos, formalizadas cinco dias após da notificação da última penhora de uma quota pertencente ao 1.° Recorrido, não constituem meras coincidências, ou factos de "sucessão nos negócios", como entende o tribunal a quo, mas sim um forte indício de dissipação de património para prejudicar a Recorrente;
X. A transmissão das quotas sociais pertencentes ao 1.° Recorrido e à 2.ª Recorrida para os seus filhos é, em si, uma circunstância que torna objectivamente difícil, senão impossível, a realização coactiva total do crédito da credora, ora Recorrente;
Y. E este receio não assenta unicamente em juízos subjectivos da Recorrente, mas sim em "regras de experiência", pois sendo os filhos do 1.° Recorrido administradores das citadas sociedades comerciais desde 2008 e 2009, é manifestamente duvidosa a razão das cessões de quotas terem acontecido em momento imediatamente posterior à penhora, e não em data anterior;
Z. Como resulta da sua fundamentação, o Tribunal a quo formou a sua convicção com base em documentos fornecidos pelos Recorridos e através dos depoimentos de testemunhas, de matérias relativas às qualidades e à personalidade do 1.° Recorrido e das situações financeiras das sociedades em que os Recorridos são sócios;
AA. O 1.º Recorrido confessou junto ao Tribunal, no processo de execução, que os "bens arrestados naqueles autos constituem a totalidade do seu património", deste modo, os meios financeiros de que dispõe o 1.° Recorrido são extremamente limitados e não aqueles que o tribunal a quo entende;
BB. Mais, das certidões do registo comercial que foram juntas ao processo n.º CVI-12-0010-CAO, e nas informações por escrito do registo predial juntos nos relatórios de avaliação do imóvel, constam informações que levantam dúvidas sobre qual o efectivo regime de bens que vigora na relação matrimonial entre 1.º Recorrido e 2.ª Recorrida;
CC. O Tribunal fundamentou a sua douta decisão, ora recorrida, quanto ao 1.° Recorrido gozar de reputação nos meios financeiros onde realiza operações comerciais, o ter conseguindo, mesmo após as penhoras de que foi alvo, um crédito em conta corrente de MOP23.500.000,00, apenas com o seu aval numa livrança subscrita pela sociedade;
DD. O tribunal a quo não ponderou o facto de que o referido crédito em conta corrente foi subscrito pela sociedade e não apenas pelo o 1.º Recorrido, que foi um mero avalista do mesmo;
EE. Sendo a Recorrente somente credora do 1.° Recorrido e não da família dele, só pode exigir a execução dos bens do 1.º Recorrido, e não os das sociedades em que este é sócio ou administrador, ou dos seus filhos;
FF. O crédito da Recorrente muito superior ao património executável do 1.º Recorrido, que neste património não existem bens suficiente para garantir o referido crédito, bem como existem factos suficientes provados para se poder concluir que o 1.º Recorrido está a desfazer-se de parte do seu património, seja de bens materiais, seja de dinheiro, por forma a furtar-se ou a pôr cm risco a satisfação do crédito da Recorrente;
GG. O Tribunal a quo dispunha de todos os factos que lhe permitiam concluir que existe de facto um receio justificado n: perda da garantia patrimonial por parte do credor, e assim decretar a providência cautelar de arresto; designadamente porque o 1.º Requerido vem dissipando o seu património de forma célere, descuidada e preocupante;
HH. Salvo o devido respeito, O Tribunal a quo não poderia, em todo o caso, ter decretado a revogação do arresto anteriormente decretado sobre as quotas detidas pelos 3.° e 4.ª Recorridos nas sociedades, “F Gestão de Participação Limitada”/ “F控股有限公司” e “Companhia de Desenvolvimento Agrícola G, Limitada”/ “G農業發展有限公司”;
II. Pelo exposto, a Recorrente entende que no presente caso estão preenchidos os requisitos do arresto, pelo que deverá, ser mantido o arresto anteriormente decretado.
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Os Requeridos responderam à motivação do recurso da Requerente, nos termos constantes a fls. 747 a 761v dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, pugnando pela improcedência do recurso ora interposto.
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Foram colhidos os vistos legais.
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II – Factos
Foi considerada como assente a seguinte factualidade pelo Tribunal a quo:
1. Em 5 de Julho de 1993, no âmbito de um projecto imobiliário, o 1.º Requerido assumiu perante a Requerente o compromisso de a reembolsar do capital mutuado e dos juros respectivos, bem como a distribuir-lhe lucros no montante de HKD108,000,000.00 (Cfr. Sentença de 23/10/2006 referente à acção ordinária que correu termos sob o n.º CV2-02-0023-CAO junto do Tribunal Judicial de Base (TJB), págs. 44v. a 46 do Doc. n.º 1 junto aos autos principais).
2. No âmbito do mesmo acordo, o 1.º Requerido obrigou-se para com a Requerente a pagar-lhe os lucros não distribuídos até ao dia 31 de Dezembro de 1996 com uma taxa de juro de 6% ao ano.
3. No ano de 1997, o 1.º Requerido cumpriu parcialmente o acordado com a Requerente, tendo liquidado somente parte dos lucros e dos juros devidos.
4. Por o 1.º Requerido não ter cumprido as obrigações no âmbito do acordo referido em 1.º, a Requerente intentou contra ele, em 28 de Dezembro de 2001, a acção ordinária supra identificada, na qual formulou o seguinte duplo pedido, a final:
“[…] condenar-se o Réu a pagar à Autora a quantia de HKD$58,745,578.44, equivalente a MOP$60,507,945.79, acrescida de juros moratórios vencidos e vincendos, à taxa de 10% ao ano, e a quantia de HKD$51,278,437.17, equivalente a MOP52,816,790.29, acrescida de juros moratórios vencidos e vincendos, à taxa de 6% ao ano, até efectivo e integral pagamento.” (Cfr. págs. 9v. e 10 do referido Doc. n.º 1 dos autos principais).
5. Na referida sentença, proferida a 23 de Outubro de 2006, o TJB condenou o 1.º Requerido no segundo pedido formulado pela Requerente, tendo julgado o primeiro pedido improcedente (Cfr. págs. 47 e 48 do Doc. n.º 1 dos autos principais).
6. A 21 de Janeiro de 2010, o Tribunal de Segunda Instância (TSI) julgou procedente o recurso da Requerente interposto da sentença final e parcialmente procedente o recurso apresentado pelo 1.º Requerido (Cfr. págs. 49 a 83v. do Doc. n.º 1 dos autos principais).
7. O TSI julgou o primeiro pedido da Requerente procedente, tendo dado razão ao 1.º Requerido quanto à iliquidez da dívida no que respeita ao segundo pedido, quantia esta que ficou de ser apurada em execução de sentença (Cfr. pág. 83v. do Doc. n.º 1 dos autos principais).
8. A 3 de Maio de 2010, a Requerente instaurou contra o 1.º Requerido uma acção executiva sob a forma sumária, que correu os seus termos sob o n.º CV2-02-0023-CAO-B, com base no referido Acórdão do TSI, tendo fixado a quantia exequenda em MOP146,559,753.77 (Cfr. págs. 2 a 33 do Doc. n.º 2 dos autos principais).
9. A 10 de Março de 2011, o Acórdão do Tribunal de Última Instância (TUI) considerou que o supra mencionado aresto do TSI não havia considerado procedente o primeiro pedido da Requerente, mas ao invés havia absolvido o 1.º Requerido da instância quanto ao mesmo, tendo mantido a condenação deste no segundo pedido, quantia a liquidar em execução de sentença (Cfr. págs. 84 a 90 do Doc. n.º 1 dos autos principais).
10. Em resultado da decisão proferida pelo TUI, a supra mencionada execução foi parcialmente extinta quanto ao primeiro pedido, tendo ficado reduzida ao montante do segundo pedido, i.e., MOP90,678,791.85 (Cfr. pág. 75 a 77v. do Doc. n.º 2 dos autos principais).
11. A 29 de Julho de 2011, através do Despacho saneador-sentença proferido nos autos de Embargos à Execução com o n.º CV2-02-0023-CAO-C, o TJB declarou a procedência dos embargos do 1.º Requerido por considerar que a quantia exequenda carecia de ser liquidada pelo tribunal, e determinou a concomitante absolvição da instância (Cfr. págs. 2 a 6 do Doc. n.º 3 dos autos principais).
12. Decisão essa que foi confirmada pelo Acórdão do TSI, datado de 24.05.2012, transitado em julgado.
13. No decurso da supra mencionada acção executiva sumária referida no artigo 8.º, a Requerente logrou penhorar 48 participações sociais, 5 imóveis e 42 contas bancárias pertencentes ao 1.º Requerido (Cfr. págs. 59 a 61, 62 a 72 e 72 a 74 do Doc. n.º 2 dos autos principais).
14. O 1.º Requerido declarou nos autos de Execução Sumária n.°CV2-02-0023-CAO-B, que os bens mencionados em 13.° constituem a totalidade do seu património.
15. Em razão da natureza devolutiva do recurso referido no artigo 12.º supra e a pedido do ora 1.º Requerido, o TJB ordenou, por Despacho proferido a 14 de Novembro de 2011, o levantamento da penhora que incidia sobre esses bens (Cfr. pág. 79 do Doc. n.º 2 dos autos principais).
16. Na sequência da decisão de procedência do procedimento cautelar de arresto, requerido pela Requerente, de 6 de Dezembro de 2011, o qual correu os seus termos sob o n.º CV2-02-0023-CAO-D, os bens do 1.º Requerido, referidos no artigo 14.º supra, foram arrestados (Cfr. Doc. n.º 4 dos autos principais).
17. Tendo o 1.º Requerido deduzido oposição ao mencionado arresto, veio a mesma a ser julgada improcedente por douta sentença proferida em 27.03.2012, constante de fls. 270 a 278 dos autos.
18. Em 26 de Junho de 2012, a Requerente interpôs, por apenso ao processo CV2-02-0023-CAO, correspondente ao Apenso E, uma nova acção executiva, sob a forma ordinária, onde líquida em MOP101.319.616,35 a respectiva obrigação do 1.º Requerido, em conformidade com o teor do requerimento executivo constante da certidão judicial junta a fls.559, da acção principal.
19. Em 22 de Maio de 2009 foi constituída em Macau uma sociedade comercial por quotas com a designação “F Gestão de Participação Limitada”/ “F控股有限公司”, com sede na Rua de XX, n.º XX, Edifício XX Centro Comercial, XX.º andar, tendo por objecto a “gestão das participações comerciais próprias, investimento e gestão de serviços de transporte internacional”, com o capital social de MOP100,000.00, titulado por dois sócios: a sociedade “H Shiping International, Limited”, com uma quota de MOP26,800,00, e o 1.º Requerido, com uma quota de MOP73,200.00 (Cfr. Doc. n.º 5 dos autos principais).
20. Por contrato de 5 de Novembro de 2009, a referida sociedade “H Shiping International Limited” dividiu a quota que detinha na “F Gestão de Participação Limitada” em duas, uma no valor de MOP12,200.00, que reservou para si, e outra no valor de MOP14,600.00, que cedeu ao 1.º Requerido, o qual a unificou com a quota que já detinha, passando a deter uma quota única de MOP87,800.00 (Cfr. Doc. n.º 5 dos autos principais).
21. Em 26 de Julho de 2010, o 1.º Requerido e a 2.ª Requerida dividiram esta sua quota em duas, uma no valor de MOP50,000.00, que cederam ao 3.º Requerido, e outra no valor de MOP37,800.00, que cederam à 4.ª Requerida, sendo ambas as cessões feitas pelo seu valor nominal, tendo os cedentes declarado já ter recebido o respectivo preço (Cfr. Docs. n.ºs 5 e 6 dos autos principais).
22. O 3.º Requerido e a 4.ª Requerida são administradores, entre outros, da sociedade "F Gestão de Participação Limitada” (Cfr. Doc. n.º 5 dos autos principais).
23. Em 3 de Outubro de 2002 foi constituída em Macau uma sociedade comercial por quotas com a designação, em língua portuguesa “Companhia de Desenvolvimento Agrícola G, Limitada”/ “G農業發展有限公司”, com sede na Rua de XX, n.º XX, Edifício Comercial XX, XX.º andar X, tendo por objecto o “investimento e comércio de importação e exportação de produtos de agricultura”, com o capital social de MOP1,000,000.00 titulado por três sócios: o 1.º Requerido, com uma quota de MOP510,000.00, I, com uma quota de MOP290,000.00, e J, com uma quota de MOP200,000.00 (Cfr. Doc. n.º 7 dos autos principais).
24. A partir de 4 de Março de 2008, o 1.º Requerido passou a deter na sociedade “Companhia de Desenvolvimento Agrícola G, Limitada” uma quota no valor de MOP900,000,00 (Cfr. Doc. n.º 7 dos autos principais).
25. Em 26 de Julho de 2010, o 1.º Requerido e a 2.ª Requerida dividiram esta sua quota em duas, uma no valor de MOP500,000.00, que cederam ao 3.º Requerido, e outra no valor de MOP400,000.00, que cederam à 4.ª Requerida, sendo ambas as cessões feitas pelo seu valor nominal, tendo os cedentes declarado já ter recebido o respectivo preço pago em dinheiro (Cfr. Docs. n.ºs 7 e 8 dos autos principais).
26. O 1.º Requerido, o 3.º Requerido e a 4.ª Requerida são administradores da mesma sociedade.
27. As duas identificadas sociedades são detentoras de participações sociais em sociedades sediadas na China Continental (Cfr. Doc. n.º 9 dos autos principais).
28. A “F Gestão de Participação Limitada” é a sócia maioritária da sociedade “K Logística de Cargas Limitada”/“K物流有限公司”, detendo 82% do seu capital social, o qual é de USD15,000,000.00 (15 milhões de dólares dos Estados Unidos) e cujo objecto social compreende as operações de carga, contentores, distribuição de bens, armazenamento e agenciamento de carga, gestão de terminal de contentores, fornecimento e reparação de contentores, venda a retalho de acessórios de máquinas e equipamento de terminais, de veículos e de navios (Cfr. pág. 1 do Doc. n.º 9 dos autos principais).
29. A “Companhia de Desenvolvimento Agrícola G, Limitada” é a sócia única de três sociedades constituídas na China Continental:
– A “L Limitada”/“L有限公司”, com o capital social de USD3,610,000.00 (três milhões seiscentos e dez mil dólares dos Estados Unidos), cujo objecto social é a pesquisa, cultivo, desenvolvimento e comércio de variedades frutícolas e hortícolas, pesquisa e desenvolvimento de novas variedades frutícolas, importação e exportação de bens (Cfr. págs. 9 e 10 do Doc. n.º 9 dos autos principais);
– A “M Limitada”/“M有限公”, com o capital social de USD3,600,000.00 (três milhões seiscentos mil dólares dos Estados Unidos), cujo objecto social é o cultivo, processamento, comércio de citrinos e outras variedades frutícolas e hortícolas (Cfr. págs. 5 e 6 do Doc. n.º 9 dos autos principais); e
– A “N Limitada”/“N有限公司”, com um capital social de USD3,590,600.00 (três milhões quinhentos e noventa mil e seiscentos dólares dos Estados Unidos), cujo objecto social é a pesquisa, cultivo, desenvolvimento e comércio de variedades frutícolas e hortícolas (Cfr. págs. 7 e 8 do Doc. n.º 9 dos autos principais).
30. Estas três sociedades são as sócias da sociedade “O, Lda.”/“O有限公司”, com um capital social de 50 milhões de Yuans (CNY50,000,000.00), cujo objecto social é o cultivo, processamento e comércio de citrinos e outras variedades frutícolas e vegetais, pesquisa e desenvolvimento de novas variedades frutícolas, importação e exportação de bens (Cfr. págs. 3 e 4 do Doc. n.º 9 dos autos principais).
31. A “F Gestão de Participação Limitada” e a “Companhia de Desenvolvimento Agrícola G, Limitada” detêm, respectivamente, a maioria do capital social de uma sociedade e a totalidade pela via directa e indirecta das participações sociais de outras quatro sociedades, todas sediadas na China Continental (Cfr. Doc. n.º 9 dos autos principais).
32. Este grupo de sociedades tem um capital social agregado no valor cerca de setenta milhões de Yuans (CNY70,000,000.00).
33. Mesmo após ter cedido a totalidade das suas participações societárias na “F Gestão de Participação Limitada” e na “Companhia de Desenvolvimento Agrícola G, Limitada”, o 1.º Requerido continua a ser o representante jurídico e a desempenhar o cargo de Director-Geral em todas as sociedades sediadas na China Continental acima referidas.
34. As transmissões das participações sociais que o 1.º Requerido e a 2.ª Requerida detinham na “F Gestão de Participação Limitada” e “Companhia de Desenvolvimento Agrícola G, Limitada” a favor dos 3.º Requerido e 4.ª Requerida, ambas efectuadas em 26 de Julho de 2010, ocorreram após o Despacho de 22 de Junho de 2010 que ordenou a penhora de 24 quotas sociais pertencentes ao 1.º Requerido, proferido nos autos de execução mencionados no artigo 13.º supra (Cfr. pág. 34 do Doc. n.º 2 dos autos principais).
35. Tendo a notificação das penhoras referentes às respectivas quotas ocorrido entre 7 e 21 de Julho de 2010 (cfr. termos de penhora constantes de págs. 35 a 58 do Doc. n.º 2 dos autos principais).
36. Dez das vinte e quatro sociedades nas quais o 1.º Requerido viu as suas quotas serem penhoradas, encontram-se sediadas no mesmo domicílio profissional dos RR. (conforme vinte e quatro certidões anexadas como Doc. n.º 10 dos autos principais).
37. Das referidas vinte e quatro sociedades, o 1.º Requerido é gerente em vinte e uma, constando a 2.ª Requerida, o 3.º Requerido e a 4.ª Requerida como gerentes em quatro, seis e em dez dessas sociedades, respectivamente (Cfr. Doc. n.º 10 dos autos principais).
38. As 24 participações sociais em sociedades sediadas em Macau têm um valor nominal global de MOP5,361,000.00, os depósitos penhorados em 42 contas bancárias, têm um valor aproximado de MOP6,000,000.00 e os 5 bens imóveis tiveram o valor global de aquisição de MOP7,604,600, (Cfr. Docs. n.º 4 e n.º 11 dos autos principais).
39. O 1.º Requerido comprometeu-se a pagar à Requerente o montante de MOP108,000,000.00 (cento e oito milhões de patacas), a título de lucros, até ao dia 31 de Dezembro de 1996 (Cfr. pág. 59 do Doc. n.º 2 dos autos principais).
40. Requerente e 1.º Requerido acordaram ainda que a partir do dia 1 de Janeiro de 1997, ao montante de lucros em falta, acresce uma taxa de juros de 6 % ao ano (Cfr. pág. 59 do Doc. n.º 2 dos autos principais).
41. O 1.º Requerido pagou, em várias prestações efectuadas entre 4 de Janeiro e 10 de Julho de 1997, o montante total de MOP69,038,355.40, não tendo, desde o dia 10 de Julho de 1997 até hoje, pago mais qualquer montante por conta da dívida que tem perante a Requerente.
42. A Requerente é ainda credora da quantia de MOP 38,961,644.60, (trinta e oito milhões novecentos e sessenta e um mil seiscentos e quarenta e quatro patacas e sessenta avos) só a título de lucros.
43. À qual acresce o montante de MOP36,749,904.12 (trinta e seis milhões setecentos e quarenta e nove mil novecentos e quatro patacas e doze avos) a título de juros anuais à taxa de 6% contados a partir de 10 de Julho de 1997 até 1 de Março de 2012.
44. O que representará um montante em dívida de cerca de MOP75,711,548.72 (setenta e cinco milhões setecentos e onze mil quinhentos e quarenta e oito patacas e setenta e dois avos).
45. No montante apurado não estão incluídos os juros legais em dívida, a contar desde a citação, ocorrida a 21 de Novembro de 2002 até efectivo e integral pagamento.
46. Todos os Requeridos são titulares de cargos de administração em várias das sociedades alvo de penhoras no processo CV2-02-0023-CAO-B.
47. o facto de as quotas em questão não se encontrarem dadas de penhor ou de outra forma oneradas, permite uma alienação rápida e facilmente concretizável pelo 3.º Requerido e pela 4.ª Requerida.
48. O 1º requerido é um homem íntegro, sério, empresário de prestígio local e nacional, homem público e político.
49. O 1.º Requerido é membro da Conferência Consultiva Política Nacional do Povo Chinês, faz parte da Comissão Nacional para os Assuntos Económicos, sendo seu Vice-Presidente.
50. O 1.º Requerido foi eleito, em 2011, Vice-Presidente da Direcção da associação Comercial de Macau e da Associação de Beneficência do Hospital Kiang Wu e agraciado, em 2007, com a medalha de honra “Lotus de Prata”.
51. O 1.º Requerido tem a base da sua vida pessoal, pública e comercial em Macau.
52. O 1.º Requerido goza de reputação nos meios financeiros onde realiza operações comerciais.
53. O 1.º Requerido, mesmo após as penhoras aludidas em 13.º, obteve para a sociedade P, Investimento Industrial e Comercial, Lda., junto do BNU, um crédito em conta corrente (overdraft) no montante de MOP23.500.000,00, apenas com o seu aval numa livrança subscrita pela sociedade.
54. O 1.º Requerido goza de crédito e reputação junto da banca.
55. Na conta n.º 1XXX1-0XXXX5-9, do Banco Luso Internacional, Lda., pertencente ao 1.º Requerido, à data com um saldo de AUD1.491.621,67, foi debitada, em 05.08.2010, a quantia de HKD7.421.870,03, por iniciativa do próprio banco, para liquidação de uma dívida do 1.º requerido para com tal instituição bancária, na modalidade de facilidades “Overdraft”, até ao montante de HKD8.000.000,00.
56. Na conta n.º3XXX2, do China Construction Bank., pertencente ao 1.º Requerido, à data com um saldo de USD1.143.490,00, foi debitada, em 02.08.2010, a quantia de HKD7.148.126,18, por iniciativa do próprio banco, para liquidação de uma dívida do 1.º requerido para com tal instituição bancária, na modalidade de facilidades “Overdraft” até ao montante de HKD8.400.000,00.
57. O levantamento de HK$1.000.000,00, da conta do “Guangdong Development Bank” (GDB), e igual montante, junto da conta do ”Hong Kong and Shanghai Bank Corp. Ltd.” (HSBC), foi feito mediante a emissão de 2 cheques cruzados a favor da filha do requerido, E, 4ª requerida.
58. A conta do "Banco Luso Internacional" n.º 1XXX1-1XXXX2-0, aberta em nome do 1.º Requerido, entre 9/7/2010 e 11/8/2010, passou de MOP$96.401,00 para MOP$144.401,39.
59. A estrutura dos negócios do 1.º Requerido tem uma natureza familiar.
60. Os 3.º e 4.º requeridos são filhos do 1.º e 2.º Requeridos.
61. É usual recorrerem a fundos pessoais (1.º requerido, sua mulher e filhos) para financiar as operações correntes das empresas da família Ngan.
62. Os fundos do 1.º requerido e elementos principais da sua família são, por vezes, trocados entre si para facilitar os financiamentos das diversas sociedades geridas pela família, atendendo às ausências frequentes de Macau por parte do requerido, em virtude dos seus afazeres, políticos e pessoais, no Interior do País e no estrangeiro.
63. O 4º requerido vem acompanhando o seu pai na administração das diversas sociedades que compõem o seu património e no exercício da respectiva actividade comercial.
64. As transmissões de quotas para os filhos do 1.º requerido estão inseridas num plano de sucessão nos negócios deste.
65. O 1.º Requerido B nasceu em 14.03.1948, criador e líder de um grupo empresarial de grande envergadura, que opera em vários ramos de actividade em Macau e na RPC.
66. As sociedades” P H, Gestão de Participação, Limitada” e “Companhia de Desenvolvimento Agrícola G, Limitada”, estão envolvidas em projectos de grande envergadura na China continental, através de sociedades ali sediadas, por elas criadas e cujo capital social detêm na quase totalidade.
67. Esta nova fase implica um acompanhamento quotidiano, no terreno dos referidos projectos.
68. O 4º requerido assumiu, juntamente com o 1.º Requerido, a gestão de facto e supervisão da actividade comercial daquelas duas sociedades.
69. Nos termos dos Artigos 6º e 8º dos respectivos Estatutos, a sociedade “F GESTÃO DE PARTICIPAÇÃO, LIMITADA”, obriga-se mediante a assinatura de quaisquer dois administradores de diferentes grupos.
70. Sendo que, os 1º, 3º e 4º requeridos são administradores do Grupo B, enquanto o Grupo A é constituído por dois terceiros.
71. Nos termos do Artigo 8º dos Estatutos da sociedade “COMPANHIA DE DESENVOLVIMENTO AGRÍCOLA G, LIMITADA”, a forma de a obrigar é idêntica (assinatura de quaisquer dois administradores de diferentes grupos)
72. Sendo que o 1º e 3º requeridos integram o Grupo A e a 4ª Requerida e um terceiro integram o Grupo B.
73. A Fracção autónoma “N5”, arrestada nos autos de arresto supra referidos, foi avaliada em 08 de Fevereiro de 2012, HKD$3.780.000,00.
74. A Fracção autónoma “F4”, arrestada nos autos de arresto supra referidos, foi avaliada em 08 de Fevereiro de 2012, HKD$4.220.000,00;
75. A Fracção autónoma “WR/C” arrestada nos autos de arresto supra referidos, foi avaliada em 08 de Fevereiro de 2012, HKD$40.000.000,00.
76. A Fracção autónoma “XR/C” arrestada nos autos de arresto supra referidos, foi avaliada em 08 de Fevereiro de 2012, HKD$40.000.000,00 (doc. 23);
77. A Fracção autónoma “DR/C” arrestada nos autos de arresto supra referidos, foi avaliada em 08 de Fevereiro de 2012, HKD$43.000.000,00.
78. A 2ª Requerida emitiu a declaração constante dos autos a fls. 327 a 329, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
*
III – Fundamentação:
Questão prévia: - Da junção dos documentos
Os Requeridos, em consequência do recurso da sentença final interposto pela Requerente, apresentaram 5 documentos que dizem respeito às novas avaliações dos 5 bens imóveis em referência.
A Requerente veio opor-se à junção dos mesmos, por entender que “são documentos desnecessários, que dizem respeito a factos da causa já indiciariamente provados pelo tribunal a quo, irrelevantes para o sorte desta”.
O artº 616º do CPCM prevê que:
1. As partes podem juntar documentos às alegações nos casos a que se refere o artigo 451º ou no caso de a junção apenas se tornar necessária em virtude do julgamento proferido na primeira instância.
2. Os documentos supervenientes podem ser juntos até se inciarem os vistos aos juízes; até esse momento podem ser também juntos os pareceres de advogados, jurisconsultos ou técnicos.
3. É aplicável à junção de documentos e pareceres, com as necessárias adaptações, o disposto nos artigos 467º e 468º.
Por sua vez, dispõe o artº 451º do CPCM que:
1. Depois do encerramento da discussão só são admitidos, no caso de recurso, os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento.
2. Os documentos destinados a provar factos posteriores aos articulados, ou cuja apresentação se tenha tornado necessária por virtude de ocorrência posterior, podem ser oferecidos em qualquer estado do processo.
No caso em apreço, como a Requerente impugnou, no recurso final, a decisão da matéria de facto quanto ao valor atribuído aos 5 bens imóveis em causa, os Requeridos apresentaram 5 documentos em referência juntamente com as contra-alegações, a fim de defender a inalteração do facto provado.
Não são, portanto, documentos destinados a provar factos posteriores.
Serão então documentos necessários em virtude do julgamento proferido na primeira instância?
A resposta não deixa de ser negativa.
Ao nível da doutrina, o Prof. Antunes Varela1 ensina que o documento só se torna necessário em virtude do julgamento a quo quando a decisão a quo “se tenha baseado em meio probatório inesperadamente junto por iniciativa do tribunal ou em preceito jurídico com cuja aplicação as partes justificadamente não tivessem contado”.
Ou seja, a decisão a quo pode, por isso, “criar pela primeira vez a necessidade de junção de determinado documento, quer quando se baseie em meio probatório não oferecido pelas partes, quer quando se funde em regra de direito com cuja aplicação ou interpretação os litigantes justificadamente não contavam”.
A jurisprudência tanto local2 como comparada3 tem seguido a mesma linha de pensamento, decidindo que “A apresentação de documentos juntamente com as alegações, fora dos casos do art. 451º, apenas se justifica, não por causa da posição das partes na petição inicial ou na contestação, mas em virtude da atitude inquisitiva do tribunal na recolha de algum elemento instrutório (portanto, não oferecido pelas partes), ou por causa de alguma disposição jurídica ou regra de direito com cuja aplicação ou interpretação os litigantes justificadamente não contassem. Ou seja, a sua admissibilidade nessa fase está relacionada com o efeito surpresa que para o apresentante constituiu a posição do tribunal recorrido. Dito de outra maneira, só é possível a junção de documentos nesta fase se a sua necessidade era imprevisível antes de proferida a decisão na 1ª instância”.
Como já referimos anteriormente, os 5 documentos em causa visam para defender a inalteração da matéria de facto provada, pelo que não documentos decorrentes de qualquer necessidade de alegação ou prova devida à decisão recorrida.
Pelo exposto, julga-se procedente a oposição formulada e determina-se, em consequência, o desentranhamento dos 5 documentos em causa.
Custas do desentranhamento pelos Requeridos com 1UC de taxa de justiça.
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I. Do recurso da sentença final:
O Tribunal a quo decidiu revogar o arresto anteriormente decretado por entender que não está verificado o pressuposto de justo receio da perda da garantia patrimonial do crédito.
No entanto, a Requerente da providência, ora Recorrente da sentença final, entendeu de forma contrária.
Para ela, tal receio existe, já que:
- As avaliações feitas pela empresa “Savills” às fracções autónomas “N5”, “F4”, “WR/C”, “XR/C” e “DR/C”, no valor de MOP$134.930.000,00, não correspondem aos valores reais do mercado, já que as mesmas foram avaliadas como se estivessem livres de quaisquer encargos e pudessem ser livremente alienadas no mercado e que na verdade, as mesmas foram objecto de penhora do Tribunal.
- O valor real do mercado dos imóveis em referência é apenas de cerca de MOP$65.000.000,00.
- Assim, somando este valor ao valor nominal das 24 participações sociais (MOP$5.361.000,00) e ao montante dos depósitos em 42 contas bancárias (MOP$6.000.000,00), o valor total dos bens arrestados e penhorados nos autos de execução é apenas de cerca de MOP$76.361.000,00, montante global esse que há de ainda sujeitar-se ao direito à meação do cônjuge do executado, uma vez que são bens comuns do casal.
- O direito à meação dos bens comuns é um direito indisponível, nos termos do artº 69º, nº 1 do CC, daí que a declaração da renúncia daquele direito à meação dos bens arrestados e penhorados nos autos de execução por parte do cônjuge do executado é nula.
- A transmissão das quotas (objecto do arresto nos presentes autos) feita pelo executado para os seus filhos não é um mero plano de sucessão nos negócios como foi erradamente considerado pelo Tribunal a quo, mas sim uma conjugação de esforços no seio familiar com vista à dissipação do património do executado de modo a impossibilitar ou a dificultar a satisfação do seu crédito.
- Além disso, o executado procedeu a levantamentos de depósitos bancários em valores elevados, o que constitui uma outra prova indiciária forte da dissipação do património por parte do executado.
- Por fim, o Banco Luso Internacional e o China Construction Bank efectuaram débitos em montantes elevados no início de Agosto de 2012, nas duas contas bancárias pertencentes ao executado, para liquidação de duas dívidas de “Overdraft”, o que indicia que o executado é eventualmente devedor de outras dívidas que não são do conhecimento da Requerente.
Quid iuris?
Antes de mais, queremos salientar que a estrutura do presente recurso da sentença final é infeliz na medida em que se mistura a impugnação da matéria de facto e do direito, sem especificar no entanto uma e outra.
Como é sabido, o nº 1 do artº 599º do CPCM exige a impugnação específica da matéria de facto, sob pena de rejeição do recurso nesta parte.
No entanto, tendo em conta o princípio do favorecimento ou pro-actione e para evitar desentendimentos no sentido de que este Tribunal queria refugiar-se em pretextos para não a apreciar, optamos pela sua apreciação.
O Tribunal a quo justificou a sua convicção pela forma seguinte:
   “A convicção do Tribunal assenta no teor dos documentos juntos aos presentes autos, bem como naqueles que constam dos apensos, conjugado com o depoimento das testemunhas ouvidas em audiência final, conforme a avaliação que infra se exporá.
O depoimento claro, conciso e que reputamos por sério e credível da testemunha, Q, serviu para dar como indiciariamente provados os factos aludidos em 73) a 77), na medida em que foi o próprio depoente quem elaborou os relatórios de avaliação juntos a fls. 279 a 326, o que lhe permitiu explicar detalhadamente o método utilizado para chegar a tais valores de mercado e asseverar que, actualmente, os mesmos pecam por defeito dado que os respectivos preços terão aumentando cerca de 20%. Consigna-se, ainda, que a explicação desta testemunha, conjugada com a nossa experiência judiciária, nos leva a concluir que o facto de duas das fracções autónomas para comércio estarem arrendadas em nada abala o seu valor de mercado, na medida em que sendo os contratos em questão de curta duração e terminarem um no ano em curso e o outro no próximo ano, será sempre possível ao senhorio a sua denúncia para o terminus do respectivo prazo. Por outro lado, os documentos juntos pela Requerente não são aptos a abalar a credibilidade de tais relatórios de avaliação, dado que o tribunal também não desconhece que, muitas das vezes, nas transacções imobiliárias, não é declarado o preço real da venda, muitos dos documentos juntos referem-se a vendas ocorridas um ano antes da avaliação ora em causa, sendo certo que também se considera inexplicável as discrepâncias existentes entre os próprios valores de transacção que foram compilados pela requerente, dado que, segundo a sua tese estamos face a imóveis com as mesmas características e a mesma localização.
Pelos motivos acabados de expor, inverteu o tribunal o seu juízo indiciário relativamente ao facto anteriormente apurado de que os bens que presentemente se encontram arrestados no processo n.° CV2-02-0023-CAO-D, têm um valor inferior ao crédito da Requerente.
Atendemos ao depoimento de R, “project manager” da sociedade F, pessoa que demonstrou ser próxima dos requeridos e conhecedora da amplitude dos respectivos negócios e investimentos, sem que, por esse facto, lhe tenha faltado imparcialidade e rigor no respectivo relato, para dar como indiciariamente demonstrada a matéria supra discriminada em 48), 51), 52) 54), 59), 61) e 62) – os dois últimos, corroborados pelos documentos bancários juntos a fls.244 a 246 – 63) a 65) – estando a idade do 1.º requerido provada documentalmente a fls.385 – e 66) a 68). Julgamos que este depoimento vai de encontro às regras de normalidade e experiência comum, quer no que respeita à forma como são dirigidos negócios em que estão envolvidos vários membros da mesma família, sendo totalmente razoável e credível a tese da progressiva sucessão no comando das empresas, do 1.º Requerido para os 3.º e 4.º Requeridos, ponderando a idade do primeiro e os assuntos não empresariais em que se comprava estar envolvido.
Atente-se, ainda, que os factos avançados pelos requeridos e supra indiciados em 65 a 66 são demonstrados pelos próprios documentos juntos com o requerimento inicial onde é possível verificar que o 1.º Requerido é líder de um grupo empresarial de grande envergadura, que opera, sobretudo, em ramos de actividade na República Popular da China, onde, segundo a própria requerente alegava, as suas sociedades participam noutras com capitais superiores a cem milhões de Yuans.
Relativamente aos factos demonstrados nos itens 49), 50), 53), 55) a 58), 69) a 72) assentam em prova documental apta para os atestar (resultando os últimos do teor das certidões de matrícula das sociedades nele mencionadas):
- não nos tendo suscitado dúvidas que o mesmo exerce os cargos que alega, ponderando o teor de fls. 211;
- acreditando que, mesmo após as penhoras efectuadas na acção executiva que corre termos no CV2, o 1.º Requerido continuou a ter créditos bancários avultados só com base no seu aval pessoal, tendo por base o teor dos contratos bancários de fls. 212 a 236;
- apurando que as contas do Banco Luso Internacional e do China Construction Bank não foram movimentadas por iniciativa do 1.º Requerido mas do próprio banco, atentos os contratos “Overdraft” existentes entre ambos, conforme resulta dos documentos bancários juntos a fls. 237 a 246.
Naturalmente que, em face desta nova prova indiciária, o juízo anterior do tribunal – de que o 1.º requerido teria ocultado avultadas quantias da requerente, sua credora – não sai demonstrada, tendo-se, ao invés, apurado que uma das suas contas bancárias apresenta um ligeiro acréscimo.
Acolheu ainda o tribunal o teor de novas certidões judiciais para dar como provados os itens 12), 17e 18).
Por fim, valorou o tribunal o depoimento de S, conjugado com os contratos bancários celebrados com o BNU, supra referidos, para considerar demostrado que o 1.º Requerido goza de crédito e reputação na banca, sendo certo que, quando questionada a testemunha quanto ao facto de não ter sido prestada a garantia bancária de MOP80.000.000,00 a que o mesmo se propunha, para substituição da presente providência, pelo mesmo foi asseverado que tal garantia veio, muito recentemente, a ser aprovada em dois bancos, mas que não foi possível tê-las prontas no prazo determinado pelo tribunal – asserção que o documento junto a fls. 71 do Apenso B) também indicia.
Relativamente aos factos da oposição que não ficaram demonstrados indiciariamente a tanto se deve a falta de prova produzida que fosse apta para tal.
Por fim, damos conta que, em face dos factos que agora se apuram, vários dos princípios de prova da nossa anterior decisão foram substituídos, caindo por terra a realidade indiciária anterior relativa à intenção que estava subjacente à cessão de quotas entre os requeridos e que ocupa os nossos autos principais.”
Começamos então pelo valor atribuído aos bens imóveis em causa.
Dispõe o nº 1 do artº 629º do CPCM que:
1. A decisão do tribunal de primeira instância sobre a matéria de facto pode ser alterada pelo Tribunal de Segunda Instância:
a) Se do processo constarem todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre os pontos da matéria de facto em causa ou se, tendo ocorrido gravação dos depoimentos prestados, tiver sido impugnada, nos termos do artigo 599.º, a decisão com base neles proferida;
b) Se os elementos fornecidos pelo processo impuserem decisão diversa, insusceptível de ser destruída por quaisquer outras provas;
c) Se o recorrente apresentar documento novo superveniente e que, por si só, seja suficiente para destruir a prova em que a decisão assentou.
Analisada a fundamentação da convicção acima transcrita, não encontramos qualquer erro, muito menos notório, na apreciação da prova nesta parte.
Bem pelo contrário, o Tribunal a quo fez uma correcta análise crítica das provas existentes, especificando os fundamentos que foram decisivos para a sua convicção.
É certo que os bens imóveis em causa foram objecto de penhora nos autos de execução nº CV2-02-0023-CAO-D, mas tal facto nada altera a decisão da matéria de facto em causa, já que foram penhorados apenas para a garantia do pagamento da mesma dívida da Requerente.
Por outro lado, o simples facto de que o relatório da avaliação foi requerido e pago por uma sociedade dos Requeridos não significa necessariamente que esta avaliação é incorrecta ou desprovida de fundamento.
No que respeita às 13 certidões prediais juntas pela Requerente com vista a abalar os valores atribuídos aos bens imóveis em causa, cumpre-nos dizer que a análise crítica desta contra-prova feita pelo Tribunal a quo está conforme as regras de experiência comum.
Em relação à questão da transmissão das quotas para os filhos, ficou provado que se trata de um plano de sucessão nos negócios do executado para com os seus filhos, e não de um acto de dissipação do património como é pretendido pela Requerente.
Não ignoramos que as transmissões das quotas em causa foram realizadas pouco tempo depois da notificação da penhora dos bens do executado, porém, isto pode ser uma mera coincidência temporal.
Antes das transmissões, cada uma das quotas das duas sociedades foram primeiramente divididas em duas e só depois é que foram transmitidas para o filho e a filha.
Repare-se, se as transmissões em causa visem simplesmente a dissipação do património do executado, não haveria necessidade de se proceder às divisões em referência, pois, bastaria ceder uma (na sua totalidade) para o filho e outra (também na sua totalidade) para a filha, alcançando assim o objectivo de ocultar ou dissipar os bens.
Por outro lado, há-de notar ainda que a cessão das quotas aos filhos não foi feita em partes iguais: a parte cedida ao filho é maior do que a da filha.
Esta forma de partilha das quotas está conforme a mentalidade tradicional chinesa, segundo a qual o filho recebe mais do que a filha.
Quanto aos factos provados de que “É usual recorrerem a fundos pessoais (1.º requerido, sua mulher e filhos) para financiar as operações correntes das empresas da família Ngan” e “Os fundos do 1.º requerido e elementos principais da sua família são, por vezes, trocados entre si para facilitar os financiamentos das diversas sociedades geridas pela família, atendendo às ausências frequentes de Macau por parte do requerido, em virtude dos seus afazeres, políticos e pessoais, no Interior do País e no estrangeiro”, o Tribunal a quo também explicou de forma detalhada como é que se formou esta convicção, em cuja apreciação não detectamos qualquer erro.
Face ao exposto, bem como conjugando com outros elementos probatórios existentes nos autos, podemos concluir que o recurso é improcedente na parte da impugnação da decisão da matéria de facto.
Passamos agora para a parte jurídica.
O Tribunal a quo pronunciou-se nos seguintes termos:
   “O artigo 351, do Código de Processo Civil estatui que “O credor que tenha justificado receio de perder a garantia patrimonial do seu crédito pode requerer o arresto de bens do devedor.
   Por sua vez, o nº 1 do artigo 352.º do Código de Processo Civil, dispõe que o requerente do arresto deve deduzir os factos que tornam provável a existência do crédito e justificam o receio invocado, relacionando os bens que devem ser apreendidos, com todas as indicações necessárias à realização da diligência.
   Finalmente, resulta ainda do nº 2, do citado artigo 352.º, do Código de Processo Civil que pode ainda o arresto ser requerido contra o adquirente de bens do devedor, caso em que, então, o “(…) requerente, se não mostrar ter sido judicialmente impugnada a aquisição , deduzirá ainda os factos que tornem provável a procedência da impugnação”. A procedência da providência cautelar requerida dependia, como anteriormente se consignou, da alegação e prova, de que:
   a) é provável a existência do seu crédito, isto é, não que o mesmo seja certo, indiscutível, mas antes que existem grandes probabilidades de ele existir ( fumus boni iuris );
   b) se justifica o receio de perder ele a garantia patrimonial, isto é, que qualquer pessoa, de são critério, em face do modo de agir do devedor - daí que seja necessário alegar e provar que o devedor já praticou ou se prepara para praticar actos, de alienação ou oneração, que diminuam o valor do seu património, de tal modo que o mesmo se torne insuficiente para garantir o pagamento do crédito invocado pelo credor -, colocado no seu lugar, também temeria vir a perder o seu crédito se não se impedir imediatamente o devedor de continuar a dispor livremente do seu património; Dito de uma outra forma, o justo receio de perda da garantia patrimonial verificar-se-á sempre que o devedor adopte, ou tenha o propósito de adoptar - conduta indiciada por factos concretos, relativamente ao seu património, quaisquer actos susceptíveis de fazer recear pela sua solvabilidade para satisfazer o direito do credor, não devendo porém tais receios assentarem unicamente em juízos puramente subjectivos do juiz ou do credor, devendo ancorar-se em factos concretos que, de acordo com as regras da experiência, aconselham e impõem uma decisão cautelar imediata como factor potenciador da eficácia da acção declarativa já instaurada.
   Daí que, para o preenchimento, ou não, do requisito geral “justificado receio de perda de garantia patrimonial ”, deverá atender-se, ao tipo de actividade do devedor, à sua situação económica e financeira, à sua maior ou menor solvabilidade, à natureza do seu património, à dissipação ou extravio que faça dos seus bens (quer se tenha já iniciado, quer existam sérios indícios de que o pretende fazer em breve), à ocorrência de procedimentos anómalos que revelem o propósito de não cumprir a obrigação, ao montante do crédito que está em causa, e, por fim, à própria relação negocial estabelecida entre as partes.
   No caso caso dos autos, estando apensa uma acção de nulidade/impugnação pauliana que justifica o arresto de bens de terceiro, bastava à Requerente a alegação e a prova dos factos relativos à probabilidade do crédito e ao justo receio de perda da garantia patrimonial, destinando-se o arresto dos bens a dar eficácia à decisão que eventualmente venha a ser proferida. Como se consignou na nossa anterior decisão, dado que o terceiro perante a relação obrigacional, uma vez julgada procedente a impugnação, não pode obstar a que o credor execute no seu património o bem objecto do acto impugnado, tendo este último direito à sua restituição na medida do seu interesse, no âmbito da providência de Arresto requerido contra o adquirente de bens do devedor justifica-se que, pelo menos no tocante ao bem objecto do acto impugnado, se exija a alegação e a prova indiciária (ónus a cargo do credor) do justo receio da prática pelo terceiro de actos de possível alienação e/ou oneração.
   Exercido o contraditório e produzida a prova dos requeridos, julgamos que um dos requisitos necessários à manutenção deste arresto não se verifica, conforme passaremos a expor.
   A factualidade indiciariamente provada continua a permitir concluir que existe, sem dúvida, um crédito da Requerente para com o 1.º Requerido, pese embora esteja agora provado, por Acórdão transitado em julgado, que essa obrigação ainda terá de ser líquidada.
   Da realidade apurada em sede cautelar, sabemos que esse crédito se situará na ordem das MOP 75.711.548,72, acrescida dos respectivos juros de mora.
   Relativamente ao periculum in mora é razão para se afirmar, salvo o devido respeito pela opinião da Requerente, que ele afinal não se verifica.
   A actuação do requerido que, segundo o juízo inicial do tribunal, indiciava que o mesmo se estaria a furtar às suas obrigações e a ocultar património por forma a impedir a garantia do crédito da requerente, não se confirma.
   Ora, em audiência final, apura-se que o património executável do 1.º Requerido, tomando em consideração apenas a RAEM, é muito elevado e será mesmo suficiente para pagamento do indiciado crédito da requerente.
   Com efeito, sabe-se agora que o mesmo tem um património imobiliário em Macau, avaliado, há cerca de um ano, em mais de MOP130.000.000,00, sendo certo que tais imóveis já estão arrestados a favor da Requerente e, a verdade, é que o 1.º Requerido tinha conhecimento de que, a qualquer momento, a execução e a subsquente penhora iriam ser solicitadas.
   A acrescer a esta quantia, sabemos que a Requerente logrou arrestar 24 participações sociais em sociedades sediadas em Macau, cujo valor nominal ascende a MOP5.361.000,00, e penhorou depósitos em cerca de 42 contas bancárias pertença do 1.º requerido num valor aproximado de MOP6.000.000,00.
Mais se sabe, agora, que não foi o 1.º Requerido quem levantou elevadas quantias pecuniárias depositadas nas suas contas bancárias para as ocultar da sua credora, dado que:
- na conta n.º 1XXX1-0XXXX5-9, do Banco Luso Internacional, Lda., pertencente ao 1.º Requerido, à data com um saldo de AUD1.491.621,67, foi debitada, em 05.08.2010, a quantia de HKD7.421.870,03, por iniciativa do próprio banco, para liquidação de uma dívida do 1.º requerido para com tal instituição bancária, na modalidade de facilidades “Overdraft”, até ao montante de HKD8.000.000,00;
- na conta n.º3XXX2, do China Construction Bank., pertencente ao 1.º Requerido, à data com um saldo de USD1.143.490,00, foi debitada, em 02.08.2010, a quantia de HKD7.148.126,18, por iniciativa do próprio banco, para liquidação de uma dívida do 1.º requerido para com tal instituição bancária, na modalidade de facilidades “Overdraft” até ao montante de HKD8.400.000,00;
- tendo-se apurado, ainda, que o levantamento de HK$1.000.000,00, da conta do “Guangdong Development Bank” (GDB), e igual montante, junto da conta do ”Hong Kong and Shanghai Bank Corp. Ltd.” (HSBC), foi feito mediante a emissão de 2 cheques cruzados a favor da filha do requerido, E, 4ª requerida;
Por outro lado, regista-se, na conta do "Banco Luso Internacional" n.º 1XXX1-1XXXX2-0, aberta em nome do 1.º Requerido, entre 9/7/2010 e 11/8/2010, um acréscimo de cerca de MOP$48.000,00.
   Por si só, o facto de ter ocorrido uma cessão de quotas, entre o 1.º Requerido e os seus filhos, nas sociedades arrestadas à ordem dos presentes autos, aliado ao facto de aquele se manter como representante jurídico/Director Geral das companhias cujas participações sociais cedeu, não serve para justificar o receio invocado pelo credor de perda da garantia patrimonial do seu crédito.
Está agora indiciado que as transmissões de quotas para os filhos do 1.º requerido estão inseridas num plano de sucessão nos negócios deste, que a estrutura dos negócios do 1.º Requerido tem uma natureza familiar, sendo certo que é o 4º requerido quem acompanha o 1.º Requerido na administração das diversas sociedades que compõem o seu património e no exercício da respectiva actividade comercial.
Ficou igualmente sumariamente provado que o 1.º Requerido é líder de um grupo empresarial de grande envergadura, que opera em vários ramos de actividade em Macau e na RPC e que o 4º requerido assumiu também a gestão de facto e a supervisão da actividade comercial das sociedades “Hanghuo H, Gestão de Participação, Limitada” e “Companhia de Desenvolvimento Agrícola G, Limitada”,
   Ora, ponderando os factos acabados de expor e ainda que o 1.º Requerido tem a base da sua vida pessoal, pública e comercial em Macau, que goza de reputação nos meios financeiros onde realiza operações comerciais – tendo ficado demonstrado que, mesmo após as penhoras de que foi alvo, obteve para a sociedade P, Investimento Industrial e Comercial, Lda., junto do BNU, um crédito em conta corrente (overdraft) no montante de MOP23.500.000,00, apenas com o seu aval numa livrança subscrita pela sociedade – que goza de crédito e reputação junto da banca e, sopesando ainda o facto de lhe terem sido arrestados bens que serão suficientes para responder pelo crédito da requerente, teremos de concluir que é de afastar o periculum in mora relativamente ao 1.º Requerido.
   Por fim, damos conta que, com o registo da acção em apenso - registo esse que é obrigatório e já se ordenou aquando da citação dos RR –, um potencial interessado na aquisição das quotas sociais em causa nesta acção tomará conhecimento da pretensão da ora Requerente em executá-las no património do 1.º Requerido, em caso de vencimento da acção, preservando-se, assim, o efeito útil da acção principal.”
Para a Requerente, o Tribunal a quo não deveria ter considerado o valor total dos bens penhorados na sua íntegra para afastar o seu justo receio, em virtude de que os bens em causa são bens comum do casal, pelo que estão sujeitos ao direito à meação do cônjuge não executado.
E não obstante a mulher do executado ter renunciado (fls. 327 a 331 dos autos) o exercício desse direito de forma irrevogável, a renúncia em causa é nula porque o exercício do direito à meação é indisponível.
Adiantamos desde já que não lhe assiste razão.
Dispõe o artº 709º do CPCM o seguinte:
1. Na execução movida contra um só dos cônjuges, podem ser penhorados bens comuns do casal, contanto que o exequente, ao nomeá-los à penhora, peça a citação do cônjuge do executado, para requerer a separação de bens.
2. Qualquer dos cônjuges pode requerer, dentro de 15 dias, a separação de bens ou juntar certidão comprovativa da pendência de acção em que a separação já tenha sido requerida, sob pena de a execução prosseguir nos bens penhorados.
3. Apensado o requerimento ou junta a certidão, a execução fica suspensa até à partilha; se, por esta, os bens penhorados não couberem ao executado, podem ser nomeados outros que lhe tenham cabido, contando-se o prazo para a nova nomeação a partir do trânsito em julgado da sentença homologatória.
Como resulta de forma clara do próprio texto do preceito legal transcrito que o legislador prevê a possibilidade da separação dos bens comuns na execução movida contra um só dos cônjuges. Porém, esta separação é facultativa e não obrigatória, pois o cônjuge não executado pode optar pela não separação dos bens comuns, contribuindo desta forma para liquidar a quantia exequenda do cônjuge executado.
Nesta conformidade, entendemos que o exercício do referido direito é livre, que está na toda disponibilidade do cônjuge não executado, pelo que a esposa do 1º Requerido pode solidarizar-se com o marido no pagamento da quantia exequenda.
Assim, o valor total dos bens penhorados ascende o montante de MOP$146,291,000.00, que é bastante superior ao da quantia exequenda (MOP$75.711.548,72, valor esse indicado pela Requerente no artº 56º da petição do arresto), acrescida dos juros legais.
Por outro lado, como bem referiu o Tribunal a quo que com o registo da acção principal (acção de impugnação paulina) – registo esse que é obrigatória e já se ordenou aquando da citação dos RR – , “um potencial interessado na aquisição das quotas sociais em causa nesta acção tomará conhecimento da pretensão da ora Requerente em executá-las no património do 1.º Requerido, em caso de vencimento da acção, preservando-se, assim, o efeito útil da acção principal”.
Pelo exposto, é de concluir que não se verifica o requisito de justo receio da perda da garantia patrimonial do crédito, requisito esse que é indispensável para o decretamento da providência do arresto.
II. Do recurso interlocutório:
Tendo em conta a supra confirmação da decisão da revogação da providência cautelar (arresto) anteriormente decretada, torna-se desnecessária a apreciação do recurso interlocutório interposto pelos Requeridos.
Aliás, o nº 2 do artº 628º do CPCM prevê expressamente que “Os recursos que não incidam sobre o mérito da causa e que tenham sido interpostos pelo recorrido em recurso de decisão sobre o mérito só são apreciados se a sentença não for confirmada”.
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Tudo visto, resta decidir.
*
IV – Decisão
Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam em:
- negar provimento ao recurso principal interposto, confirmando a sentença recorrida; e
- não conhecer o recurso interlocutório.
*
Custas do recurso principal pela parte vencida.
Sem custas no recurso interlocutório.
Notifique e registe.
*
RAEM, aos 18 de Setembro de 2013.

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Ho Wai Neng
(Relator)

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José Cândido de Pinho
(Primeiro Juiz-Adjunto)

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Lai Kin Hong
(Segundo Juiz-Adjunto)




1 R.L.J., ano 115º, nº 3696, pág. 95 e 96.
2 Ac. do TUI, de 30/04/2013, Proc. nº 2/2003 e Acs. do TSI, de 7/02/2013 e de 18/07/2013, Procs. nºs 844/2011 e 50/2013, respectivamente.
3 Ac. do STJ de 12/01/94, no BMJ 433/467.
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316/2013