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Processo nº 663/2013 Data: 31.10.2013
(Autos de recurso penal)

Assuntos : Crime de “reentrada ilegal”.
Erro notório na apreciação da prova.



SUMÁRIO

1. A “fotocópia” (de um documento oficial) não possui a força probatória do documento autêntico ou autenticado quando não seja atestada a sua conformidade com o original.

2. Todavia, não se pode olvidar que nos termos do art. 112° do C.P.P.M. “são admissíveis as provas que não forem proibidas por lei”, que a cópia de um documento não consta do art. 113° do mesmo Código que regula os “Métodos proibidos de prova”, e que em conformidade com o estatuído no art. 150°, n.° 1 do C.P.P.M. “é admissível prova por documento, entendendo-se por tal a declaração, sinal ou notação corporizada em escrito ou qualquer outro meio técnico, nos termos da lei penal”, nenhuma censura merecendo o Tribunal por ter ponderado no teor de uma fotocópia junta aos autos para formar a sua convicção.

O relator,

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Processo nº 663/2013
(Autos de recurso penal)






ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:





Relatório

1. Sob acusação pública respondeu no T.J.B. A, com os restantes sinais dos autos, vindo a ser condenado como autor da prática de 1 crime de “reentrada ilegal”, p. e p. pelo art. 21° da Lei n.° 6/2004, na pena de 4 meses de prisão suspensa na sua execução por 1 ano e 9 meses; (cfr., fls. 36 a 39 que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).

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Inconformado com o assim decidido, o arguido recorreu para, em síntese, imputar (apenas) à sentença recorrida o vício de “erro notório na apreciação da prova” ; (cfr., fls. 43 a 47).

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Em Reposta e posterior Parecer, é o Ministério Público de opinião que nenhuma censura merece a sentença recorrida que, por isso, deve ser integralmente confirmada com a rejeição do recurso dada a sua manifesta improcedência; (cfr., fls. 49 a 50 e 61 a 62).

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Cumpre decidir.


Fundamentação

Dos factos

2. Estão provados e não provados os factos como tal elencados no Acórdão recorrido a fls. 36-v a 37, e que aqui se dão como integralmente reproduzidos.

Do direito

3. Resulta do que se deixou relatado que o presente recurso tem como objecto a sentença do Mmo Juiz do T.J.B. que condenou o arguido dos autos como autor da prática de 1 crime de “reentrada ilegal”, p. e p. pelo art. 21° da Lei n.° 6/2004, na pena de 4 meses de prisão suspensa na sua execução por 1 ano e 9 meses, e que a única questão colocada tem a ver com o eventual vício de “erro notório na apreciação da prova” que na opinião do recorrente, inquina a dita sentença.

Porém, carece o recorrente de razão, sendo efectivamente de rejeitar o recurso dada a sua “manifesta improcedência”; (cfr., art. 410°, n.° 1 do C.P.P.M.).

Vejamos.

O arguido ora recorrente foi condenado nos termos já explicitados, dado que provado ficou que em 15.09.2010, assinou a “ordem de expulsão de Macau”, tomando conhecimento que se reentrasse no prazo de 3 anos, cometeria o crime de “reentrada ilegal”, o que efectivamente, veio a suceder, em 30.03.2011, tendo agido livre e voluntariamente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei.

Diz o recorrente que o Tribunal a quo incorreu no aludido vício de “erro notório na apreciação da prova”, dado que nos autos apenas constava a “cópia da referida ordem de expulsão”, e não o original, e que, assim, não se devia decidir a matéria de facto como decidido foi.

Ora, como sem esforço se mostra de concluir, e como já se deixou adiantado é evidente que não se pode acolher o assim entendido.

Com efeito, e como repetidamente temos afirmado, o vício de “erro notório na apreciação da prova existe quando se dão como provados factos incompatíveis entre si, isto é, que o que se teve como provado ou não provado está em desconformidade com o que realmente se provou, ou que se retirou de um facto tido como provado uma conclusão logicamente inaceitável. O erro existe também quando se violam as regras sobre o valor da prova vinculada, as regras de experiência ou as legis artis. Tem de ser um erro ostensivo, de tal modo evidente que não passa despercebido ao comum dos observadores.”

De facto, “É na audiência de julgamento que se produzem e avaliam todas as provas (cfr. artº 336º do C.P.P.M.), e é do seu conjunto, no uso dos seus poderes de livre apreciação da prova conjugados com as regras da experiência (cfr. artº 114º do mesmo código), que os julgadores adquirem a convicção sobre os factos objecto do processo.
Assim, sendo que o erro notório na apreciação da prova nada tem a ver com a eventual desconformidade entre a decisão de facto do Tribunal e aquela que entende adequada o Recorrente, irrelevante é, em sede de recurso, alegar-se como fundamento do dito vício, que devia o Tribunal ter dado relevância a determinado meio probatório para formar a sua convicção e assim dar como assente determinados factos, visto que, desta forma, mais não se faz do que pôr em causa a regra da livre convicção do Tribunal”; (cfr., v.g., Ac. de 12.05.2011, Proc. n° 165/2011, e mais recentemente de 30.07.2013, Proc. n.° 485/2013 do ora relator).

No caso dos autos, e como bem observa o Ilustre Procurador Adjunto no seu douto Parecer:

“Sendo certo que os documentos (fotocópias) em causa não foram observados, com o devido rigor, as determinações legais para que assumam força probatória plena como documentos autênticos. Porém, daí não se pode fazer um salto de lógica em afirmar, sem mais, que tais documentos não se servem para nada!
Efectivamente, a não observância de requisitos formais de documentos não alteram a sua própria essência de ser um documento. O que se sucede é que a lei determina e até retira, nesse caso, o grau de força probatória que o mesmo documento merece.
Em conformidade com o art° 359 do Código Civil:
“A força probatória do documento escrito a que falte algum dos requisitos exigidos na lei é apreciada livremente pelo tribunal”.
Pensamos que foi assim que aconteceu no caso em apreço.
Na verdade, basta reparar a sentença recorrida, especialmente na parte da sua convicção, aí nunca foi mencionado que tais documentos foram avaliados como documentos que têm força probatória plena, ou até a convicção do tribunal baseou-se pura e simplesmente em tais provas documentais.
Pelo contrário, é fácil de verificar que o tribunal “a quo” avaliou, para além de prova documental, a leitura permitida das próprias declarações prestadas pelo arguido e o depoimento de testemunha.
Ora, o que se extrai daí é que o tribunal “a quo” só avaliou tais documentos como documentos particulares e servem-se deles só como uma parte integrante no conjunto dos meios de prova que foram apreciados.
Procedimento esse que foi legal e legítimo”; (cfr., fls. 61-v a 62).

E, perante isto, pouco mais há a dizer.

Com efeito, uma “fotocópia” (de um documento oficial) não possui a força probatória do documento autêntico ou autenticado quando não seja atestada a sua conformidade com o original.

Todavia, não se pode olvidar que nos termos do art. 112° do C.P.P.M. “são admissíveis as provas que não forem proibidas por lei”, que a cópia de um documento não consta do art. 113° do mesmo Código que regula os “Métodos proibidos de prova”, e que em conformidade com o estatuído no art. 150°, n.° 1 do C.P.P.M. “é admissível prova por documento, entendendo-se por tal a declaração, sinal ou notação corporizada em escrito ou qualquer outro meio técnico, nos termos da lei penal”.

Nesta conformidade, não tendo o ora recorrente demonstrado a falsidade da “fotocópia” em questão, e constatando-se que o Tribunal a quo limitou-se a apreciar tal elemento probatório de acordo com o princípio da livre apreciação da prova – art. 114° do C.P.P.M. – à vista está a solução.

Decisão

4. Nos termos e fundamentos expostos, em conferência, acordam rejeitar o recurso; (cfr., art. 409°, n.° 2, al. a) e 410, n.° 1 do C.P.P.M.).

Pagará o recorrente 5 UCs de taxa de justiça, e como sanção pela rejeição do seu recurso, o equivalente a 3 UCs; (cfr., art. 410°, n.° 4 do C.P.P.M.).

Honorários ao Exm° Defensor no montante de MOP$1.200,00.

Macau, aos 31 de Outubro de 2013


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José Maria Dias Azedo
(Relator)

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Chan Kuong Seng
(Primeiro Juiz-Adjunto)

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Tam Hio Wa
(Segundo Juiz-Adjunto)


Proc. 663/2013 Pág. 2

Proc. 663/2013 Pág. 1