打印全文
(Tradução)
     Materiais pornográficos
     O artigo 1.º da Lei n.º 10/78/M
     Conceito legal de pornografia
     O artigo 2.º, n.º 1 da Lei n.º 10/78/M
     Pudor público
     Mensagens publicitárias
     Serviço de massagens sensuais
Distribuição em lugares públicos de cartões publicitários que ofendem o pudor público
     O artigo 4.º, n.º 1 da Lei n.º 10/78/M
     Pena
     
Sumário
  1. De acordo com o conceito de pornografia definido no artigo 2.º, n.º 1 da Lei n.º 10/78/M de 8 de Julho, são considerados pornográficos ou obscenos os objectos ou meios referidos no artigo 1.º que contenham palavras, descrições ou imagens que ultrajem ou ofendam o pudor público ou a moral pública.
  2. Assim sendo, mesmo que os elementos dos cartões não contenham qualquer das circunstâncias enumeradas no artigo 2.º, n.º 2, al.s a) e b) que são manifestamente pornográficas, poderiam preencher o conceito de “pornografia” referido no artigo 2.º, n.º 1.
  3. Os objectos ou meios referidos no artigo 1.º da Lei acima referida incluem quaisquer impressos.
  4. Os cartões em apreço são manifestamente impressos, em que se apresenta fotografia de jovem do sexo feminino em fato de banho, número de telefone, bem como as palavras “serviço de massagens” e “disposto 24 horas em hotéis”.
  5. Fotografias são uma forma de imagens. As fotografias acima referidas, juntas com as palavras e número de telefone supracitados, constituem substancialmente uma publicidade de prestação do serviço de massagens por jovens do sexo feminino em fato de banho que se deslocam aos hotéis a qualquer momento através de chamada telefónica.
  6. Do ponto de vista dum cidadão comum de Macau, uma senhora que preste o serviço de simples massagens não vai prestar tal serviço vestindo fato de banho, pelo que as mensagens publicitárias contidas nos cartões em apreço têm respeito com o serviço de massagens sensuais que ofende o pudor público, e os cartões devem ser assim considerados como objectos compreendidos no conceito legal definido no artigo 2.º, n.º 1 da Lei acima referida.
  7. Quem, distribuir materialmente em lugares públicos impressos cujo conteúdo preencha o conceito legal de “pornografia” definido no artigo 2.º, n.º 1 da Lei acima referida é punido com pena prevista no artigo 4.º, n.º 1 da mesma.
Acórdão de 23 de Janeiro de 2014
Processo n.º 597/2013
Relator: Chan Kuong Seng

Processo nº 597/2013
   (Autos de recurso penal)
Recorrente: Ministério Público
Recorrido: A
Tribunal a quo: Tribunal Singular do 1º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base de Macau
Número do processo no Tribunal a quo: CR1-13-0139-PSM
  

ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
I – Relatório
  O Tribunal Singular do 1º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base decidiu no processo n.º CR1-13-0139-PSM absolver o arguido A do acto ilícito previsto e punido conjuntamente pelo artigo 1.º e artigo 4.º, n.º 1 da Lei n.º 10/78/M de 8 de Julho (em relação ao combate à venda, exposição e exibição públicas de material pornográfico e obsceno) que lhe era imputado pelo Ministério Público (cfr., a decisão apresentada a fls. 22 a 23 dos autos).
  Inconformado com o assim decidido, veio o Ministério Público recorrer para o Tribunal de Segunda Instância, apontando a essa decisão a quo a violação do conceito dos objectos pornográficos referido no artigo 2.º, n.º 1 da Lei n.º 10/78/M para pedir que o arguido passe a ser condenado pela prática do delito que lhe era imputado (cfr., a petição do recurso do MP a fls. 30 a 32 dos autos).
  Ao recurso respondeu o arguido no sentido de manter a decisão a quo (cfr., a resposta a fls. 38 a 43 dos autos)
  Subidos os autos, emitiu a Digna Procuradora-Adjunta junto deste tribunal de recurso parecer (cfr., o teor do parecer a fls. 56 a 57v dos autos) sustentando a procedência do recurso.
  Feito o exame preliminar e corridos os vistos.
  Realizada a audiência indicada no artigo 411.º, n.º 1 do Código de Processo Penal, cumpre decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICA
  Examinados os autos, para se aquilatar do mérito do recurso, é preciso, antes de mais, que se conheçam as razões e os juízos seguidos pelo Tribunal a quo:
  “…
  Factos provados:
  No dia 28 de Julho de 2013, cerca das 19h30, na operação contra a prostituição realizada junto ao Venetian Resort Hotel (área I) sita na Estrada do Istmo, o pessoal do CPSP descobriu que o arguido A estava a distribuir a transeuntes cartões de anúncios em que se publicitava a prestação do serviço de massagens, pelo que este foi levado para o comissariado policial junto com os objectos na sua posse.
  No comissariado, o agente policial realizou a revista dos objectos na posse do arguido com a sua voluntariedade e consentimento e, descobriu num saco preto do mesmo 422 cartões de anúncios em que se publicitava a prestação do serviço de massagens.
  Os cartões acima referidos foram entregues ao arguido por um homem de identidade desconhecida e de nacionalidade chinesa no dia 28 de Julho de 2013, pelas 12h00, no casino do Venetian Resort Hotel localizado na Estrada do Istmo, momento em que este pagou-lhe 100 patacas para deitar os cartões no local para a distribuição.
***
  Segundo o arguido, as suas condições pessoais são:
  …
***
  Factos não provados:
  Tais cartões preenchem o disposto no artigo 2.º (conceito de pornografia) da Lei n.º 10/78/M.
  O arguido espalhou publicamente os respectivos cartões bem sabendo que estes tinham conteúdo pornográfico e obsceno.
  O arguido agiu de forma livre, voluntária e consciente ao praticar dolosamente a conduta acima referida, bem sabendo que esta era legalmente proibida e punida.
***
  Nos termos do artigo 2.º da Lei n.º 10/78/M,
Artigo 2.º
(Conceito de pornografia)
  “1. Para efeitos desta lei, são considerados pornográficos ou obscenos os objectos ou meios referidos no artigo anterior que contenham palavras, descrições ou imagens que ultrajem ou ofendam o pudor público ou a moral pública.
  2. São designadamente compreendidas neste conceito:
  a) A representação ou descrição de actos sexuais ou a exposição dos órgãos genitais, num contexto de pura exibição sexual;
  b) A exploração de formas de perversão sexual, bem como a de situações sexuais, através do recurso a técnicas de sobre excitação visual e/ou sonora.”
  Neste caso, por um lado, não havia no conteúdo dos cartões representação ou descrição directamente relacionadas com actos sexuais, por outro lado, a questão de saber se o conteúdo dos cartões sugere o sexo depende de contextos culturais; assim sendo, não pode este Tribunal reconhecer sem dúvida que as palavras, o conteúdo e as fotografias mostrados nos respectivos cartões preenchem plenamente o âmbito de “ofender o pudor público ou a moral pública” do supra referido diploma, pelo que não se verificam os elementos objectivos do crime de venda, exposição e exibição públicas de material pornográfico e obsceno.
***
  Este Tribunal formou a sua convicção com base nas declarações feitas pelo arguido em relação à acusação, os depoimentos prestados pelas testemunhas na audiência de julgamento bem como as provas documentais constantes dos presentes autos.
***
  Deve absolver-se o arguido do crime de venda, exposição e exibição públicas de material pornográfico e obsceno por não ter sido verificados os elementos objectivos e subjectivos do crime.
  …” (cfr., a decisão a fls. 22 a 23 dos autos).
III – FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
  Cumpre notar que com excepção da matéria de conhecimento oficioso, ao tribunal de recurso cumpre resolver só as questões material e concretamente alegadas na motivação do recurso e ao mesmo tempo devidamente delimitadas nas conclusões da mesma, e já não responder a toda e qualquer razão aduzida pela parte recorrente para sustentar a procedência das suas questões colocadas (nesse sentido, cfr., os acórdãos do TSI, de 25 de Julho de 2002, no Processo n.º 47/2002, de 17 de Maio de 2001 no Processo n.º 63/2001, de 3 de Maio de 2001 no Processo n.º 18/2001, de 7 de Dezembro de 2000, no Processo n.º 130/2000, e de 27 de Janeiro de 2000 no Processo n.º 1220).
  Ora, dos motivos da decisão de primeira instância, resulta que o juiz a quo suscitou dúvidas sobre se as palavras, conteúdo e fotografias nos respectivos cartões preenchiam plenamente o âmbito de ofensa ao pudor público ou à moral pública indicado no artigo 2.º da Lei n.º 10/78/M, razão pela qual reconheceu primeiro que não se verificaram os elementos objectivos do tipo de crime que vinha imputado ao arguido, e por conseguinte que nem se verificaram os elementos subjectivos do mesmo.
  Entretanto, o exame de se as palavras, conteúdo e fotografias nos respectivos cartões preenchem o legalmente indicado âmbito de ofensa ao pudor público ou à moral pública só tem a ver com o julgamento de direito, mas não pertence ao âmbito do julgamento de facto. Pelo que o Tribunal a quo não deve considerar a frase “tais cartões preenchem o disposto no artigo 2.º (conceito de pornografia) da Lei n.º 10/78/M” como facto controvertido e por conseguinte qualificá-la como facto não provado, nem deve indicar, a nível do julgamento de facto, que não se tenham provado “o arguido espalhou publicamente os respectivos cartões bem sabendo que estes tinham conteúdo pornográfico e obsceno” e “o arguido agiu de forma livre, voluntária e consciente ao praticar dolosamente a conduta acima referida, bem sabendo que esta era legalmente proibida e punida” com base na sua posição formada no julgamento de direito.
  Ora, a questão nuclear consiste em saber se os cartões em causa preenchem o conceito legal de pornografia definido pelo artigo 2.º, n.º 1 da Lei n.º 10/78/M. Se for preenchido o conceito, considera-se provada a prática do crime, caso contrário, não se dá por provada a mesma.
  De acordo com o conceito legal definido pelo n.º 1 acima referido, são considerados pornográficos ou obscenos os objectos ou meios referidos no artigo 1.º que contenham palavras, descrições ou imagens que ultrajem ou ofendam o pudor público ou a moral pública.
  Assim sendo, mesmo que os elementos dos cartões não contenham qualquer das circunstâncias enumeradas no artigo 2.º, n.º 2, al.s a) e b) que são manifestamente pornográficas, poderiam preencher o conceito de “pornografia” referido no artigo 2.º, n.º 1.
  Os objectos ou meios referidos no artigo 1.º da Lei acima referida incluem quaisquer impressos.
  Os cartões em apreço são manifestamente impressos.
  Cumpre, pois, analisar se o conteúdo dos cartões ofende o pudor público ou a moral pública. Se a resposta for sim, os cartões são objectos pornográficos.
  Do conteúdo dos cartões (a fls. 6 dos autos) apreendidos nos autos resulta que em cada um dos cartões se apresenta fotografia de jovem do sexo feminino em biquíni, número de telefone, e as palavras tais como “serviço de massagens”, “disposto 24 horas em hotéis”, “a companhia tem para a sua escolha senhoras lindas de diversas origens tais como China, Japão, Coreia do Sul, África, Europa e América”
  Fotografias são uma forma de imagens.
  As fotografias acima referidas, juntas com as palavras e número de telefone supracitados, constituem substancialmente uma publicidade de prestação do serviço de massagens por jovens do sexo feminino em fato de banho que se deslocam aos hotéis a qualquer momento através de chamada telefónica.
  Este Tribunal crê convictamente que, do ponto de vista dum cidadão comum de Macau, uma senhora que preste o serviço de simples massagens não vai prestar tal serviço vestindo fato de banho, pelo que as mensagens publicitárias contidas nos cartões em apreço têm respeito com o serviço de massagens sensuais que ofende o pudor público.
  Os cartões devem ser assim considerados como objectos compreendidos no conceito legal definido no artigo 2.º, n.º 1 da Lei acima referida.
  Quem, distribuir materialmente em lugares públicos impressos cujo conteúdo preencha o conceito legal de “pornografia” definido no artigo 2.º, n.º 1 da Lei acima referida é punido com pena prevista no artigo 4.º, n.º 1 da mesma.
  No entanto, a fim de garantir ao arguido dois graus de jurisdição em relação à medida da pena, este Tribunal pode determinar o Mmo juiz a quo à determinação da medida da pena em relação ao crime acima referido.
IV - DECISÃO
  Em face do exposto, acordam conceder provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público, passando a condenar o arguido pela prática do ilícito que lhe era imputado e a determinar o Mmo juiz a quo a aplicar-lhe a pena correspondente.
  Dado que o arguido sustentou a improcedência do recurso, pagará o mesmo todas as custas derivadas deste processo, incluindo três UC de taxa de justiça e os honorários devidos ao seu defensor no valor de duas mil e quinhentas patacas.
Macau, 23 de Janeiro de 2014.
Chan Kuong Seng (Relator) –Choi Mou Pan –Tam Hio Wa (com declaração de voto)



Processo n.º 597/2013
(Autos de recurso penal)
Recorrente: Ministério Público

Declaração de Voto
  Dissenti do decidido, por entender que o conteúdo dos cartões no presente caso não preencher o conceito de pornografia definido pelo artigo 2.º da Lei n.º 10/78/M (cfr., os acórdãos do TSI, de 24 de Outubro de 2013, no Processo n.º 523/2013 e de 12 de Dezembro de 2013 no Processo n.º 685/2013), consequentemente, o arguido deve ser absolvido do respectivo crime.
  Aos 23 de Janeiro de 2014
Tam Hio Wa (Primeira Juíza-Adjunta)

Processo n.º 597/2013 (autos de recurso penal)012