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Processo nº 64/2011
Data do Acórdão: 28NOV2013


Assuntos:

Acidente de viação
Indemnização a título de alimentos
Ampliação da matéria de facto provada
Presunção judicial
Juros de mora


SUMÁRIO

1. Conjugando os artºs 5º/2, 629º e 630º do CPC, o Tribunal de recurso pode fundar a sua decisão nos factos, já alegados nos articulados mas não levados ao saneador, desde que possam resultar provados por elementos provados existentes nos autos.

2. Tendo em conta as condições físicas no local do acidente no local do embate, nomeadamente a suficiente largura e a boa visibilidade em ambas as faixas de circulação, a existência de uma vedação de betão armado que impede a invasão de peões na faixa de circulação direita que se seguia a vítima, esta podia circular-se sempre para frente ao longo da faixa de rodagem direita que se seguia a uma velocidade próxima do limite genérico que é de 40 km/hora, sem necessidade de abrandamento, dada a inexistência de intersecções e entroncamentos, portanto não se pode concluir, com razoável segurança, por meio da presunção judicial do simples facto provado de a vítima ter sido projectada para uma distância de 16,5 metros após o embate, que o veículo conduzido pela vítima estava a circular-se à velocidade superior ao limite máximo gerérico de 40 km/hora.



O relator


Lai Kin Hong


Processo nº 64/2011


Acordam em conferência na Secção Cível e Administrativa no Tribunal de Segunda Instância da RAEM:

I

No âmbito dos autos da acção ordinária, registada sob o nº CV3-09-0004-CAO, do 3º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Base, foi proferida a seguinte sentença:

I – Relatório :
A, portador do BIRM n.º XXXX emitido pelos SIM em 20/01/2005 e B, portadora do BIRM n.º XXXX emitido pelos SIM em 10/11/2005, ambos de nacionalidade chinesa, residentes em Macau, RAE, XXXXX,
vieram intentar a presente
Acção Ordinária
Contra
1. C, S.A.R.L. (C有限公司), com sede em Macau, na XXX,
2. D, solteira, maior, comerciante, portadora do BIR n.º XXXX, residente em Macau XXXX,
com os fundamentos constantes da petição inicial de fls. 2 a 12.
Concluiram pedindo que seja julgada procedente por provada a presente acção e, em consequência, as 1ª e 2ª Rés sejam condenadas a pagar aos Autores a quantia global de MOP$3.562.392,00, a título de danos patrimoniais e não patrimoniais acrescida de juros de mora à taxa legal desde a citação até integral pagamento.
*
A 1ª e 2ª Réus contestaram a acção com os fundamentos constantes de fls 84 a 94 e 74 a 80 dos autos
Concluíram pedindo que seja julgado improcedente o pedido dos Autores.
*
Este Tribunal é o competente em razão da matéria e da hierarquia.
As partes são dotadas de personalidade e capacidade judiciária e de legitimidade "ad causam".
O processo é o próprio.
Inexistem nulidades, excepções ou outras questões prévias que obstem à apreciação "de meritis".
*
Procedeu-se a julgamento com observância do devido formalismo.
***
II – Factos:
Dos autos resulta assente a seguinte factualidade com interesse para a decisão da causa:
Da Matéria de Facto Assente:
- A e B são pais de E nascido em 25.12.1986 e que faleceu em 04.08.2007 no estado de solteiro e sem filhos – cf. Fls. 115 a 117 (alínea A) dos factos assentes).
- E faleceu no dia 4 de Agosto e 2008 pelas 04h05m, devido a traumatismo laceratório do fígado e rim direito – cf. Fls. 20 e 21 – lesões essas que foram consequência directa e necessário do embate ocorrido entre os veículos MJ-XX-XX e CM-XXXXX ocorrido no dia 03.08.2007 pelas 23.18 horas no cruzamento entre a Rua da Fonte da Inveja e a Avenida Sidónio Pais (alínea B) dos factos assentes).
- No dia 3 de Agosto de 2007, pelas 23.18 horas, D, ora 2.ª Ré, conduzia o veículo automóvel ligeiro de passageiros com a matrícula MJ-XX-XX, no seu interesse e sob a sua direcção efectiva, no cruzamento da Rua da Fonte da Inveja com a Avenida de Sidónio Pais pretendendo entrar nesta via e de seguida, virar à direita por forma a entrar na Rua de António Basto (alínea C) dos factos assentes).
- No mesmo dia e nas mesmas circunstâncias de tempo e lugar, E, conduzia o ciclomotor com a matrícula CM-XXXXX na faixa direita da Avenida Sidónio Pais no sentido da Estrada de Adolfo Loureiro (alínea D) dos factos assentes).
- Por essa altura, devido a obras, a faixa esquerda da Av. Sidónio Pais (tomando em consideração o sentido de marcha dos veículos que circulam nessa via) estava cortada e os semáforos desligados, incluindo o semáforo do cruzamento da Rua da fonte da Inveja e da Av. Sidónio Pais (alínea E) dos factos assentes).
- A responsabilidade por danos causados a terceiros pelo veículo MJ-XX-XX havia sido transferida para a C, SARL, ora 1ª Ré, por contrato de serguro titulado pela apólice n.º LFH/MPC/2006/008515, até ao limite de MOP$1.000.000,00 (um milhão de patacas) por acidente tudo conforme consta de fls 95 e aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais (alínea F) dos factos assentes).
- No momento referido em C) no cruzamento da Rua da Fonte da Inveja e da Av. Sidónio Pais, havia um sinal vertical, para quem, como a D, virava à esquerda para a Av. Sidónio Pais vindo da Rua da Fonte de Inveja, indicando que os veículos da Av. Sidónio Pais tinham prioridade de passagem (alínea G) dos factos assentes).
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Da Base Instrutória:
- O veículo automóvel ligeiro de passageiros com a matrícula MJ-XX-XX pertence à 2ª R. (resposta ao quesito da 1º da base instrutória).
- No momento referido em C) havia boas condições climatéricas, o trânsito era escasso, o piso via era bom e estava seco e havia boa visibilidade (resposta ao quesito da 2º da base instrutória).
- A 2ª Ré não viu se circulavam veículos na faixa da direita da Av. Sidónio Pais (resposta ao quesito da 3º da base instrutória).
- A 2ª R. não viu o veículo conduzido por E (resposta ao quesito da 4º da base instrutória).
- A 2ª Ré não cedeu a passagem ao veículo conduzido por E (resposta ao quesito da 5º da base instrutória).
- A 2ª R. atravessou as duas faixas da Av. Sidónio Pais pretendendo virar para a Rua Antonio Basto, no cruzamento imediato, abalroando o ciclomotor CM-XXXXX com a parte lateral direita da dianteira do seu veículo (junto da roda dianteira) (resposta aos quesitos das 6º, 7º e 20º da base instrutória).
- A 2ª R. D, conduzia no dia e hora referidos em C) o automóvel MJ-XX-XX, na Rua da Fonte de Inveja (resposta ao quesito da 10º da base instrutória).
- E Logo de seguida, o ciclomotor voou por cima daquele automóvel, vindo a imobilizar-se mais à frente na Avenida de Sidónio Pais, a cerca de 9.1 metros do ponto de embate (resposta ao quesito da 21º da base instrutória).
- E foi projectado a cerca de 16.5 metros do ponto de embate (resposta ao quesito da 22º da base instrutória).
- O embate verificou-se a 1.2 metro do passeio da esquina da Avenida de Sidónio Pais com a Rua de António Basto (resposta ao quesito da 23º da base instrutória).
- Em consequência directa do embate entre os veículo MJ-XX-XX e CM-XXXXX, este ficou totalmente destruído (resposta ao quesito da 27º da base instrutória).
- Os AA. pagaram pelo relatório médico aos Serviços de Saúde do governo da RAEM a quantia de MOP$300,00 (resposta ao quesito da 29º da base instrutória).
- Os AA. pagaram a título de despesas com o funeral, campa, coveiro, flores, altar, a quantia de MOP106.446,40 e RMB84.808,00 (resposta ao quesito da 30º da base instrutória).
- Os AA. têm de pagar ao CHCSJ despesas com a hospitalização e tratamento de E em de MOP17.602,00 (resposta ao quesito da 31º da base instrutória).
- E trabalhava como “dealer” para a SJM há mais de uma ano (resposta ao quesito da 32º da base instrutória).
- E recebeu da entidade Patronal de 1-1-2007 a 31-07-2007 a quantia de MOP$94.606,00 (resposta ao quesito da 33º da base instrutória).
- E vivia com o seus pais e irmão (resposta ao quesito da 34º da base instrutória).
- Chan Kin o contribuia para as despesas do agregado familiar, dando todos os meses MOP$8.000,00 aos seu pais (resposta ao quesito da 35º da base instrutória).
- A A. está desempregada (resposta ao quesito da 36º da base instrutória).
- O Irmão de E estava a estudar (resposta ao quesito da 38º da base instrutória).
***
III – Fundamentos:
Cumpre analisar os factos e aplicar o direito.
Pela presente acção, pretendem os Autores que as Rés sejam condenadas a indemnizá-los pelos danos patrimoniais e não patrimoniais resultantes do acidente de viação de que foi vítima o filho daqueles.
Para o efeito alegam que o seu filho foi atropelado mortalmente pelo veículo conduzido pela 2ª Ré porque esta estava a circular com excesso de velocidade e desrespeito ao sinal de prioridade de passagem a favor daquele; que o seu filho bem como os próprios Autores tiveram sofrimentos antes da morte daquele; que o seu filho prestava todo o apoio, carinho e dedicação aos Autores a quem estes, por sua vez, dedicavam toda a sua vida; que o seu filho contribuía com o seu salário para as despesas do agregado familiar; que o Autor tem apenas um trabalho a tempo parcial e a Autora está desempregada; que o ciclomotor conduzido pelo seu filho ficou totalmente destruído; que tiveram despesas com a hospitalização, tratamento e relatório médico do filho; e que tiveram despesas com o funeral, campa, coveiro flores e altar do filho.
Contestando a acção, vieram as Rés alegar que o acidente se deveu a culpa exclusiva do filho dos Autores que conduzia com excesso de velocidade embatendo no veículo conduzido pela 2ª Ré. Ademais, impugnam os danos invocados pelos Autores bem como os valores peticionados. A 1ª Ré veio ainda invocar o limite da cobertura facultada pelo contrato de seguro celebrado entre as Rés defendendo que a 1ª Ré é apenas responsável pelo pagamento da eventual indemnização num valor não superior MOP$1.000.000,00.
Tendo em conta a exposição feita, proceder-se-á à analise das seguintes questões:
1. O acidente e sua causa;
2. As consequências do acidente;
3. O direito à indemnização dos Autores;
4. A responsabilidade das Rés.
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Do acidente e sua causa
Flui da exposição acima feita que, apesar de as partes reconhecerem a ocorrência do acidente entre o veículo conduzido pela 2ª Ré e o ciclomotor conduzido pelo filho dos Autores na data e local indicados na petição inicial, as mesmas têm entendimentos diferentes quanto à forma como o acidente se deu bem como a quem deve ser atribuída a culpa pelo mesmo.
Feito o julgamento, resulta claro que o acidente ocorreu porque a 2ª Ré não tinha respeitado a prioridade de passagem que o filho dos Autores gozava.
Apesar de o veículo conduzido pela 2ª Ré se situar na esquerda do ciclomotor conduzido pelo filho dos Autores o que daria àquela prioridade de passagem nos termos do artigo 25º, nº 3, do Código da Estrada aprovado pelo Decreto-Lei nº 16/93/M, de 28 de Abril, vigente à data do acidente, ficou provado que, no local do acidente, havia um sinal vertical de prioridade de passagem a favor dos veículos que transitavam na faixa de rodagem onde estava a conduzir o filho dos Autores em detrimento da passagem dos veículos que circulavam na faixa de rodagem onde seguia a 2ª Ré.
Nos termos do artigo 7º, nº 2, do Código da Estrada então vigente, “As prescrições resultantes da sinalização prevalecem sobre as regras de trânsito.”
O sinal vertical de prioridade de passagem é precisamente uma dessas prescrições que prevalece sobre a regra prevista no artigo 25º, nº 3, do Código da Estrada então vigente (cfr. artigos 3º, nº 1, 4º, nºs 1 e 2, fl), do Regulamento do Código da Estrada, aprovado pelo Decreto-Lei nº 17/93/M, de 28 de Abril).
Conforme o artigo 25º, nº 1, do Código da Estrada então em vigor, “A cedência de passagem consiste no dever de o condutor reduzir a velocidade ou parar, por forma a que outro não tenha necessidade de modificar a sua velocidade ou direcção.”
Pelo que, era obrigação da 2ª Ré reduzir a velocidade em que seguia ou parar por forma a que o filho dos Autores pudesse atravessar o cruzamento sem qualquer obstáculo. Ora, isso impunha à 2ª Ré um especial cuidado na certificação do estado da via para onde ia entrar designadamente se nela havia veículos a transitar ou a aproximar.
Porém, contra esse dever, a 2ª Ré entrou na faixa de rodagem em que o filho dos Autores seguia e embateu neste abalroando o seu ciclomotor. De facto, ficou provado que a 2ª Ré não tinha visto se havia veículos a circular na via pública onde ia entrar, não tinha visto o filho dos Autores, não tinha cedido passagem ao ciclomotor deste e tinha atravessado as duas faixas da via pública onde este estava embantendo nele. Além disso, não consta dos factos assentes qualquer circunstância que permita justificar a conduta da 2ª Ré. Antes, ficou provado que, quando esta ia entrar na via pública onde estava o filho dos Autores, havia boas condições climatéricas, o trânsito era escasso, o piso via era bom e estava seco e havia boa visibilidade
Ora, conjugando estes factos, vê-se claramente que toda a tragédia com que estamos a debater se deveu ao facto de a 2ª Ré não ter certificado se a via pública onde estava a circular o filho dos Autores estava livre para si quando nada obstava que o tivesse feito.
Nem se alegue como a 1ª Ré que o acidente ocorreu a 1,2 metros do passeio do cruzamento, o ciclomotor voou por cima do veículo conduzido pela 2ª Ré vindo a ficar imobilizado a cerca de 9,1 metros do ponto de embate e filho dos Autores foi projectado a cerca de 16,5 metros do ponto de embate, porque o filho dos Autores tinha alterado o travão dianteiro do ciclomotor que conduzia facto que contribuiu para a verificação do acidente senão exclusivamente, pelo menos, consideravelmente.
É que, nada dos autos nos permite chegar à conclusão a que chegou a 1ª Ré. Com efeito, para o efeito pretendido pela 1ª Ré, é indispensável que haja factos que indicam que a alteração do travão causou problemas no ciclomotor na altura do acidente. No entanto, como se pode constatar dos factos assentes, nada disso se verifica. Antes, tudo indica que foi a 2ª Ré que provocou o acidente como foi já sobejamente referido mais acima.
Pelo que, é de imputar causalmente o acidente à 2ª Ré.
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   Posto isto, há que apurar a quem pode ser atribuída a culpa pela verificação do acidente.
   Nos termos do artigo 480º, nº 2, do CC, “A culpa é apreciada, na falta de outro critério, pela diligência de um bom pai de família, em face das circunstâncias de cada caso.”
   Decorre do acima exposto que o acidente se deveu à violação do dever de cedência de passagem a que a 2ª Ré estava obrigada e não há qualquer fundamento para justificar essa violação. Assim, é mais que evidente que houve culpa da 2ª Ré na produção do acidente.
   Urge ainda analisar se o filho dos Autores contribuiu culposamente para a sucedido.
   Alegam as Rés que aquele conduzia de uma forma imprudente e com excesso de velocidade o que o impediu de fazer parar o seu ciclomotor no espaço livre e visível à sua frente e evitar o acidente. Além disso, como foi já referido, as Rés entendem que o filho dos Autores contribuiu para a produção do acidente porque tinha alterado o sistema de travão do ciclomotor que conduzia.
   Contudo, feito o julgamento da matéria de facto, nada disso ficou provado. Pelo que, nenhuma culpa pode assacar ao filho dos Autores nessa tragédia.
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Das consequências do acidente
Dispõe o artigo 477º, nº 1, do CC, “Aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação.”
Dessa norma vê-se que a produção culposa de um acidente, por si, não basta para impor qualquer obrigação de indemnizar ao respectivo agente. É preciso que haja lesão ilícita de direitos ou interesses legalmente protegidos da qual resultam danos.
Além disso, é indispensável que haja nexo de causalidade entre a lesão e o dano. Com efeito, dispõe o artigo 557º do CC que “A obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão.”
*
   Dos factos provados constata-se que o filho dos Autores perdeu a sua vida e o ciclomotor conduzido por este ficou totalmente destruído. Estão em causa manifestamente direitos cuja violação merece tutela do direito.
   Tendo em conta o acima expendido acerca do acidente, não resta qualquer dúvida de que foi a 2ª Ré quem violou ilicitamente o direito à vida do filho dos Autores e o direito de propriedade sobre o ciclomotor.
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No que se refere aos danos, retira-se dos factos assentes que os danos do presente caso são a morte do filho dos Autores, a perda do ciclomotor que ficou totalmente destruído, as despesas médicas incorridas com o tratamento do filho dos Autores, as despesas do relatório médico e do funeral, campa, coveiro, flores e altar deste, a perda dos meios de subsistência facultados pelo filho dos Autores aos Autores durante a vida daquele.
A esses danos, não pode deixar de se acrescentar as dores sofridas pelos Autores pela perda do seu filho, pois trata-se de uma manifestação mais que natural dos seres humanos quando estão em causa relações afectivas tão íntimas como as de pais e filhos. Aliás, o legislador foi o primeiro a considerar isso como um dado assente ao atribuir direito à indemnização aos pais das vítimas mortais nos casos de responsabilidade civil extracontratual (cfr. artigo 489º, nº 2, do CC).
Já o mesmo não acontece com as alegadas dores e agonia que o filho dos Autores teve de suportar antes de falecer e o desespero sentido pelos Autores também antes da morte do seu filho, por os respectivos factos não estarem provados.
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Quanto ao nexo de causalidade, é de referir que resulta dos factos assentes que a morte do filho dos Autores é consequência directa e necessária do embate. Assim, não se pode negar que há nexo de causalidade adequada entre a perda da vida e o acto ilícito praticado pela 2ª Ré.
Do mesmo modo, pode-se concluir sem grande esforço que as dores sofridas pelos Autores resultaram causalmente da lesão perpetrada pela 2ª Ré.
O mesmo acontece com a danificação do ciclomotor e as despesas médicas e do funeral, campa, coveiro, flores e altar do filho dos Autores. Pois, os Autores não teriam de os suportar não fosse o acidente provocado pela 2ª Ré.
Não se consegue, no entanto, descortinar o nexo entre as despesas do relatório médico e o facto ilícito por nada ter sido alegado acerca da utilidade do respectivo relatório médico. É que, “Exige-se entre o facto e o dano indemnizável um nexo mais apertado do que a simples coincidência ou sucessão cronológica. ... para que um dano seja reparável pelo autor do facto, é necessário que o facto tenha actuado como condição do dano.” Como muito bem salienta Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Almedina, Coimbra, 7ª edição, 1991, pg 877 e 898.
No que se refere à perda dos meios de subsistência por parte dos Autores, por resultar dos factos assentes que o filho dos mesmos contribuía com o seu salário e mensalmente MOP$8.000,00 para as despesas do agregado familiar de que fazia parte sendo a Autora desempregada, é manifesto que foi a lesão do direito à vida do filho dos Autores que causou a perda desta fonte de rendimento dos Autores.
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Do direito à indemnização dos Autores
   Assente a responsabilidade da 2ª Ré na produção dos danos resultantes do acidente, cabe agora analisar cada um dos danos considerados causados pela lesão provocada pela 2ª Ré a fim de determinar o conteúdo da indemnização que assiste aos Autores começando pelos danos não patrimoniais.
   Nos termos do artigo 489º, nºs 2 e 3, do CC, já acima referido, “Pela morte da vítima, o direito à indemnização por danos não patrimoniais cabe, em conjunto, ao cônjuge não separado de facto e aos filhos ou outros descendentes; na falta destes, ao unido de facto e aos pais ou outros ascendentes; e, por último, aos irmãos ou sobrinhos que os representem.” e “O montante da indemnização é fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 487º; no caso de morte, podem ser atendidos não só os danos não patrimoniais sofridos pela vítima, como os sofridos pelas pessoas com direito a indemnização nos termos do número anterior.”
  Flui das normas acima transcritas que assistem aos Autores o direito à indemnização aí referidas para a reparação dos danos não patrimoniais sofridos pelo filho dos Autores e pelos próprios Autores nos quais se incluem, como é já doutrina e jurisprudência assente, o da perda da vida do filho dos Autores.
  Conforme ainda essas normas, o montante é fixado equitativamente com recurso às circunstâncias como o grau de culpabilidade da 2ª Ré, a situação económica desta e dos Autores e as demais que o presente caso justifiquem (cfr. artigo 488º do CC).
  Segundo Antunes Varela, ob. cit., pg 599 a 600, nota (4), “... o montante da reparação deve ser proporcionado à gravidade do dano, devendo ter-se em conta na sua fixação todas as regras de boa prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas, de criteriosa ponderação das realidades da vida. É este, como já foi observado por alguns autores, um dos domínios onde mais necessários se tornam o bom senso, o equilíbrio e a noção das proporções com que o julgador deve decidir.”
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  Pelo dano da morte do filho dos Autores, pedem estes que a indemnização seja fixada em MOP$500.000,00.
  Conforme os factos assentes, à data da morte, o filho dos Autores tinha 20 anos de idade, era solteiro e não tinha filhos. Desses dados vê-se que se tratava de um jovem com bastante boas perspectivas de vida no futuro. Quanto à culpa no acidente, como foi já referido, o acidente deu-se por culpa exclusiva da 2ª Ré que tinha entrado na faixa de rodagem onde estava o filho dos Autores sem ter sequer dado conta da aproximação deste quando tinha obrigação de o ter. A culpa não é leve. Quanto à condição económica da 2ª Ré, nada foi alegado pelas partes. Além disso, a jurisprudência dos tribunais locais chegou a fixar indemnização superior a MOP$500.000,00 pelo dano da morte.
  Conjugando todos esses factores e tendo em conta o valor peticionado que constitui o limite da condenação (cfr. artigo 564º, nº 1, do CPC), julga-se adequado fixar a indemnização pela perda da vida por parte do filho dos Autores em MOP$500.000,00.
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Pedem os Autores que sejam indemnizados pelas dores sofridas pela perda do filho, no valor de MOP$250.000,00 para cada um deles.
Dos factos assentes resulta que o filho dos Autores, além de jovem como foi já referido, vivia com os Autores e o irmão e contribuía com quase 2/3 do seu salário para as despesas do agregado familiar. Esses factos demonstram uma relação íntima entre o filho dos Autores e a sua família e justificam sentimentos de consolação por parte dos Autores ao verem o filho já adulto e plenamente capaz de ganhar a sua vida bem como de cuidar também dos próprios pais. Se viver a morte de um filho é, em si, extremamente doloroso por ser contrária a ordem natural das coisas em que a morte dos pais precede à dos filhos, no presente caso, suportar o perecimento do filho dos Autores é ainda mais atormentador face às relações familiares existentes, pois a sua morte ocorreu numa altura quando tudo estava a correr da melhor maneira e, obviamente, ao agrado dos Autores, quando havia as mais justificadas expectativas de um futuro estável e feliz tanto para estes como para o seu filho. Em suma, a morte prematura e violenta do filho dos Autores deu-se quando nada o faria prever.
Face ao expendido, julga-se adequado fixar-se a indemnização pelos dores sofridas pelos Autores em MOP$250.000,00 para cada um deles.
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No que se refere aos danos não patrimoniais, estão em causa dois tipos de danos: por um lado os danos emergentes e por outro os lucros cessantes.
A esse respeito, dispõe o artigo 488º do CC o seguinte: “1. No caso de lesão de que proveio a morte, é o responsável obrigado a indemnizar as despesas feitas para salvar o lesado e todas as demais, sem exceptuar as do funeral. ... 3. Têm igualmente direito a indemnização os que podiam exigir alimentos ao lesado ou aqueles a quem o lesado os prestava no cumprimento de uma obrigação natural.”
Além disso, o artigo 556º do CC estipula que “Quem estiver obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação.”
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No grupo dos danos emergentes, deparamo-nos com o valor do ciclomotor que ficou completamente destruído, as despesas de hospitalização e tratamento do filho dos Autores e do funeral, campa, coveiro, flores e altar do mesmo.
No que concerne ao ciclomotor, por não ter sido alegado a quem este pertencia, nada pode ser arbitrado aos Autores. É que, na falta desse facto, não se pode concluir que assistem aos mesmos o direito de reclamar a indemnização pela destruição do ciclomotor.
No que diz respeito às despesas de hospitalização e tratamento do filho dos Autores e do funeral, campa, coveiro, flores e altar do mesmo, é já de conceder o pedido formulado pelos Autores visto que ficou provado que estes tiveram estas despesas em virtude da lesão e morte do filho.
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Quanto aos lucros cessantes, estão em causa apenas a perda dos meios de subsistência que o filho dos Autores prestava a estes.
Resulta provado que, à data da morte, o filho dos Autores ganhava, em média, cerca de MOP$13.515,00 por mês e contribuía mensalmente MOP$8.000,00 para as despesas do agregado familiar da qual fazia parte este filho dos Autores, os próprios Autores e um outro filho que estava a estudar. Além disso, o filho dos Autores vivia com os Autores e o irmão e a Autora está desempregada. Desses factos vê-se que a contribuição do filho dos Autores se destinava a uma agregado familiar de quatro membros o que pode levar a concluir que este prestava alimentos tanto aos Autores como ao irmão.
Pedem os Autores que os lucros cessantes sejam fixados na base de MOP$8.000,00 por mês.
Tendo em conta os factos assentes, é manifesto que se deve descontar a quota parte que o próprio filho falecido dos Autores e o irmão deste consumiam. Pois, o que os Autores podem peticionar são apenas uma indemnização correspondente aos alimentos que o filho falecido lhes proporcionava. Assim, julga-se adequado considerar que a cada um dos membros do agregado familiar dos Autores cabia 1/4 dessa contribuição ficando cada um dos Autores com direito a uma indemnização calculada na base de MOP$2.000,00 mensais.
Na contestação da 1ª Ré, esta invocou a possibilidade de redução dos alimentos prestados pelo filho dos Autores pelo facto de este poderia vir a constituir a sua própria família.
Apesar de a probalidade de constituir família por parte de um jovem de 20 anos ser real, a conclusão a que chegou a 1ª Ré não é assim tão convincente. É que, não se pode olvidar que o montante de MOP$2.000,00 para cada um dos progenitores é apenas 14.7% do vencimento do filho dos Autores o que significa que este teria cerca de 70% do salário disponível para a sua própria família. Além disso, no cálculo dos MOP$2.000,00 não se teve em conta a possibilidade de aumentos salariais.
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Entendem os Autores que o seu filho lhes prestaria alimentos por vinte anos por ser essa a expectativa de vida dos Autores.
Nas alegações de direito da 1ª Ré, foi suscitada a questão da instabilidade do mercado laboral de Macau para permitir uma prognose nesse sentido.
No que a isso diz respeito, ensina Vaz Serra, Revista de Legislação e de Jurisprudência, 113º, pg 326 que “Para que o tribunal possa atender a danos futuros, é necessário que eles sejam previsíveis com segurança bastante, porque, se o não forem, não pode o tribunal condenar o responsável a indemnizar danos que não se sabe se virão a produzir-se; se não for seguro o dano futuro, a sua reparação só pode ser exigida quando ele surgir. A segurança do dano pode resultar de probabilidades.”
Apesar de nunca poder haver certezas acerca da futura situação laboral de quem quer que seja, o certo é que, na falta de outros factores convincentes no sentido contrário designadamente uma evolução económica negativa com reflexos no mercado de trabalho, não se pode deixar de considerar muito provável que o filho dos Autores manteria empregado e aufereria um salário semelhante ao que auferia à data da morte face à actual conjuntura económica.
Nestes termos, julga-se adequado considerar que os alimentos manteriam até à data da morte dos próprios Autores.
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Na contestação da 1ª Ré foi referida a necessidade de se proceder ao desconto do valor a arbitrar face à diferença entre a percepção mensal de uma fracção da quantia a arbitrar e o recebimento da totalidade dessa quantia que permitiria a sua capitalização criando uma situação de enriquecimento sem justa causa à custa alheia.
Este argumento é bem mais convincente e deve ser atendido aquando da fixação do montante efectivo da indemnização. Porém, para o efeito, não se pode olvidar que a taxa de juros praticados localmente é relativamente baixa. Além disso, deve-se também entrar em linha de conta o período de tempo provável em que os alimentos seriam prestados pelo filho dos Autores, isto é, o número de anos por que os Autores provavelmente manterão vivos.
Quanto a este último aspecto, alegam os Autores que era de esperar viver até aos 77,5 anos para o Autor e 82,1 para a Autora. Nessa base, entendem que receberiam alimentos do seu filho durante vinte anos porque tinham respectivamente 55 e 45 anos de idade.
Porém, não consta dos autos elementos acerca da idade dos Autores.
Nos termos do artigo 564º, nº 2, do CPC, “Se não houver elementos para fixar o objecto ou a quantidade, o tribunal condena no que se liquidar em execução de sentença, sem prejuízo de condenação imediata na parte que já seja líquida.”
Assim, relega-se a fixação da indemnização correspondentes aos alimentos que os Autores receberiam para a execução da sentença a qual terá em conta os elementos acima referidos.
*
Pedem os Autores que as Rés lhes paguem também juros de mora contados a partir da citação.
Nos termos do artigo 794º, nº 1, do CC, “O devedor só fica constituído em mora depois de ter sido judicial ou extrajudicialmente interpelado para cumprir.”
Porém, dispõe o artigo 794º, nº 4, do CC, que “Se o crédito for ilíquido, não há mora enquanto se não tornar líquido, salvo se a falta de liquidez for imputável ao devedor.”
No presente caso, por todas as quantias devidas são ilíquidas, os juros de mora só se conta a partir do trânsito da presente sentença que os fixar. Assim, relativamente da indemnização pelos danos não patrimoniais no valor de MOP$1.000.000,00, os juros são devidos a partir do trânsito da presente sentença, e relativamente à indemnização pelos danos patrimoniais a liquidar em execução de sentença, os juros só são devidos a partir do trânsito da sentença que a liquidar.
*
Da responsabilidade das Rés
Flui do acima expendido que os Autores têm direito a serem indemnizados pelos danos patrimoniais e não patrimoniais no valor total de MOP$1.000.000,00 (MOP$500.000,00 pelo dano da morte do filho dos Autores + MOP$250.000,00 pelos sofrimentos do Autor pela perda do filho dos Autores + MOP$250.000,00 pelos sofrimentos da Autora pela perda do filho dos Autores) acrescido do montante que vier a liquidar em execução da presente sentença.
Assim, é manifesto que o valor da indemnização excede a quantia de MOP$1.000.000,00.
Conforme os factos assentes, a responsabilidade por danos causados a terceiros pelo veículo MJ-52-98 havia sido transferida para a 1ª Ré, por contrato de seguro titulado pela apólice n.º LFH/MPC/2006/008515, até ao limite de MOP$1.000.000,00 (um milhão de patacas) por acidente.
Pelo que, a 1ª Ré é apenas condenada a pagar a quantia de MOP$1.000.000,00 sendo o remanescente do valor da indemnização a suportar pela 2ª Ré.
***
IV – Decisão (裁 決):
Face a todo o que fica exposto e justificado, o Tribunal julga parcialmente procedente a acção e, em consequência, decide:
1. Condenar as Rés, C, S.A.R.L. e D a pagar aos Autores, A e B, a seguinte indemnização:
- A 1ª Ré a pagar o montante de MOP$1.000.000,00 acrescido dos respectivos juros;
- A 2ª Ré a pagar o remanescente da indemnização acrescido dos respectivos juros.
2. Fixar a seguinte composição à indemnização:
- A quantia de MOP$500.000,00, a favor dos Autores a título de danos não patrimoniais pela morte do seu filho E acrescida de juros de mora calculados à taxa legal desde o trânsito em julgado da presente sentença até integral e efectivo pagamento;
- A quantia de MOP$250.000,00, a favor de cada um dos Autores, no total MOP$500.000,00, a título de danos não patrimoniais sofridos pelos próprios Autores pela morte do seu filho acrescida de juros de mora calculados à taxa legal desde o trânsito em julgado da presente sentença até integral e efectivo pagamento; e
- A quantia a liquidar em execução da presente sentença, a favor de cada um dos Autores, a título de danos patrimoniais correspondentes aos alimentos que seriam prestados pelo seu filho desde o trânsito em julgado da respectiva sentença que a liquidar até integral e efectivo pagamento.
3. Absolver as Rés dos restantes pedidos formulados pelos Autores.
Custas pelas partes na proporção dos respectivos decaimentos.
Registe e Notifique.
*
據上論結,本法庭裁定訴訟理由部份成立,裁決如下:
1. 判處二名被告向原告A及B支付如下賠償:
- 第一被告C有限公司支付澳門幣1,000,000.00元,附加相關利息;
- 第二被告D支付賠償總額的餘數,附加相關利息。
2. 訂定賠償總額由以下部份組成:
i. 一項導致二名原告兒子E死亡之非財產損害賠償,二名原告獲合共澳門幣500,000.00元,附加自本判決確定日起按法定利率計算之利息,直至全數及實際支付為止;
ii. 一項導致二名原告因兒子0 `\死亡而承受之非財產損害賠償,每人獲澳門幣250,000.00元,合共澳門幣500,000.00元,附加自本判決確定日起按法定利率計算之利息,直至全數及實際支付為止;
iii. 一項導致二名原告因兒子死亡喪失扶養費之財產損害賠償,二名原告每人獲賠償之金額乃本判決執行時結算所得,附加自作出結算之判決確定日起按法定利率計算之利息,直至全數及實際支付為止。
3. 駁回原告的其他請求,開釋兩名被告。
訴訟費用由原告及被告按勝負比例分擔。
依法作出通知及登錄本判決。

Não se conformando com o decidido, tanto os Autores como a 2ª Ré vieram recorrer da mesma.

Concluindo e pedindo os Autores que:

I. Os AAs. peticionaram a quantia de MOP$300,00 referente ao relatório médico de fls... dos Serviços de Saúde do governo da RAEM, a quantia de MOP$106.446,40 e RMB$84.808,00 a título de despesas com o funeral, campa, coveiro, flores, altar e a quantia de MOP$17.602,00 a pagar ao CHCSJ a título de despesas com a hospitalização e tratamento do E;
II. Todos estes danos foram considerados provados;
III. O Tribunal a quo haver nexo de causalidade entre o acidente e os referidos danos;
IV. O Tribunal a quo andou mal ao não condenar nenhuma das Rés a pagar quaisquer destas quantias;
V. Devendo as Rés serem condenadas a pagar aos AAs. a quantia de MOP$224.421,84(300,00+106.446,40+(84.808,00x1,18)+ 17.602,00);
VI. Julgou o Tribunal a quo "adequado considerar que a cada um dos membros do agregado familiar dos AAs. cabia ¼ dessa contribuição (MOP$8.000,00), ficando cada um dos AAs. com direito a uma indemnização calculada na base de MOP$2.000,00 mensais.";
VII. No Art. 43.º da P.I os AAs. alegaram que "O pai tinha à data da morte do filho 55 anos e mãe 45 anos de idade.";
VIII. No assento de nascimento (Documento autêntico) do E, o pai tinha 34 anos e a mãe tinha 24 anos, à data do nascimento deste;
IX. Tendo o E falecido com 20 anos, facilmente concluímos que a idade dos AAs. corresponde à alegada em 43 da P.I;
X. Assim, alicerçando-se no assento de nascimento da vítima quanto à idade dos AAs., bem como no doc. 32 da P.I quanto à esperança média de vida na RAEM, deveria o Tribunal a quo ter condenado as Rés a pagar a cada Autor a quantia de MOP$480.000,00 (MOP$2.000,00 X12 X20 anos) a título de alimentos (lucros cessantes) prestados pela vítima;
XI. O Art. 794.º n.º 1 do C.P.C diz-nos que só há mora do devedor depois de ser interpelado para cumprir (o que se fez com a citação - interpelação judicial) e o n.º 4 do mesmo Art. diz-nos que não há mora se o crédito não se tornar liquido (liquidação operada no pedido da acção declarativa);
XII. O Tribunal a quo limitou-se a confirmar os valores liquidados e peticionados pelos AAs. na P.I quanto ao direitos não patrimoniais (dano morte MOP$500.000,00 e MOP$250.000,00 pelos danos não patrimoniais sofridos por cada um dos autores);
XIII. Havendo, por isso, mora das Rés pelo não pagamento dessas quantias;
XIV. Violou o Tribunal a quo os Arts. 477.º n.º 1, 488.º, 489.º n.º 2 e 3, 556.º, 557.º,794.º n.º 1 e n.º 4 todos do Código Civil.
Nestes termos
e nos mais de direito que V.ª Ex.ªs doutamente suprirão deve o presente recurso ser procedente, substituindo-se o Acórdão recorrido por outro que acolha as conclusões ora apresentadas.
Assim
se fazendo acostumada
JUSTIÇA;

Por sua vez alegando e pedindo a 2ª Ré que:

結論
- 載於被上訴的判決書中,部份已證事實與裁決出現「有關裁決與卷宗內出現獲證明之事實存有矛盾之處」;
- 另外,被上訴的判決書未有考慮一些有利於第二被告的已證事實,而宣告第二被告為交通事故及對死者的死亡的唯一過錯方。
- 故被上訴的判決書在此部份出現了遺漏,又或是未有詳細考慮各種事宜。
- 至少,死者亦應承擔部份責任 - 已可客觀指出死者駕駛的超速狀況及改裝了電單車。
- 所以,現被上訴之判決予以部份廢止,並由上級法院依法裁決死者亦應承擔事故的責任程度。

基於此,請求法官 閣下作出裁決,廢止被上訴之裁決,因已獲得證實之事宜不足以支持該裁決,又或,請求同意及支持上訴人之論述及觀點,作出新的判決,並載有死者應承擔本次事故的責任範圍及程度。

Os Autores apresentaram as contra-alegações pugnando pela improcedência do recurso interposto pela 2ª Ré – cf. 305 a 312 dos p. autos.

Usando da faculdade conferida pelo disposto no artº 613º/3 do CPC, a 2ª Ré apresentou novas alegações impugnando os fundamentos do recurso interposto pelos Autores – cf.

II

Foram colhidos os vistos, cumpre conhecer.

Conforme resulta do disposto nos artºs 563º/2, 567º e 589º/3 do CPC, são as conclusões do recurso que delimitam o seu objecto, salvas as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras e as que sejam de conhecimento oficioso.

Comecemos pelo recurso dos Autores.

Recurso dos Autores

Em face das conclusões na petição de recurso, são três as questões levantadas pelos Autores, quais são as:

1. Da omissão parcial da condenação;

2. Da fixação da indemnização a título de alimentos; e

3. Dos juros de mora.

Então apreciemos.

1. Da omissão parcial da condenação

Para os recorrentes, o Tribunal a quo andou mal ao não condenar as Rés a pagar a indemnização a título de despesas com o funeral, campa, coveiro, flores, altar e as com a hospitalização e tratamento do seu filho vítima do acidente, uma vez que tais despesas foram comprovadamente reconhecidas na fundamentação da sentença recorrida como causadas pelo acidente que vitimou o seu filho.

Cremos que se trata da omissão originada pelo simples esquecimento da Exmª Juiz a quo no momento em que foi redigido a parte dispositiva da sentença recorrida.

Pois, a Exmª Juiz a quo diz na parte da fundamentação da sentença que:

No grupo dos danos emergentes, …… .

…… .

No que diz respeito às despesas de hospitalização e tratamento do filho dos Autores e do funeral, campa, coveiro, flores e altar do mesmo, é já de conceder o pedido formulado pelos Autores visto que ficou provado que estes tiveram estas despesas em virtude da lesão e morte do filho.

E ficou provado que:

Os AA. pagaram pelo relatório médico aos Serviços de Saúde do governo da RAEM a quantia de MOP$300,00 (resposta ao quesito da 29º da base instrutória).

Os AA. pagaram a título de despesas com o funeral, campa, coveiro, flores, altar, a quantia de MOP106.446,40 e RMB84.808,00 (resposta ao quesito da 30º da base instrutória).

Os AA. têm de pagar ao CHCSJ despesas com a hospitalização e tratamento de E em MOP17.602,00 (resposta ao quesito da 31º da base instrutória).
Assim, nos termos prescritos no artº 630º do CPC, é de condenar as Rés a pagar aos Autores estas quantias todas, peticionadas e não questionadas pelas Rés, no valor total de MOP$224.421,84.

Procede portanto esta parte do recurso.

2. Da fixação da indemnização a título de alimentos

Os Autores pediram a indemnização a título de alimentos, que deixaram de poder sido prestados a favor deles pelo seu filho falecido, por causa do acidente que o vitimou, nos 20 anos posteriores à morte do filho.

Pedido esse acabou por ser acolhido pelo Tribunal a quo nos termos seguintes:

Quanto aos lucros cessantes, estão em causa apenas a perda dos meios de subsistência que o filho dos Autores prestava a estes.

Resulta provado que, à data da morte, o filho dos Autores ganhava, em média, cerca de MOP$13.515,00 por mês e contribuía mensalmente MOP$8.000,00 para as despesas do agregado familiar da qual fazia parte este filho dos Autores, os próprios Autores e um outro filho que estava a estudar. Além disso, o filho dos Autores vivia com os Autores e o irmão e a Autora está desempregada. Desses factos vê-se que a contribuição do filho dos Autores se destinava a uma agregado familiar de quatro membros o que pode levar a concluir que este prestava alimentos tanto aos Autores como ao irmão.

Pedem os Autores que os lucros cessantes sejam fixados na base de MOP$8.000,00 por mês.

Tendo em conta os factos assentes, é manifesto que se deve descontar a quota parte que o próprio filho falecido dos Autores e o irmão deste consumiam. Pois, o que os Autores podem peticionar são apenas uma indemnização correspondente aos alimentos que o filho falecido lhes proporcionava. Assim, julga-se adequado considerar que a cada um dos membros do agregado familiar dos Autores cabia 1/4 dessa contribuição ficando cada um dos Autores com direito a uma indemnização calculada na base de MOP$2.000,00 mensais.

Na contestação da 1ª Ré, esta invocou a possibilidade de redução dos alimentos prestados pelo filho dos Autores pelo facto de este poderia vir a constituir a sua própria família.

Apesar de a probalidade de constituir família por parte de um jovem de 20 anos ser real, a conclusão a que chegou a 1ª Ré não é assim tão convincente. É que, não se pode olvidar que o montante de MOP$2.000,00 para cada um dos progenitores é apenas 14.7% do vencimento do filho dos Autores o que significa que este teria cerca de 70% do salário disponível para a sua própria família. Além disso, no cálculo dos MOP$2.000,00 não se teve em conta a possibilidade de aumentos salariais.

Mesmo assim, foi com fundamento na inexistência dos elementos nos autos acerca a idade dos Autores, o Tribunal a quo relegou a quantificação dos montantes da indemnização para a execução da sentença nos termos autorizados pelo artº 564º/2 do CPC.

Vieram agora dizer os Autores que existe nos autos um assento de nascimento, do qual constam a data do nascimento do seu filho e a idade dos Autores, no momento do nascimento do filho, e com base nesse documento pedir que seja fixado o quantitativo da indemnização de acordo com a forma de cálculo da indemnização já definida na parte da fundamentação da sentença recorrida, tomando em conta a idade de ambos os Autores, demonstrável pelo teor daquele documento comprovativo de nascimento.

Foi alegado na petição inicial que “o pai tinha à data da morte do filho 55 anos e mãe 45 anos de idade” (vide o artº 43º da p.i.) e que os Autores juntaram aos autos a certidão do nascimento a fls. 114 e 115.

Conjugando os artºs 5º/2, 629º e 630º do CPC, o Tribunal de recurso pode e deve fundar a sua decisão nos factos, já alegados nos articulados mas não levados ao saneador, desde que possam resultar provados por elementos provados existentes nos autos.

Assim sendo, este tribunal já tem elemento que o Tribunal a quo entendeu inexistir para a quantificação dos montantes da indemnização.

Conforme se vê nesse documento, o filho dos Autores nasceu em 25DEZ1986, altura em que o pai e a mãe tinham 34 e 24 anos de idade, respectivamente.

Tendo em conta o momento da morte do seu filho que é 04AGO2007, podemos apurar aritmeticamente que os Autores tinham no momento da morte do seu filho 55 anos (pai) e 45 anos de idade (mãe).

Existem sim elementos nos autos para o apuramento da idade dos Autores.

O que nos permite já a fixação do quantum da indemnização a arbitrar a cada um dos autores, tendo em conta o critério já definido na parte da fundamentação acima transcrita da sentença recorrida, não questionada pelas Rés, através da seguinte fórmula:

MOP$2.000 X 12 (meses) X 20 (anos) = MOP$480.000

Todavia, tendo em conta a natureza de ser lump sum a indemnização que vamos arbitrar, os factores de inflação que se vão surgindo e a possibilidade de capitalização dos juros que se vão vencendo, ao longo de vinte anos, entendemos que é justo e razoável fazer corresponder a 70% dessa quantia apurada na fórmula supra o quantitativo da indemnização a arbitrar a favor de cada um dos Autores.

Assim, tem direito cada um dos autores a receber:

MOP$480.000 X 70% = MOP$336.000

3. Dos juros de mora

O Tribunal a quo determina que as quantias da indemnização fixadas sejam acrescidas de juros de mora calculados à taxa legal desde o trânsito em julgado da sentença recorrida até integral e efectivo pagamento.

Para os Autores, como o Tribunal se limitou a confirmar os valores peticionados pelos Autores quanto aos direitos não patrimoniais (dano morte MOP$500.000 e MOP$250.000 pelos danos não patrimoniais sofridos por cada um dos Autores), os juros de mora referentes a estes valores devem ser calculados a partir da citação.

A propósito da questão de juros de mora, podemos poupar as tintas uma vez que o Venerando TUI já fixou no seu douto Acórdão de 02MAR2011, tirado no processo nº 69/2010, jurisprudência obrigatória nos termos seguintes:

A indemnização pecuniária por facto ilícito, por danos patrimoniais ou não patrimoniais, vence juros de mora a partir da data da decisão judicial que fixa o respectivo montante, nos termos dos artigos 560º, nº 5, 794º, nº 4 e 795º, nºs 1 e 2 do Código Civil, seja sentença de 1.ª Instância ou de tribunal de recurso ou decisão na acção executiva que liquide a obrigação.

Assim, procede parcialmente esta parte do recurso dos Autores.

Recurso da 2ª Ré

Passemos agora a debruçar-nos sobre o recurso interposto pela 2ª Ré.

De acordo com a sentença recorrida, à 2ª Ré foi atribuída a culpa exclusiva na produção do acidente.

Ora, a única questão levantada pela 2ª Ré consiste em saber se, tendo em conta a matéria de facto provada, deve repartir a culpa na produção do acidente entre a 2ª Ré e o filho falecido dos Autores.

Para a recorrente, do facto provado de que após o embate a vítima foi projectada a cerca de 16,5 metros do ponto de embate e o local onde se encontrava deixada, é de fazer ilação de que a vítima contribuiu com culpa para a produção do acidente dada a alta velocidade do veículo que ela própria conduzia.

E limita-se a pedir a revogação da decisão na parte que lhe atribuiu culpa exclusiva sem que todavia tivesse quantificado a percentagem do seu contributo para a produção do acidente.

Ora para nós a alegada “alta velocidade” é um juízo conclusivo, e portanto não podemos pegar tão somente disso para concluir pela concorrência de culpa.

De qualquer maneira, o pedido do recurso não pode proceder.

De facto, para além da comprovada distância da projecção da vítima do ponto de embate para o local onde se encontrava deixada, nada mais ficou demonstrado nos autos que apontam para a concorrência de culpa.

Pois, tendo em conta as condições físicas no local do acidente, nomeadamente a suficiente largura e a boa visibilidade em ambas as faixas de circulação, a existência de uma vedação de betão armado que impede a invasão de peões na faixa de circulação direita que se seguia a vítima, esta podia circular-se sempre para frente ao longo da faixa de rodagem direita que se seguia a uma velocidade próxima do limite genérico que é de 40 km/hora, sem necessidade de abrandamento, dada a inexistência de intersecções e entroncamentos, portanto não cremos que do simples facto de a vítima ter sido projectada para uma distância de 16,5 metros possamos tirar com razoável segurança por presunção judicial a conclusão de que o veículo conduzido pela vítima estava a circular-se à velocidade superior ao limite máximo gerérico de 40 km/hora (cf. artºs 1º/-aa) e 22º do Código da Estrada e artº 22º do Regulamento do Código da Estrada, aplicáveis ao caso sub judice).

Não tendo sido alegados nem provados factos demonstrativos da culpa por parte do filho falecido dos Autores, não podemos atribuir qualquer percentagem da culpa à vítima.

Asssim, é de julgar improcedente o recurso da 2ª Ré.

Tudo visto, resta decidir.
III

Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam em:

* Julgar parcialmente procedente o recurso interposto pelos Autores;

* Julgar improcedente o recurso interposto pela 2ª Ré;

* Condenar as Rés a pagar aos Autores a indemnização a título de despesas com o funeral, campa, coveiro, flores, altar e as com a hospitalização e tratamento do seu filho vítima do acidente, no valor total de MOP$224.421,84;

* Condenar as Rés a pagar a cada um dos Autores a quantia de MOP$336.000, a título de indemnização pelos danos patrimoniais de alimentos;

* Revogar a sentença na parte que diz respeito ao terminus a quo da contagem de juros de mora, e em substituição determinar que sejam calculados de acordo com a forma definida pelo TUI no seu douto Acórdão de 02MAR2011, tirado no processo nº 69/2010, os juros de mora de todas as quantias de indemnização arbitradas neste Acórdão e as fixadas na sentença recorrida mas não alteradas neste Acórdão; e

* Manter o resto do decidido na sentença recorrida em tudo quanto se compatibiliza com o decidido no presente Acórdão.

Custas pelos recorrentes, na proporção do decaimento.

Notifique.

RAEM, 28NOV2013

Lai Kin Hong
João A. G. Gil de Oliveira
Ho Wai Neng