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Processo nº 268/2009
(Autos de Recurso Contencioso)

Data: 05 de Dezembro de 2013

ASSUNTO
- Prova ilegal
- Vício do desvio de poder

SUMÁRIO
- O recurso às imagens gravadas por câmaras de vídeo do circuito interno do serviço para comprovar as ausências do serviço não constitui uma prova ilegal, nem viola os princípios de adequação, necessidade, proporcionalidade e de boa-fé.
- O desvio de poder é o vício que afecta o acto administrativo praticado no exercício de poderes discricionários quando estes hajam sido usados pelo órgão competente com fim diverso daquele para que a lei os conferiu ou por motivos determinantes que não condigam com o fim visado pela lei que conferiu tais poderes.
- Não resultando dos próprios termos do acto recorrido que a entidade recorrida prosseguiu o fim alegado pelo recorrente nem outros diferentes daquele que a lei visa alcançar, é de julgar improcedente a arguição do vício do desvio de poder.
O Relator,
Ho Wai Neng

Processo nº 268/2009
(Autos de Recurso Contencioso)

Data: 05 de Dezembro de 2013
Recorrente: A
Entidade Recorrida: Secretário para a Segurança

ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:

I – Relatório
A, melhor identificado nos autos, vem interpor o presente Recurso Contencioso do despacho do Secretário para a Segurança, de 25/02/2009, pelo qual negou provimento ao seu recurso hierárquico necessário, concluíndo que:
1. O acto recorrido padece dos vícios de violação de lei por erro nos pressupostos de facto e de direito;
2. A demonstração da realidade dos alegados atrasos e saídas antecipadas é feita através de imagens gravadas por câmaras de vídeo do circuito interno e de relatório resultante da perseguição que foi movida ao ora Recorrente, entre os dias 12/11/2008 e 15/12/2008, o que constitui prova manifestamente ilegal;
3. O recurso às imagens gravadas do Recorrente para poder ser utilizado como meio de controlo da pontualidade e assiduidade do ora Recorrente têm de se submeter às exigências de adequação ou idoneidade, de necessidade e de proporcionalidade em sentido estrito, tal como resulta dos artigos 5º 1-3) e 6º-5) da Lei da Protecção de Dados Pessoais;
4. O recurso às imagens gravadas do Recorrente não é o meio idóneo, adequado e necessário para o controlo da pontualidade e assiduidade daquele;
5. Do artigo 79º do ETAPM retira-se a exigência de que, no controlo da duração da prestação do trabalho, o trabalhador adopte um comportamento positivo, no sentido de obter, ele mesmo, o registo e a comprovação da hora de entrada ou saída, seja através da aposição da assinatura e hora de entrada e saída em livro próprio, da perfuração de cartão próprio ou ainda do registo por captação por mecanismo próprio da impressão digital, palmar ou ocular;
6. São razões de segurança e de certeza jurídicas que determinam a necessidade de o trabalhador ter acesso imediato ao registo da hora em que entrou ou em que saiu, com vista a poder justificar eventuais atrasos ou para, se for o caso, reclamar do registo horário efectuado, dados os efeitos gravosos das faltas injustificadas, que, para além de consequências disciplinares, determinam a perda da remuneração correspondente, desconto nas férias e não contagem para efeitos de antiguidade;
7. Estas condições não se verificam no controlo da duração do tempo de trabalho através do sistema de vídeo-vigilância;
8. A lei não admite o sistema de vídeo-vigilância como meio de controlo principal da duração do trabalho, em virtude de o mesmo não ser adequado a esse fim;
9. Nunca houve por parte da direcção da Escola da P.J. ou da Directoria da P.J. o cuidado de qualquer o mecanismo electrónico de captação da impressão digital, aí existente, com vista a poder ser utilizado pelo Recorrente.
10. O Recorrente desconhecia por completo que a sua pontualidade e assiduidade estavam a ser controladas por esse meio, nunca tendo sido informado de tal facto, nem nunca foi esse meio utilizado, no passado, para fazer o referido controlo a quem quer que fosse;
11. Através da utilização desse meio, o Recorrente ficou impedido de ter acesso ao registo diário ou ao cômputo semanal das suas entradas e saídas do serviços;
12. Os registos horários constantes das imagens gravadas são tudo menos fidedignos, tal como o comprovam os próprios serviços da P.J., para além de que não se pode afastar a possibilidade de adulteração dos mesmos;
13. Admite-se que esse sistema possa ser utilizado apenas e tão-só como meio subsidiário do contrato efectuado através do livro de ponto, de meios mecânicos ou electrónicos, nomeadamente, como prova favorável ao trabalhador, como forma de prevenir a utilização abusiva do meio próprio de registo e como forma de suprimento de falhas ocasionais de funcionamento do mecanismo próprio de registo;
14. O sistema de vídeo-vigilância não é o meio menos oneroso do ponto de vista do direito à imagem do ora Recorrente, existem outros meios que, sem afectarem o direito à imagem do Recorrente, se apresentam como mias adequados e eficazes para o referido controlo;
15. Para além de o Recorrente nunca ter dado o seu consentimento para que as suas imagens fossem utilizadas para efeito referido, também como as referidas imagens não se alcançam substanciais e superiores benefícios ou vantagens para o interesse público, em confronto com o concreto direito à imagem do ora Recorrente;
16. O sistema de vídeo-vigilância será adequado e plenamente justificado, por exemplo, para finalidades como a segurança do pessoal, das instalações e do serviço relativamente a actos de terceiros ou, em geral, a prevenção de ilícitos, ou ainda, como meio complementar e subsidiário de controlo relativamente ao meio próprio e adequado de controlo da pontualidade e assiduidade, mas não, seguramente, como meio principal desse controlo;
17. Também não é ilícito controlar-se a pontualidade e assiduidade através da perseguição ou seguimento à distância, tal como ocorreu com o Recorrente, pelo menos, entre 12/11/2008 e 15/12/2008;
18. A perseguição às escondidas do ora Recorrente, espiando o que ia fazer após a saída do local de trabalho, traduz-se, do ponto de vista da ideia de Estado-de-direito, numa actuação altamente censurável, violadora da autonomia ética irredutível, de qualquer pessoa, ainda que agente de investigação criminal, como o Recorrente;
19. Há muito que o Recorrente se encontra arredado de funções de investigação criminal, à excepção das funções de inspector de Piquete durante sete dias em cada mês;
20. A utilização de imagens gravadas bem como o relatório contendo os dados resultantes da perseguição ou seguimento a que o ora Recorrente foi submetido constituem, manifestamente, prova ilegal;
21. O acto recorrido, por virtude dos actos por si incorporados, padece do vício de desvio de poder;
22. Comprova-se que a Directoria da P.J., através destes seus actos, não pretendeu a agir em vista do interesse público relativo ao regular desempenho de funções administrativas, subjacente ao controlo da pontualidade e assiduidade, mas, antes, e apenas, em função do seu interesse em obter a factualidade necessária para permitir uma punição disciplinar severa do ora Recorrente, doutra forma não teria a Directoria da P.J. notificado o Recorrente apenas em 17/12/2008 para justificar 34 faltas relativas a atrasos e saídas antecipadas, quando tomou conhecimento dos alegados atrasos e saídas, no dia 16/10/2008;
23. A Directoria da P.J., em vez de prosseguir de prosseguir o interesse público, relativo ao controlo da pontualidade e assiduidade, foi deixando, de má fé, que as faltas se fossem acumulado e arranjando provas (ilícitas), espiando o Recorrendo, para depois o confrontar, mais de 2 meses volvidos sobre o conhecimento do início dos alegados atrasos e saídas antecipadas, com faltas relativas a 34 dias;
24. No caso dos autos, a prossecução do interesse público imporia ma actuação rápida se imediata por parte da Directoria da P.J., pedindo a justificação dos alegados atrasos e saídas antecipadas e sancionando, se fosse o caso, tal como sucedeu num caso ocorrido com o Recorrente em 8/11/2006;
25. A abertura de processo disciplinar relativamente aos 39 dias de faltas injustificadas e que acabou por abarcar mais três alegadas infracções disciplinares e o facto de ser proferida acusação, onde se indicia o Recorrente do cometimento de infracções disciplinares graves, merecedoras, como aí se diz, da sanção de demis-são, é bem revelador de qual foi a intencionalidade prosseguida pelos três despachos incorporados pelo acto recorrido que consideraram como injustificadas 39 faltas;
26. O facto de o dirigente da P.J. ter dado participação criminal contra o Recorrente, em 28/11/2008, por alegado crime de difamação em que se considera ofendido, não deixa de pesar na conclusão a tirar quanto à real motivação subjacente aos referidos despachos de injustificação de faltas de 19/12/2008, 26/12/2008 e de 14/1/2009;
27. Os despachos que injustificaram as 39 faltas padecem do vício de desvio de poder, na medida em que os mesmos vão dirigidos, não à satisfação do interesse público relativo ao regular desempenho das funções administrativas, que devia presidir a esses actos, mas, antes, como se comprova, à obtenção do número de dias de faltas injustificadas (39) necessárias a uma punição gravosa do ora Recorrente, com o que violado as normas dos artigos 90º/1-b do ETAPM e 4º do CPA;
28. O Despacho recorrido violou, nomeadamente, as normas dos artigos 79º, 90º/1-b do ETAPM; 4º/2, 8/1 do CPA, 5º /1-3) e 6º-5) da Lei nº 8/2005 e os princípios da proporcionalidade, da boa fé e da prossecução do interesse público.
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Regularmente citada, a Entidade Recorrida contestou nos termos constantes a fls. 100 a 105 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, pugnando pelo não provimento do recurso.
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O Recorrente apresentou as alegações facultativas, mantendo, no essencial, a posição já tomada na petição inicial.
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O Ministério Público é de parecer pela improcedência do recurso, a saber:
   “Vem A impugnar o despacho do Secretário para a Segurança de 25/2/09 que negou provimento a recurso hierárquico interposto de despachos de dirigentes da Polícia Judiciária que consideraram injustificadas faltas do recorrente ocorridas durante os meses de Novembro e Dezembro de 2008, num total de 39 dias, relativas a atrasos na hora do início dos trabalhos, tanto no período da manhã, como da tarde, bem como saídas do local de trabalho antes do horário normal de saída, assacando-lhe vícios de violação de lei, por erro nos pressupostos de facto e de direito e de desvio de poder, entendendo, em síntese, que, pelo menos parte da prova recolhida atinente ao controlo da pontualidade e assiduidade do recorrente é ilícita, não obedecendo às exigências de adequação, necessidade e proporcionalidade, para além de que, em tal matéria, em vez de se ter perseguido o interesse público relativo ao regular desempenho das funções administrativas subjacente ao controlo da pontualidade e assiduidade, se optou pelo interesse próprio na obtenção de factualidade necessária para permitir uma punição disciplinar severa ao recorrente.
   Mas, não vemos como.
   O controlo de entradas, saídas e ausências do serviço pode ser, e é, hoje em dia, efectuado pelos mais diversos métodos, com maior ou menor avanço tecnológico, ou com a conjugação de vários, desde os meios mecanográficos, digitais, vídeo e outros, por forma a assegurar, dentro dos limites legalmente aceitáveis, a maior segurança possível no controlo da pontualidade e assiduidade dos funcionários, medidas que se impõem, já que se torna necessário assegurar que os funcionários, sustentados pelo erário público, cumpram com as obrigação inerentes à qualidade respectiva.
  Mister é que se não ultrapasse, em caso algum, o cumprimento escrupuloso das regras que regem a protecção da vida privada e dos dados pessoais, interesses protegidos pela Lei 8/2005.
  E, a verdade é que se não vê, no caso vertente, e ao arrepio do pretendido pelo recorrente, que tais limites tenham sido ultrapassados, designadamente que tenha existido atropelo dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade.
  Sendo certo que os deveres de pontualidade e assiduidade se revelam essenciais ao regular funcionamento dos serviços da Administração na prossecução do interesses público, a reiteração e persistência das ausências do recorrente nas entradas e saídas do serviço justificam a adopção de medidas de controle suplementar, as quais ainda mais logram justificação na medida que se trata de funcionário no topo da carreira de investigação e em que, de algum modo, aquelas “quebras” dos citados deveres funcionais poderiam alcançar justificação plausível, pese embora durante o período em que se situa o comportamento faltoso, nunca tenha sido autorizado ou ordenado o cumprimento de horário diverso do normal de um funcionário público, salvo a eventual integração em “piquete de intervenção”, o que não é o caso.
  Nestes parâmetros, mal se vê como justificar, com base em pretensa afronta da proporcionalidade e razoabilidade, a exclusão dos meios vídeo para controle dos deveres de pontualidade e assiduidade do recorrente, não se descortinando também que, com a actuação específica, alguma vez se tenha afrontado a vida privada ou invadido indevidamente os dados pessoais do recorrente.
  Por outras banda, o “desvio de poder” assacado pelo recorrente, nos termos em que pelo mesmo é configurado, revela-se, em termos benevolentes, pouco menos que ofensivo da honorabilidade dos responsáveis pelo acto em escrutínio.
  Na verdade, ao afirmar-se que “a Directoria da P.J., através dos seus actos, não pretendeu agir em vista do interesse público relativo ao regular desempenho de funções administrativas, subjacente ao controlo da pontualidade e assiduidade, mas antes e apenas em função do seu interesse em obter factualidade necessária para permitir uma punição disciplinar severa do ora Recorrente ... deixando, de má fé, que as faltas se fossem acumulando e arranjando provas (ilícitas), espiando o Recorrente...”, não se está apenas a tentar revelar má prática processual ou mau entendimento dos responsáveis: no mínimo, o que se sugere é uma predisposição para perseguição ao recorrente, absolutamente inadmissível, quer a nível profissional, quer pessoa, sem qualquer sustentação nos elementos factuais constantes dos autos e respectivo instrutor, elementos nos quais, ao invés, se colhe que a actuação dos responsáveis, recorrida incluída, se balizou pelo estrito cumprimente das normas legais, designadamente dos artºs 79º e 90º ETAPM, no intuito da prossecução do interesse público atinente ao regular funcionamento dos serviços da Administração e, concretamente da corporação em causa, nos precisos termos do artº 4º, CPA.
  Donde, por não ocorrência de qualquer dos vícios assacados, ou de qualquer outro de que cumpra conhecer, sermos a pugnar pelo não provimento do presente recurso”.
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Foram colhidos os vistos legais dos Mmºs Juizes-Adjuntos.
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O Tribunal é o competente.
As partes possuem personalidade e capacidade judiciárias.
Mostram-se legítimas e regularmente patrocinadas.
Não há questões prévias, nulidades ou outras excepções que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
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II – Factos
Com base nos elementos existentes nos autos, é considera como provada a seguinte factualidade com interesse à boa decisão da causa:
- À data dos factos, o ora recorrente pertencia ao grupo de pessoal de investigação criminal da PJ, na categoria de Inspector de 1ª classe.
- Através de movimento de pessoal determinado pela Direcção, publicado na ordem de serviço nº 103-B, de 26/12/2003, o recorrente foi afecto à Escola de Polícia Judiciária com efeitos desde 02/01/2004.
- Por despacho do Sr. Director da PJ, de 19/12/2008, 26/12/2008, 05/01/2009 e 14/01/2009, foram consideradas dadas pelo recorrente 39 faltas injustificadas no período entre 14 de Outubro a 05 de Dezembro de 2008.
- Inconformado, o recorrente impugnou os despachos em referência por meio do recurso hierárquico necessário.
- Por despacho do Sr. Secretário para a Segurança, de 25/02/2009 (Despacho nº 10/SS/2009), foi negado provimento ao recurso hierárquico interposto.
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III – Fundamentação
Entende o recorrente que o recurso às imagens gravadas por câmaras de vídeo do circuito interno do serviço para comprovar as suas ausências do serviço constitui uma prova ilegal, violando os princípios de adequação, necessidade, proporcionalidade e de boa-fé, pelo que esta prova deveria ser considerada como inexistente, e, em consequência, não verificadas as faltas injustificadas.
Não lhe assiste razão.
Bem notou o Dignº Procurador Adjunto do Mº Pº junto deste Tribunal que “...O controlo de entradas, saídas e ausências do serviço pode ser, e é, hoje em dia, efectuado pelos mais diversos métodos, com maior ou menor avanço tecnológico, ou com a conjugação de vários, desde os meios mecanográficos, digitais, vídeo e outros, por forma a assegurar, dentro dos limites legalmente aceitáveis, a maior segurança possível no controlo da pontualidade e assiduidade dos funcionários, medidas que se impõem, já que se torna necessário assegurar que os funcionários, sustentados pelo erário público, cumpram com as obrigação inerentes à qualidade respectiva.
  Mister é que se não ultrapasse, em caso algum, o cumprimento escrupuloso das regras que regem a protecção da vida privada e dos dados pessoais, interesses protegidos pela Lei 8/2005.
  E, a verdade é que se não vê, no caso vertente, e ao arrepio do pretendido pelo recorrente, que tais limites tenham sido ultrapassados, designadamente que tenha existido atropelo dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade.
  Sendo certo que os deveres de pontualidade e assiduidade se revelam essenciais ao regular funcionamento dos serviços da Administração na prossecução do interesses público, a reiteração e persistência das ausências do recorrente nas entradas e saídas do serviço justificam a adopção de medidas de controle suplementar, as quais ainda mais logram justificação na medida que se trata de funcionário no topo da carreira de investigação e em que, de algum modo, aquelas “quebras” dos citados deveres funcionais poderiam alcançar justificação plausível, pese embora durante o período em que se situa o comportamento faltoso, nunca tenha sido autorizado ou ordenado o cumprimento de horário diverso do normal de um funcionário público, salvo a eventual integração em “piquete de intervenção”, o que não é o caso.
  Nestes parâmetros, mal se vê como justificar, com base em pretensa afronta da proporcionalidade e razoabilidade, a exclusão dos meios vídeo para controle dos deveres de pontualidade e assiduidade do recorrente, não se descortinando também que, com a actuação específica, alguma vez se tenha afrontado a vida privada ou invadido indevidamente os dados pessoais do recorrente...”.
Nesta conformidade, é de julgar improcedente este argumento do recurso.
Imputa ainda o recorrente ao acto recorrido o vício do desvio de poder, na medida em que o controlo da sua pontualidade e assiduidade não visa tutelar ou prosseguir um interesse público mas sim para obter factos necessários “para permitir uma punição disciplinar severa” ao recorrente.
Tem entendido, de forma pacífica e uniforme que “o desvio de poder é o vício que consiste no exercício de um poder discricionário por um motivo principalmente determinante que não condiga com o fim que a lei visou ao conferir aquele poder” e “pressupõe uma discrepância entre o fim legal e o fim real (ou fim efectivamente prosseguido pela Administração).
E o desvio de poder comporta duas modalidades principais: uma, o desvio de poder por motivo de interesse público, quando a Administração visa alcançar um fim de interesse público, diverso daquele que a lei impõe; e a outra, desvio de poder por motivo de interesse privado, quando a Administração não prossegue um fim de interesse público, mas sim um fim de interesse privado”1.
Para Marcello Caetano, o desvio de poder é “o vício que afecta o acto administrativo praticado no exercício de poderes discricionários quando estes hajam sido usados pelo órgão competente com fim diverso daquele para que a lei os conferiu ou por motivos determinantes que não condigam com o fim visado pela lei que conferiu tais poderes”2.
Ora, no caso sub justice, não resulta dos próprios termos do acto recorrido que a entidade recorrida prosseguiu o fim alegado pelo recorrente nem outros diferentes daquele que a lei visa alcançar, pelo que improcede a arguição do vício do desvio de poder.
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Tudo visto, resta decidir.
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IV – Decisão
Nos termos e fundamentos acima expostos, acordam em negar provimento ao presente recurso contencioso, mantendo o acto recorrido.
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Custas pela Recorrente com 8UC taxa de justiça.
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Notifique e registe.
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RAEM, aos de 05 de Dezembro de 2013.

Ho Wai Neng
José Cândido de Pinho Presente
Tong Hio Fong Vitor Coelho
1 Freitas do Amaral, Curso de Direito Administrativo, Vol. II, 2002, p. 394 e 395.
2 Marcello Caetano, Manual de Direito Administrativo, Almedina, Coimbra, Vol. I, 10.ª ed., p. 506.
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