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Processo nº 765/2013 Data: 23.01.2014
(Autos de recurso penal)

Assuntos : Crime de “tráfico”, “consumo” e “detenção de utensilagem”.
Pena.
Atenuação especial.



SUMÁRIO

1. A atenuação especial da pena (nos termos do art. 66° do C.P.M.) só deve ter lugar em situações “excepcionais” ou “extraordinárias”, ou seja, “quando a conduta em causa se apresente com uma gravidade tão diminuída que possa razoavelmente supor-se que o legislador não pensou em hipóteses tais quando estatuiu os limites normais da moldura cabida ao tipo de facto respectivo.

2. Na determinação da medida da pena, adoptou o Código Penal de Macau no seu art.º 65.º, a “Teoria da margem da liberdade”, segundo a qual, a pena concreta é fixada entre um limite mínimo e um limite máximo, determinados em função da culpa, intervindo os outros fins das penas dentro destes limites.

O relator,

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José Maria Dias Azedo

Processo nº 765/2013
(Autos de recurso penal)






ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:





Relatório

1. Sob acusação pública e em audiência colectiva respondeu, no T.J.B., A, (2°) arguido com os sinais dos autos.

Realizado o julgamento, decidiu o Colectivo, condenar o dito arguido como autor da prática em concurso real de:

- 1 crime de “tráfico de estupefacientes” p. e p. pelos art°s 8°, n.° 1 da Lei n.° 17/2009, na pena de 4 anos e 9 meses de prisão;
- 1 crime de “detenção para consumo” e 1 outro de “detenção de utensilagem”, p. e p. pelos art°s 14° e 15° da mesma Lei n.° 17/2009, nas penas parcelares de 2 meses de prisão cada; e,
- 1 outro crime de “arma proibida”, p. e p. pelo art. 262°, n.° 1 do C.P.M., na pena de 2 anos e 9 meses de prisão.
Em cúmulo jurídico, foi o arguido condenado na pena única de 6 anos de prisão; (cfr., fls. 257 a 270 que como as que se vierem a referir, dão-se aqui como reproduzidas para todos os efeitos legais).

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Inconformado, o (2°) arguido A recorreu, pedindo a redução das penas aplicadas pelos crimes p. e p. pelos art. 8°, n.° 1, 14° e 15° da Lei n.° 17/2009 (cfr., fls.285 a 287-v).

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Respondendo, é o Exmo. Magistrado do Ministério Público de opinião que a decisão recorrida não merece nenhuma censura, devendo ser objecto de confirmação; (cfr., fls. 291 a 295).

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Admitido o recurso, e remetidos os autos a este T.S.I., em sede de vista emitiu o Ilustre Procurador Adjunto o seguinte douto Parecer:

“A única questão levantada pelo recorrente no presente recurso relaciona-se com a determinação da pena, o recorrente discorda a pena concreta encontrada pelo tribunal “a quo”, especificadamente, na parte respeitante ao crime de tráfico. (não foi arguido qualquer excesso relativamente ao crime de consumo, crime de utensilagem e ao crime de arma proibida)
Para nós, pensamos que poucas palavras valem a pena acrescentar às considerações judiciosas do nosso Colega já afirmadas na sua resposta.
Com efeito, a pena é fixada em função da culpa do agente manifestada nos factos e das exigências de prevenção criminal. (art° 65 do C.P.M.)
No caso concreto, de acordo com os factos dados como provados, para além de ser primário, não vemos de onde tenha resultado a verificação de algum factor especial de atenuação da pena, nomeadamente, não tenha verificado nenhuma circunstância prevista no art° 66 do C.P.M.
Ora, salva melhor opinião, entendemos que a ausência de delinquência do recorrente já tenham sido ponderadas na decisão recorrida.
De facto, a moldura penal abstracta do crime de tráfico de estupefaciente ronda em três (3) a quinze (15) anos de prisão e a pena concreta encontrada é fixada em quatro (4) anos de nove (9) meses de prisão, isto é, representa menos de um sexto na respectiva moldura abstracta.
Na verdade, afirmou o tribunal recorrido que tinha sido levado em conta a quantidade de droga aprendida e as influências negativas da conduta do recorrente para a sociedade em geral e para os consumidores em especial.
Tratam-se, nitidamente, factores legais que a lei também exige ao julgador a ponderar na determinação da pena.
Por outro lado, como foi bem referenciado pelo nosso Colega na sua resposta, sendo o recorrente um não residente, veio a traficar em R.A.E.M., mostra-se alto grau de ilicitude dos factos.
E o fenómeno de tráfico de estupefaciente é um mal comum para toda a sociedade, afectando seriamente a saúde pública e causando problemas sociais em várias ordens, assim, são prementes as necessidades em combater qualquer tipo de tráfico em termos de prevenção geral.
Por isso, é inegável a necessidade de imposição da pena para salvaguardar a validade da norma violada e a confiança da sociedade na eficácia da ordem legal.
Tudo ponderado, entendemos que tanto a pena concreta aplicada ao crime de tráfico como a posterior pena única resultante do cúmulo são ajustadas e proporcionais.
Sem mais delonga, pensamos que todos os argumentos do recorrente não procedem e deve ser rejeitado o recurso interposto”; (cfr., fls. 314 a 315).

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Nada obstando, cumpre apreciar e decidir.

Fundamentação

Dos factos

2. Estão provados os factos como tal elencados no Acórdão recorrido a fls. 261 a 264-v, e que aqui se dão como integralmente reproduzidos.

Do direito

3. Diz o recorrente que excessivas são as penas que lhe foram aplicadas pelo crime de “tráfico de estupefacientes”, “detenção para consumo” e “detenção de utensilagem”, p. e p. pelos art°s 8°, n.° 1, 14° e 15° da Lei n.° 17/2009, pedindo a sua atenuação, (redução).

Dúvidas não havendo que a conduta da ora recorrente (dada como provada) integra os crimes em questão (e o outro de “arma proibida”), vejamos.

Ao crime de “tráfico de estupefacientes” cabe a pena de 3 a 15 anos de prisão; (cfr., art. 8°, n.° 1 da Lei n.° 17/2009).

E, não sendo caso de “atenuação especial da pena” – pois que como temos entendido, esta só deve ter lugar em situações “excepcionais” ou “extraordinárias”, ou seja, “quando a conduta em causa se apresente com uma gravidade tão diminuída que possa razoavelmente supor-se que o legislador não pensou em hipóteses tais quando estatuiu os limites normais da moldura cabida ao tipo de facto respectivo”, (cfr., v.g., o recente Ac. deste T.S.I. de 14.04.2011, Proc. n°130/2011 e, mais recentemente de 05.12.2013, Proc. n° 715/2013) – há pois que se confirmar a pena de 4 anos e 9 meses de prisão fixada, já que se encontra, ainda assim, próxima do seu limite mínimo, e a mais de 10 anos do seu limite máximo.

Por sua vez, e no que toca aos crimes de “consumo de estupefacientes” e de “detenção de utensilagem”, p. e p. pelos art°s 14° e 15° da Lei n.° 17/2009, eis o que se nos oferece dizer.

A estes crimes cabe a pena de prisão até 3 meses ou pena de multa até 60 dias.

Prevê o art. 64° do C.P.M. que:

“Se ao crime forem aplicáveis, em alternativa, pena privativa e pena não privativa da liberdade, o tribunal dá preferência à segunda sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição”.

Porém, entendeu o Colectivo a quo que, nomeadamente, face ao facto de ser o arguido um turista que vem a Macau e comete os (vários) crimes dos autos e às necessidades de prevenção criminal, que a pena de multa não realizava, adequada e suficientemente, as finalidades da punição.

E, mostra-se efectivamente de confirmar o assim decidido, já que atenta a natureza dos crimes em questão, prementes são as ditas necessidades de prevenção criminal.

Nesta conformidade, (e no que toca à “medida da pena”), cabe apenas dizer que tendo em conta os critérios dos art°s 40° e 65° do C.P.M., e estando as penas em questão a meio da moldura penal aplicável, excessivas não se mostram de considerar.

Com efeito, e como tem este T.S.I. entendido, “na determinação da medida da pena, adoptou o Código Penal de Macau no seu art.º 65.º, a “Teoria da margem da liberdade”, segundo a qual, a pena concreta é fixada entre um limite mínimo e um limite máximo, determinados em função da culpa, intervindo os outros fins das penas dentro destes limites”; (cfr., v.g., o Ac. de 03.02.2000, Proc. n° 2/2000, e, mais recentemente, de 14.11.2013, Proc. n° 549/2013).

Tudo visto, confirmando-se as penas impugnadas, e não padecendo a decisão recorrida de qualquer vício de conhecimento oficioso, impõe-se a improcedência do recurso.

Decisão

4. Nos termos que se deixam expostos, acordam julgar improcedente o recurso do (2°) arguido A.

Pagará o arguido a taxa de justiça de 5 UCs.

Honorários ao Exmo. Defensor no montante de MOP$1,800.00.

Macau, aos 23 de Janeiro de 2014

José Maria Dias Azedo [Nos termos da minha declaração de voto anexa ao Acórdão de 31.03.2011, Processo n.° 81/2011].
Chan Kuong Seng
Tam Hio Wa
Proc. 765/2013 Pág. 12

Proc. 765/2013 Pág. 11