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Processo n.º 33/2014
Recurso relativo ao direito de reunião e manifestação
Recorrente: Chao Teng Hei, presidente do conselho da Associação “Open Macau Society”
Recorrido: Comandante do Corpo de Polícia de Segurança Pública
Data da sessão: 4 de Junho de 2014
Juízes: Song Man Lei (Relatora), Sam Hou Fai e Viriato Manuel Pinheiro de Lima

Assuntos: - Direito de reunião
- Área para reunião
- Poderes discricionários
- Segurança pública
- Fundamentação

SUMÁRIO

1. A Polícia tem poderes para fixar uma área para reuniões ou manifestações, dentro do local mais vasto pretendido pelos respectivos promotores, com fundamento em considerações de segurança pública e de manutenção da ordem e tranquilidade públicas.
2. O acto mencionado na conclusão anterior é proferido no uso de poderes discricionários, mas tem de justificar devidamente as razões de segurança pública ou ordem pública em que se fundamenta.
  
A Relatora,
Song Man Lei
ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU:

1. Relatório
Chao Teng Hei, presidente do conselho da Associação “Open Macau Society”, vem interpor recurso para este Tribunal de Última Instância, nos termos do art.º 12.º da Lei n.º 2/93/M, do despacho proferido em 26 de Maio de 2014 pelo Comandante do Corpo de Polícia de Segurança Pública (CPSP), que decidiu restringir o espaço pretendido pela Associação para a reunião demarcada para o dia 4 de Junho de 2014.
Alega o recorrente que:
1. A restrição espacial à reunião imposta pelo despacho recorrido não está abrangida na competência conferida pelo art.º 8.º da Lei n.º 2/93/M ao Comandante do CPSP.
2. Nos termos do n.º 2 do art.º 8.º, ao recorrido é conferida somente a competência de “alterar os trajectos programados de desfiles ou cortejos ou determinar que os mesmos façam só por uma das faixas de rodagem”.
3. A restrição espacial imposta pelo despacho recorrido está, obviamente, fora do âmbito das restrições imponíveis previstas nos n.ºs 3 e 4 do art.º 8.º.
4. Estando a data e o lugar previamente avisados pelo recorrente intimamente ligados ao objecto da reunião, a sua alteração prejudicará o exercício da liberdade de expressão do recorrente.
5. Ao abrigo do art.º 1.º n.º 3 da Lei n.º 2/93/M, “O exercício dos direitos de reunião ou manifestação apenas pode ser restringido, limitado ou condicionado nos casos previstos na lei.”
6. A imposição de restrição espacial à reunião no despacho recorrido violou o princípio da legalidade consagrado no Código de Procedimento Administrativo.
7. Ultimamente, um grupo avisou que iria realizar reunião no espaço público para peões do Largo do Senado, onde havia ao mesmo tempo um outro grupo a realizou actividades, mas a Polícia não impôs restrição espacial à reunião.
8. O recorrente presume que provavelmente o objecto da reunião do recorrente é considerado “sensível” pelo Governo, por conseguinte, o recorrido violou os “princípios de igualdade e de proporcionalidade” previstos no Código de Procedimento Administrativo e impõe injustamente as restrições inadequadas (improporcionais) à actividade do recorrente.
9. O local de reunião delimitado pelo recorrido pode bloquear a entrada de algumas lojas, que assumem importância para a actividade turística da qual muito depende Macau. Pelo contrário, se o recorrente puder mudar a reunião para outro sítio além da área delimitada pela Polícia onde não se encontra ocupada por outras actividades legais, como por exemplo Santa Casa da Misericórdia, poderá reduzir para o mínimo a influências a causar a outras actividades, ao negócio das lojas que se encontram nos arredores e ao fluxo das pessoas que aí se encontram.
10. Por Acórdão proferido no processo nº 16/2010 (recurso relativo ao direito de união e manifestação), o Tribunal de Última Instância decidiu que “não há restrição espacial para a reunião e manifestação promovidas pelo recorrente por existência de outras reuniões ou manifestações no mesmo local”.
11. A escolha livre do lugar de reunião é parte integrante da liberdade de expressão e de reunião e, sem prejuízo da liberdade alheia, o cidadão pode exercer a sua liberdade de expressão e de reunião, que é a liberdade protegida pela lei constitucional de Macau.
12. O acto do recorrido danificou a expectativa que o público tem em relação à previsibilidade das leis.
13. O recorrido violou vários princípios que os órgãos administrativos devem cumprir, ofendendo a liberdade do recorrente e dos cidadãos que pretendem participar na reunião, garantida pela lei constitucional de Macau.

O Comandante do CPSP respondeu, alegando essencialmente o seguinte:
- As circunstâncias de ordem pública podem-se alterar em função do tempo e do local, tornando frágil quaisquer juízos de previsibilidade, daí que haja momentos em que possa haver uso de espaços públicos para várias actividades ao mesmo tempo, e noutros não, não havendo aqui ou em qualquer decisão da Polícia, violação da igualdade.
- Por outro lado, na análise de cada pedido para o uso de espaços públicos para exercício do direito de reunião e manifestação, está sempre a ponderação entre os riscos de perturbação da ordem e tranquilidade públicas, que não pode ser negligenciável pelas autoridades de segurança, e o respeito pela essência desses direitos fundamentais. E assim foi feito.
- Pela experiência dos anos anteriores, onde é costume registarem-se pequenos confrontos e alterações à ordem pública, e porque para todo o dia 4 de Junho (onde algumas das reuniões começam às nove da manhã),
- para além da do recorrente, outras cinco associações marcaram reuniões, entre elas a Chong kok – Ou Mun Tai Iok Chong Vui Luen Hap Vui; Man Chu Hei Tong; Ou Mun Man Chu Fat Chgin Luen Vai Vui; Yuen Meng (em nome individual); Hoi Veng Chong e Lam Meng, houve necessidade de delimitar o espaço para a sua realização.
- O despacho do comandante do Corpo de Polícia de Segurança Pública, órgão recorrido, não visa de modo algum o constrangimento do exercício do direito de manifestação ou reunião, ou a utilização do local para o seu exercício.
- A decisão ora impugnada, pretende garantir que o direito de manifestação e reunião, seja exercido com plena segurança, e tal determinou a Polícia a proceder à delimitação do espaço, uma vez que estão marcadas para o mesmo local e às mesmas horas, também outras reuniões e actividades.
- Como acima se referiu, há o legítimo e fundado receio de que os interesses e objectivos em causa, não sejam convergentes, o que obriga a que, cautelarmente, se proceda ao acantonamento dos diversos eventos anunciados para o mesmo local.
- Só assim pode a Polícia garantir a segurança pública colectiva e individual, dos participantes e demais utentes daquela praça (o local turístico com maior afluência (juntamente com as Ruínas de São Paulo), de visitantes e transeuntes desta cidade), evitando qualquer incidente de natureza táctico-policial.
- Desde modo, mantém-se o interesse substancial do despacho, embora se qualifique e subsuma esta posição policial por referência ao disposto no artº 10º da Lei n.º 2/93/M, e não à alínea c) do artº 11º do mesmo diploma, como por lapso consta do despacho impugnado.
Conclui, afinal, que este Tribunal de Última Instância deve, no uso dos seus poderes de jurisdição plena e que vem firmando nas suas últimas decisões, decidir no sentido favorável das delimitações impostas pelo CPSP, acompanhando as preocupações de segurança interna, e negar provimento ao recurso.

2. Fundamentos
2.1. Matéria de facto
Conforme os elementos constantes dos autos, são considerados provados os seguintes factos:
- Associação “Open Macau Society” avisou, em 13 de Maio de 2014, o Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais de que se realizaria reunião no dia 4 de Junho, das 16:00 às 23:30, no espaço público para peões do Largo do Senado.
- No dia 25 de Maio, o Comandante do CPSP proferiu o seguinte despacho:
“I. Relatório:
O conteúdo do aviso de reunião apresentado, em 13 de Maio de 2014, pela Associação “Open Macau Society”, ao Presidente do Conselho de Administração do I.A.C.M. é o seguinte:
‘Actividade: Reunião
Promotor: Associação “Open Macau Society”
Assunto: 「Regresso ao Largo de Senado – Comemoração do 25.º Aniversário do Acontecimento de 4 de Junho」
Hora: 4 de Junho de 2014 Das 16H00 às 23:30
Local de reunião: Espaço público para peões no Largo de Senado
II. Obrigações que a associação promotora/o promotor deve cumprir:
1. Deve cumprir as obrigações gerais previstas no artigo 2.º do Regulamento Geral dos Espaços Públicos;
2. Nos termos do artigo 4.º da Lei n.º 2/93/M:
Não é permitida a realização de reuniões ou manifestações entre as 0,30 e as 7,30 horas;
3. Deve cumprir o disposto no artigo 11.º n.º 1 alínea c) da Lei n.º 2/93/M, não são permitidos os actos contrários a lei que perturbem grave e efectivamente a segurança pública ou o livre exercício dos direitos das pessoas, devendo assegurar desobstruídas as vias do local de reunião, no sentido de não afectar outros utentes das vias, bem como ao demonstrar os objectos relacionados com a actividade de reunião, a área do espaço público a ocupar não pode ser muito grande;
4. Deve manter a ordem da actividade e assegurar que a actividade é realizada numa atmosfera pacífica e racional;
5. Deve assegurar que não pode produzir ruídos ou não pode praticar actos perturbadores contra outrem quanto ao ambiente e à saúde;
6. A reunião deve ser realizada conforme a área definida pela Polícia (cfr. a área assinalada a cor azul constante do anexo ao presente despacho), não podendo interferir nem perturbar as actividades a realizar por outras associações no local.
III. O promotor pode interpor recurso para o Tribunal de Última Instância nos termos do artigo 12.º da Lei n.º 2/93/M.”
- No mesmo dia 4 de Junho de 2014 e no mesmo local demarcado pelo recorrente para a reunião, há mais quatro actividades ou reuniões a realizar.

2.2. Direito
2.2.1. Na óptica do recorrente, o acto recorrido violou os princípios da legalidade, da igualdade e da proporcionalidade.
Alega em primeiro lugar que a restrição espacial à reunião imposta pelo despacho recorrido não está abrangida na competência conferida pelo art.º 8.º da Lei n.º 2/93/M ao Comandante do CPSP.
Trata-se de saber se o despacho recorrido violou a disposição legal ao fixar uma faixa do Largo do Senado para uma reunião promovida pela respectiva associação.

Ora, é sem dúvida que o direito de reunião, de desfile e de manifestação é um dos direitos fundamentais consagrados no art.º 27.º da Lei Básica da RAEM para os residentes de Macau, que se encontra também garantido na Lei n.º 2/93/M, cujo n.º 1 prevê expressamente que todos os residentes de Macau têm o direito de se reunir, pacificamente e sem armas, em lugares públicos, abertos ao público ou particulares, sem necessidade de qualquer autorização e gozam ainda do direito de manifestação.
E os direitos e as liberdades de que gozam os residentes de Macau “não podem ser restringidos excepto nos casos previstos na lei” (art.º 40.º n.º 2 da Lei Básica) e o exercício do direito de reunião ou manifestação “apenas pode ser restringido, limitado ou condicionado nos casos previstos na lei” (n.º 3 do art.º 1.º da Lei n.º 2/93/M).
São exemplos desses casos a não permissão de reuniões ou manifestações para fins contrários à lei (art.º 2.º da Lei n.º 2/93/M), a imposição de restrições espaciais no caso de reuniões ou manifestações com ocupação ilegal de lugares públicos, abertos ao público ou particulares (art.º 3.º), a imposição de restrições temporais (art.º 4.º), que são competências do presidente do conselho de administração do Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais (art.ºs 6.º e 7.º do mesmo diploma).
E a Lei n.º 2/93/M confere ainda competência ao comandante da PSP para impor algumas restrições a reuniões ou manifestações (art.º 8.º), podendo as autoridades policiais até interromper a realização de reuniões ou manifestações (art.º 11.º), quando se verifiquem as situações legalmente previstas.
“Artigo 8.º
(Imposição de restrições pelo comandante da PSP)
1. O presidente do conselho de administração do Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais dará imediato conhecimento ao comandante da polícia de Segurança Pública dos avisos recebidos nos termos do artigo 5.º.
2. Se tal se revelar indispensável ao bom ordenamento do trânsito de pessoas e veículos nas vias públicas, o comandante da Polícia de Segurança Pública pode, até 24 horas antes do seu início e através da forma prevista no artigo 6.º, alterar os trajectos programados de desfiles ou cortejos ou determinar que os mesmos se façam só por uma das faixas de rodagem.
3. No prazo e pela forma previstos no número anterior, a mesma entidade, fundada em razões de segurança pública devidamente justificadas, pode exigir que as reuniões ou manifestações respeitem uma determinada distância mínima das sedes do Governo e da Assembleia Legislativa da Região Administrativa Especial de Macau, dos edifícios afectos directamente ao funcionamento destes, da sede do Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais, das instalações dos tribunais e das autoridades policiais, dos estabelecimentos prisionais e das sedes de missões com estatuto diplomático ou de representações consulares, sem prejuízo do disposto no artigo 16.º.
4. A distância referida no número anterior não pode ser superior a 30 metros.”
“Artigo 11.º
(Interrupção de reuniões e manifestações)
1. As autoridades policiais só podem interromper a realização de reuniões ou manifestações nos seguintes casos:
a) Quando, com fundamento no artigo 2.º, tenha sido regularmente comunicada aos promotores a sua não permissão;
b) Quando as mesmas, afastando-se da sua finalidade ou não tendo sido objecto de aviso prévio, infrinjam o disposto no artigo 2.º;
c) Quando as mesmas se afastem da sua finalidade pela prática de actos contrários à lei que perturbem grave e efectivamente a segurança pública ou o livre exercício dos direitos das pessoas.
2. A decisão de interromper uma reunião ou manifestação deve, sempre que possível, ser imediatamente comunicada aos promotores presentes na mesma.
3. Após a interrupção, as autoridades policiais devem lavrar auto da ocorrência com a descrição pormenorizada dos seus fundamentos e entregar cópia desse auto aos promotores no prazo de 12 horas a contar da interrupção.”
Ora, decorre claramente da Lei n.º 2/93/M que, no que respeita ao direito de reunião e manifestação e no sentido de proibir ou impor restrições antes da sua realização, o comandante do CPSP apenas tem competência para exercer os poderes previstos no art.º 8.º n.ºs 2 e 3.1
E já no decurso de reuniões ou manifestações, as autoridades policiais têm poderes para interromper a sua realização.

A questão que nos interessa no presente recurso não se prende com a aplicação do n.º 3 do art.º 8.º, que se refere à manutenção da distância mínima exigida entre o local de reuniões ou manifestações e as sedes, os edifícios e as instalações das entidades públicas aí mencionados bem como as sedes de missões com estatuto diplomático ou de representações consulares.
Também não está em causa o n.º 2 do art.º 8.º, que se aplica à alteração de trajectos programados de desfiles ou cortejos e não a uma reunião num local fixo2, já que, no caso em apreciação, o que pretende a associação é realizar uma reunião no espaço público para peões do Largo do Senado.
Repare-se que o Comandante do CPSP não determinou nenhuma alteração do local da reunião pretendido pela Associação “Open Macau Society”, que se limitou a avisou a realização da reunião no espaço público para peões do Largo do Senado.
Na realidade, o Largo do Senado vai desde o limite da Avenida Almeida Ribeiro até ao Largo de S. Domingos e o comandante do CPSP limitou-se a fixar uma faixa, ainda dentro do Largo do Senado, para que a associação efectue a reunião, com condição de não interferir nem perturbar outras actividades a realizar no local por outras associações.
Será que a decisão do comandante violou a lei?
A Lei n.º 2/93/M nada diz expressamente a este respeito. Há de ponderar, no entanto, que esta Lei foi legislada no ano de 1993 e já tem 21 anos, salvo pequena alteração posterior. E durante este lapso de tempo, a realidade social e política de Macau mudou muito. Como é facto do conhecimento geral, a população aumentou e o número de turistas que visitam Macau cresceu exponencialmente. A realidade política é, também, completamente diversa da de 1993. Mas a Lei continua a mesma….
É certo, por outro lado, que a lei não pode prever tudo.
Ora, é sabido que ao CPSP incumbem atribuições de manutenção da ordem e tranquilidade públicas, bem como da segurança pública.
Nos termos do art.º 11.º da Lei n.º 2/93/M, as autoridades policiais podem interromper a realização de reuniões ou manifestações nos casos previstos na lei, incluindo o caso em que as reuniões ou manifestações se afastem da sua finalidade pela prática de actos contrários à lei que perturbem grave e efectivamente a segurança pública ou o livre exercício dos direitos das pessoas.
E cabe também ao CPSP zelar pelo bom ordenamento do trânsito de pessoas nas vias públicas (art.º 8.º n.º 2 da Lei n.º 2/93/M).
Neste raciocínio das coisas, e com base no conjunto das normas, afigura-se-nos poder extrair um princípio segundo o qual a Polícia tem poderes para fixar uma área para reuniões ou manifestações, dentro do local mais vasto pretendido pelos respectivos promotores, com fundamento em considerações de segurança pública e de manutenção da ordem e tranquilidade públicas.
Neste aspecto, é de relembrar o Acórdão deste Tribunal de Última Instância, proferido no proc. n.º 16/2010, de 29 de Abril de 2010, em que se decidiu o seguinte:
“… perante a acumulação de pessoas, a lei admite a imposição de restrições às manifestações por parte dos órgãos da Polícia de Segurança Pública, com fundamento no bom ordenamento do trânsito de pessoas e bens nas vias públicas ou em razões de segurança pública quanto ao respeito de distância mínima de determinadas instalações (art.º 8.º da Lei n.º 2/93/M).
Nesta medida, os órgãos policiais têm poderes para organizar espacialmente várias actividades de reunião ou manifestação previstas para o mesmo local, até para interromper a sua realização quando as mesmas se afastem da sua finalidade pela prática de actos contrários à lei ou que perturbem grave e efectivamente a segurança pública ou o livre exercício dos direitos das pessoas (art.º 11.º, n.º 1, al. c) da Lei n.º 2/93/M).”
No caso dos autos, é de reafirmar a posição já assumida por este Tribunal, no sentido de considerar que o comandante do CPSP tem competência para fixar uma faixa, ainda dentro do Largo do Senado pretendido, para reunião, com vista à boa disciplina e organização espacial de várias actividades a realizar no mesmo local, ao bom ordenamento do trânsito de pessoas e, em fim, à segurança pública e à manutenção da ordem e tranquilidade públicas, face às características do Largo do Senado e à realização simultânea de várias actividades e reuniões no mesmo local.
É de concluir que o despacho recorrido não violou a lei.

2.2.2. Invoca ainda o recorrente o princípio da igualdade e da proporcionalidade.
Quanto ao princípio da igualdade, é de salientar que no exemplo referido pelo recorrente no seu requerimento do recurso, só havia duas actividades realizadas no mesmo tempo, enquanto no nosso caso concreto está prevista a realização simultânea de cinco actividades no Largo do Senado.
Daí que não se pode falar na igualdade de tratamento para situações desiguais.
No que concerne ao princípio da proporcionalidade, não se vê em que termos é que a decisão ora recorrida se mostra inadequada e desproporcionada aos objectivos a realizar.
Na tese do recorrente, o local de reunião delimitado pela Polícia pode bloquear a entrada de algumas lojas e a mudança para outro sítio, como por exemplo Santa Casa da Misericórdia, poderá reduzir para o mínimo as influências a causar a outras actividades, ao negócio das lojas que se encontram nos arredores e ao fluxo das pessoas que aí se encontram.
Neste parte, há de reconhecer, tal como têm sido reconhecidos, os poderes discricionários à Polícia e só o erro manifesto ou a total desrazoabilidade no exercício destes poderes, o que não se verifica no caso dos autos, constituem uma forma de violação de lei e é judicialmente sindicável.
Daí que não é de sindicar a escolha da Polícia.

2.2.3. Finalmente, não podemos deixar de notar que o despacho recorrido não está devidamente fundamentado.
No que toca à restrição do espaço, consta apenas do despacho recorrido que “a reunião deve ser realizada conforme a área definida pela Polícia (cfr. a área assinalada a cor azul constante do anexo ao presente despacho), não podendo interferir nem perturbar as actividades a realizar por outras associações no local”.
Embora sem qualificar juridicamente a questão como falta de fundamentação, arguiu o recorrente o vício.
Na realidade, pretendia a Associação “Open Macau Society” realizar a reunião no espaço público para peões do Largo do Senado, enquanto o despacho recorrido restringiu o pedido a uma parte deste Largo, sem que tenha explicado razões que motivaram tal decisão, como é devido, o que levou o recorrente a manifestar a sua incompreensão quanto ao motivo da decisão, alegando que presume que provavelmente foi por causa de o objecto da reunião ser considerado “sensível” pelo Governo.
Face ao seu conteúdo, é de considerar que o despacho recorrido não contem fundamentação suficiente, o que dá causa à anulação do acto.

E sendo o presente recurso de plena jurisdição, não se limita este Tribunal de Última Instância a apreciar a validade do acto impugnado, podendo proferir decisão sobre a pretensão material do interessado no caso de anulação do acto.
Assim, pode a Associação “Open Macau Society” realizar a reunião no espaço público para peões do Largo do Senado, sem se limitar à faixa fixada pelo despacho recorrido, mas sem prejuízo de outras realizações no local já programadas e autorizadas bem como do trânsito das pessoas.

3. Decisão
Face ao expendido, acordam em conceder provimento ao recurso e anular o acto recorrido, permitindo a realização da reunião no espaço público para peões do Largo do Senado, a realizar no dia 4 de Junho de 2014, sem prejuízo de outras realizações no local já programadas e autorizadas bem como do trânsito das pessoas.
Sem custas.
  Macau, 4 de Junho de 2014
  
   Juízes: Song Man Lei (Relatora) – Sam Hou Fai –
Viriato Manuel Pinheiro de Lima
  
1 Ac. do Tribunal de Última Instância, proc. n.º 16/2010, de 29-4-2010.
2 Ac. do Tribunal de Última Instância, proc. n.º 44/2013, de 12-7-2013.
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