打印全文
Processo n.º 12/2013
Recurso civil
Recorrentes: A e B
Recorridos: C, D e E
Data da conferência: 4 de Junho de 2014
Juízes: Song Man Lei (Relatora), Sam Hou Fai e Viriato Manuel Pinheiro de Lima

Assuntos: - Julgamento da matéria de facto
  - Falta de fundamentação da decisão de facto
 
SUMÁRIO

1. Nos termos do n.º 2 do art.º 556.º do Código de Processo Civil e no que respeita ao julgamento da matéria de facto, exige o legislador que o tribunal de primeira instância fundamente a sua decisão sobre a matéria de facto, com análise crítica das provas e especificação dos fundamentos decisivos para a sua convicção.
2. Conforme a disposição no n.º 5 do art.º 629.º do Código de Processo Civil, a sanção para a falta de fundamentação da decisão de facto é o reenvio do processo para o tribunal de primeira instância, se a parte o requerer, mas apenas com vista à sua fundamentação, e não para novo julgamento.
3. Com efeito, a falta ou insuficiência de fundamentação da matéria de facto não determina a anulação das respostas dadas aos quesitos da base instrutória, podendo apenas implicar, se estiver em causa algum facto essencial para o julgamento da causa, que o tribunal de recurso determine que o tribunal de primeira instância a fundamente, a requerimento da parte e se for possível.

A Relatora,
Song Man Lei
  ACORDAM NO TRIBUNAL DE ÚLTIMA INSTÂNCIA DA REGIÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL DE MACAU:
  
  
1. Relatório
A e B, melhor identificados nos autos, intentaram no Tribunal Judicial de Base uma acção ordinária contra C, D e mulher E (1.ª, 2.º e 3.º Réus), pedindo que se declare nula a escritura pública de compra e venda outorgada pelos 1.ª e 2.º Réus e, em consequência, se ordene que os 2.º e 3.º Réus restituam a fracção autónoma em causa aos Autores sem quaisquer ónus e encargos, se declare cancelados todos os registos sobre a fracção autónoma em causa efectuados após 27 de Abril de 2007, sobretudo o registo de aquisição requerido pelos 2.º e 3.º Réus e se declare revogada a procuração passada pelos Autores à 1.ª Ré, e subsidiariamente se condene a 1.ª Ré a pagar aos Autores uma indemnização no montante de MOP$1.200.000,00.
Por sentença proferida em 23 de Dezembro de 2011, foi a acção julgada improcedente in totum.
Inconformados com a decisão, recorreram os Autores para o Tribunal de Segunda Instância, que decidiu negar provimento ao recurso, confirmando a decisão recorrida.
Deste Acórdão vêm agora os Autores A e B recorrer para o Tribunal de Última Instância, apresentando as alegações com a formulação das seguintes conclusões:
(i) Falta de fundamentação adequada na decisão sobre a matéria de facto
1. A questão no quesito 7º: Será que o 2º réu sabia, quando adquiriu por MOP$135.000,00 a fracção autónoma no litígio, que a 1ª ré vendeu a mesma contra a vontade e instruções dos autores (representados), isto é, a vontade e instruções de não vender a fracção em causa antes de 2014?
2. A questão supracitada é muito relevante em relação à decisão correcta da causa. Isto é porque tal facto trata-se de requisito no abuso da representação, e também de facto constitutivo em que fundamenta o pedido dos autores.
3. Assim sendo, deve o Tribunal ainda indicar fundamentos suficientes para convencer as partes ou a terceira pessoa, de forma que as partes ou o tribunal superior possam ter um juízo razoável sobre a matéria de facto através das regras da ciência, lógica e experiência.
4. Mesmo segundo a decisão recorrida: “No fundo, o que Tribunal disse foi que as testemunhas não confirmaram esse facto, um elemento interno, do foro cognoscitivo … …” Assim, deve o Tribunal analisar porque os depoimentos das testemunhas não são suficientes para a confirmação. Importa saber que é demasiado difícil provar um elemento interno ou foro cognoscitivo!
5. Será que os autores devem apresentar um documento que mostre que o 2º réu sabia que a 1ª ré vendeu a fracção autónoma litigiosa contra a vontade e instruções daqueles, isto é, as instruções e vontade de não vender a fracção em causa antes de 2014? Caso assim se exija, os autores acreditam que quase não é possível existir o abuso de representação.
6. Além disso, os 2º e 3º réus disseram na contra-alegação que eles não foram obrigados de conhecer o acordo entre os autores e a 1ª ré, e que o preço verdadeiro na escritura de compra e venda corresponde a MOP$800.000,00.
7. Por isso, o Tribunal escolheu os respectivos factos e suscitou, em relação aos quesitos 33 a 38, as respectivas questões, às quais o acórdão respondeu: Não provado.
8. A par disso, se a 1ª ré realmente se preocupasse com a perda do imóvel BR/C ou da quantia de MOP$823.200,00 que tinha emprestado aos recorrentes, o preço da venda do imóvel que ela fixou não devia ser inferior a MOP$823.200,00, só assim o acto conforma-se com a experiência comum. No entanto, a mesma vendeu a fracção BR/C por MOP$135.000,00.
9. Razão pela qual, os recorrentes deduziram nas alegações anteriores os seguintes fundamentos:
“O Tribunal a quo deu como provados os factos de que os AA adquiriram, em 26 de Abril de 2007, a fracção autónoma BR/C para uso comercial pelo preço de MOP$823.200,00 (vd. factos assentes (B)) e que a 1ª ré vendeu, em 10 de Setembro de 2009, a referida fracção ao 2º R. pelo preço de MOP$135.000,00 (vd. resposta ao quesito 5).
É consabido que o preço dos imóveis em Macau tem subido bastante durante os últimos anos. O preço de uma habitação ordinária é, pelo menos, de mil e tal patacas por pé quadrado.
Perante estes factos que não carecem de alegação nem de prova (artº 434º, nº 1 do CPC) e analisando com base nas regras práticas da experiência, qualquer residente de Macau, sem precisar de uma investigação profunda, pode ter dúvida fundada – é verdade que posso comprar uma loja para uso comercial por um preço tão baixo? Pelo exposto, podemos concluir que o 2º R. sabia e devia saber a existência de abuso de representação.
Tal como diz Pires de Lima e Antunes Varela no Código Civil Anotado, Vol. 1, página 312: “Um exemplo extraído da jurisprudência: feita a prova de que o preço declarado numa escritura de compra e venda é inferior ao preço real, pode inferir-se daí, por presunção, a existência de um acordo simulatório para defraudar a Fazenda Nacional (cfr. Acórdão do S.T.J., de 4 de Dezembro de 1973, no B.M.J. nº 232, págs. 107 e segs.).”
Assim, os recorrentes entendem que o facto no quesito 7º devia ser dado como provado por presunção judicial. No entanto, o Tribunal a quo não proferiu tal decisão, pelo que esta viola o artº 434º, nº 1 e o artº 558º, nº 1 do CPC e o artº 342º do CC.
10. Podemos encontrar, na jurisprudência recente do TSI: processo n.º 653/2011, fls. 503 a 504, o exemplo de presunção dum facto com base nas regras da experiência.
11. Assim sendo, apesar de a decisão sobre a matéria de facto não ter estado fundamentada ou apenas simplesmente fundamentada, o TSI ainda entendeu que o Tribunal de 1ª instância preencheu o disposto no artigo 562, n.º 2 do CPC, pelo que não anulou a decisão sobre a matéria de facto por aquele proferido, isso violou o disposto no artigo 629, n.º 5 do CPC.
12. Pelo que deve ser imposto o reenvio do quesito 7º para o Tribunal de Segunda Instância, que deve reenviar para o novo julgamento no Tribunal Judicial de Base.
(ii) Abuso de representação
13. Se for procedente o fundamento no ponto II supracitado e provado o quesito 7º, deveriam ser julgados procedentes os primeiros três pedidos dos autores por se ter verificado todos os requisitos de abuso de representação previstos no artigo 262 do CC.
Caso assim se não entenda, vêm ainda os recorrentes apresentar os seguintes motivos:
(iii) Violação ao artigo 5, n.º 2 do CPC
14. No que toca ao abuso de representação, é necessária a verificação dos seguintes factos:
1. Actividade de abuso de representante;
2. Conhecimento ou devido conhecimento, por terceira, do abuso;
15. Dos factos resulta que a 1ª ré violou as instruções dos autores e abusou do poder de representação que lhe foi delegado por estes. Por isso, provou-se o primeiro facto essencial do abuso de representação.
16. No entanto, tal como se referiu anteriormente, é demasiado difícil provar o segundo facto essencial do abuso de representação, isto é, elemento interno ou foro cognoscitivo. Por isso, a fim de provar este facto essencial - Será que o 2º réu sabia, quando adquiriu por MOP$135.000,00 a fracção autónoma no litígio, que a 1ª ré vendeu a mesma contra a vontade e instruções dos autores (representados), isto é, a vontade e instruções de não vender a fracção em causa antes de 2014, precisamos de procurar ajuda de alguns factos instrumentais.
17. Nesta causa, tais factos instrumentais são:
A dita fracção autónoma foi adquirida pelos AA. mediante escritura pública celebrada em 26 de Abril de 2007 pelo preço de MOP$823.200,00. (vd. factos assentes (B)).
A 1ª R. vendeu a dita fracção autónoma ao 2º R. pelo preço de MOP135.000,00 (vd. resposta ao quesito 5º).
18. O Tribunal só precisa de ter em conta os dois factos instrumentais supracitados e usar as regras de experiência - o preço dos imóveis em Macau tem subido bastante durante os últimos anos. O preço de uma habitação ordinária é, pelo menos, de mil e tal patacas por pé quadrado – para presumir que, o 2º réu sabia, quando adquiriu por MOP$135.000,00 a fracção autónoma no litígio, que a 1ª ré vendeu a mesma contra a vontade e instruções dos autores (representados), isto é, as instruções e vontade de não vender a fracção em causa antes de 2014.
19. O acórdão recorrido viola o disposto no artigo 5, n.º 2 do CPC por não ter considerado, segundo tal disposto, os factos instrumentais supracitados.
No caso de improcedência dos fundamentos supra referidos, vêm ainda os recorrentes apresentar os seguintes fundamentos:
(iv) Representação sem poderes e nulidade da decisão
20. Provou-se que depois de os autores ter assinado a procuração, estes e a 1ª ré deslocaram-se ao escritório de da Dra. F, advogada, para assinaram uma declaração, que fixou um prazo para o exercício do poder atribuído na procuração: a procuradora não pode hipotecar ou vender a fracção BR/C no período de sete anos contados a partir da data da celebração da procuração. (vd. resposta aos quesitos 1º e 3º).
21. Tal como entende o acórdão recorrido: “Certo é que a 1ª recorrida agiu e procedeu à venda do imóvel com poderes de representação, ainda que em violação do acordado quanto ao uso de tais poderes.”
22. Nesta causa, os autores e a 1ª ré chegaram, através ddeclaração, a um consentimento unânime de não exercício do poder de representação em 7 anos, razão pela qual o acordado tornou-se parte da procuração. Por outras palavras, o efeito do poder de representação só começará quando decorridos os 7 anos fixados no acordado.
23. Nos termos do artigo 271 do CC, Se for estipulado que os efeitos do negócio jurídico comecem ou cessem a partir de certo momento, é aplicável à estipulação, com as necessárias adaptações, o disposto nos artigos 265.º e 266.º.
24. Por outras palavras, a 1ª ré não tem o pleno poder de representação antes de 26 de Abril de 2014, quer dizer que a representação por esta exercida trata-se da representação sem poder. Por isso, o acto de a 1ª ré ter vendido, em nome dos autores, a fracção BR/C aos 2º e 3º réus não produz efeito em relação aos autores, sendo o fundamento de direito previsto no artigo 261 do CC.
25. Assim, os primeiros 3 pedidos dos autores podem ser julgados procedentes com base neste fundamento, no entanto, o Tribunal a quo não proferiu tal decisão, assim erradamente interpretando e aplicando o disposto no artigo 261 do CC.
26. Sendo a consequência necessária da representação sem poder, a procuração em causa deve ser revogada.
27. Além disso, tanto a decisão do TJB como o acórdão recorrido deixaram de apreciar a questão supracitada. Isso mostra que os Tribunais deixaram de pronunciar-se sobre a questão de que a procuração em causa está sujeita ao prazo de 7 anos, de forma que o exercício do poder de representação delegado na procuração dentro de 7 anos produzisse a representação sem poder.
28. Assim sendo, nos termos do artigo 571, n.º 1, al. d) do CPC, deve ser nulo o acórdão recorrido.

Contra-alegaram os Réus, formulando as seguintes conclusões:
A - Nos termos do art. 638.º, n.º 2 do C.P.C., ainda que o valor da presente acção – MOP$1.200.000,00 – exceda o valor da alçada do Tribunal de Segunda Instância, tendo em conta que o Tribunal de Segunda Instância confirmou integralmente a decisão proferida pelo Tribunal de Primeira Instância, tal significa que, à partida, do Acórdão por último proferido não seria admissível recurso para o Tribunal de Última Instância.
B - Acontece que ao Acórdão proferido pelo Tribunal de Segunda Instância foi aposta uma declaração de voto, razão pela qual o recurso foi admitido com a salvaguarda sobre a “... dúvida sobre a natureza de “vencido” da declaração de voto aposta no acórdão ...”.
C - Analisada a declaração de voto logo se retira que a mesma tem uma natureza muito peculiar, na medida em que sufraga o projecto sobre o mérito da decisão recorrida, bem como a pronúncia sobre a resposta ao quesito n.º 7 da base instrutória.
D - A única salvaguarda da declaração de voto diz respeito à lacónica fundamentação da resposta aos quesitos 6.º, 8.º, 22.º a 27.º e 33.º a 38.º da mesma B.I., embora não se conclua no sentido da remessa dos autos à primeira instância, uma vez que os Recorrentes nada requereram nesse sentido.
E - Das alegações dos Recorrentes para o Tribunal de Última Instância, resulta que os mesmos recorrem novamente do mérito da causa, insistindo na alteração da resposta ao quesito n.º 7 da base instrutória, questões confirmadas quer pelo acórdão ora recorrido, quer pela própria declaração de voto de “vencido”.
F - Os Recorrentes não se socorrem da objecção oposta ao Acórdão do Tribunal de Segunda Instância quanto à omissão de fundamentação da decisão proferida em 1.º instância quanto aos quesitos 6.º, 8.º, 22.º a 27.º e 33.º a 38.º da mesma B.I., quesitos esses que, aliás, nem são mencionados no recurso.
G - No caso, dúvidas não podem existir de que o Acórdão do Tribunal de Segunda Instância confirmou a decisão da Primeira Instância, tendo existido unanimidade de votos quanto ao projecto da decisão, bem como quanto à resposta ao quesito 7.º da base instrutória
H - Pelo exposto, tendo os Recorrentes novamente recorrido do mérito da sentença, bem como da resposta ao quesito 7.º da base instrutória, questões confirmadas pelo Acórdão do Tribunal de Segunda Instância e igualmente sufragadas na declaração de voto que lhe foi aposta, ao abrigo do disposto nos arts. 638.º, n.º 2 e 594.º, n.º 4 do C.P.C., entendem os Recorridos que, no caso em apreço, o recurso não deverá ser admitido.
Acresce que,
I - Nos termos do art. 639.º do C.P.C., os recursos interpostos para o Tribunal de Última Instância têm cariz residual, circunscrevendo-se essencialmente à apreciação de questões de direito. Para além de invocadas nulidades do acórdão recorrido, o Tribunal de Última Instância não conhece de matéria de facto.
J - Das alegações dos Recorrentes resulta que os mesmos pretendem a alteração da matéria de facto quanto à resposta ao quesito 7.º da base instrutória (conferir página 1 a 7 do recurso e conclusões 1 a 13).
K - Pelo exposto, entendem os Recorridos que, no recurso agora interposto, ao pretenderem nova apreciação e, a final, alteração da resposta à matéria de facto quanto ao quesito n.º 7 da base instrutória, os Recorrentes recorrem de matéria de facto, ou seja, matéria excluída dos poderes de cognição do Tribunal de Última Instância (conferir art. 652.º do C.P.C.), razão pela qual, quanto a essa parte, deverá igualmente ser negado conhecimento ao recurso, por violação do disposto no art. 639.º do C.P.C..
L - Quando assim não se entenda, o que por mera cautela de patrocínio se pondera, sem conceder, não podem os Recorridos deixar de chamar a atenção para a peculiaridade da situação em apreciação nos presentes autos e, de alguma forma, para a hipocrisia dos Recorrentes, na medida em que vêm, novamente, pela via do presente recurso, renovar a aparência de que se terão celebrado um contrato de compra e venda paradigmático, quando é totalmente falso que assim seja e isso mesmo foi apreciado e dado como provado nos presentes autos.
M - Resulta claramente evidenciado nos autos que a compra por parte dos Recorrentes da fracção autónoma “BR/C” rés-do-chão “B” para comércio, sita na [Endereço(1)], em apreço nos autos, não se destinou à sua verdadeira aquisição, tendo sido efectuada tão só com o objectivo dos mesmos poderem requerer a residência em Macau ao IPIM, sendo ainda certo que o requerimento foi aprovado em Novembro de 2008 (alínea D dos factos assentes e quesito n.º 16).
N - Os Recorrentes insistem em omitir o seu próprio comportamento e as reais motivações pelas quais a fracção “BR/C” foi registada em seu nome, sendo certo que nem pagaram qualquer preço pela “suposta” aquisição da fracção.
O - Tal como resulta das conclusões 1 a 13 do recurso (e das páginas 1 a 7 das alegações), centram os Recorrentes o seu recurso na resposta ao quesito 7.º da base instrutória, para assim tentarem uma alteração da sentença proferida pelo Tribunal Judicial de Base e confirmada pelo Tribunal de Segunda Instância.
P - Quanto à pretendida impugnação da resposta ao quesito n.º 7, os Recorrentes não recorrem do entendimento sufragado no Acórdão recorrido, antes reproduzindo novamente o entendimento consagrado na sentença proferida pelo Tribunal de 1.ª Instância.
Q - A prova do quesito n.º 7 (à semelhança, aliás, da prova do quesito 6.º não posto em causa no presente recurso) competia inequivocamente aos Recorrentes, não tendo os mesmos dado cumprimento ao disposto no art. 599.º do C.P.C. (“Ónus do Recorrente que alegue sobre matéria de facto”).
R - Contrariamente à pretensão dos Recorrentes e tal como se encontra devidamente clarificado no Acórdão recorrido, não se trata de facto que se possa dar por provado por presunção, ao abrigo do art. 342.º do Código Civil.
S - Em bom rigor, no caso, até podíamos estar a falar de uma doação da 1.ª Recorrida aos 2.º e 3.ºs Recorridos, sem que daí fosse legítimo extrair qualquer ilação quanto ao conhecimento dos 2.º e 3.ºs Recorridos no sentido de que os Recorrentes apenas pretendiam que o imóvel fosse vendido mais tarde.
T - É inadmissível tal pretensa ilação / presunção de conhecimento quanto à vontade dos Recorridos, tanto mais que da procuração em causa nos autos não vem estabelecido qualquer prazo para o exercício dos poderes que pela mesma foram conferidos.
U - Pelo exposto, tal como já apreciado no Acórdão recorrido (e sufragado no próprio voto de vencido), deve ser negado provimento à pretendida alteração à resposta ao quesito 7 da base instrutória.
V - Entendem os Recorridos que o art. 5.º, n.º 2 do C.P.C. não tem a mínima aplicação ao caso em apreço, tratando-se antes de um subterfúgio inventado pelos Recorrentes de forma a tentarem desonerar-se da prova do quesito n.º 7, cujo ónus inegavelmente lhes cabia .
X - Não percebem sequer os Recorridos qual o critério dos Recorrentes para a distinção entre factos essenciais e factos instrumentais, porquanto em causa está a prova do facto – essencial – expressamente alegado e vertido no quesito n.º 7 da base instrutória.
Z - Pelo que, não procedeu o Tribunal a quo a qualquer violação do disposto no art. 5.º, n.º 2 do C.P.C., devendo improceder a pretensão de alteração da resposta ao quesito 7.º da base instrutória com esse fundamento.
AA - Quanto à pretensa verificação dos pressupostos da representação sem poderes, tal como resulta do Acórdão recorrido, no caso, é manifesto que a 1.ª Recorrida agiu e procedeu à venda do imóvel com poderes de representação, tanto mais que a procuração foi outorgada em seu benefício, donde não se verificam os pressupostos do art. 261.º do Código Civil.
BB - Sendo ainda certo que a utilizou antes do prazo convencionado, mas fê-lo com justa causa, com receio de perder o imóvel e o valor por que antecipadamente o adquiriu (o valor do empréstimo aos Recorrentes).
CC - Pelo que, também não se verificam as consequências invocadas pelos Recorrentes ao mencionar as disposições dos arts. 271.º, 265 e 266.º do Código Civil, sendo certo que tais normativos não comportam qualquer cominação em caso de incumprimento.
DD - Não obstante tudo quanto os Recorrentes queiram dizer, resultou claramente demonstrado nos autos que, os 2.º e 3.º Recorridos são terceiros adquirentes de boa fé, razão pela qual ao caso não têm aplicação os artigos 261.º e 262.º do Código Civil.
EE - Da análise da procuração não consta qualquer prazo de validade ou limitação ao exercício dos poderes.
FF - Caso a 1.ª Recorrida não utilizasse a procuração que foi outorgada em seu benefício, correria o risco de perder, quer o imóvel, quer o valor do empréstimo que concedeu aos Recorrentes no avultado montante de MOP$823.200,00.
GG - Pelo exposto, o Acórdão recorrido não viola qualquer norma jurídica, não se verificando os pressupostos da representação sem poderes, nem do abuso de representação.
HH - o Acórdão recorrido não padece de qualquer nulidade, na medida em que apreciou e fundamentou todas as questões que lhe foram submetidas, devendo, assim, ser negado provimento ao recurso.

Por despacho da Juíza Relatora do processo, não foi admitido o recurso interposto das decisões que foram confirmadas, sem voto de vencido, pelo Tribunal de Segunda Instância.
E o âmbito do presente recurso ficou assim delimitado às questões relativas à falta de fundamentação da decisão de facto, à violação do art.º 5.º n.º 2 do Código de Processo Civil e à nulidade da decisão.

Foram corridos os vistos.
Cumpre decidir.

2. Factos Provados
Nos autos ficaram provados os seguintes factos:
- Durante o período entre 27 de Abril de 2007 e 10 de Setembro de 2009, os AA. eram donos e proprietários legais da fracção autónoma B do r/c – “BR/C”, para comércio, do prédio sito em [Endereço(1)], inscrito na matriz predial da freguesia de Santo António sob o art. XXXXX, descrito na Conservatória do Registo Predial de Macau sob o n.º XXXXX (vide doc. n.º 1 junto com a p. i.). (A)
- A dita fracção autónoma foi adquirida pelos AA. mediante escritura pública celebrada em 26 de Abril de 2007 pelo preço de MOP$823.200,00 (oitocentos e vinte e três mil e duzentas patacas). (B)
- Após a aquisição pelos AA. da propriedade da dita fracção, foi efectuada a inscrição a favor deles na Conservatória do Registo Predial de Macau sob o n.º XXXXXXG (vide doc. n.º 1 junto com a p.i.). (C)
- Os AA. adquiriram a dita fracção com o objectivo de requerer junto do Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau a fixação de residência em Macau, tendo tal pedido de fixação de residência por investimento sido deferido em Novembro de 2008. (D)
- Em 26 de Abril de 2007 (no mesmo dia em que os AA. adquiriram a propriedade da fracção referida em B) dos factos assentes), os AA. celebraram com a 1.ª R. um “contrato-promessa de compra e venda” que tinha como objecto a mesma fracção, pelo preço de HKD$700.000,00, equivalente a MOP$721.000,00, não tendo sido combinado entre as partes em tal contrato o pagamento de sinal (vide doc. n.º 2 junto com a p.i.). (E)
- O artigo 2º do contrato acima aludido dispõe que “os 1.º e 2.ª outorgantes concordam em realizar a transacção do imóvel decorridos sete anos, na data marcada pelo Cartório Notarial de Macau, …”. (vide anexo 2) (F)
- No entanto, em 9 de Junho de 2009, a procuradora (ora 1.ª R.) pediu ao Dr. G, notário privado, a emissão do certificado da dita procuração, e depois em 10 de Setembro de 2009, vendeu, em representação dos AA. e na qualidade de procuradora, a fracção autónoma “BR/C” do prédio descrito na C.R. P. sob o n.º XXXXX ao 2.º R., mediante escritura pública de compra e venda lavrada pelo Dr. H, advogado e notário privado (vide anexos 5 e 6, que aqui se dão por integralmente reproduzidos). (G)
- Em 14 de Setembro de 2009, os 2.º e 3.ª RR. pediram, mediante requerimento n.º XXX, junto da Conservatória de Registo Predial, o registo de aquisição da dita fracção autónoma, para a modificação do registo relativo à propriedade de tal imóvel e a realização do registo definitivo a favor deles (vide fls. 32 a 38 do doc. n.º 1). (H)
- Os AA., a pedido da 1.ª R., outorgaram, em 26 de Abril de 2007 (no mesmo dia em que foi outorgado o “contrato-promessa de compra e venda”), uma procuração, a favor da 1.ª R., que lhe concedeu poderes para a prática de negócio jurídico consigo mesmo em relação à fracção autónoma “BR/C” do prédio descrito sob o n.º XXXXX (doc. 3 da p.i., que aqui se dá por integralmente reproduzido). (1º)
- A dita procuração foi outorgada em benefício da procuradora (1.ª R.). (2º)
- A seguir, os AA. e a 1.ª R. deslocaram-se ao escritório da advogada Dra. F para assinarem uma “declaração” em que foi acordado um prazo para a utilização da dita procuração, estipulando-se que a procuradora (1.ª R.) não poderá dar em hipoteca nem vender a fracção em causa dentro do prazo de 7 anos a contar da data de outorga da procuração (doc. n.º 4 junto com a p.i., que aqui se dá por integralmente reproduzido). (3º)
- Após a outorga de tal “declaração”, os AA. entregaram a dita procuração à advogada Dra. F confiando-lhe a guarda da mesma. (4º)
- A 1.ª R. vendeu a dita fracção autónoma ao 2.º R. pelo preço de MOP$135.000,00. (5º)
- O marido da 1.ª R. (I) tinha concedido aos AA. um empréstimo de HKD$327.000,00, tendo os últimos declarado dar de hipoteca a favor do marido da 1.ª R. uma fracção autónoma designada por “BS7”, do prédio sito em [Endereço(2)]. (9º)
- Tal hipoteca obstaria aos AA. a pedir a fixação de residência em Macau. (10º)
- A dada altura, os AA. pretendiam proceder ao reembolso da dívida e ao cancelamento da hipoteca. (11º)
- Tendo o credor I falecido, o cancelamento da hipoteca só seria possível após o inventário por sucessão daquele, o qual levaria algum tempo a concluir. (12º)
- A 1.ª R. sugeriu aos AA. uma solução alternativa que consistia na aquisição por estes de um outro imóvel que pertencia a J (fracção autónoma designada por “BR/C” do prédio sito em [Endereço(1)], descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º XXXXX), com base no qual os AA. iriam requerer a fixação de residência. (13º)
- A fim de não protelar mais as formalidades do pedido de fixação de residência, a J e os AA. celebraram, em 26 de Abril de 2007, uma escritura pública de compra e venda na qual a primeira declarou vender aos segundos a sua fracção acima referida, e estes declararam comprar àquela, pelo preço de MOP$823.200,00. (14º)
- A 1.ª R. emprestou aos AA. a quantia de MOP$823.200,00, em numerário, tendo aquela, por sua vez, pedido ao Sr. K para ir depositar a mesma quantia na conta bancária da 2.ª A. e, posteriormente, pediram os AA. ao banco que emitisse uma ordem de pagamento com base no referido dinheiro para pagar a J o preço do imóvel. (15º)
- Com base nessa aquisição, os AA. requereram a fixação de residência junto do Instituto de Promoção de Comércio e do Investimento de Macau. (16º)
- A 1.ª R. e os AA. entretanto acordaram que, uma vez decorrido o prazo de 7 anos durante o qual os segundos se encontravam impedidos de vender o imóvel que adquiriram ao abrigo da lei de fixação de residência, o mesmo seria transferido para a primeira. (17º)
- Pelo que assinaram o contrato-promessa junto à petição inicial como doc. n.º 2 através do qual os AA. prometeram vender à 1.ª R. o mesmo imóvel pelo preço de MOP$721.000,00. (18º)
- As partes declararam no dito contrato que o preço seria pago no momento da celebração da escritura pública de compra e venda, decorridos 7 anos. (19º)
- A fim de garantir o cumprimento do negócio prometido, os AA. outorgaram ainda a procuração junto à petição inicial como doc. n.º 3 através da qual os mesmos conferiram à 1.ª R. plenos poderes de administração e disposição sobre o imóvel. (20º)
- Tendo em conta o empréstimo aludido em 15º, os AA., através do acordo junto à petição inicial como doc. n.º 4, conferiram que a 1.ª R. tinha a direito de usar o imóvel sem necessidade de pagar qualquer contrapartida. (21º)
- A 1.ª R., recendo que os AA. vendessem a terceiros a fracção objecto do contrato-promessa junto à petição inicial como doc. n.º 2 cujo direito de aquisição lhe pertencia ou que esta fosse penhorada pelos credores dos mesmos, vendeu, em nome e representação dos AA., o imóvel em causa ao 2º R. (28º)
- Em 21 de Julho de 2006, os AA. haviam celebrado com I, marido da 1.ª R., um contrato de empréstimo no montante de HKD$327.000,00; e em 8 de Setembro e 23 de Outubro do mesmo ano, os AA. voltaram a celebrar com I, marido da 1.ª R., dois contratos de empréstimos no montante de HKD$84.800,00 e HKD$87.200,00, no total de HKD$499.000,00 (vide doc.s n.ºs 1 a 3 juntos com p.i., que aqui se dão por integralmente reproduzidos). (30º)
- Posteriormente, quando os AA. pretenderam reembolsar os empréstimos a I, marido da l.ª R., este já tinha falecido, pelo que os AA. pagaram à 1.ª R. (C) a quantia de HKD$500.000,00 para reembolsar os empréstimos acima aludidos, tendo, ao mesmo tempo, lhe pedido para proceder, com a maior brevidade possível, ao cancelamento da hipoteca da fracção autónoma BS7 (vide doc. n.º 4 junto com a réplica). (31º)
- Tendo em conta que o cancelamento da hipoteca da fracção autónoma BS7 levaria algum tempo a concluir, a 1.ª R., por tomar conhecimento de que os AA. necessitaram de um imóvel para requerer junto do Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau a fixação de residência em Macau, sugeriu aos AA. a solução aludida em 13º. (32º)

3. Direito
As questões a apreciar prendem-se com a falta de fundamentação da decisão de facto, a violação do art.º 5.º n.º 2 do Código de Processo Civil e a nulidade da decisão.

3.1. Apreciemos em primeiro lugar a questão de nulidade da decisão.
Os recorrentes invocaram a nulidade da decisão prevista na al. d) do n.º 1 do art.º 571.º do Código de Processo Civil, que se refere à omissão de pronúncia.
Alegam os recorrentes que tanto o Tribunal Judicial de Base como o Tribunal de Segunda Instância deixaram de pronunciar-se sobre a questão de que a procuração em causa está sujeita ao prazo de 7 anos, de forma que o exercício do poder de representação delegado na procuração dentro de 7 anos produzisse a representação sem poder. O que não corresponde à verdade.
Na realidade, basta uma leitura simples do Acórdão recorrido (nomeadamente na parte III, pontos 2 e 4) para constatar que o facto de ficar acordado que a procuradora (1.ª R.) não poderia vender a fracção em causa dentro do prazo de 7 anos a contar da data de outorga da procuração foi devidamente ponderado pelas duas instâncias no âmbito do abuso de representação, sendo que os tribunais entenderam que a utilização da procuração dentro do prazo de 7 anos não pode configurar uma situação pretendida pelos recorrentes de representação sem poderes.
Daí que não se verifica a nulidade alegada pelos recorrentes.

3.2. Imputando a falta de fundamentação adequada na decisão sobre a matéria de facto, alegam os recorrentes que, quanto às respostas negativas dadas aos quesitos da base instrutória, nomeadamente ao quesito 7.º, que se trata duma questão muito relevante em relação à decisão correcta da causa, deveria o Tribunal ter indicado fundamentos suficientes para convencer as partes ou a terceira pessoa, de forma que as partes ou o tribunal superior possam ter um juízo razoável sobre a matéria de facto através das regras da ciência, lógica e experiência.
O quesito 7.º tem o seguinte teor: Será que o 2º réu sabia, quando adquiriu por MOP$135.000,00 a fracção autónoma no litígio, que a 1ª ré vendeu a mesma contra a vontade e instruções dos autores (representados), isto é, as instruções e vontade de não vender a fracção em causa antes de 2014?
Na óptica dos recorrentes, a resposta a tal quesito deveria ser a outra, e não aquela dada pelo tribunal de primeira instância.
Ora, nos termos do n.º 2 do art.º 556.º do Código de Processo Civil e no que respeita ao julgamento da matéria de facto, exige o legislador que a decisão sobre a matéria de facto deve declarar quais os factos que o tribunal julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas e especificando os fundamentos que foram decisivos para a convicção do julgador.
E ao abrigo do disposto no art.º 629.º n.º 5 do Código de Processo Civil, “se a decisão proferida sobre algum facto essencial para o julgamento da causa não estiver devidamente fundamentada, pode o Tribunal de Segunda Instância, a requerimento da parte, determinar que o tribunal de primeira instância a fundamente, tendo em conta os depoimentos gravados ou escritos ou repetindo a produção da prova, quando necessário; sendo impossível obter a fundamentação com os mesmos juízes ou repetir a produção da prova, o juiz da causa limita-se a justificar a razão da impossibilidade”.
Daí decorre que o tribunal de primeira instância deve fundamentar a sua decisão sobre a matéria de facto, com análise crítica das provas e especificação dos fundamentos decisivos para a sua convicção.
E a sanção para a falta de fundamentação da decisão de facto é o reenvio do processo para o tribunal de primeira instância, se a parte o requerer, mas apenas com vista à sua fundamentação.
Constata-se nos autos que, no recurso interposto para o Tribunal de Segunda Instância, os recorrentes não requereram que o processo regressasse à primeira instância para ser fundamentada a decisão; o que os recorrentes queriam era uma alteração à resposta ao quesito em causa, quesito 7.º, dando-se resposta positiva.
Daí que não assiste razão aos recorrentes ao afirmar que o Tribunal de Segunda Instância violou o disposto no referido n.º 5 do art.º 629.º, pois o mecanismo aí previsto, o reenvio do processo, só funciona a requerimento da parte, como resulta inequivocamente do próprio texto legal, o que não sucedeu no presente caso.
Com efeito, a falta ou insuficiência de fundamentação da matéria de facto não determina a anulação das respostas dadas, podendo apenas implicar, se estiver em causa algum facto essencial para o julgamento da causa, que o tribunal de recurso determine que o tribunal de primeira instância a fundamente, a requerimento da parte e se for possível. 1
Por outro lado, e ao impugnar o julgamento da matéria de facto feito pelo tribunal de primeira instância, os recorrentes não cumpriram os ónus impostos pelo art.º 599.º do Código de Processo Civil, na medida em que não indicaram quais os concretos meios probatórios que impunham uma decisão diversa, sabendo-se que a legislação é exigente quanto à impugnação da matéria de facto, que tem de ser feita com a indicação não só dos concretos pontos da matéria de facto que considera incorrectamente julgados, mas também dos concretos elementos de prova, sob pena de rejeição do recurso. Improcede assim também a pretensão de o Tribunal de Segunda Instância vir alterar a decisão de primeira instância sobre a matéria de facto nos termos do art.º 629.º do Código de Processo Civil.

No recurso interposto para este Tribunal de Última Instância, alegam os recorrentes que, ao considerar cumprido o disposto no n.º 2 do art.º 562.º do Código de processo Civil e não anular a decisão proferida pelo tribunal de primeira instância sobre a matéria de facto, violou o Tribunal de Segunda Instância o n.º 5 do art.º 629.º do mesmo diploma, pelo que o processo deve ser reenviado para novo julgamento, na parte respeitante ao quesito 7.º.
No entanto, o pedido dos recorrentes não pode ser satisfeito.
Desde logo, porque o reenvio do processo previsto no n.º 5 do art.º 629.º do Código de Processo Civil visa apenas a fundamentação da decisão, e não para novo julgamento.
Por outro lado, toda a alegação dos recorrentes para o Tribunal de Última Instância vai no mesmo sentido de pretender a anulação da decisão de facto, o que não pode ter sucesso, pois não se conforma com o disposto no art.º 629.º n.º 5 do Código de Processo Civil.

3.3. Os recorrentes imputaram ainda ao Acórdão recorrido a violação do disposto no n.º 2 do art.º 5.º do Código de Processo Civil, alegando que basta ter em consideração os dois factos provados (B dos factos assentes e resposta ao quesito 5.º, respectivamente) e as regras de experiência comum para dar resposta positiva ao quesito 7.º.
Ora, trata-se evidentemente da discordância com a decisão sobre a matéria de facto, pretendendo que o tribunal de recurso proceda à sua alteração.
Tal como já foi demonstrado, a pretensão dos recorrentes não pode ser satisfeita, uma vez que não cumpriram os ónus impostos pelo art.º 599.º do Código de Processo Civil.
Ao mesmo tempo, é consabido que, em recurso cível correspondente a 3.º grau de jurisdição, o Tribunal de Última Instância conhece, em princípio, de matéria de direito e não de facto e a sua competência em apreciar a decisão de facto fica limitada, sendo que a decisão proferida pelo Tribunal de Segunda Instância quanto à matéria de facto é, em princípio, intocável, salvo nos caso expressamente previstos na parte final do n.º 2 do art.º 649.º do Código de Processo Civil, isto é, se houver ofensa de disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova, o que não é, sem dúvida, o nosso caso.

Deve ser negado provimento ao recurso.

4. Decisão
Face ao exposto, acordam em negar provimento ao presente recurso.
Custas pelos recorrentes.

               Macau, 4 de Junho de 2014
   Juízes: Song Man Lei (Relatora) – Sam Hou Fai –
Viriato Manuel Pinheiro de Lima
1 Neste sentido, cfr. Ac. da RL de portugal, de 16-2-2005, proc. 2966-4 e Ac. do STJ, de 21-9-2006, proc. 06B2904, citados no Código de Processo Civil Anotado, de Abílio Neto, 2008, p. 1070 e 1075, em anotação ao art.º 712.º, que corresponde ao art.º 629.º do Código de Processo Civil de Macau.
---------------

------------------------------------------------------------

---------------

------------------------------------------------------------




29
Processo n.º 12/2013