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Processo n.º 437/2013
(Revisão de sentença proferida no Exterior)

Relator : João Gil de Oliveira
Data : 3/Julho/2014


ASSUNTOS:
- Revisão de sentença
- Requisitos formais necessários para a confirmação
- Colisão ou não com matéria da exclusiva competência dos Tribunais de Macau
- Compatibilidade com a ordem pública

   SUMÁRIO:

1- Com o Código de Processo Civil (CPC) de 1999, o designado privilégio da nacionalidade ou da residência constante da anterior al. g) do artigo 1096º do CPC, deixou de ser considerado um requisito necessário, passando a ser configurado como mero obstáculo ao reconhecimento, sendo a sua invocação reservada à iniciativa da parte interessada, se residente em Macau, nos termos do artigo 1202º, nº2 do CPC.

2- Não se conhecendo do fundo ou do mérito da causa, na revisão formal, o Tribunal limita-se a verificar se a sentença estrangeira satisfaz certos requisitos de forma e condições de regularidade, pelo que não há que proceder a novo julgamento tanto da questão de facto como de direito.

3- Quanto aos requisitos relativos ao trânsito em julgado, competência do tribunal do exterior, ausência de litispendência ou de caso julgado, citação e garantia do contraditório, o tribunal verifica oficiosamente se concorrem as condições indicadas nas alíneas a) e f) do artigo 1200º, negando também oficiosamente a confirmação quando, pelo exame do processo ou por conhecimento derivado do exercício das suas funções, apure que falta algum dos requisitos exigidos nas alíneas b), c), d) e e) do mesmo preceito.

4- É de confirmar a sentença proferida por um Tribunal do Estado do Paraná, Brasil, que dissolveu um casamento por mútuo consentimento, na sequência de um divórcio intentado como litigioso, com homologação da guarda de filho menor, prestações alimentícias para o filho e para o cônjuge do requerente, alteração do nome para o de solteira em relação a esta, não se vislumbrando qualquer violação ou incompatibilidade com a ordem pública ou qualquer obstáculo à revisão dessa sentença.

O Relator,
João A. G. Gil de Oliveira

Processo n.º 437/2013
(Revisão de Sentença do Exterior)
Data : 3/Julho/2014

Recorrente : A

Recorrida : B
         (anteriormente usava B)

    ACORDAM OS JUÍZES NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INSTÂNCIA DA R.A.E.M.:
    I - RELATÓRIO
    A, mais bem identificado nos autos, cuja residência no Brasil se situa na Rua Regente Feijo, XXX FOZ DO IGUAÇU PR BRASIL, vem requerer contra B, antes, B, também ela mais bem identificada nos autos,
Acção Especial de Revisão e Confirmação de Decisões Proferidas por Tribunais ou Árbitros do Exterior de Macau, o que faz nos termos e com os fundamentos seguintes:
“1.
O requerente e a requerida contraíram casamento em 30 de Janeiro de 1986 no Brasil, sob o regime de comunhão parcial de bens, depois do qual, a requerida passou a utilizar o nome B (vide o Anexo I, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais).
2.
Na constância deste casamento, nasceram três filhos, que são:
C, de sexo feminino;
D, de sexo masculino; e
E, de sexo masculino. (vide a página 3 do Anexo II, da qual, por lapso de escrita, ficou a constar Cg. Aqui, o requerente solicita que lhe autorize a apresentação oportuna dos documentos comprovativos relacionados.)
3.
Depois do casamento, nos últimos anos, havia desarmonia entre o requerente e a requerida. As suas opiniões divergiram-se muitas vezes devido às diferenças nos hábitos e na cultura, o que resultou em conflitos e na ruptura dos laços afectivos dos cônjuges. Assim sendo, pediu-se o divórcio.
4.
Os três filhos têm vivido na Inglaterra desde muito jovens e estudam em Londres. São todos cidadãos europeus.
5.
Mais tarde, tendo o requerente e a requerida chegado a um acordo verbal, a requerida foi viver com os três filhos para Londres.
6.
O requerente estava determinado a divorciar-se da requerida, pelo que os dois, além de que de facto não viviam juntos na mesma casa, não viviam ou mantinham contactos em condições dos cônjuges.
7.
Desde então, o requerente começou a viver com uma outra mulher em condições análogas às dos cônjuges, situação essa que durou cerca de um ano. A requerida, os três filhos, bem como os parentes, amigos e vizinhos também tinham conhecimento desse facto.
8.
Com base nisso, em 4 de Maio de 2007, o requerente requereu o divórcio contra a requerida junto do Juízo da Vara de Família da Comarca de Foz do Iguaçu do Estado do Paraná, tendo sido instaurado o processo de divórcio litigioso n.º 792/2007 (vide os Anexos II e III, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais).
9.
No âmbito do pedido de divórcio litigioso, sobre o exercício do poder paternal e a prestação de alimentos aos três filhos, o requerente propôs que fossem os regulados, e em relação à pensão alimentícia a favor da requerida, o requerente propôs a não prestação de atenção.
10.
Ademais, no dito pedido de divórcio litigioso, o requerente ainda prestou esclarecimentos sobre os bens do casal, alegando que não existiam bens sujeitos à partilha.
11.
No referido processo de divórcio litigioso, o Juízo designou o dia 25 de Setembro de 2008 para a realização da audiência de julgamento (vide a página 1 do Anexo II).
12.
No dia designado, durante a audiência de julgamento, teve lugar, com êxito, uma tentativa de conciliação das partes, que levou à conversão do divórcio litigioso em divórcio por mútuo consentimento (vide a página 1 do Anexo II).
13.
Deste modo, as partes chegaram ao seguinte acordo:
“a) as partes concordam com a decretação da separação judicial;
b) a guarda do filho menor caberá a genitora;
c) o genitor terá o direito de visitas livres;
d) as partes não possuem bens a partilhar;
e) o requerente pagará a título de pensão alimentícia para a requerida o valor equivalente a um salário mínimo nacional, até o dia 30 de cada mês, mediante recibo;
f) o requerente arcará com todas as despesas do filho menor;
g) a requerida voltará a utilizar seu nome de solteira.” (vide a página 1 do Anexo II)
14.
Ouvido o parecer favorável emitido pelo MºPº, o Mm.º Juiz proferiu a sentença decidindo:
“Considerando que as partes requereram nesta audiência, de comum acordo, a conversão da separação litigiosa em consensual e, ouvidos por este Juízo, confirmaram sua pretensão, não aceitando reconciliar-se, ratificando o acordo, com fundamento no art. 269, III, do CPC, HOMOLOGO, por sentença, para que produza seus jurídicos e legais efeitos, o acordo formulado entre as partes, que passa a fazer parte integrante desta decisão, ressalvados direitos de terceiros e decreto a separação judicial de A e B. A requerida voltará a assinar seu nome de solteira, B. Expeça-se mandado de averbação. Custas pelas partes. Dou a presente por publicada e as partes por intimadas. Registre-se. Oportunamente, arquivem-se.” (vide a página 1 do Anexo II)
15.
Ambas as partes, isto é, o requerente e a requerida, manifestaram que se renunciavam ao prazo de recurso (sic), o que foi deferido pelo Mm.º Juiz (vide a página 1 do Anexo II).
16.
Para constar se lavrou e assinou o Termo de Audiência de que constam o acordo das partes, a sentença e as declarações de renúncia ao prazo de recurso supracitados. Consta o mesmo a fls. 076 dos respectivos autos.
17.
No dia supramencionado, ou seja, em 25 de Setembro de 2008, a sentença acima referida transitou em julgado (vide a página 9 do Anexo II).
18.
O conteúdo concreto do acordo entre o requerente e a requerida está em conformidade com as respectivas disposições legais do Brasil, daí que tenha sido reconhecido pelo Juízo.
19.
O acordo das partes constante do aludido Termo de Audiência foi reconhecido à luz do art.º 269, III do Código de Processo Civil do Brasil, no qual, para além do resultado da tentativa de conciliação, foi indicado que as partes chegaram a acordo relativamente aos assuntos exigidos por lei, nomeadamente a decretação do divórcio, o exercício do poder paternal e os alimentos referentes ao filho menor, os bens do casal, os alimentos a favor da cônjuge e o nome da cônjuge.
20.
O referido Termo de Audiência foi assinado não só pelo Mm.º Juiz, oficial de justiça e procuradores das partes, como também pelas próprias partes (vide a página 1 do Anexo II).
21.
Sendo assim, a relação conjugal entre o requerente e a requerida dissolveu-se no dia em que foi prolatada a sentença supracitada (25 de Setembro de 2008).
22.
Como se demonstra pela Certidão de Trânsito em Julgado da Sentença, consoante a lei do local do tribunal de origem, a sentença constante do respectivo Termo de Audiência já transitou em julgado, dito por outras palavras, esta decisão o preenche o requisito estipulado no art.º 1200.º, n.º 1, al. b) do CPC de Macau.
23.
Para efeitos de verificação do requisito previsto no art.º 1200.º, n.º 1, al. a) do CPC de Macau, não há duvidas sobre a autenticidade do documento de que conste esta sentença (i.e. o Termo de Audiência que vimos juntar) nem sobre a inteligibilidade da sentença. (sic)
24.
Ainda por cima, não foi numa circunstância de fraude à lei que o tribunal de origem era competente. Acresce que, quer conforme o art.º 65.º-A do CPC de Macau de 1961, quer nos termos do art.º 20.º do CPC de 1999 ora vigente em Macau, o conteúdo desta sentença não é da competência exclusiva dos tribunais de Macau.
25.
De acordo com a interpretação a contrario sensu dos preceitos legais aludidos no número anterior, segundo a lei de Macau, o tribunal brasileiro tem competência internacional relativa à respectiva acção de divórcio.
26.
Em relação ao que consta do Termo de Audiência e que constitui o objecto do presente requerimento de revisão e confirmação, não há processo pendente ou caso julgado nos tribunais das diferentes instâncias da RAEM, portanto, não se pode deduzir a excepção de litispendência ou a de caso julgado com o fundamento de que o caso já foi julgado pelos tribunais de Macau.
27.
Em sintonia da lei do local do tribunal de origem, ou seja, a lei brasileira, no respectivo processo de divórcio, a ré já foi regularmente citada e foram observados os princípios do contraditório e da igualdade das partes.
28.
O divórcio decretado por esta sentença e o acordo que as partes chegaram para o efeito estão de acordo com a ordem pública da RAEM e os seus princípios, com base nisto, esta decisão judicial reúne os requisitos legais estabelecidos no art.º 1200.º, n.º 1, al. e) do CPC de Macau, conjugado com o art.º 273.º, n.º 2 do Código Civil de Macau.
Por último,
29.
Ora vem requerer a revisão e confirmação da sentença prolatada pelo Juízo da Vara de Família da Comarca de Foz do Iguaçu do Estado do Paraná, procurando que a mesma obtenha plenos efeitos jurídicos na ordem jurídica da RAEM.
30.
Por esse motivo, perante os órgãos competentes da Administração da RAEM, o requerente tem a necessidade de formalizar a sua situação.
31.
Deste´arte, ao abrigo do disposto no art.º 1199.º e ss. do CPC de Macau, a propósito deste pedido de revisão e confirmação da sentença proferida pelo Juízo da Vara de Família da Comarca de Foz do Iguaçu do Estado do Paraná para que a mesma possa produzir efeitos jurídicos em Macau, excepto os pressupostos referidos no art.º 1200.º, n.º 1, al.s a) e f) que aguardam o conhecimento oficioso do Venerando Tribunal, já foi verificado que estão reunidos todos os requisitos legais.
Nos termos acima expendidos, solicita-se ao Venerando Tribunal que, na acção vertente, reveja e confirme o que consta do Termo de Audiência respeitante ao divórcio do requerente e requerida lavrado e assinado pelo Juízo da Vara de Família da Comarca de Foz do Iguaçu do Estado do Paraná em 25 de Setembro de 2008, designadamente o acordo que as partes chegaram e a sentença transitada em julgado no dia supracitado (i.e. o teor da página 1 do Anexo II), de modo a que a referida sentença produza plenamente os seus efeitos jurídicos na ordem jurídica da RAEM.
     Por isso, solicita-se aos Mm.ºs Juízes que, em conformidade com o art.º 1201.º, n.º 1 do CPC, mandem citar a requerida para, querendo, contestar dentro do prazo de 15 dias e que apliquem as respectivas disposições legais até à conclusão do processo sub judice.”
    Não foi deduzida oposição.
    O Digno Magistrado do Ministério Público pronuncia-se no sentido de não vislumbrar obstáculo à revisão em causa.
    Foram colhidos os vistos legais.


II - PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
O Tribunal é o competente internacionalmente, em razão da matéria e da hierarquia.
As partes são dotadas de personalidade e capacidade judiciária, dispondo de legitimidade ad causam.
     Inexistem quaisquer outras excepções ou questões prévias de que cumpra conhecer.
    
    III – FACTOS
    Com pertinência, vem certificado pelo Juízo da Vara de Família da Comarca de Foz do Iguaçu, do Estado do Paraná da República Federativa do Brasil, o seguinte relativamente ao divórcio dos ora requerentes:
    II – FACTOS
    Com pertinência, têm-se por assentes os factos seguintes:

1. Vem certificado o seguinte pelo REGISTRO CIVIL DAS PESSOAS NATURAIS, da República Federativa do Brasil:


“REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL
REGISTRO CIVIL DAS PESSOAS NATURAIS

CERTIDÃO DE CASAMENTO
COM AVERBAÇÃO DE DIVÓRCIO
E ANOTAÇÃO DE CASAMENTO
Nomes
A
B
Matrícula
079897 01 55 1986 2 00042 178 0012853059
Nomes completos de solteiro, datas e locais de nascimento, nacionalidade e filiações dos cônjuges
A, nascido aos 10 de Agosto de 1962, natural de MACAU-REPUBLICA PORTUGUESA, de nacionalidade Portuguesa, solteiro, COMERCIANTE, filho de XXX e de XXX, residente e domiciliado em XXX
B, nascida aos 23 de Outubro de 1965, natural de VILA SERIO-RS, de nacionalidade brasileira, solteira, DO LAR, filha de XXX e de XXX, residente e domiciliada em XXX

Data do registro do casamento (por extenso)
Trinta de Janeiro de um mil e novecentos e oitenta e seis 30-01-1986
Regime de bens do casamento
Comunhão Parcial de Bens
Nome que cada um dos cônjuges passou a utilizar (quando houver alteração)
B
Observações / Averbações
Casamento celebrado neste Ofício, perante o Juiz de Paz NELCI TEREZINHA NEVES DA CRUZ. Consta do referido Assento as seguintes AVERBAÇÕES e ANOTAÇÃO : Por mandado do Dr. GUILHERME CUBAS CESAR M.M. Juiz de Direito da VARA DE FAMILIA DESTA COMARCA, extraído dos autos n.º 792/2007 averbo a Separação Consensual, do casal, decretado por sentença em 25/09/2008, e transitado em julgado em 25/09/2008, voltando a separanda a usar o nome de B, averbado no dia 09/09/2009. Por mandado do Dr. RODRIGO LUIS GIACOMIN M.M. Juiz de Direito da Vara de Família desta cidade e comarca de FOZ DO IGUAÇU-PR, extraído dos autos n.º 5178-67/2010 averbo a Conversão em Divórcio Consensual, do casal, em que é , requerente A e requerida B, decretado por sentença em 06/10/2010, e transitado em julgado em 04/11/2010, voltando a divorcianda a usar o nome de B, averbado no dia 09/11/2010. O cônjuge casou com Min Ling Leung em Foz do Iguaçu-PR, neste ofício da 29/06/2012, cont. Termo n.º 39619, folhas 139, livroB-127. Passando ela assinar o mesmo nome (Min Ling Leung), anotado no dia 03/07/2012. Custas : R$24,67, (175,00VRC), Selo : R$1,34 Lei (13.228/2001), Buscas : R$1,41.
O conteúdo da certidão é verdadeiro . Dou fé.

FOZ DO IGUAÇU PP, 03 de Junho de 2013

Claudia Muriana Cardoso Almeida
Escrevente Autorizado”

    2. Mais vem certificada a petição de divórcio litigioso, a sentença homologatória do divórcio por mútuo consentimento e o trânsito, nos seguintes termos:

    “EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO DA VARA DE FAMÍLIA DA COMARCA DE FOZ DO IGUAÇU – ESTADO DO PARANÁ
    
    792/07
    038
    016
***
A, português, casado, comerciante, inscrito no CPF sob n.º 703.889.469-20 e portador do RNE V031183-S, residente e domiciliado nesta cidade de Foz do Iguaçu, à Rua Itaúna, 784, conjunto Libra IV, por seu procurador infra-assinado, instrumento de mandato anexo (doc. 01), vem à presença de Vossa Excelência, com fulcro no art. 5º parágrafo 1º, da Lei Nacional n.º 6.515, de 26 de Dezembro de 1977, propor
***
AÇÃO DE SEPARAÇÃO LITIGIOSA
    Em face de B, brasileira, casada, comerciante, inscrita no CPF sob n.º 615.789.249-87 e no RG sob n.º 4.440.079-0 SSP/PR, actualmente residindo na cidade de Londres (ING), Flat 16, 15 Nevern Road, SW5 9PQ, Londres - Reino Unido, pelos seguintes fatos e fundamentos de direito:
    I - DOS FATOS:
    01. O Separando está casado, sob o regime de Comunhão Parcial de Bens, com o Separanda, desde 30/01/1986, de acordo com a Lei Nacional n.º 1.110, de 23 de Maio de 1950, conforme fotocópia da certidão de casamento anexa (doc. 02) à presente peça vestibular.
    02. Desta união nasceram 03 filhos, quais sejam: Cg (21 anos), D (18 anos) e o menor E (14 anos), conforme fotocópias das certidões de nascimento anexas (doc 03 usque 05) à presente exordial.
    03. Ocorre, que há mais de 04 (quatro) anos o casal não vem tendo uma convivência pacífica, sendo certo que por várias vezes neste período houve brigas e ameaças de separação em virtude de desentendimentos pessoais.
    04. Actualmente os 03 (três) filhos estão legalmente morando e estudando em Londres, são cidadãos Europeus, haja vista, o Separando ser nacional de Portugal.
    05. Acontece que há mais de 01 {um) ano a Separanda também foi residir juntamente com os filhos em Londres e, em que pese o acordo verbal que haviam feito, ignora os pedidos do Separando para que seja efectivada a separação, pois de fato já não vivem maritalmente, além de não conviverem sob o mesmo teto.
    06. É certo também que o Separando vive maritalmente com outra mulher há aproximadamente 01 (um) ano, fato que é de conhecimento da Separanda, dos filhos do casal, dos parentes, amigos e vizinhos onde reside (declarações anexas) .
    07. Por este motivo é que o Separando vem, através da Justiça, buscar que seja declarada a separação judicial do casal, visto ser esta a situação de fato vivido por ambos.
II - DA GUARDA DOS FILHOS E DOS ALIMENTOS:
    01. O Separando não obsta que a Separanda continue na companhia dos filhos, haja vista morarem juntos no exterior, e ter sido este o acordo entre ambos.
    02. Com relação à visita dos filhos pelo Separando, este tem a intenção de sempre que possível, tendo em vista a distância, efetuá-las, bem como estará sempre de braços abertos para recebê-los.
    03. No que concerne aos alimentos o Separando continuará subsidiando todos os gastos com seus filhos, fato este que sempre ocorreu. É certo que o Separando envia mensalmente em média R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais) mensais para a subsistência destes.
    04. Necessário mencionar que na Inglaterra todos os estudos são gratuitos para os cidadãos europeus, inclusive o nível superior, não incidindo ónus algum para os estudantes. Da mesma maneira, não há despesa com saúde. Portanto, o valor enviado mensalmente cobre todas as despesas que se fazem necessárias. É de anotar também que os filhos maiores já estão trabalhando.
    05. Em relação aos alimentos devidos à Separanda, não se deve cogitar, haja vista a mesma ter todas as aptidões necessárias para exercer actividade laboral. Na Inglaterra, diferentemente do Brasil, há oferta abundante de trabalho.
III - DOS BENS DO CASAL:
    01. O casal possui em comum um único imóvel, qual seja, um lote com área 24.200 metros quadrados, conforme matrícula n.º 14.669, do livro n.º 02, ficha 01 do 2° Registrador de Imobiliário de Foz do Iguaçu (PR). Cópia em anexo (doc. 06).
    02. Ocorre que o referido imóvel foi objecto de penhora de 50% de sua parte ideal. Protocolo n.º 20.085 de 26/01/2001, em cumprimento aos autos 357/2000 de Execução de Títulos Extrajudicial.
    03. A penhora, de acordo com a decisão judicial, foi sobre a meação correspondente à executada, qual seja, a Separanda. Portanto, os 50% da parte ideal do imóvel sem ônus, é propriedade exclusiva do Separando, não incidindo partilha sobre a mesma.
IV - DO PEDIDO:
    Diante do exposto, requer a Vossa Excelência:
    a) no MÉRITO, a procedência do pedido principal, para que seja decretada a separação judicial;
    b) a citação da separanda, para, querendo, vir contestar a presente ação, sob pena de revelia e confissão;
    c) a intimação do ilustre representante do Ministério Público, para que se manifeste e acompanhe o feito até o seu final, sob pena de nulidade, ex-vi dos arts. 82, incisos I e II, 84 e 246, todos do Código de Processo Civil;
    d) a produção de todas as provas admissíveis em direito, especialmente prova documental inclusa e apresentação de demais documentos que forem ordenados, prova pericial, o depoimento pessoal da separanda, reservando-se o direito de usar os demais recursos probatórios que se fizerem necessá rios ao deslinde da ação;
    e) ao final, seja expedido o competente formal de partilha dos bens, bem como, a expedição do mandado de averbação junto ao Oficial do 2.º Registro Civil da Comarca de Foz do Iguaçu, em cumprimento ao disposto no art. 1.124, do Código de Processo Civil.
    Dá à presente causa, o valor de R$ 40.000,00 (quarenta mil reais).
    Nestes termos, Pede deferimento.
    Foz do Iguaçu, 26 de abril de 2007.
    ADOLF UZA BARBOSA
Advogado - OAB/PR 41.022”
*

“PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ
COMARCA DE FOZ DO IGUAÇU

TERMO DE AUDIÊNCIA

Data : 25 de Setembro de 2008, às 15:00 horas
Local : Sala de audiências da Vara de Família da Comarca de Foz do Iguaçu – PR
Autos n.º 792/07 – Separação Litigiosa
Juiz de Direito : Dr. Guilherme Cubas Cesar
Promotora de Justiça : Maria Julia Berriel Soares Ruiz
Requerente : A
Procurador da Requerente : Juvelina Benedita da Silva Marques
Requerido : B
Procuradora da Requerida : Leila de Fátima C. Cornelio
Na data e horário supra mencionados, na sala de audiências do Fórum desta Cidade e Comarca, onde presente se achava o MM. Juiz de Direito, Dr. Guilherme Cubas Cesar, a promotora de Justiça, Dra. Maria Júlia Berriel Soares Ruiz, comigo escrivã de seu cargo, e as partes acima nominadas, ausente a procuradora da autora. O MM. Juiz declarou abertos os trabalhos. Proposta de conciliação restou frutífera : “a) as partes concordam com a decretação da separação judicial; b) a guarda do filho menor caberá a genitora; c) o genitor terá o direito de visitas livres; d) as partes não possuem bens a partilhar; e) o requerente pagará a título de pensão alimentícia para a requerida o valor equivalente a um salário mínimo nacional, até o dia 30 de cada mês, mediante recibo; f) o requerente arcará com todas as despesas do filho menor; g) a requerida voltará a utilizar seu nome de solteira.” A representante do Ministério Público se manifestou favoravelmente ao acordo formulado. Por fim o MM. Juiz de Direito proferiu a seguinte decisão : “Considerando que as partes requereram nesta audiência, de comum acordo, a conversão da separação litigosa em consensual e, ouvidos por este Juízo, confirmaram sua pretensão, não aceitando reconciliar-se, ratificando o acordo, com fundamento no art. 269, III, do CPC, HOMOLOGO, por sentença, para que produza seus jurídicos e legais efeitos, o acordo formulado entre as partes, que passa a fazer parte integrante desta decisão, ressalvados direitos de terceiros e decreto a separação judicial de A e B. A requerida voltará a assinar seu nome de solteira, B. Expeça-se mandado de averbação. Custas pelas partes. Dou a presente por publicada e as partes por intimadas. Registre-se. Oportunamente, arquivem-se”. As partes dispensaram o prazo recursal, o que foi deferido. Nada mais, encerro o presente termo que depois de lido e achado conforme, vai devidamente assinado. Eu ________, o digitei e subscrevi.

Guilherme Cubas Cesar – Juiz de Direito
Maria Julia Berriel S. Ruiz – Promotora de Justiça
A – Requerente
Juvelina Benedita da Silva Marques – Procuradora de Requerente
B – Requerido
Leila de Fátima C. Cornelio”
*
    
     “PODER JUDICIÁRIO
CERTIDÃO DE TRANSITO EM JULGADO
    CERTIFICO E DOU FÉ, que em 25 de Setembro de 2008, transitou em julgado a respeitável Sentença de fls. 076.
    O referido é verdade.
Foz do Iguaçu, 03/06/2013

Luciano Lopes das Graças
Empregado Juramentado
******

Cartório
Vara de Família e Anexos

CERTIDÃO
    CERTIFICO E DOU FÉ, a pedido verbal de parte interessada que revendo os livros de Registro de Feitos, nele verifiquei constar os autos de AÇÃO DE SEPARAÇÃO LITIGIOSA, autuado sob o n.º 792/2007, em que é requerente A e é requerida B, cujo processo ingressou nesta serventia na data de 04/05/2007 e arquivado em data de 29/07/2009 diante da r. sentença lá prolatada, a seguir transcrito : “… Considerando que as partes requereram nesta audiência, de comum acordo, a conversão da separação litigiosa em consensual e, ouvidos por este Juízo confirmaram sua pretensão, não acietando reconciliar-se, ratificando o acordo, com fundamento no art. 269, III, do CPC, HOMOLOGO, por sentença, para que produza seus jurídicos e legais efeitos, o acordo formulado entre as partes, que passa a fazer parte integrante desta decisão, ressalvados direitos de terceiros e decreto a separação judicial de A e B. A requerida voltará a assinar seu nome de solteira, B …”. Nada mais me foi pedido para certificar, dou a presente certidão por encerrada.
O referido è verdade.
Foz do Iguaçu, 05/11/2012

Luciano Lopes das Graças
Empregado Juramentado
Portaria n.º 043/2011”
    
   IV - FUNDAMENTOS
O objecto da presente acção - revisão de sentença proferida em processo de divórcio pelo Juízo da Vara de Família da Comarca de Foz do Iguaçu, do Estado do Paraná da República Federativa do Brasil, - de forma a produzir aqui eficácia, passa pela análise das seguintes questões:
- Requisitos formais necessários para a confirmação;
- Colisão ou não com matéria da exclusiva competência dos Tribunais de Macau;
- Compatibilidade com a ordem pública;
*
1. Prevê o artigo 1200º do C. Processo Civil:
“1. Para que a decisão proferida por tribunal do exterior de Macau seja confirmada, é necessária a verificação dos seguintes requisitos:
a) Que não haja dúvidas sobre a autenticidade do documento de que conste a decisão nem sobre a inteligibilidade da decisão;
b) Que tenha transitado em julgado segundo a lei do local em que foi proferida;
c) Que provenha de tribunal cuja competência não tenha sido provocada em fraude à lei e não verse sobre matéria da exclusiva competência dos tribunais de Macau;
d) Que não possa invocar-se a excepção de litispendência ou de caso julgado com fundamento em causa afecta a tribunal de Macau, excepto se foi o tribunal do exterior de Macau que preveniu a jurisdição;
e) Que o réu tenha sido regularmente citado para a acção, nos termos da lei do local do tribunal de origem, e que no processo tenham sido observados os princípios do contraditório e da igualdade das partes;
f) Que não contenha decisão cuja confirmação conduza a um resultado manifestamente incompatível com a ordem pública.
2. O disposto no número anterior é aplicável à decisão arbitral, na parte em que o puder ser.”

    Com o Código de Processo Civil (CPC) de 1999, o designado privilégio da nacionalidade ou da residência - aplicação das disposições de direito privado local, quando este tivesse competência segundo o sistema das regras de conflitos do ordenamento interno - constante da anterior al. g) do artigo 1096º do CPC, deixou de ser considerado um requisito necessário, passando a ser configurado como mero obstáculo ao reconhecimento, sendo a sua invocação reservada à iniciativa da parte interessada, se residente em Macau, nos termos do artigo 1202º, nº2 do CPC.
A diferença, neste particular, reside, pois, no facto de que agora é a parte interessada que deve suscitar a questão do tratamento desigual no foro exterior à R.A.E.M., facilitando-se assim a revisão e a confirmação das decisões proferidas pelas autoridades estrangeiras, respeitando a soberania das outras jurisdições, salvaguardando apenas um núcleo formado pelas matérias da competência exclusiva dos tribunais de Macau e de conformidade com a ordem pública.
Não se conhecendo do fundo ou do mérito da causa, na revisão formal, o Tribunal limita-se a verificar se a sentença estrangeira satisfaz certos requisitos de forma e condições de regularidade1, pelo que não há que proceder a novo julgamento tanto da questão de facto como de direito.
Dúvidas não resultam quanto à dissolução do casamento proferida à luz do ordenamento do Estado do Paraná, Brasil.
Vejamos então os requisitos previstos no artigo 1200º do CPC.

   3. Autenticidade e inteligibilidade da decisão.
Parece não haver dúvidas de que se trata de um documento autêntico devidamente selado, certificando-se uma decisão proferida pelo Juízo da Vara de Família da Comarca de Foz do Iguaçu, do Estado do Paraná da República Federativa do Brasil, de 25 de Setembro de 2008 e transitada nesse mesmo dia, face às leis do Estado respectivo, cujo conteúdo facilmente se alcança, em particular no que respeita à parte decisória - dissolução do casamento e homologação dos demais acordos dele dependentes.2
4. Quanto aos requisitos relativos ao trânsito em julgado, competência do tribunal do exterior, ausência de litispendência ou de caso julgado, citação e garantia do contraditório, dispõe o artigo 1204º do CPC:
    “O tribunal verifica oficiosamente se concorrem as condições indicadas nas alíneas a) e f) do artigo 1200º, negando também oficiosamente a confirmação quando, pelo exame do processo ou por conhecimento derivado do exercício das suas funções, apure que falta algum dos requisitos exigidos nas alíneas b), c), d) e e) do mesmo preceito”.
   Tal entendimento já existia no domínio do Código anterior3, entendendo-se que, quanto àqueles requisitos, geralmente, bastaria ao requerente a sua invocação, ficando dispensado de fazer a sua prova positiva e directa, já que os mesmos se presumiam4.
   É este, igualmente, o entendimento que tem sido seguido pela Jurisprudência de Macau.5
   Ora, nada resulta dos autos ou do conhecimento oficioso do Tribunal, no sentido da não verificação desses requisitos que assim se têm por presumidos.
   A sentença proferida produziu efeitos a partir da data do registo, depois de oportunamente ter sido instaurada acção em Tribunal. a requerimento do autor, cônjuge marido e convertida em mútuo consentimento.
5. Já a matéria da competência exclusiva dos Tribunais de Macau está sujeita a indagação, implicando uma análise em função do teor da decisão revidenda, à luz, nomeadamente, do que dispõe o artigo 20º do CC:
“A competência dos tribunais de Macau é exclusiva para apreciar:
a) As acções relativas a direitos reais sobre imóveis situados em Maca
b) As acções destinadas a declarar a falência ou a insolvência de pessoas colectivas cuja sede se encontre em Macau.”
Ora, ainda aqui se observa que nenhuma das situações contempladas neste preceito colide com o caso sub judice.
    6. Da ordem pública.
Não se deixa de ter presente a referência à ordem pública, a que alude o artigo 273º, nº2 do C. Civil, no direito interno, como aquele conjunto de “normas e princípios jurídicos absolutamente imperativos que formam os quadros fundamentais do sistema, pelo que são, como tais, inderrogáveis pela vontade dos indivíduos.”6E se a ordem pública interna restringe a liberdade individual, a ordem pública internacional ou externa limita a aplicabilidade das leis exteriores a Macau, sendo esta última que relevará para a análise da questão.
No caso em apreço, em que se pretende confirmar a sentença que dissolveu o casamento, decretando o divórcio entre o ora requerente e a sua esposa, não se vislumbra que haja qualquer violação ou incompatibilidade com a ordem pública.
Aliás, sempre se realça que o nosso direito substantivo prevê a dissolução do casamento, seja por via litigiosa, seja por mútuo consenso.
O pedido de confirmação de sentença do Exterior não deixará, pois, de ser procedente, não esquecendo que existem ainda outros acordos dependentes daquela dissolução, acordos esses que foram homologados pelo Tribunal e que constituem uma sentença, como se alcança da documentação junta, nomeadamente em relação à guarda do filho menor, não havendo bens a partilhar, pensão alimentícia para a requerida, as despesas para o filho menor a cargo do requerente, passando a requerida a usar o seu nome de solteira, sendo certo que também na nossa ordem jurídica são possíveis todos esses acordos na dependência do divórcio.
Assim se confirmará a decisão proferida em todas as suas vertentes, tal como requerido.
   V - DECISÃO
Pelas apontadas razões, acordam conceder a revisão e confirmar a sentença proferida pelo Juízo da Vara de Família da Comarca de Foz do Iguaçu, do Estado do Paraná da República Federativa do Brasil, nos termos da qual foi dissolvido o casamento celebrado entre o ora requerente e a requerida, por sentença de 25 de Setembro de 2008 transitada nesse mesmo dia, conforme vem certificado, nos precisos termos dos documentos de fls. 6 a 16.
Custas pelo requerente.
                  Macau, 3 de Julho de 2014,
     João A. G. Gil de Oliveira
     Ho Wai Neng
     José Cândido de Pinho
    
    
1 - Alberto dos Reis, Processos Especiais, 2º, 141; Proc. nº 104/2002 do TSI, de 7/Nov/2002
2 - Ac. STJ de 21/12/65, BMJ 152, 155
3 - cfr. artigo 1101º do CPC pré-vigente
4 - Alberto dos Reis, ob. cit., 163 e Acs do STJ de 11/2/66, BMJ, 154-278 e de 24/10/69, BMJ, 190-275
5 - cfr. Ac. TSJ de 25/2/98, CJ, 1998, I, 118 e jurisprudência aí citada, Ac. TSI de 27/7/2000, CJ 2000, II, 82, 15/2/2000, CJ 2001, I, 170, de 24/5/2001, CJ 2001, I, 263 de 11/4/2002, proc. 134/2002 de 24/4/2002, entre outros
6 -João Baptista Machado, Lições de DIP, 1992, 254
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